Acórdão nº 0663/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelPOLÍBIO HENRIQUES
Data da Resolução14 de Julho de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO: A... e mulher B..., com os demais sinais dos autos, intentaram, no Tribunal Administrativo do Círculo do Porto, recurso contencioso de anulação do despacho do Presidente da Câmara de Gondomar, de 06.09.2002, que deferiu o pedido de licenciamento de construção da obra sita em Rua de ..., freguesia de São Cosme, concelho de Gondomar, no processo nº 11655/87 a favor de C..., casado, construtor civil, residente em Rua ..., na freguesia de ..., Gondomar.

Por sentença de 28 de Fevereiro de 2007 o Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel começou por julgar improcedentes as excepções de intempestividade do recurso e de irrecorribilidade do acto e, conhecendo do mérito, concedeu provimento ao recurso, anulando o acto contenciosamente impugnado.

1.1. Inconformado, o Presidente da Câmara de Gondomar recorre para este Supremo Tribunal apresentando alegações com as seguintes conclusões: 1. Em primeiro lugar, e no que se refere à questão da extemporaneidade do recurso contencioso, andou mal o MM Juiz a quo, ao concluir pela improcedência total de tal excepção.

  1. Isto porque, inversamente ao vertido na douta sentença recorrida, o termo inicial do mencionado prazo de dois meses, não se transfere para o dia seguinte, em virtude da aplicação da alínea b) do artigo 279º do C.C., tendo em conta o prescrito na alínea c) do mesmo normativo.

  2. É que, salvo o devido respeito, não obstante a patente confusão plasmada na douta sentença em crise, as duas alíneas em questão não podem ser aplicadas cumulativamente, sob pena de se desvirtuar completamente o espírito subjacente ao mencionado dispositivo legal.

  3. A este respeito vide Santos Botelho, in Contencioso Administrativo, 2ª Edição, Almedina, pág. 244, "I. Rompendo com uma tradição largamente dominante, o art. 28º, nº 2 da LPTA veio estatuir que os prazos estabelecidos no número anterior se contavam nos termos do art. 279º do C. Civil, imputando-lhe assim natureza substantiva ao contrário do entendimento adjectivo anterior. II. Ao art. 279º prevalece a ideia do aproveitamento do prazo inteiro. Para atingir esse desiderato, é que a al. c) dispõe o término do prazo para as 24 horas do dia correspondente, dentro da última semana, mês ou ano, à mesma data. III. Mas nada mais, ou seja, se à regra da al. c) se cumulasse a da al. b), aumentaria de um dia o prazo fixado em semanas, meses ou anos, o que, além de se não justificar, atentaria contra a lógica do sistema do art. 279º do C. Civil. IV. Notificado o recorrente do acto contenciosamente impugnado em 22 de Agosto, por aplicação da al. c) do art. 279º do C. Civil e al. c) do art. 279º do C. Civil e al. a) do nº 1 do art. 28º LPTA, o prazo de interposição do respectivo recurso termina em 22 de Outubro do mesmo ano. Interposto este no dia seguinte, sendo este, como aquele, útil, o recurso é extemporâneo" STA 29. 421, 96.05.30.

  4. Logo, tratando-se no presente caso, de um prazo fixado em meses (artigo 28°, n° 1 da L.P.T.A.), a contar de certa data (artigo 29°, n° 1 da L.P.T.A.), apenas se aplica a alínea c) do artigo 279° do C.C., mas já não a referida alínea b).

  5. "I.

    O art. 28°, n° 2 da LPTA ao dispor que os prazos parao recurso contencioso de anulação se contam nos termos do art. 279° do Cód. Civil veio romper com a jurisprudência largamente dominante que, ao invés, lhe atribuía natureza adjectiva.

    1. O prazo de dois meses fixado na al.

    1. do n° 1 do citado art. 28° da LPTA, termina no dia, do segundo mês, correspondente àquele em que ocorreu a publicação ou notificação do acto recorrido. III.

    As regras contidas nas aIs. b) e c) do art. 279° do Cód. Civil têm campos diferentes de aplicação a ao prazo referido em II é aplicável a regra da aludida al. c), em consonância com a norma do art. 29°, n° 1 da LPTA que faz corresponder o início da contagem do prazoà data da notificação" STA 40.685, 98.10.08.

  6. Pelo que, ao considerar totalmente improcedente a questão da extemporaneidade do recurso contencioso, violou a douta sentença recorrida o disposto nos mencionados preceitos legais.

  7. Doutro passo, igualmente não foi mais certeira a decisão em recurso, ao concluir pela violação do artigo 73° do RGEU.

  8. Isto porque, no seguimento da opinião partilhada pela maioria da Jurisprudência do S.T.A., as regras contidas nos artigos 73° e 75° do RGEU aplicam-se, única e exclusivamente ao prédio a construir, ou seja, na situação em análise, ao prédio do recorrido particular.

  9. Ou seja, as normas em causa, destinam-se a titular a salubridade, a iluminação, a exposição solar e o arejamento do prédio a construir, uma vez que, apenas no prédio do recorrido particular é que existem compartimentos de habitação com janelas.

