Acórdão nº 0105/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Abril de 2018
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 11 de Abril de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, na formação a que se refere o n.º 6 do artigo 150.º do CPTA:*1.1.
A………….., Lda., deduziu impugnação, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, contra o ato de liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), relativo ao exercício de 2007, bem como os atos de liquidação de juros compensatórios, no montante global de €150.808,01, tendo peticionado a sua anulação.
*1.2.
Aquele Tribunal, por sentença de (fls.396/422), julgou a impugnação improcedente.
*1.3.
O impugnante recorreu dessa decisão para o Tribunal Central Administrativo Sul que, por acórdão de 03/03/2016, fls.492/514, anulou a sentença recorrida e ordenou a baixa dos autos ao Tribunal de 1.ª instância, «cumprindo-se em conformidade as diligências de instrução que se reputem úteis e necessárias à discussão da matéria de facto após o que se deverá proferir nova sentença que leve em consideração a factualidade entretanto apurada.».
*1.4.
Em cumprimento do determinado pelo acórdão identificado no parágrafo antecedente o Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja proferiu nova sentença em 24/08/2016, fls.598/628, julgando improcedente a impugnação e mantendo os atos de liquidação impugnados.
*1.5.
A impugnante recorreu dessa decisão para o Tribunal Central Administrativo Sul que, por acórdão de 13/09/2017, fls. 734/772, negou provimento ao recurso.
*1.6.
É desse acórdão que o recorrente vem, ao abrigo do artigo 150.º do CPTA, requerer a admissão do recurso de revista, justificando este pedido com o seguinte quadro conclusivo: «A. O recurso respeita à interpretação que é dada pelo tribunal a quo e à consequente aplicação do disposto no artigo 45.º/1 da LGT em conjugação com os artigos 8.º/2 a), 46.º/1, 45.º/4/5, e 74.º/1 da LGT, 35.º/1/5/6 do RGIT, 58.º 242.º 243.º e 262.º do CPP, 2.º, 28.º, 37.º, 38.º, 39.º, 46.º, 51.º RCPIT, 5.º/2/h, 6.º/4 e 40.º-A do CIRS, 36.º/2, 38.º e 123.º/1 a) do CPA e 2.º, 18.º, 20.º, 32.º da CRP.
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Haverá que considerar, portanto, que, para a apreciação da caducidade da liquidação, se mostra necessário apurar em que data a liquidação foi notificada à recorrente e as circunstâncias que relevam para efeitos de definir as causas de interrupção e suspensão do prazo de caducidade, tais como notificação do início da ação inspetiva e notificação das conclusões do relatório, como factos relacionados com eventuais causas de alargamento do prazo de caducidade.
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Desde logo, salvo melhor e reconhecido entendimento, o procedimento tributário é ilegal e a notificação da liquidação dos autos é nula.
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A credenciação é um dos pressupostos para o início do procedimento de inspeção tributaria.
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Acontece que o funcionário B…………. que elaborou o relatório de inspeção de facto não se encontrava credenciado para o exercício da inspeção tributária no exercício de 2007.
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A preterição desta formalidade legal tem como consequência a ilegalidade das liquidações.
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Por seu lado, o artigo 51.º RCPIT diz que assinatura da ordem de serviço (notificação) determina o inicio do procedimento de inspeção. Ou seja, o procedimento de inspeção é iniciado na data da notificação da ordem de serviço que credencia o funcionário para proceder aos atos de inspeção (artigos 46.º/1 e 51.º/2 RCPIT).
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Se esta notificação é inválida, não pode se ter por iniciado o procedimento tributário. Sendo a notificação inválida, sob a forma de nulidade, o mesmo é dizer que não produz qualquer efeito.
I. Em bom rigor esta é a verdadeira notificação que dá início ao procedimento de inspeção externo. Deve por isso ter-se sempre presente a necessidade de credenciação por parte dos funcionários J. Ora, o ato da notificação será cominado com a sanção de nulidade nas situações em de falta de menção do autor do ato ou na falta da qualidade em que decidiu, no seu sentido e da sua data, quando o autor do ato o tenha praticado ao abrigo de delegação ou subdelegação de poderes.
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Como foi o caso! L. Quando um ato é praticado com base em delegação ou subdelegação de poderes deve ser mencionada essa qualidade no ato. Na respetiva notificação deve ser feita menção da qualidade em que foi praticado o ato, bem como do sentido da delegação ou subdelegação e a sua data, implicando a falta de qualquer destas indicações a nulidade do ato de notificação.
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Em suma, é forçoso concluir pela nulidade da notificação da ordem de serviço.
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Em suma, o ato de notificação padece do vício da nulidade que se estende a todo o procedimento de inspeção que levou a nova liquidação.
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O que aporta consequência diretas e necessárias ao prazo de caducidade. Por um lado, P. Sendo a notificação da liquidação nula, não produz quaisquer efeitos, tendo-se por não realizada, o direito previsto no artigo 45.º/1 da LGT não foi exercido no prazo previsto para o efeito, tendo o mesmo caducado.
