Acórdão nº 01015/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Abril de 2018
Magistrado Responsável | CASIMIRO GON |
Data da Resolução | 18 de Abril de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1.
A………….., Lda., com os demais sinais dos autos, recorre, por oposição de acórdãos, nos termos do disposto no art. 27º, nº 1, al. b) do ETAF e do art. 284° do CPPT, do aresto proferido na Secção de Contencioso Tributário do TCA Sul, em 09/02/2017, no recurso que ali correu termos sob o nº 06423/13 e no qual se manteve a decisão que havia sido proferida no TAF de Sintra, que julgara improcedente a impugnação judicial apresentada contra a liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios, relativamente ao exercício de 2005 e no montante total de 43.947,55 euros.
A recorrente invoca oposição, relativamente a três diferentes questões, entre o decidido no acórdão recorrido e o decidido em três diferentes arestos (do TCAS e do TCAN) que identifica: — quanto à questão do «ónus de demonstração da asserção da falta de aderência à realidade das facturas emitidas por “B……….., Lda. e C……….., Lda.” motivada no percurso histórico destas sociedades, para efeitos de aplicação do disposto no artigo 74º e 75º da Lei Geral Tributária», oposição com o acórdão do TCA Norte (secção de contencioso tributário) proferido em 21/12/2016, no proc. nº 00477/09.
— quanto à questão «da (des)consideração como custos de serviços prestados pelas sociedades acima identificadas, devidamente registados na contabilidade da Recorrente, nos termos do artigo 23º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“CIRC”), para efeitos de determinação do lucro tributável», oposição com o acórdão do TCA Sul (secção de contencioso tributário) proferido em 17/03/2016 (e não 18/03/2016, como, certamente por lapso, a recorrente indica), no proc. nº 08227/14.
— quanto à questão «da (des)consideração de custos efectivamente suportados pela Recorrente para a realização dos trabalhos que prestou às suas Clientes (Juntas de freguesia de Lisboa, na sua maioria), em 2005, devidamente documentados, nos termos do artigo 23º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“CIRC”), para efeitos de determinação do lucro tributável e respeito pelo princípio da tributação do rendimento real», oposição com o acórdão do TCA Norte (secção de contencioso tributário) proferido em 03/05/2012, no proc. nº 00607/08.8BEPNF.
1.2.
Para sustentar a alegação de oposição entre o acórdão recorrido e os referidos acórdãos fundamento, a recorrente diz o seguinte: 1.2.1.
Quanto à primeira questão O acórdão recorrido considerou que «(...) a A. Fiscal pode desconsiderar custos reflectidos nos documentos porque lhe suscitam dúvidas quando à sua existência ou quantificação, hipótese em que deverá concretizar a factualidade indiciária que conduziu a essa situação de dúvida (v.g. pagamento em numerário de quantias avultadas; falta de prova do levantamento de importância de depósito à ordem para o caixa a fim de satisfazer o pagamento, etc.). O contribuinte tem, então, o ónus de comprovar a efectividade do custo e a consequente determinação do seu concreto montante, recorrendo a qualquer meio de prova e, do êxito da prova, depende a medida do exercício do direito à imputação de custos.
» E mais se considerou que «Nas situações em que a Fazenda Pública desconsidera as facturas/documentos equivalentes que reputa de falsos, em virtude de documentarem operações simuladas, aplicam-se as regras do ónus da prova (cfr. art. 74º, da LGT) incumbindo à A. Fiscal a produção de prova de que estão verificados os indícios sérios/fundados de que as operações em causa não correspondem à realidade. Efectuada esta prova, passa então a incidir sobre o sujeito passivo do imposto o ónus probatório da veracidade da transacção. Por outras, não tem a Fazenda Pública que provar a falsidade dos documentos contabilísticos em causa (e muito menos os pressupostos da simulação previstos no art. 240º, do C. Civil), bastando-lhe alegar factos que traduzam uma probabilidade elevada de as operações referidas nos mesmos não serem verdadeiras, abalando-se, desta forma, a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados que constam da sua contabilidade (...) Mais se dirá que no âmbito do direito tributário, a doutrina e a jurisprudência falam em indícios, para tanto havendo que recorrer à prova indirecta, a vestígios, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras da experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema da prova.
».
Porém, esta solução adoptada no acórdão recorrido apresenta-se em oposição com aquela que, relativamente a uma situação de facto em tudo idêntica e com idênticos quadros legislativos de referência, foi sancionada no mencionado acórdão do TCAN, de 21/12/2016, no proc. nº 00477/09.9BEPNF, relativamente à necessidade de estabelecer um nexo entre a actividade ilícita do emitente de facturas (reportadas como falsas) e as operações facturadas ao utilizador.
