Acórdão nº 0754/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelFERNANDA XAVIER
Data da Resolução04 de Março de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A A... e a B... interpuseram recurso para este STA do despacho saneador proferido pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, na parte em que o mesmo julgou procedente a excepção de ilegitimidade passiva do Estado Português (i), julgou procedente a excepção do caso julgado (ii) e julgou improcedente o pedido de condenação dos RR no pagamento de despesas judiciais, extrajudiciais e honorários.

O recurso foi admitido por despacho de 27.06.2005, a subir com o primeiro recurso que depois dele houvesse de subir, nos próprios autos e com efeito devolutivo (artº 733º, 735º, nº1 e 736º do CPC).

As recorrentes e o Réu Estado apresentaram as alegações e as contra-alegações do recurso interposto, que se encontram a fls. 377 e segs e a fls. 406 e segs., respectivamente.

As recorrentes formularam as seguintes CONCLUSÕES: 1ª. Na presente acção as ora recorrentes peticionam que lhes sejam pagas as quantias correspondentes aos danos provocados nos seu prédios e nas parcelas ocupadas, os lucros cessantes da sua exploração agrícola, o valor das parcelas do terreno propriedade da ora recorrente B... e os juros que se venceriam sobre o produto da venda dos imóveis em causa (v. als. a) e d) do pedido das ora recorrentes; artº 20º, 22º e 62º da CRP e artº12º, 13º, 483º e segs., 501º e 1304º a 1310º do C.Civil).

  1. Os ora recorridos - actual EP e Estado Português - são sujeitos da relação material controvertida, tal como esta foi configurada pelos ora recorrentes na p.i. e têm interesse directo em contradizer, pelos encargos e prejuízos que a procedência da presente acção lhes pode provocar (v. artº28º do CPC), pelo que a sua legitimidade passiva é manifesta.

  2. Conforme resulta do invocado pelos ora recorrentes na sua p.i., os ora recorridos são igualmente partes legítimas na presente acção, pois: a) O actual EP é responsável pelos prejuízos causados às ora recorrentes, em consequência da ocupação ilícita dos seus terrenos e pelos prejuízos causados (v.artº 22º e 62º da CRP, artº1305º do CC e artº215º e 216º do C.Penal).

    b) O Estado Português é solidariamente responsável com o actual EP pelos extensos prejuízos decorrentes para as ora recorrentes das actuações dos institutos públicos que estão sujeitos à sua tutela (v. artº 22º e 199º/d) da CRP e artº501º do CC).

  3. Contrariamente ao decidido no douto despacho recorrido, a identidade de sujeitos na presente acção e no processo nº25/97, que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Portel, não é causa suficiente da verificação da excepção do caso julgado relativamente à parcela nº70, propriedade da ora recorrente A..., tanto mais que quanto a esta nem sequer foi pedido o respectivo valor ou a quantia correspondente ao produto da sua venda (v. alíneas c) e d) do petitório).

  4. Na presente acção e no referido Proc. 25/97, que correu termos no Tribunal Judicial da comarca de Portel, os ora recorrentes não pretenderam obter o mesmo efeito jurídico nem as pretensões deduzidas procedem do mesmo facto jurídico, não existindo, assim, identidade do pedido e de causa de pedir (v. artº497º e 498º do CPC).

  5. A presente acção é absolutamente idónea para fixar a indemnização devida aos titulares dos bens e/ou direitos expropriados em consequência de factos anteriores à declaração de utilidade pública e em áreas que não tenham sido objecto de expropriação (v. artº 22º e 62º da CRP).

  6. O pagamento das despesas judiciais, extra-judiciais e honorários constituem claramente danos indemnizatórios, pois integram danos emergentes ou gastos extraordinários decorrentes do acto lesivo, conforme tem sido entendimento pacífico deste Venerando Supremo Tribunal Administrativo (v. artº 20º e 22º da CRP; cfr. Artº 562º e segs. do CC; Ac. STA de 2005.08.03, Proc. 39934-A).

  7. A invocação constante do artº40º da p.i. que deu origem ao presente processo é claramente idónea e adequada para fundamentar o pedido de indemnização genérico que foi formulado relativamente aos referidos encargos e prejuízos, pois a ora recorrente está impossibilitada de concretizar ou especificar outros factos, relativos a pagamentos que não lhe foram ainda exigidos (v. artº471º e 514º do CPC; cfr. Artº 569º do CC).

    1. O douto despacho recorrido enferma assim de manifestos erros de julgamento, tendo violado frontalmente, além do mais, o disposto nos artº20º, 22º, 62º e 199º da CRP, os artº 12º, 13º, 483º e segs, 501º, 562º e segs., 569º e 1304º a 1310º do CC, bem como os artº26º, 471º, 497º, 498º e 514º do CC.

      *Nas contra-alegações, o Réu Estado CONCLUIU assim:

      a) Quanto à ilegitimidade passiva do Estado: 1º Em face do petitório, a actuação do Estado consistiu, tão só, na declaração de utilidade pública da expropriação de diversos prédios (entre os quais as parcelas 70, 112, 114 e 115, pertencentes às Autoras), destinada à construção do lanço da EN 18 - e alongamento entre a EN 256 e Vidigueira, publicada no DR, II Série (Suplemento) de 21.11.95 (vg. Artigo 7º da petição), sendo que, em nenhum momento, foi posta em causa a legalidade de tal declaração.