  10. De qualquer modo, atendendo à interpretação maioritária relativamente ao preceituado no artigo 73° do RGEU, o mesmo apenas se aplica aos casos em que, o edifício a construir tem janelas que deitam para um muro ou fachadas fronteiros.

  11. O que não sucede no presente caso, uma vez que, as janelas e as varandas do prédio do recorrido particular, apenas deitam para uns anexos sem janelas, quase completamente enterrados, dos ora Recorridos.

  12. Deste modo, estando salvaguardadas todas as exigências legais, nomeadamente, encontrando-se assegurado o arejamento, a salubridade, a iluminação e a exposição solar, quer do prédio do recorrido particular, quer dos aqui recorridos, não ocorre qualquer violação dos supra citados preceitos legais.

  13. Aliás, mesmo que se entendesse que os normativos em causa se aplicam ao prédio já construído, o que por mera hipótese se coloca, ainda assim, tal Jurisprudência, "vai no sentido de aplicar o normativo (art.

    73° do RGEU) tanto às situações em que na edificação a construir existam janelas, como às situações em que na edificação preexistente também existam janelas, igualmente correspondentes a vãos de compartimentos de habitação"" - José Pais do Amaral, in RGEU Afastamento Entre Edificações, Coimbra Editora 2002, pág. 55.

  14. Por conseguinte, ao decidir de maneira diversa, violou a douta sentença recorrida o preceituado no artigo 73° do RGEU.

  15. Por todo o exposto, violou a sentença em crise, o disposto no artigo 279° do C.C. e artigo 73° do RGEU.

    1.2. Também o interessado particular C... recorre da sentença, formulando as seguintes conclusões: 1ª - Este recurso é interposto da douta sentença proferida a fls. 286 e seguintes, que anulou o acto do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Gondomar que aprovou o licenciamento da obra de construção do aqui Agravante; 2ª- A interposição do recurso contencioso de anulação do despacho recorrido por parte dos recorrentes está ferida de caducidade, excepção esta invocada já pelo agravante no tribunal "a quo", aliás de conhecimento oficioso (neste sentido, o Ac. STA - 2ª Subsecção de 26.10.2004 e P. 141/04); 3ª - O despacho recorrido é irrecorrível, uma vez que a aprovação do licenciamento do agravante se acha assegurada e consolidada na ordem jurídica pelo teor de fls. 88 e 111 a 113 do PA; 4ª- A expressão "fronteiros" inserta no art. 73º do RGEU refere-se unicamente às construções que se posicionam de frente da fachada principal do prédio projectado, que não das fachadas laterais, como é o caso dos autos; 5ª- O art. 73º do RGEU aplica-se unicamente a edifícios projectados que não a prédios já construídos (neste sentido, Ac STA de 19-1-1978 in AD nº 198, págs. 752 e 753).

    6ª - O projecto licenciado a que se refere o despacho recorrido assegura o arejamento, iluminação, exposição solar e a salubridade do prédio do agravante, cumprindo o disposto no art. 58º do RGEU, o que os autos nem sequer questionam de facto; 7ª - Diversa interpretação do preceito em causa - o art. 73º do RGEU - no sentido de que o afastamento mínimo de 3m é aplicável às fachadas laterais, que não fronteiras, cegas ou com janelas, aberturas ou vãos de compartimentos do prédio a construir, relativamente a um terreno vizinho, como é o caso, consubstancia um ónus real sobre o terreno do prédio a construir, legalmente inadmissível por via genérica administrativa, mas também violadora do direito à edificação, que constitui uma vertente do direito de propriedade consagrado no art. 62º-1 da CRP; Desta foram, a douta sentença em crise violou as acima citadas normas, no sentido acabado de expor.

    1.3. Os recorrentes contenciosos, ora agravados contra-alegaram, concluindo: A - O prazo de interposição de recurso de acto administrativo contenciosamente recorrível cujos vícios assacados importem a sua anulabilidade, à data dos factos em apreço, residindo o recorrente no continente, era de 2 meses por força do disposto no artigo 28.°, nº 1, al. a), da LPTA.

    B - De acordo com o disposto no n.º 2, do referido preceito legal, esse prazo de dois meses conta-se nos termos do artigo 279.° do Código Civil.

    C - Por força do disposto no artigo 29.°, nº 1, da LPTA, o prazo para a interposição de recurso de acto expresso conta-se da respectiva notificação ou publicação, quando esta seja imposta por lei.

    D - O que dispõe o artigo 29.°, nº 1, da LPTA, é o evento a partir do qual se inicia a contagem do prazo para a interposição do recurso contencioso.

    E De acordo com o disposto no artigo 279.°, al. b), do Código Civil, "Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr".

    F - De acordo com o disposto na alínea c) daquele mesmo artigo 279.°, "O prazo fixado em semanas, meses ou anos, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data; (".)".

    G - Com a redacção dada à alínea b) do artigo 279.°, do Código Civil, o legislador pretendeu e efectivamente fixou a regra a seguir na determinação ou fixação do termo inicial para a contagem de qualquer prazo, seja um prazo de horas, dias, semanas, meses ou anos.

    H - Com a redacção dada à alínea c) do artigo 279º, do...

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