Neste acórdão do TCA Norte entendeu-se, no essencial, conforme se exara no respectivo sumário: «1. Quando a AT desconsidera facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74º da LGT competindo-lhe fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios, seguros e consistentes de que as operações constantes de determinadas facturas não reflectem operações económicas reais, só então passando a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova veracidade das operações tituladas por tais facturas; 2. Os indícios de falsidade recolhidos pela AT são insuficientes para abalar a presunção de veracidade da escrita do impugnante se nada de seguro e consistente vem relatado que permita estabelecer um nexo entre a actividade ilícita do emitente e as operações facturadas ao utilizador. 3. A circunstância de os cheques apresentados para justificar o pagamento das facturas não terem tido por destino a sociedade emitente não tem qualquer valia indiciária se a própria AT afirma que o emitente é um sujeito passivo incumpridor e não apresenta quaisquer custos com pessoal e fornecedores, pois nessas situações não se coloca para o emitente, consistentemente, a necessidade de remuneração de tais factores produtivos com entradas de dinheiro; 4. Se a AT refere uma inexistente estrutura empresarial do emitente reflectida nas bases de dados da AT e da Segurança Social e a impugnante faz prova de que o mesmo alocou trabalhadores na execução da subempreitada a que estão referenciadas as facturas, o indício perde validade, sobretudo se nada investigou sobre os mecanismos de fiscalização e prevenção da utilização de mão-de-obra clandestina implementados no terreno pelo dono da obra, para mais tratando-se este de um organismo público, não se podendo, por outro lado, afirmar tratar-se o emitente de uma mera empresa de passagem de fundos, destinada a dar cobertura a operações reais do utilizador com sujeitos passivos não emitente.
» E mais se refere no texto do acórdão que «...
da circunstância de um sujeito passivo se dedicar à emissão de facturas falsas, não pode concluir-se, sem mais, que não exerça simultaneamente a actividade para que está colectado, no caso do emitente, a de construção). Daí a necessidade, também, da recolha de indícios, seguros e credíveis, centrados na relação concreta por ele estabelecida com o utilizador, de modo a poder estabelecer-se algum nexo entre a actividade ilícita do emitente e as operações facturadas ao utilizador. Porque, o que verdadeiramente importa apurar é se os serviços facturados foram efectivamente prestados pelo emitente. independentemente do incumprimento generalizado das obrigações legais e fiscais (art. 31°, nºs. 1 e 2 da LGT) a que ele está vinculado no exercício da actividade prestadora.
Serve isto para dizer que um sujeito passivo pode não ter assalariados inscritos na segurança social, não reter e/ou não entregar ao Estado o imposto sobre remunerações pagas, nem declarar à AT operações com terceiros fornecedores de bens e serviços (cf. RIT, fls. 67 PA), sem que isso represente de per si um indício forte da irrealidade das operações facturadas, sendo certo que a capacidade empresarial do emitente nem sempre poderá ser apreendida e medida a partir da sua estrutura de custos declarada (com assalariados e operações com terceiros), bastando pensar, no sector da construção civil, na recorrente situação de alocação de trabalho indiferenciado com recurso a mão-de-obra clandestina.
De resto, nem a AT é tão temerária que conclua pela falsidade das facturas só porque emitidas por sujeito passivo sem adequada estrutura de custos declarada para a realização dos serviços facturados, e/ou por se tratar de sujeito passivo que não cumpre as obrigações fiscais a que está vinculado e nisso esgote a sua actividade investigatória.» Ou seja, na tese da recorrente, o acórdão recorrido, quando aceita a conclusão da AT no sentido de que as facturas identificadas no relatório de inspecção (contabilizadas pela recorrente e emitidas pelos sujeitos passivos "B……………, Lda." e "C………., Lda.") não correspondem a operações reais, face a vestígios que encontrou, alicerçados na suspeita de estas sociedades emitirem facturas indiciadas como falsas e não terem a estrutura adequada, sendo que aquela consideração levou a que a AT não tivesse feito o percurso investigatório necessário e bastante para chegar a tal conclusão (daí advindo como consequência a inversão do ónus da prova da veracidade daquelas operações para o contribuinte), encontra-se em manifesta oposição com a solução adoptada no acórdão fundamento indicado.
1.2.2.
Quanto à segunda questão (desconsideração como custos de serviços prestados pelas sociedades “B…………., Lda." e "C………….., Lda.", registados na contabilidade da recorrente, nos termos do art...
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