Acórdão nº 0527/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelMADEIRA DOS SANTOS
Data da Resolução05 de Novembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A Federação Portuguesa de Automobilismo e Karting interpôs a presente revista do acórdão do TCA-Sul que, concedendo provimento ao recurso deduzido por A…, autor na acção administrativa especial destes autos, não só revogou o despacho saneador em que o TAF de Lisboa julgara inimpugnáveis as decisões acometidas e absolvera da instância a dita Federação, mas também ordenou que o processo baixasse à 1.ª instância para prossecução dos seus ulteriores termos.

A recorrente terminou a sua alegação de recurso enunciando as conclusões seguintes: I. A questão da determinação da competência material dos Tribunais Administrativos e consequente delimitação da competência das instâncias competentes no seio da ordem desportiva para apreciar questões estritamente desportivas, revela-se essencial para a boa aplicação do direito, para o respeito pela lei substantiva e para o bom funcionamento dos tribunais.

  1. Assume importância do ponto de vista jurídico aferir a correcta aplicação do artigo 18º da Lei de Bases da Actividade Desportiva no que se refere à Justiça Desportiva, uma vez que da análise dessa questão jurídica depende igualmente a boa aplicação do direito.

  2. Atendendo ao cerne do litígio, estão reunidos os pressupostos do disposto no artigo 150º do CPTA para a admissão do recurso de revista que ora se interpõe.

  3. O Tribunal a quo, no seu douto acórdão, deferiu na totalidade o recurso interposto pelo Autor, ora recorrido, por negar provimento à questão da inimpugnabilidade dos actos impugnados, que havia sido julgada procedente pelo tribunal de 1° instância, que na sua douta sentença reconheceu e bem a natureza puramente desportiva dos actos praticados.

  4. Entendeu, e bem, o Tribunal a quo, que a questão fundamental seria a de aferir a competência material dos Tribunais Administrativos.

  5. Delimitado o problema o Tribunal a quo concluiu pela natureza materialmente administrativa dos actos praticados pela FPAK, ora recorrente.

  6. O Tribunal a Quo não identificou bem a questão do recurso, do ponto de vista dos actos em causa, porque concluiu que a sanção disciplinar aplicada tinha a natureza de acto materialmente administrativo, sendo que o objecto do recurso analisado pelo Tribunal a Quo não era a decisão disciplinar aplicada, mas sim, dois despachos do Conselho de Disciplina da FPAK que negam a admissão do recurso da sanção disciplinar para o Tribunal de Apelação, sendo que tal recusa tem por fundamento a falta de pagamento de uma caução imposta pelo artigo 180° do Código Desportivo Internacional.

  7. A questão da natureza dos actos e bem assim da competência material dos Tribunais administrativos foi apreciada pelo Supremo Tribunal Administrativo, à luz da antiga Lei de Bases do Desporto — Lei n° 30/2004 de 21 de Julho, como resulta do Acórdão do STA, proferido no recurso n° 0262/06.

  8. Apesar de nesse recurso o STA ter decidido pela natureza materialmente administrativa das decisões da Recorrente, certo é que tal decisão não foi tomada por unanimidade, e o raciocínio espelhado em sede de voto vencido, corresponde na íntegra à posição assumida pelo Ministério Publico que em ambos os processos (o de 2006 e o presente processo) concluiu no sentido da inimpugnabilidade dos actos, atenta a sua natureza puramente desportiva.

  9. No presente caso o que se aprecia é a aplicação do artigo 180° do Código Desportivo Internacional que fixa uma caução para apreciação do recurso para os tribunais de Apelação dentro da ordem desportiva.

  10. Com a nova Lei de Bases de Actividade Física e Desporto, Lei n° 5/2007 de 16 de Janeiro, resulta ainda mais clara a distinção dos actos administrativos e actos de natureza desportiva, por resultarem de questões estritamente desportivas e por isso apreciáveis exclusivamente no seio da ordem desportiva, de acordo com o disposto no artigo 18° da mencionada Lei.

    XII.

    Assume especial importância do ponto de vista jurídico aferir a correcta aplicação do artigo 18º da Lei de Bases de Actividade Física e Desporto, que se refere à Justiça Desportiva, uma vez que da análise dessa questão jurídica depende igualmente a boa aplicação do direito e, bem assim, o respeito das competências materiais dos tribunais administrativos e dos tribunais existentes no seio da ordem desportiva.

  11. A questão da determinação da competência material dos Tribunais Administrativos e consequente delimitação da competência das instâncias competentes no seio da ordem desportiva para apreciar questões estritamente desportivas, revela-se essencial para a boa aplicação do direito, para o respeito pela lei substantiva e para o bom funcionamento dos tribunais.

  12. Essa questão reveste-se de maior importância considerando que em ultimo caso, o Tribunal Administrativo poderá obrigar a Federação a incumprir as suas leis de jogo, por dar um tratamento administrativo a uma questão desportiva, o que viola claramente o principio da legalidade e o principio da separação de competências, conduzindo a um resultado arrepiante do ponto de vista jurídico uma vez que a Federação enquanto Autoridade Desportiva Nacional tem o dever de transpor as leis de jogo, no caso em apreço, o Código Desportivo Internacional — CDI, para o seu universo jurídico e zelar pelo cumprimento de tais leis.

  13. A decisão proferida pelo Tribunal a Quo violou o artigo 18° da Lei de Bases de Actividade Física e Desporto e violou igualmente o artigo 180º do Código Desportivo Internacional, que a Recorrente tem o dever de cumprir.

  14. O Tribunal a quo delimitou e bem o cerne do litígio, na sequência da posição assumida pelo Tribunal de 1.ª Instância, ao conhecer em sede de despacho saneador, a questão suscitada pela Requerida, ora Recorrente, — a questão prévia da inimpugnabílidade dos actos em razão da sua natureza.

  15. No processo de análise dessa questão, o Tribunal de 1ª Instância considerou os fundamentos apresentados e consequentemente apurou a natureza dos actos cuja eficácia o Autor, ora Recorrido, pretendia ver anulado pelo Tribunal Administrativo.

  16. Para aferir a natureza dos actos, o Tribunal de 1ª Instância utilizou, e bem, o critério legalmente estabelecido para identificar os actos administrativos; porém o Tribunal a quo, com base na apreciação errada do objecto do recurso e bem assim das normas aplicáveis, decidiu em sentido contrário.

  17. Nos termos do artigo 120° do CPA para o acto ser administrativo tem de ser: uma decisão dos órgãos da administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.

  18. Em todas as relações jurídicas, sejam elas de natureza publica, privada ou mista, há sempre lugar à produção de efeitos jurídicos numa determinada situação individual e concreta, por força de aplicação de determinadas normas, pelo que o que distingue as decisões públicas das decisões privadas é exactamente o cariz da norma aplicada.

    XXI.

    Pelo que o critério reflectido na douta sentença revogada pelo acórdão de que ora se recorre, é reflexo de um raciocínio correcto e legalmente...

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