Acórdão nº 01012/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução14 de Maio de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

A... interpôs, no Tribunal Central Administrativo, recurso contencioso de anulação do despacho do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, de 17.09.1997, que lhe aplicou a pena de aposentação compulsiva, alegando que o mesmo padecia de vícios de violação de lei.

Sem sucesso já que, por Acórdão de 19/06/2008, lhe foi negado provimento.

Inconformado, o Recorrente agravou para este Tribunal para o que formulou as seguintes conclusões: 1. O Recorrente constata no presente processo que em muito foi ultrapassado o prazo razoável para a sua decisão, dado que o sempre dito processo se iniciou em 24/11/1997 e só agora, volvidos mais de 10 anos, o mesmo viu recair sobre si, em 1.ª Instância ainda só, uma decisão - situação esta que o ora Recorrente considera violadora das citadas normas da Convenção Europeia dos Direitos Homem, da Declaração Universal dos Direitos do Homem, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e da Constituição da República Portuguesa (Cfr. Ponto Prévio das presentes Alegações de Recurso).

  1. O acto punitivo que aplicou ao recorrente a pena de aposentação compulsiva enferma, assim, de nulidade por desrespeito do prazo de 30 dias previsto no n.° 4 do art. 66.° do EDFAACRL; 3. O acto punitivo que aplicou ao recorrente a pena de aposentação compulsiva padece de violação de lei de fundo por prescrição do procedimento disciplinar, decorrido que foi o prazo previsto no n.° 2 do art. 4° do EDFAACRL; 4. O acto punitivo que aplicou ao recorrente a pena de aposentação compulsiva encontra-se inquinado de violação de lei por erro nos pressupostos uma vez que ao considerar que o arguido obteve e pretendeu obter um lucro ilícito com o seu comportamento, o acto punitivo assentou em factos falsos e dos quais não se fez prova.

  2. Assim, deverá o acto, da responsabilidade de Sua Excelência o Ministro dos Negócios Estrangeiros, datado de 17/09/97, que aplicou a pena de aposentação compulsiva ao ora recorrente, ser declarado nulo (cfr. supra cit. n.º 1 do art. 66° do EDFAACRL; cfr. ainda ponto 2 das presentes Conclusões), ou, se tal não se entender, deverá o mesmo acto ser revogado (Cfr. supra cit. n.º 2 do art. 4° do EDFAACRL; cfr. ainda os pontos 3 e 4 das presentes Conclusões).

    Não foram apresentadas contra alegações.

    Ilustre Magistrado do M.P. foi de parecer que se negasse provimento ao recurso.

    Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

    FUNDAMENTAÇÃO I. MATÉRIA DE FACTO.

    A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos: a) O Recorrente é, conselheiro de embaixada do quadro de pessoal do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), na situação de aposentado, e à data dos factos exercia funções de Cônsul de Portugal, em Porto Alegre, Brasil.

    b) Na sequência de queixa endereçada pela sociedade financeira "B... S.A, ao Secretário-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros (datada de 20.12.95) é, por despacho de 29.01.96, deste Gabinete, solicitada à Inspecção Geral Diplomática e Consular (IDC), através do of. n.º 178, de 01.02.96, "uma averiguação cuidadosa" à factualidade revelada (fls. 19 a 33 do Vol do I do Processo Instrutor-doravante PI- cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido).

    c) Em 13.02.96, aqueles serviços inspectivos iniciam, a coberto do fax n.º A 1/96 - no qual pedem ao Consulado de Portugal, em Porto Alegre, o envio de todos os elementos que possam esclarecer o desaparecimento de um cheque, no valor de 40 mil US$, emitido ao portador pelo recorrente - a recolha de toda a documentação que alicerça o Relatório n.º1-A/96, recepcionado no Gabinete do Secretário Geral em 04.03.96, com base no qual ( ) o Ministro dos Negócios Estrangeiros, por despacho de 18.03.1996, manda instaurar processo disciplinar contra o Recorrente (cfr. fls. 22 dos autos e fls. 1 a 234 do I volume do PI, que aqui se dão por integralmente reproduzidas).

    d) Por despacho de 21 de Março de 1996, foi nomeado o instrutor, facto que foi comunicado ao arguido em 27.03.1996 (cfr. fls. 240 do I Vol. P.I.) e) Em data não apurada, o instrutor do processo deduziu acusação contra o recorrente, nos termos constantes de fls. 394 a 397 do II Vol. do P.I..

    f) O recorrente respondeu à nota de culpa, arrolou testemunhas e juntou dois documentos (cfr. fls. 401 a 433, do II vol. do P.I).

    g) Ouvidas que foram as testemunhas e concluída a peritagem contabilística ordenada ao Consulado de Portugal em Porto Alegre, com vista a apurar sobre "a eventual utilização de verbas consulares entre Agosto de 1990 e Fevereiro de 1994", nos termos constantes de fls. 445 a 688 do II Vol. do P.I. (cujo teor se dá por integralmente reproduzido) o instrutor do processo elaborou, em 17.03.1997 nova acusação contra o recorrente, do seguinte teor: "1. O presente processo disciplinar foi mandado instaurar por Sua Excelência o Ministro dos Negócios Estrangeiros ao conselheiro de embaixada do quadro de pessoal do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Dr. A..., por despacho de 18 de Março de 1996.

  3. Tendo em conta o relatório de 29 de Fevereiro de 1996 da Inspecção Geral Diplomática e Consular, foi elaborada Nota de Culpa e apresentada a defesa pelo Arguido.

