Acórdão nº 0746/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelANA PAULA LOBO
Data da Resolução07 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

RECURSO JURISDICIONALDECISÃO RECORRIDA – Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra .

de 31 de Janeiro de 2017.

Julgou parcialmente procedente a presente impugnação, Anulou a liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2003, e, bem assim, a liquidação dos respetivos juros compensatórios; Manteve a liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2004, e anulou a liquidação dos respetivos juros compensatórios.

Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A Representante da Fazenda Pública, veio interpor o presente recurso da sentença supra mencionada, proferida nos autos de impugnação judicial n.º 499/08.7BEPRT instaurado por A……………….., Lda., contra os actos de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) dos exercícios de 2003 e 2004 e respetivos juros compensatórios, no valor global de € 923.853,92, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida contra as liquidações adicionais de IRC n.º 2007 8310017121 e 2007 8310017145, emitidas pela Administração Tributária (AT), com referência aos exercícios de 2003 e 2004, circunscrito, na parte vencida, contra a decisão de que "a liquidação de IRC de 2003 impugnada está ferida de excesso na quantificação, devendo, por isso, ser [totalmente] anulada.

" B. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o decidido - a anulação da liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2003, por não refletir o valor da matéria coletável objeto de acordo (parcial) no procedimento de revisão -, por padecer tal decisão de erro de julgamento de direito, pelas razões que passa a expender.

C. A questão que se coloca é se o facto do excesso verificado em tal liquidação, uma vez que o valor resultante da mesma foi excessivo em face do decidido em resultado do procedimento de liquidação, será motivo para a anulação total da mesma.

D. Efetivamente, em face das conclusões constantes da sentença recorrida, nomeadamente, o facto de "[c]oncluindo-se pela inexistência de erro quanto aos pressupostos de facto e de direito da aplicação de métodos indirectos", restava, então, "aquilatar se a Impugnante conseguiu, ou não, demonstrar a excessiva quantificação da matéria tributável".

E. Apreciado "o alegado erro no cálculo da presunção de custos decorrente do facto de o custo contabilizado no exercício de 2003 … ter sido de € 2.530.605,96, tendo a AT comparado o valor global estimado com o valor contabilizado de € 2.684.777,83 e não com o montante correto, de € 2.530.605,96, o que originou uma presunção de custos inferior à devida", tal argumento foi julgado procedente e bastante para a anulação da liquidação de IRC de 2003 por excesso na quantificação.

F. Como resulta à evidência da decisão sob recurso, o valor do excesso verificado na liquidação em causa foi perfeitamente identificado e quantificado: € 154.171,87, como custo do exercício de 2003.

G. Como bem notou o Tribunal a quo, "esta precisa questão foi levantada no procedimento de revisão, tendo os peritos acordado na aceitação do valor de € 154.171,87 como custo do exercício de 2003, que não foi considerado pela inspeção tributária na variação da produção considerada para efeitos da determinação do lucro tributável desse exercício, tendo, por conseguinte, deliberado a redução do lucro tributável para € 2.018.803,53 em vez do valor de € 2.172.975,40 que resulta do relatório de inspeção tributária, tendo o órgão decisor decidido indeferir o pedido de revisão, "mantendo os valores propostos no Parecer do perito da Administração Fiscal, quanto ao IRC, nos montantes de € 2.018.803,53 … e € 457.345,16 … como lucro tributável para os exercícios de 2003 e 2004, respetivamente"".

H. Do mesmo modo, bem notou o Tribunal a quo "que a liquidação adicional referente ao exercício de 2003 não contempla o acordo na redução da matéria tributável para o montante de € 2.018.803,53, determinada no procedimento de revisão, mantendo o valor da matéria coletável corrigida apurado no ponto 5.1.4.1 do relatório de inspeção e na respetiva nota de fixação, de € 2.172.975,40".

I. Portanto, o único e concreto valor considerado pelo Tribunal a quo como excesso verificado na liquidação em causa, além de perfeitamente identificado e quantificado pelo Tribunal, já o havia sido, de forma pacífica, no procedimento de revisão.

J. Não pode a Fazenda Pública conformar-se com o decidido, no sentido de que ao se ter reconhecido o erro de cálculo, a liquidação de IRC de 2003 impugnada está ferida de excesso na quantificação, devendo, por isso, ser anulada na totalidade.

K. O acto tributário de liquidação é divisível e, consequentemente, pode ser só parcialmente anulado pelos tribunais, no respectivo processo de impugnação.

