Acórdão nº 01314/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Fevereiro de 2018
Magistrado Responsável | ASCENS |
Data da Resolução | 28 de Fevereiro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO A Autoridade Tributária e Aduaneira, vem recorrer para este Supremo Tribunal do despacho do M.mº Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou extinto o procedimento contraordenacional interposto contra a sociedade, A…………, SA, melhor identificada nos autos, por alegada violação do disposto no artigo 98.º, nº 3, do Código do IRS no valor de € 1.884,50 acrescido de custas processuais.
Inconformada com o assim decidido, apresentou as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões: «l. À Recorrente arguida foi aplicada coima no valor de €1.884,50, acrescida de custas processuais, no âmbito do processo contraordenacional n.º 32392016060000104398 pela prática de ilícito contraordenacional pela falta de entrega de imposto retido na fonte no valor de €6.281,67 com referência ao período de 2016/06, em incumprimento do disposto no artigo 98,° do CIRS, infracção prevista e punida pelo n.º 2 do artigo 114º e n.º 4 do artigo 26.°, do RGIT.
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Sendo que a recorrente foi declarada insolvente no Processo n.º 26379/16.4T8LSB com termos na 1ª Secção de Comércio (J4) da Comarca de Lisboa — Instância Central por sentença transitada em julgado, datada de 12/12/2016.
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Questão pertinente na presente sede é proceder ao preenchimento do conceito a atribuir à “morte do arguido” a que apela a norma contida na alínea a) do artigo 61.º do RGIT, de acordo com o qual o procedimento de contraordenação se extingue com a morte do arguido, uma vez que tal extinção impõe, pela via do artigo 62.º do RGIT, a extinção da obrigação de pagamento da coima e de cumprimento das sanções acessórias.
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Se o procedimento contraordenacional se extingue com a morte do arguido, e portanto com a extinção da pessoa colectiva, é seguro afirmar que, de acordo com o artigo 160.º, n.º 2, do CSC e a alínea t) do n° 1 do artigo 3.º do Código do Registo Comercial, a extinção da pessoa colectiva se efectiva apenas com o registo comercial do encerramento da liquidação da pessoa colectiva.
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Da declaração de insolvência da pessoa colectiva decorre a sua dissolução (alínea e) do n.º 1 do artigo 141.º do CSC), o que determina que a sociedade entre em liquidação (cf. n.º 1 do artigo 146.° do CSC). Porém, sucede que o n.º 2 do artigo 146.º do CSC determina expressamente que a sociedade em liquidação mantém a personalidade jurídica, sendo-lhe aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições que regem as sociedades não dissolvidas, daí decorrendo uma clara e inequívoca comparação entre a sociedade que exerce em condições normais a sua actividade e a sociedade que inicia processo de dissolução e de liquidação.
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Ademais, a declaração de insolvência, pela verificada impossibilidade de cumprimento pontual das obrigações por parte do devedor (artigo 3º, n.º 1, do CIRE), não acarreta uma imediata cessação da actividade da empresa, e veja-se neste sentido o n.º 1 do artigo 82.º do CIRE que afirma que os órgãos sociais do devedor se mantêm em funcionamento após a declaração de insolvência, indiciando a continuidade, ainda que em moldes necessariamente diferentes face ao constrangimento provocado pela insolvência, da actividade da empresa.
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Nem a declaração de insolvência implica a necessária dissolução e liquidação da empresa, porquanto da assembleia de credores na sequência da declaração de insolvência pode emergir a aprovação e homologação de um plano de insolvência (artigos 209.° a 216.° do CIRE) que preveja, como dispõe a alínea c) do n.º 2 do artigo 195.º do CIRE, a manutenção em actividade da empresa, podendo inclusive o plano de insolvência aprovado reconduzir-se a uma estratégia de recuperação da empresa, acaso tal objectivo se mostre exequível e conforme ao deliberado em assembleia de credores.
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Para reforço do predito, veja-se o disposto na norma do n.º 3 do artigo 192.º do CIRE, aditada pela Lei n.º 16/2012, de 20/04, que se dispôs clarificar o conceito de plano de insolvência quando a finalidade subjacente é a da recuperação da empresa, atribuindo-lhe a denominação de Plano de Recuperação.
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Resulta do exposto que o regime plasmado no CIRE configura a declaração de insolvência como o primeiro estádio de um eventual processo de recuperação da empresa, compatível com a continuação do exercício da actividade da empresa ou com a recuperação da mesma.