  4. Finda a produção da prova oferecida pelo Arguido, constatou-se ser necessário para o completo esclarecimento da verdade relativamente à utilização de verbas consulares por parte do Arguido, entre Agosto de 1990 e Fevereiro de 1994, realizar uma peritagem contabilística ao Consulado de Portugal em Porto Alegre, tendo esta diligência sido superiormente autorizada por Sua Excelência o Ministro em 17 de Dezembro de 1996.

  5. Em virtude das conclusões do Relatório elaborado pelo Dr. C..., Cônsul de Portugal em Santos, na sequência da peritagem contabilística que efectuou ao Consulado de Portugal em Porto Alegre, Sua Excelência o Ministro autorizou a dedução de nova acusação, pelo que se elabora a presente NOTA DE CULPA, nos termos e pelos fundamentos seguintes: 4.1. O Arguido, ao tempo exercendo as funções de Cônsul de Portugal em Porto Alegre, celebrou no dia 1 de Agosto de 1990, na qualidade de diplomata, dois contratos de arrendamento de duas casas distintas, uma situada na Rua ... n.° .. com o Senhor D..., em que foi fiador o Senhor E..., secretário de 1.ª classe do Consulado de Portugal em Porto Alegre, que aparece referenciado no contrato como "funcionário consular", e outra situada na Avenida ..., n.° ... com o mesmo Senhor E... que neste contrato aparece referenciado como "aposentado" (vd. fls. 290 291 296 e 297).

    4.2 O Arguido residiu de facto na casa situada na Rua ..., n.° ... até 31 de Julho de 1991 (vd. fls. 245 e 255) e nunca residiu na casa situada na Av. ..., n.° ... (vd. fl. 247).

    4.3. O Arguido enviou para o Ministério dos Negócios Estrangeiros em Lisboa, em 4 de Setembro de 1990, a coberto do ofício n.° 286^146 (vd. fl. 218) o contrato de arrendamento da casa situada na Av. ..., n.° ... para efeitos de pagamento de abono de habitação pelo Ministério.

    4.4. A renda da casa situada na Av..., n.° ... encontrava-se fixada em dólares norte-americanos USD, no montante de USD 2100, enquanto que a renda da casa situada na Rua ..., n.° ... se encontrava fixada em cruzeiros, no montante de BRC 120000 equivalente no dia 1 de Agosto de 1990 a USD 1719 e no dia 1 de Abril de 1991 a USD 496 (vd. fls. 384, 386, 389, 390, 391 e 392).

    4.5. O Arguido sabia que a renda de casa mensal dos funcionários era paga pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, através de um abono de habitação, por reembolso, e até um limite máximo fixada pelo próprio Ministério, que à data era de USD 1009 e que a partir de 1 de Janeiro de 1992 foi aumentado para USD 1602.

    4.6. O Arguido pretendia com a sua actuação obter um lucro ilícito correspondente à diferença entre a renda por si efectivamente suportada, estabelecida em moeda local em constante desvalorização, e o abono de habitação que o Ministério lhe pagava, abono este que correspondia ao limite máximo previsto no Despacho Conjunto A-220/86-X, de 16 de Setembro, actualizado pelo Despacho n.° 28/1/91 de 30 de Outubro, lucro ilícito que em 1 de Julho de 1991 se cifrava em USD 626,07 mensais e em 1 de Julho de 1993 USD 1596,62 mensais, totalizando de Agosto de 1990 até Julho de 1991 USD 3725,07 e de Agosto de 1991 até Julho de 1993 USD 27279,93.

    4.7. Em 1 de Abril de 1991, o Arguido celebrou um contrato de arrendamento de uma casa situada na Rua ..., n.° ... com a Dra. F..., em que foi fiador o Consulado de Portugal. No mesmo contrato, o Arguido Dr. A... assinou como locatário e como fiador em representação do Consulado de Portugal. A renda mensal estipulada no contrato era de BRC 300.000 (vd. fls. 285 a 289).

    4.8. O Arguido passou a residir efectivamente nesta última casa em 1 de Agosto de 1991, nunca enviando o seu contrato para o Ministério dos Negócios Estrangeiros, pelo que continuou a perceber o abono de habitação referente ao contrato de arrendamento da casa situada na Av. ..., n.° .... A referida renda, não só foi estabelecida em moeda local em constante desvalorização, como ídí congelada logo de início em resultado de processo judicial que o Arguido intentou contra a senhoria.

  6. O Arguido utilizou, durante a sua gerência do Consulado de Portugal em Porto Alegre, de uma maneira sistemática e regular, dinheiro do Consulado para despesas pessoais, cujo total liquidava no final de cada mês, beneficiando assim da desvalorização da moeda local (vd. fls. 369 a 378).

    Perante as declarações do Senhor G..., chanceler do quadro de pessoal do Consulado de Portugal em Porto Alegre (vd. fl. 305), da Sr.ª D. H..., secretária de 2.ª classe do mesmo quadro de pessoal (vd. fl. 332) e do próprio Arguido (vd. fls. 369 a 371 e 380) e com base na existência de listagens mensais intituladas "Despesas efectuadas pelo Sr. Cônsul", com data, discriminação e valor das despesas, rubricadas pelo Arguido, e indicação do montante do "Total das despesas a reembolsar ao Consulado", bem como de um conjunto de recibos e comprovativos de depósitos do Arguido, entregues pela actual...

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