Por outro lado, Q. Mesmo que assim não fosse, a notificação da liquidação é 10-01-2012 quando já tinha caducado o direito à liquidação.
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Ainda por referência ao procedimento tributário, importa denotar que não resulta provado que as quantias em apreço não tenham uma “causa”.
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A AT subsume a conduta da recorrente no artigo 6.º/4 do CIRS sem curar de demonstrar e nem de provar a base da presunção.
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Em suma, não se encontra preenchida a base da presunção.
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Segundo os artigos 74.º/1 LGT e 342.º/1 CC, a base da presunção judicial deve imperativamente ser provada com os correspondentes factos dela integradores sob pena de a causa ser decidida em sentido desfavorável à parte onerada com esse ónus, ou seja, à AT.
V. Inexiste, portanto, facto tributário.
Por conseguinte, W. Diz o 46.º/1 LGT que o prazo de caducidade se suspende com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa.
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Consabidamente, os prazos de caducidade estão sujeitos ao princípio de legalidade (artigo 8.º/2
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LGT).
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Os presentes autos dizem respeito ao IRS do ano de 2007.
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Este imposto é devido a partir do ano civil seguinte àquele a que se reporta o facto que lhe deu origem.
AA. Na medida em que a notificação da ordem de serviço é nula, não pode haver suspensão do prazo. Sem conceder, BB. Comprovadamente, a decisão recorrida viola o disposto no artigo 45.º da LGT.
CC. Dispõe o artigo 45.º/5 que sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo a que se refere o artigo 45.º/1 é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.
DD. Segundo o princípio da legalidade fiscal, para que não se verifique a caducidade do direito à liquidação no prazo de quatro anos (artigo 45.º/1 LGT), é necessário que tenha sido instaurado um inquérito criminal até ao limite do prazo referido.
EE. Além da questão temporal, é necessário que os factos investigados sejam os mesmos factos que deram origem à liquidação. Não basta a existência de uma ação inspetiva para que se verifique a suspensão do prazo de caducidade e não basta a existência de um processo-crime para que haja um alargamento do prazo de caducidade. Em suma, os factos investigados em processo-crime têm de ser os factos tributários que serviram de base à liquidação.
FF. O que não é o caso! Os factos não são os mesmos.
GG. Ou seja, na base da liquidação estão os factos referentes à sociedade C…………..
HH. De notar ainda que o dever de cooperação que impende sobre o mero contribuinte não pode por em causa o núcleo essencial do direito à não autoincriminação reconhecido ao arguido suspeito da prática de um crime. Daí que processo criminal seja incompatível com procedimento de inspeção tributária. Assim, a partir do momento em que surge a notícia da prática de um crime, os inspetores devem constituir formalmente a pessoa visada como arguido. Quando a autoridade tributaria recebe a notícia da infração e, sem informar o suspeito, e em vez de fazer uso de prerrogativas legais, como as buscas, apreensões e congelamentos, aciona os deveres de cooperação, pedindo-lhe documentos e informações que entende, com base nos quais procede à instrução do processo.
II. A agir deste modo, a AT atentou diretamente contra o direito à não autoincriminação e contra o princípio da legalidade fiscal.
JJ. Sendo certo que o tribunal a quo podia e devia ter concluído de modo diverso.
Termos em que deve o presente recurso de revista ser admitido e julgado procedente e, em consequência, ser ordenada a reforma da decisão recorrida e assim se fazendo a costumada Justiça!».
*1.7.
Não foram apresentadas contra-alegações.
*1.8.
O MP pronunciou-se a fls. 855 afirmando que a sua intervenção se circunscreve à apreciação do mérito do recurso que é posterior à apreciação preliminar sumária sobre a verificação dos pressupostos para conhecimento do recurso.
*1.9. Colhidos os vistos legais, cabe decidir.
*2.
A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto: «
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A Impugnante tem por objeto a atividade de compra e venda de Cortiça, Com O CAE 46110 (cfr. relatório de inspeção tributária – documento nº 2 junto com a petição inicial e fls. não numeradas do processo administrativo tributário apenso); B) Em 12/10/2010, foi emitida, por despacho do Diretor de Finanças Adjunto, a Ordem de Serviço nº 01201003221 para a realização de ação de inspeção externa de âmbito geral ao ano de 2007 da sociedade Impugnante, sendo identificados os funcionários …………… (Chefe de Equipa) e …………… (Técnico) (cfr. documento nº 2 junto com a petição inicial a fls.56 a 153 dos autos); C) Em 9/05/2011, foi remetida à Impugnante, por correio registado com o talão de registo n° RM 673312836PT, o ofício com a referência 012933 da Direção de Finanças de Setúbal – Serviços de Inspeção Tributária, por meio do qual se deu conhecimento, nos termos da alínea I) do nº 3 do artigo 59º da Lei Geral Tributária (LGT) e artigo 49º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT), da visita dos técnicos dos...
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