Acórdão nº 0229/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução13 de Novembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

B…, Lda., propôs, no TAF de Lisboa, acção de responsabilidade civil extra-contratual contra o Estado Português pedindo que este fosse condenado a pagar-lhe a quantia de Esc.: 5.255.178.000$00 - correspondente ao valor total do pedido indemnizatório reportado a 31/12/1997 no montante de Esc.: 5.198.000.000$00, actualizado de acordo com a taxa média de inflação de 2,20% publicada pelo I.N.E. desde 1/01/98 até final de Junho de 1998, inclusive - e a quantia correspondente à actualização do valor acima referido, de acordo com a taxa média de inflação do I.N.E., desde Julho de 1998 (inclusive) até à data de citação do Réu, bem como os juros de mora calculados à taxa legal, desde a data de citação até integral pagamento.

Para tanto alegou ter-se candidatado à concessão da exploração de uma sala de bingo a qual, por despacho do Secretário de Estado do Turismo que veio a ser anulado pelo STA com fundamento em vício de violação de lei, foi concessionada à candidata C… SA. Acrescenta que se aquela ilegalidade não tivesse sido praticada aquela concessão ter-lhe-ia sido adjudicada visto a sua proposta ser a melhor e que, por isso, tem direito a ser ressarcida dos prejuízos que a decisão ilegal lhe causou.

Sem êxito, já que a acção foi julgada improcedente com o fundamento de que ficara por provar que a Autora tivesse apresentado a melhor proposta e, portanto, que tinha direito à adjudicação. Inexistia, assim, um nexo de causalidade entre o acto ilícito e os alegados danos.

É esta decisão o objecto deste recurso o qual foi finalizado com a formulação das seguintes conclusões: 1) Como não podia deixar de ser, a presente acção é uma reconstituição da situação hipotética da lesada, ou seja, daquela em que ela agora estaria se o acto ilícito não houvesse sido praticado, e é com este objectivo que se formula o pedido indemnizatório.

2) A A., ora recorrente, alegou e provou, cabalmente, a culpa da administração, o prejuízo, o nexo de causalidade existente entre o acto, o dano e os lucros cessantes, que se ampliaram à falta de exploração de um Hotel e à realização de aplicações financeiras.

3) A qualidade da A., ora recorrente, de empresa do sector turístico, foi um factor de diferenciação relativamente às outras propostas e claramente reconhecido pela entidade adjudicante, tendo igualmente ficado provado que a A. assegurava as demais condições concursais.

4) Não se trata, por isso, de um pedido indemnizatório fundado numa "omissão ilegal" ou "adjudicação virtual", já que a A., ora recorrente, provou, como lhe competia, a adjudicabilidade da sua proposta e o verdadeiro direito à adjudicação de que era titular.

5) O estudo junto pela A. baseia-se, predominantemente, em fontes oficiais e do mercado, e a sua consistência e qualidade está bem patente na dificuldade que o Réu tem em o infirmar ou contrariar, não tendo apresentando um único meio de prova que contrarie os resultados apresentados.

6) A sentença recorrida viola, assim, o disposto nos artigos 483.°, 562.°, 563.°, 564.° e 566.°, todos do Código Civil.

7) Acresce que, ao fundamentar a sua motivação em meras presunções, sem qualquer sustentação em factos que se encontrem provados, a sentença recorrida viola, também, o disposto no artigo 351.° do Código Civil.

O Ilustre Magistrado do M.P., em representação do Estado, contra alegou para concluir como se segue: 1. A presente acção radica no princípio da responsabilidade civil extracontratual do Estado por facto ilícito e culposo prevista no n.º 1 do art.º 2.º do DL 48.051, de 21/11/67, sustentando a Recorrente estarem, no caso sub judice, cumulativamente verificados os pressupostos de que depende a efectivação dessa responsabilidade: a prática de um acto voluntário por parte de um órgão ou agente administrativo no exercício das suas funções públicas; o nexo de imputação subjectiva desse facto ao agente (culpa); a existência de danos; o nexo de causalidade adequada entre o facto ilícito invocado como causa de pedir e o danos verificados.

  1. Radicando a pretensão indemnizatória deduzida pela Recorrente no acto administrativo declarado ilegal pelo STA - despacho do Secretário de Estado do Turismo de 10/11/1988 - pelo qual se adjudicou provisoriamente à sociedade denominada C…, SA, a exploração do jogo de bingo posta a concurso por aviso publicado no DR, III, n.º 132, de 8/06/1988 - apenas foi demonstrada a verificação dos pressupostos da ilicitude e da culpa; já não os restantes pressupostos, mais propriamente a demonstração de que foram produzidos danos causalmente ligados, por uma relação de causalidade adequada, ao facto que vem invocado pelo Recorrente como causa de pedir.

  2. Com efeito, é patente que, nos termos da pretensão formulada pela Recorrente, nenhum dos prejuízos alegados resulta, normal e provavelmente, da adjudicação provisória contida no despacho de 10 de Novembro de 1988.

  3. Como mais desenvolvidamente se sustenta no ponto VI do parecer jurídico que oportunamente foi junto com a contestação pelo R. Estado, como doc. n.º 2 e cujo teor aqui se tem por reproduzido, mesmo a existir um tal nexo de causalidade, o que apenas se admite por mera hipótese de raciocínio, o mesmo teria de ter-se por interrompido em face da negligente conduta processual da A. ora recorrente, no accionamento do meio processual de suspensão de eficácia do despacho ilegal em causa.

  4. Assim, foi essa negligente conduta processual, e não a ilegalidade do despacho de adjudicação provisória, a causa directa dos danos que a Recorrente, na qualidade de concorrente preterida e a título de lucros cessantes, alega terem-lhe sido causados, sendo aplicável, neste capítulo, a segunda parte do art.º 7.º do DL 48.051, de 21/11/67 e do n.º 1 do art.º 570.º do CC, em termos de fixar a indemnização apropriada.

  5. Sempre se dirá que a pretensão indemnizatória formulada pela Recorrente na presente acção labora num equívoco de base que consiste em confundir realidades distintas, qual sejam: (1) a reconstituição natural ou específica da sua situação jurídica tal como se verificaria no presente se, hipoteticamente, a conduta administrativa ilegal não se tivesse verificado - a «reconstituição da situação actual hipotética»; (2) a obrigação de indemnizar decorrente da inexecução, legítima ou ilegítima, da sentença anulatória, verificada em sede de execução de sentença; (3) a obrigação do Estado indemnizar, nos termos do regime geral da responsabilidade civil dos entes públicos, por factos ilícitos praticados por seus órgãos ou agentes.

  6. Tal equívoco está claramente patenteado nas alegações da Recorrente, ao concluir «Como não pode deixar de ser, a presente acção é uma reconstituição da situação hipotética da lesada, ou seja, daquela em que ela agora estaria se o acto ilícito não tivesse sido praticado, e é com este objectivo que se formula o pedido indemnizatório» - v - conclusão 1.ª.

  7. Ora, como desenvolvidamente tratado no ponto VII do parecer supra referido, cujo teor aqui se tem por reproduzido, a anulação do acto administrativo de adjudicação provisória pelo...

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