Acórdão nº 0883/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução16 de Maio de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida na acção administrativa especial com o n.º 2017/08.8BELRS 1. RELATÓRIO 1.1 O Representante da Fazenda Pública (adiante Recorrente) junto do Tribunal Tributário de Lisboa recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença daquele tribunal que, julgando procedente a acção administrativa especial deduzida pela “Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP)” (adiante Autora ou Recorrida), condenou a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) a reconhecer a isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) relativamente a fracções autónomas de um imóvel sujeito ao regime da propriedade horizontal, fracções que são da Autora e destinadas a garagem, apresentando alegações, que rematou com a formulação de conclusões do seguinte teor: «

  1. A questão decidenda prende-se em saber se as garagens (fracções autónomas) pertencentes à Recorrida podem merecer a qualificação de imóveis destinados directamente à realização dos fins da Recorrida e, consequentemente, beneficiarem da isenção do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI).

  2. Cabendo interpretar a norma da alínea d) do Artigo 44.º do EBF verificamos que esta alínea consagra, desde logo, uma isenção mista: de cariz subjectivo, atenta a qualidade dos sujeitos passivos dela beneficiários, ou seja, as associações sindicais e de cariz objectivo, na medida em que estas entidades só dela podem beneficiar quanto aos prédios ou parte dos prédios destinados directamente à realização dos seus fins.

  3. É a verificação do pressuposto objectivo que está em discussão.

  4. Na verdade, a lei pretende isentar de IMI os prédios que as associações sindicais utilizem directamente na realização dos seus fins, i.e, dos prédios que elas têm necessidade de utilizar para a prossecução do seu objecto social.

  5. Se dúvidas houvessem, o legislador fez constar da norma, o advérbio “directamente”, visando obrigar as associações a consignarem expressamente perante a AT o destino dos imóveis obrigando à responsabilidade dos seus responsáveis pelo uso do bem no âmbito do escopo da entidade.

  6. É, pois, a partir do advérbio “directamente” que resulta assente que o legislador não quis isentar a totalidade dos prédios detidos pelas associações sindicais, mas apenas os que estão directamente afectos a realização dos seus fins.

  7. Não cumprindo as garagens esse propósito, na medida em que, ao contrário do que é dito na sentença recorrida, não existe qualquer ligação funcional entre as mesmas e a actividade.

  8. E não existe, porque a prossecução da sua actividade não depende, nem na sua dimensão cívica, nem na sua dimensão social, da existência de quaisquer dependências ou garagens.

  9. Não valendo, para o efeito, o argumento do transporte pelos seus associados porque nenhuma actividade sindical está funcionalmente dependente dos meios de transporte utilizados pelos seus membros.

  10. De notar que o que está em causa é a mera susceptibilidade de essas fracções poderem ser afectas a outros fins que não aqueles em que se esgota a actividade da associação, o que foi o bastante para o legislador se revestir de tantas cautelas.

  11. Poderá ser, ou não, o caso da Recorrida mas a lei é geral e abstracta e tem por destinatário o universo dos sujeitos passivos.

  12. Pelo que se o legislador assim optou, certamente que o fez atento ao valor da segurança jurídica, que se perfaz pela certeza, estabilidade sistémica, protecção da confiança e pela concretização da justiça.

  13. Resulta, assim, inequivocamente da letra da lei que tem que existir uma relação directa entre o destino dos prédios e os fins prosseguidos pela pessoa colectiva, sendo que essa relação só é directa quando resulta da própria afectação ou utilização do prédio.

  14. Acresce que a Recorrente não pode renunciar à sua interpretação da lei, segundo os seus próprios juízos de equidade, fazendo tábua rasa do princípio da legalidade a que sim está vinculada.

  15. Cabia à Recorrente fazer foi exactamente o que fez, uma interpretação declarativa da norma em análise, limitando-se a eleger o sentido que o texto directa e claramente comporta.

  16. Por outro lado, há que sublinhar que as isenções de IMI respeitantes às garagens como complemento da habitação estão dependentes da prova da afectação do imóvel à habitação própria e permanente, distanciando-se, deste modo, da previsão da alínea e) do artigo 44.º do EBF, que faz depender a isenção do pressuposto objectivo que é a afectação das fracções ao fim prosseguido pelas associações, o que, em nosso entender, impede a sua transposição para o caso em apreço.

  17. Mas existe ainda um argumento de força maior que obsta a que se faça tal remissão e que é o seguinte: a fracção que está afecta aos fins da associação tem por destino serviços e não a habitação, logo não tem cabimento transpô-la para o caso sub judice.

  18. O que, de facto, se afigura transparente é que através deste figurino de isenções o legislador manifesta uma clara intenção em não tributar a capacidade contributiva das associações sindicais revelada pela propriedade ou posse de imóveis desde que o seu proprietário os aloque a fins de utilidade pública.

  19. Donde, à luz de tal justificação e da interpretação que fazemos da lei aplicável, é notório que a Recorrida não tem direito à isenção de IMI sobre as fracções supra identificadas.

Nos termos supra expostos, e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente, não se confirmando a douta sentença recorrida».

1.2 A Recorrida apresentou contra-alegações, com conclusões do seguinte teor: «a. As fracções GN, GO e GP, embora fisicamente distintas da fracção JZ, perdem a sua autonomia uma vez que servem de parqueamento a esta fracção, ficando submetidas à totalidade do espaço que serve a mesma utilidade material e económica, estando, desta forma, todas elas conectadas directamente com a realização dos fins da A., entendimento acolhido pelo actual artigo 46.º, n.º 2, do EBF, que determina que os arrumos, despensas e garagens, ainda que fisicamente separados, mas integrando o mesmo edifício ou conjunto habitacional, desde que utilizados exclusivamente pelo proprietário, inquilino ou seu agregado familiar, como complemento da habitação isenta, são também objecto de isenção; b. Nada obsta à interpretação extensiva do disposto no artigo 40.º, n.º 1, alínea d), do EBF, no sentido de que a isenção à liquidação de IMI concedida à fracção onde está instituída a sede da Associação Sindical, e onde se desenvolve grande parte da actividade intrínseca à prossecução dos seus fins, deverá ser extensível a todas as fracções que prestem um apoio funcional e complementar a esta, na medida em que só assim o prédio (onde se encontram as instalações da ASJP) poderá funcionar como uma verdadeira unidade material e económica na realização dos fins da A.; c. Ao exigir-se, nos termos do artigo 109.º do Regulamento do PDM de Lisboa de 1994, a construção das garagens como estrutura de apoio a parcelas integrados em edifícios (entenda-se prédios) destinados a serviços, estabelece-se que as garagens são um complemento necessário e directo à utilização dessas parcelas/prédios, pelo que, também por esta via, podemos concluir que, no caso sub judice, as fracções GN, GO e GP não são autonomizáveis em relação à fracção JZ, sendo antes uma parte integrante desta, servindo de apoio funcional aos serviços que se prestam na fracção JZ, estando, por isso, directamente conectadas com a realização dos fins da A.; d. Por último, o entendimento da Recorrente desrespeita, in casu, o princípio de justiça material em matéria tributária...

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