    2. Ainda que a pretensão indemnizatória deduzida na acção, tal como foi configurada ab initio pelas Autoras, seja fundada, a posição jurídica subjectiva afectada pela procedência da acção é a posição de uma pessoa jurídica que embora integrada na organização administrativa do Estado - administração estadual indirecta - é pessoa jurídica dele distinta.

    3. Ao julgar procedente a excepção de ilegitimidade do Estado, "por evidente falta de interesse em contradizer", não merece qualquer reparo a douta decisão recorrida.

    4. De resto, não fora a absolvição da instância por efeito da procedência da excepção da ilegitimidade, sempre o Estado teria de ser absolvido do pedido, no despacho saneador, com fundamento na falta, relativamente a ele, de causa de pedir, a qual se mostrava então insusceptível de suprimento através de despacho de aperfeiçoamento por força do disposto nos artº508º, nº5, 273º, nº1 e 264º, nº1 e 2 do CPC.

    5. Ademais, não é legalmente admissível a ampliação da causa de pedir, efectuada pelas AA em sede de alegações de recurso, a pretexto de esclarecerem quais as razões de facto e de direito em que sustentaram a pretensão indemnizatória formulada contra o R. Estado, invocando os artº22º e 199º, d) da CRP e 501º do CC).

    6. Tal alteração da causa de pedir viola o disposto no artº273º do CPC.

    7. Em qualquer caso, o Estado só é sujeito da relação jurídica de expropriação se for a entidade expropriante (artº40º, nº1 do CE/91) e quando, não o sendo, os bens objecto da expropriação se destinem a ser incorporados no domínio público do Estado, como sucede a rede de infra-estruturas rodoviárias, como decorre do artº20º, nº2 do CPC - neste sentido, o parecer da PGR nº224/80.

    8. Não é esse, todavia, o objecto da presente acção.

    9. O que nela está em causa é, tão só, a responsabilidade civil do Estado por factos ilícitos e culposos relacionados com procedimentos expropriativos.

    10. Neste quadro, a legitimidade terá de ser aferida em função dos factos que consubstanciem uma concreta conduta ilícita e culposa, atribuída aos titulares de órgãos do Estado seus agentes ou funcionários.

    11. A posição de garante do pagamento da indemnização que recai sobre o Estado nos termos do artº21º do Código de Expropriações de 1991, só existe nos casos em que, não sendo a entidade expropriante, se verifique falta de pagamento por esta da indemnização já fixada em termos definitivos em processo de expropriação amigável ou litigiosa.

    12. A JAE, como depois o IEP, o ICOR e o ICERR, integravam a administração estadual indirecta, com a categoria de institutos públicos, sujeitos a tutela governamental - artº. 1º do DL nº184/78, de 18.07 e do DL nº 237/99, de 25.06; como tal, detinham personalidade jurídica própria e autonomia administrativa e financeira; definiam as posições e praticavam actos administrativos através de órgãos próprios.

    13. A relação tutelar entre o R. Estado e as primitivas Rés, dada a não previsão expressa de poderes de tutela revogatória e substitutiva, não era idónea para o fazer incorrer em responsabilidade civil por actos ou omissões ilícitas directamente imputáveis aos titulares de órgãos ou aos funcionários dessas entidades, uma vez que tais actos não eram susceptíveis de reapreciação ou revisão tutelares, assim como não eram passíveis de suprimento tutelar eventuais omissões.

    14. O artº22º da CRP, independentemente da configuração que se pretenda dar ao princípio de responsabilidade aí consagrado, não tem in casu virtualidades que o regime infraconstitucional do DL 48051, de 21 de Novembro de 1967, aqui aplicável, não contemple.

    15. É certo que do artº22º da CRC resulta que o Estado e as demais entidades públicas são sempre responsáveis perante o particular e que o regime do DL 48051 apenas prevê a responsabilidade em forma solidária na modalidade da responsabilidade por factos ilícitos e, mesmo aí, circunscrita aos casos de dolo, sendo nos demais casos a responsabilidade da Administração, com ou sem direito de regresso, exclusiva - artº2º.

    16. Porém, uma vez que os autores apenas pretendem que seja o Estado a responder civilmente por perdas e danos, e não também um seu qualquer funcionário ou agente, é despiciendo invocá-lo ou discutir o que tão pouco fazem, uma eventual desconformidade (superveniente) do DL 48051 face ao artº22º da Constituição.

    17. Decisivo é que os actos ou omissões ilícitos foram alegadamente praticados por titulares de órgãos, agentes ou funcionários de entidades distintas do Estado.

    18. A terem-se verificado, serão essas entidades que, nos termos do artº22º da CRP e 2º do DL 48051, responderão solidariamente com aqueles, pelos prejuízos resultantes das acções ou omissões ilícitas em causa.

    19. O Estado responderia se, acaso, para a produção desses danos tivessem concorrido actos ou omissões ilícitas culposas dos membros do Governo.

    20. Tal não...

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