L. O Tribunal tributário conhecendo em impugnação judicial de um acto administrativo de liquidação e da legalidade desse acto tem o dever de, reconstituindo a situação lesiva, ordenar, se for caso disso, a sua modificação pois só assim exerce a tutela judicial efectiva consagrada na CRP, sendo que, a anulação parcial de tal acto insere-se nos poderes e função judicial do Tribunal.

M. A questão da divisibilidade do acto tributário de liquidação é tratada na jurisprudência de forma uniforme e reiterada no sentido de que os actos de liquidação de tributos são divisíveis.

N. A Lei admite a possibilidade da anulação parcial dos actos tributários, pois, dispõe o art. 100.º da LGT, sob a epígrafe de "[e]feitos de decisão favorável ao sujeito passivo" que a AT "está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade (…)".

O. Deste modo, se o vício que constitui o fundamento da procedência da impugnação apenas afectar parte da liquidação, e não a sua totalidade, a liquidação deve ser anulada parcialmente, ou seja, apenas na parte que fica afectada por esse vício, subsistindo a liquidação na restante parte.

P. No caso dos presentes autos, o vício (excesso de quantificação) que constitui o fundamento da procedência (parcial) da presente impugnação apenas afecta parte da liquidação de IRC de 2003, não subsistindo qualquer dúvida quanto à respectiva quantificação efectuada no RIT, à determinada no procedimento de revisão, e à encontrada no documento de correção (DC), sendo, deste modo, perfeitamente identificável o erro (lapso?) de quantificação plasmado a final.

Q. Assim sendo, não poderia o juiz a quo ter julgado a impugnação "totalmente procedente", mas antes deveria ter anulado o acto de liquidação na parte correspondente ao excesso quantificado, ordenando à AT a correcção do erro que esteve na origem da liquidação controvertida.

R. Com efeito, in casu, estamos perante uma situação em que a anulação parcial da liquidação é possível, uma vez que a ilegalidade em causa, erro na quantificação da matéria colectável, não afecta o acto tributário na totalidade.

S. Se o juiz reconhecer que o acto tributário está inquinado de ilegalidade que só em parte o invalida, deve anulá-lo apenas nessa parte, deixando-o subsistir no segmento em que nenhuma ilegalidade o fira.

T. O critério jurisprudencial para determinar se o acto deve ser total ou parcialmente anulado passa, pois, por determinar se a ilegalidade afecta o acto tributário no seu todo, caso em que o acto deve ser integralmente anulado … ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial.

U. No caso dos autos, a anulação parcial do acto tributário impugnado justifica-se pelo facto de não ter havido erro da Administração Tributária na aplicação de métodos indirectos e porque, tão só relativamente à liquidação adicional do IRC de 2003, haverá que excluir do "valor da matéria colectável corrigida" o montante de € 154.171,87, "constante no relatório de inspeção e da nota de fixação que havia sido reduzido em sede de revisão, em virtude de se ter reconhecido o erro de cálculo." V. A ilegalidade cometida não fere de ilegalidade o acto no seu todo, a impor a sua total anulação, antes se afigura a sua anulação meramente parcial, na parte em que erradamente desconsiderou aquele montante de custos contabilizados no exercício de 2003.

W. Não existindo qualquer dúvida, quer sobre a existência do facto tributário, quer no que se cinge à quantificação do facto tributário, sendo o valor em excesso na liquidação perfeitamente identificado, ao decidir como decidiu, a douta sentença incorreu em erro de julgamento, consubstanciado na errada interpretação e aplicação das normas legais citadas, designadamente o disposto nos art. 63º, 74º, 77º, 81º, 87º, 90º, 92º, nº 3, e 100º da LGT, e art. 18º, 52º, 82º, al a), 83º, 91º, 93º, 95º 115º, 125º do CIRC (na redacção vigente à data dos factos).

Requereu que seja concedido provimento ao presente recurso revogando-se, por conseguinte, a decisão recorrida.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Foi emitido parecer pelo Magistrado do Ministério Público no sentido da procedência do recurso.

A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos: 1. Em 29/06/2005, deu entrada na Direção de Finanças do Porto um ofício dos Serviços do Ministério Público dos Juízos Criminais, do Tribunal de Instrução Criminal e DIAP, contendo certidão extraída dos autos de inquérito n.º 2254/05.7TDPRT, para instauração de procedimento contra-ordenacional contra a Impugnante face à divergência de valores declarados na escritura pública de compra e venda do prédio sito à Rua ………., ………., …………, Porto e no respetivo contrato promessa - Cfr. ofício e certidão constantes do volume 1 de 9 juntos aos autos em 23/06/2010.

  1. Com base na Ordem de Serviço n.º OI200503799, determinada por despacho de 28/07/2005, de B……………., chefe de...

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