Acórdão nº 01382/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução07 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – A Autoridade Tributária e Aduaneira – AT, vem, ao abrigo do disposto no artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista excecional do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 7 de Julho de 2016, que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgara procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade “ A……., LDA” contra liquidação oficiosa de IRS (retenções na fonte) e respectivos juros compensatórios relativa ao exercício de 2008.

A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: 1. No acórdão recorrido decidiu-se que o regime jurídico do adiantamento por conta de lucros se encontra vertido no art. 297.º do CSC e que esse artigo pressupõe a transferência da sociedade para o sócio de disponibilidades financeiras geradas em resultado de exercício.

  1. Com base nesse entendimento, o aresto em apreço conclui que a AT não tinha feito prova de que a verba depositada em conta bancária do seu sócio-gerente tinha tido origem em resultados de exercício, julgando, em consequência, procedente a impugnação.

  2. O art. 297.º do CSC apenas é aplicável às sociedades anónimas e não às sociedades por quotas e outras.

  3. Em relação a estas últimas, o Código das Sociedades Comerciais proíbe absolutamente o adiantamento por conta de lucros.

  4. No entanto, seja qual for a posição que se adote sobre a aplicabilidade do art. 297.º do dito diploma às sociedades por quotas, a verdade é que a solução da questão é irrelevante para a presente hipótese.

  5. Na verdade, o conceito contabilístico e fiscal de “adiantamento por conta de lucros” é diverso do vertido no Código das Sociedades e não obriga à existência de um lucro de exercício, ainda que provisório ou intercalar.

  6. A tributação do “adiantamento por conta de lucros”, a título de rendimento de capitais, teve origem no extinto Código de Imposto sobre Capitais.

  7. Nele previa-se que estavam sujeitos ao citado imposto “os adiantamentos por conta de lucros, fosse qual fosse a sua natureza, espécie ou designação”.

  8. A tributação dos adiantamentos manteve-se no art. 5.º, 2 h) do CIRS com a mesma amplitude 10. O SNC e, anteriormente, o POC reconhecem a distinta natureza do “adiantamento por conta de lucros” versus “dividendo antecipado” previsto no art. 297.º do CSC, prevendo contas distintas e distintos lançamentos para as duas realidades.

  9. A nível contabilístico, o “adiantamento por conta de lucros” corresponde a um crédito da sociedade sobre o sócio, a regularizar numa próxima distribuição de lucros, que implica apenas uma alteração qualitativa do património social.

  10. E o dividendo antecipado a uma atribuição a título definitivo, que gera uma redução do património social, que deve ser reconhecida no balanço social como rúbrica negativa do capital próprio.

  11. O conceito fiscal e contabilístico de “adiantamento por conta de lucros” não depende, portanto, da existência de um resultado de exercício.

  12. Ainda que assim não se entendesse, mostra-se provado nos autos que as verbas em apreço resultaram de pagamentos de clientes.

  13. Isto é, mostra-se provado nos autos que as verbas atribuídas aos sócios tiveram origem em operações que deviam ter contribuído para o resultado de exercício.

  14. Claro é ainda que o objectivo assumido pela sociedade foi reduzir o imposto sobre o seu lucro e ainda aquele que incidiria sobre o lucro a distribuir aos sócios.

  15. Em face do que se refere, o acórdão em recurso não pode manter-se e deve ser revogado.

  16. A presente revista é admissível uma vez que o presente acórdão, ao estabelecer uma conexão entre o “adiantamento por conta de lucros” fiscalmente relevante e o lucro de exercício, introduziu dúvidas e perplexidades quanto ao regime legal aplicável, cujo esclarecimento exige a intervenção clarificadora desse Venerando Tribunal.

Termos em que deve ser admitido e dado provimento ao presente recurso, com as legais consequências.

2 – Contra-alegou a recorrida, nos termos de fls. 217 a 226 dos autos, sustentando a rejeição do presente recurso, por inadmissibilidade em razão de não estarem preenchidos os respectivos pressupostos legais e, caso assim não se entenda, o seu não provimento.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 235/236 dos autos, nele suscitando a questão da inconstitucionalidade dos artigos 150.º, n.º 1, art. 2 al. c) e art. 2.º al. e) todos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais, na interpretação segundo a qual, por via da aplicação supletiva as normas sobre organização e processo nos tribunais administrativos e tributários e do Código de Processo Civil, o recurso de revista é admissível no contencioso tributário.

Quanto a esta questão prévia, diga-se desde já que não deixaremos de acompanhar a jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal, entretanto sancionada pelo Tribunal Constitucional – cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 610/16, de 15 de Novembro de 2016, cujo entendimento vem sendo reiterado em Decisões Sumárias e Acórdãos posteriores (cfr. o recente Acórdão n.º 35/18, de 31 de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT