Acórdão nº 0886/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelANTÓNIO CALHAU
Data da Resolução02 de Dezembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – A…, com os sinais dos autos, não se conformando com a sentença da Mma. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a oposição por si deduzida ao processo de execução fiscal n.º 3344200201512404, instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa 11, por dívida de IRC do exercício de 1996 da sociedade B..

., no montante de € 75.785,61, dela vem interpor recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões: 1. O presente recurso vem interposto da douta sentença que indeferiu a oposição judicial apresentada pelo ora Recorrente na sequência da decisão de reversão contra o Requerente de uma dívida de IRC do ano de 1996 da B….

  1. O Meritíssimo Juiz a quo considerou não ter ficado demonstrada a não verificação dos pressupostos legais de reversão.

  2. O Recorrente não se conforma com este entendimento que resulta de incorrecta interpretação e aplicação da lei ao caso em apreço e que se traduz na aplicação de uma norma inconstitucional.

  3. Desde logo, o Recorrente considera que o art.º 13.º do CPT é inconstitucional, na parte que respeita à presunção legal de culpa e consequente inversão do ónus da prova.

  4. A presunção legal de culpa, por demasiada onerosa e injustificada, viola, desde logo, o princípio constitucional da proporcionalidade ou proibição do excesso, consagrado no art.º 266.º, n.º 2 da CRP.

  5. O carácter excessivo e, por isso mesmo, desproporcionado, retira-se logo do facto de não existirem quaisquer limites à responsabilidade tributária dos responsáveis subsidiários, nos termos defendidos por Paulo de Pitta e Cunha e Jorge Costa Santos, in “Responsabilidade Tributária dos Administradores ou Gerentes”, Lex, Lisboa 1999, págs. 124 e segs.

  6. A desproporção de um regime deste tipo havia sido reconhecida pelo próprio legislador de 1987, que através do Decreto-Lei n.º 68/87, de 9 de Fevereiro, alterou o então vigente art.º 16.º do CPCI, introduzindo a verificação da culpa efectiva como requisito de responsabilidade dos administradores e transferindo para a Administração Fiscal o ónus de a provar.

  7. Como consta do preâmbulo do referido diploma legal, que passamos a transcrever, “O princípio da culpa é, em matéria de responsabilidade civil, de decisivo relevo para a configuração da esfera jurídica das pessoas, na qual elas se poderão disponivelmente mover. Pressupõe uma regra de justiça, isenta de qualquer fatalismo tendencialmente inadequado. (...) No tocante à responsabilidade civil dos gerentes e administradores da sociedade, não deverá a solução divergir, no fundamental, da genericamente adoptada. (…) Daí que perca cada vez mais sentido dotar o Estado, enquanto credor social, de um estatuto desproporcionalmente privilegiado”.

  8. O próprio legislador admitiu, claramente, que um regime de responsabilidade não assente na culpa efectiva, a provar pelo credor, nos termos gerais, era desproporcionado e constituiria um privilégio injustificado do Estado.

  9. A desproporção constata-se, ainda, na própria posição processual ocupada pelas entidades envolvidas: a Administração Fiscal nada mais tem que fazer que requerer uma certidão de registo comercial da qual conste o nome dos administradores a exercer funções à data dos factos, recaindo sobre estes inteiramente o ónus da prova de diversos factos negativos, como o não exercício efectivo da gerência ou a inexistência de culpa.

  10. A desproporção em termos processuais é, pois, notória, tanto mais quanto é ampla e unanimemente reconhecida a dificuldade de prova de factos negativos – cfr. sobre esta matéria Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, págs. 442 e seguintes.

  11. O dispositivo legal em causa viola, também, o princípio da capacidade contributiva na medida em que ignora por completo a capacidade económica de pagar impostos por parte do responsável subsidiário.

  12. A lei prevê uma transferência subjectiva da responsabilidade de pagamento sem qualquer regime de salvaguarda, protecção e sem atender às condições económicas do gerente.

  13. Uma regra deste tipo, com a aplicação que se pretende, implica o consumo de patrimónios de terceiros alheios às manifestações de riqueza ou de capacidade contributiva que constituem a matéria colectável dos impostos em causa.

  14. A admitir-se a responsabilidade tributária dos gerentes por dívidas de terceiros - o que se admite, dentro de certos condicionalismos decorrentes dos princípios constitucionais -, como forma de indemnizar o Estado na sua qualidade de credor social, sempre se teriam que verificar em concreto os pressupostos da responsabilidade civil extra-contratual, nomeadamente a prática de um acto ilícito, culposo e causal.

  15. E cumpriria à Administração Fiscal alegar, demonstrar e provar a verificação de todos estes elementos, nos termos gerais de Direito.

  16. O art.º 13.º do CPT está, pois, clara e frontalmente, em contradição com o estabelecido no art.º 104.º da CRP, implicando a inconstitucionalidade material da referida norma.

  17. Face ao exposto, considera o Recorrente que a presunção legal de culpa prevista no art.º 13.º do CPT é inconstitucional por violar os princípios constitucionais da proporcionalidade e da capacidade contributiva.

  18. Assim sendo, competiria à Administração Fiscal fazer prova da culpa efectiva do ora Recorrente, enquanto ex-gerente da B…, o que não sucedeu.

  19. Mas, mesmo que assim não se entenda, sempre se dirá que não se...

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