Acórdão nº 0124/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução10 de Janeiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 146/16.3BEBRG 1. RELATÓRIO 1.1 O Representante da Fazenda Pública (doravante Recorrente) junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida naquele Tribunal que, julgando procedente a oposição deduzida por A…………. (adiante Executado, Oponente ou Recorrido), julgou extinta por prescrição (quanto a ele) a execução fiscal que, instaurada contra uma sociedade para cobrança de dívida proveniente de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do ano de 2004, reverteu contra ele, na qualidade de responsável subsidiário.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor (() Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.

): «A.

Por douta sentença, datada de 29.09.2016, o tribunal a quo julgou procedente a Oposição à execução, por prescrição das dívidas tributárias e, em consequência, extinguiu o processo executivo.

  1. Para fundamentação da douta sentença fez constar o seguinte: “(...) Na solução dada ao caso em concreto, o tribunal louva-se na jurisprudência do Tribunal Constitucional n.º 362/2015, de 09.07.2015, processo n.º 760/14, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 186, de 23.09.2015 que julgou inconstitucional, “por violação do artigo 165.º n.º 1, alínea i) da Constituição, a norma do artigo 100.º do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, interpretada no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário.

    (…) Daí ter-se desconsiderado, para efeitos de suspensão da prescrição, a declaração de insolvência (e o, eventual, lapso de tempo em que o processo de execução possa ter estado junto ao processo de insolvência)”.

  2. A Fazenda Pública não se pode conformar com a douta decisão do tribunal a quo que entendeu não aplicar o artigo 100.º do CIRE como causa suspensiva da prescrição, imputável ao devedor subsidiário.

  3. Discorda a Fazenda Pública desta decisão, porquanto, com o devido respeito, o TC não decidiu que a declaração de insolvência da devedora originária não constitui facto suspensivo da prescrição das dívidas tributárias imputáveis ao devedor subsidiário.

  4. A decisão do TC consubstanciou-se no seguinte: “(...) Julgar inconstitucional, por violação do artigo 165.º n.º 1, alínea i), da Constituição, a norma do artigo 100.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, interpretada no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário; (...)” F. Esta decisão constitucional foi proferida num processo em concreto, na sequência de um conjunto de alegações específicas, só produzindo efeitos nesse mesmo processo, carecendo de força obrigatória geral.

  5. E o douto tribunal a quo aplica-a como se a mesma tivesse força obrigatória geral, comportamento com o qual a Fazenda Pública não se pode conformar.

  6. Mas inexiste decisão do TC, com força obrigatória geral, que declare a inconstitucionalidade orgânica do artigo 100.º do CIRE.

    I. Ao desconsiderar a declaração de insolvência da devedora originária como causa suspensiva da prescrição, extensível ao devedor subsidiário, declarando, em consequência, a prescrição das dívidas tributárias e a extinção do processo executivo, o tribunal a quo fez errada interpretação e aplicação dos artigos 100.º do CIRE, 48.º e 49.º da Lei Geral Tributária (LGT) e 321.º, n.º 1 do Código Civil (C. Civil).

  7. No Acórdão n.º 362/2015, de 09.07.2015, no qual o tribunal a quo sufraga a sua sentença, o TC decidiu julgar a inconstitucionalidade orgânica do artigo 100.º do CIRE quando interpretado no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário.

  8. O artigo 100.º do CIRE dispõe: “A sentença de declaração de insolvência determina a suspensão de todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis pelo devedor, durante o decurso do processo” (realce nosso).

    L. Este normativo não contende com o regime de suspensão da prescrição das dívidas tributárias, consagrado nos artigos 48.º e 49.º da LGT, porquanto, não é especificamente dirigido às dívidas tributárias, antes, abrange todos os credores, tendo em vista a melhor satisfação possível dos seus créditos, constituindo este o objectivo precípuo do processo de insolvência.

  9. Esta norma legal não configura nenhum regime inovatório. Constitui corolário de um princípio geral segundo o qual a prescrição se suspende durante o período de tempo em que o titular estiver impedido de fazer valer o seu direito. É o que resulta do artigo 321.º, n.º 1 do C. Civil.

  10. Tal princípio geral vale também no direito tributário. Encontrando-se o titular do direito impossibilitado de lançar mão da execução fiscal, entender-se que contra ele correriam os prazos de prescrição seria uma solução adversa aos mais elementares princípios da justiça e da boa-fé.

  11. Por isso, tal como sucedeu na situação tratada no Acórdão do TC n.º 280/2010, “nenhum motivo existe também aqui para uma intervenção parlamentar, quando o que está em causa é igualmente a definição de uma solução jurídica exigida pela própria lógica do regime de insolvência e que se encontra justificada à luz de um princípio geral de direito (artigo 321.º, n.º 1, do Código Civil”.

    Vide, neste sentido, Acórdãos do STA de 05.12.2012, proferido no âmbito do processo n.º 01225/12 e de 18.06.2014, proferido no âmbito do processo n.º 0119/14.

  12. O artigo 100.º do CIRE não visa directa e imediatamente os créditos tributários, antes se caracteriza como uma solução própria do processo de insolvência, razão pela qual, não interfere com matéria garantística de reserva de lei fiscal prevista no artigo 103.º, n.º 2, da CRP.

  13. Neste sentido se pronunciou o próprio TC na decisão na qual a sentença a quo se sufraga, onde escreve: “(...) Ponto é que a disciplina do artigo 100.º do CIRE não visa directa e imediatamente os créditos tributários, mas a generalidade dos créditos sobre a massa insolvente, apresentando-se como uma solução imposta pelo carácter universal da execução em que se tende a traduzir o processo de insolvência e pela necessidade de assegurar no âmbito do mesmo a igualdade entre os credores da insolvência, sem prejuízo do valor e da hierarquia dos respectivos créditos.

    Nessa medida, “a suspensão de todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis pelo devedor” surge como uma condição de operacionalidade do próprio regime do processo de insolvência tal como conformado pelo legislador, não se relacionando com a função garantística da reserva de lei fiscal. A suspensão de prazos em apreço é inerente às soluções normativas conformadoras do processo de insolvência, não introduzindo qualquer alteração no regime geral dos impostos (incluindo em matéria de prescrição e de caducidade). E a contraprova da racionalidade sistémica da inclusão dos créditos tributários titulados pela Administração fiscal no âmbito de aplicação do artigo 100.º do CIRE é a de que uma sua eventual exclusão redundaria num injustificável benefício para os demais credores da insolvência e num não menos injustificável prejuízo para o interesse público. (…)” R. Naquele aresto, é o próprio TC que admite que o artigo 100.º do CIRE não contende com a matéria de “garantia dos contribuintes”.

  14. Solução que a Fazenda Pública subscreve na íntegra. Até porque, solução inversa conduziria à seguinte conclusão: a declaração de...

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