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Por outro lado, independentemente do destino seguido em processo de insolvência (recuperação ou liquidação da empresa ou mesmo alienação da mesma), sempre esta manterá a sua personalidade jurídica, mesmo que em liquidação, bem como mantêm a sua personalidade tributária nos termos do artigo 15.º da Lei Geral Tributária, a qual não é afectada pela declaração de insolvência.
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Assim, mostra-se o entendimento de acordo com a qual só com o registo do encerramento da liquidação é que a pessoa colectiva se extingue, atento o prescrito no artigo 160.º do CSC, como aquele que permite acomodar o regime jurídico vertido no CIRE e que prefigura a possibilidade de recuperação da empresa, conformando-se ademais com o prescrito no artigo 160.° do CSC, não ocorrendo com a declaração de insolvência a extinção da pessoa colectiva.
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Nestes termos constatamos, face à matéria de facto provada nos autos, que a arguida foi declarada insolvente, o que não permite consolidar e afirmar, conforme faz a douta sentença recorrida, o juízo de extinção da pessoa colectiva nos termos da alínea a) do artigo 61.º do RGIT, bem como não permite determinar a extinção do procedimento contraordenacional.
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Concluímos, desta forma, que a declaração de insolvência da arguida não é determinante da extinção do procedimento contraordenacional por morte do infractor, por não enquadrável na alínea a) do artigo 61.º do RGIT, uma vez que não pode ser equiparada a insolvência declarada por sentença transitada em julgado à extinção da pessoa colectiva.
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Pelo que é entendimento da Fazenda Pública que a douta sentença procedeu a errónea subsunção dos factos às normas jurídicas pertinentes, com violação das normas da alínea a) do artigo 61.º e do artigo 62.º do RGIT, e do artigo 160.º, n.º 2, do CSC.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso deve a decisão recorrida ser revogada e o recurso interposto da decisão de aplicação da coima ser julgado improcedente.
PORÉM V. EXAS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.» Não foram apresentadas contra alegações.
O Ministério Público a fls. 135 e seguintes emitiu parecer com o seguinte conteúdo: (…) «Inconformada, veio a Fazenda Pública interpor recurso jurisdicional do despacho decisório proferido em 26/05/2017, pelo M.mº Juiz de Direito do Tribunal Tributário de Lisboa, que declarou extinto o procedimento contraordenacional contra a Recorrente, ordenando o consequente arquivamento dos autos.
O julgador do tribunal a quo aduziu, para tanto, brevitatis causa, que a Recorrente A…………, S.A. tinha sido declarada insolvente e a jurisprudência e a doutrina justributária, neste domínio, equiparam a insolvência à morte das pessoas físicas, para os efeitos do disposto nos artigos 61.º e 62.º do RGIT (cfr. o despacho recorrido e, ainda; as alegações recursivas, insertas a fls. não numeradas do processo em suporte físico, doravante, p. f.) Da análise das conclusões formuladas pela Recorrente, as quais delimitam o objeto do presente recurso jurisdicional, constata-se que a mesma veio atacar o despacho recorrido, vindo esgrimir com a verificação de erros de julgamento quanto à matéria de direito; materializados na interpretação, que aí teria sido deficientemente efetuada, do disposto nas normas da alínea a) do artigo 61.º e do artigo 62.º ambos do RGIT e, ainda, do artigo 160.º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais (v. as conclusões alegatórias, maxime a XIV, ínsitas a fls. não numeradas do p. f.) A título perfunctório, o Ministério Público avança, desde já, que o presente recurso jurisdicional não merece provimento, pelas razões que irá explanar de seguida.
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DOS ERROS DE JULGAMENTO DA MATÉRIA DE DIREITO Veio, pois, a Recorrente Fazenda Pública assacar, à decisão judicial recorrida, os já enunciados erros de julgamento de direito, quanto à interpretação e aplicação dos normativos legais convocados pelo tribunal a quo para a decisão final.
E, em abono da sua posição doutrinal, veio chamar à colação os arestos tirados na jurisdição comum, que confortam o seu entendimento, nomeadamente, os Acórdãos do Colendo STJ, de 26/06/2008, no Processo n.º 08B1184 e do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, de 08/05/2012, no Processo n.º 5799/09.6TBOER.L1-7, ambos consultáveis in www.dgsi.pt.
Sucede que o Ministério Público não ignora que esta corrente jurisprudencial é uniforme e pacífica, nos tribunais comuns, de que é paradigmático o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, tirado em 09/02/2009, no...
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