Acórdão nº 01279/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução26 de Outubro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de embargos de terceiro com o n.º 1742/14.9BEBRG 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade denominada “A…………………, Lda.” (adiante Embargante ou Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que, julgando caducado o direito de embargar de terceiro, por a apresentação da petição inicial ser ulterior à venda, absolveu a Fazenda Pública da instância nos embargos de terceiro que aquela sociedade deduziu contra a ordem de entrega do imóvel vendido em execução fiscal.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo e a Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «1.º- Os Embargos de Terceiro têm como fundamento, em princípio, a ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência da penhora ou de qualquer outro acto judicialmente ordenado da titularidade de quem não seja parte na causa: art. 342.º, n.º 1, do CPC, visando este preceito legal os denominados embargos de terceiro repressivos; 2.º- Todavia, o disposto no art. 350.º n.º 1 do CPC consente a dedução de embargos de terceiro a título preventivo em face de despacho que ordene a diligência ofensiva e antes da mesma ser concretizada; 3.º- In casu, estamos perante Embargos de Terceiro com função preventiva porquanto foram deduzidos depois da prolação do despacho que ordenou a diligência, mas antes de realizada, que não foi; 4.º- Neles tendo a Recorrente a posição de terceiro uma vez que não foi parte no processo de execução no qual foi proferido o despacho que ordena a entrega do imóvel em causa; 5.º- Os embargos com função preventiva, embora não estejam previstos no CPPT, mostram-se regulados no art. 350.º do CPC, subsidiariamente aplicável ao processo judicial tributário por força do disposto no artigo 2.º, alínea e), do CPPT; 6.º- Aos embargos de terceiro de função preventiva não é aplicável o prazo de caducidade previsto no n.º 3 do art. 237.º do CPPT, que se aplica apenas aos embargos de função repressiva; 7.º- Pois, a aplicação do referido prazo de caducidade tem como pressuposto a concreta realização da diligência ofensiva da posse, isto é, é seu pressuposto tratar-se de embargos de terceiro de função repressiva; 8.º- Tem sido este o douto entendimento deste Venerando Tribunal, expressamente vertido no Acórdão de 10.10.2012, proferido no proc. n.º 0933/12, da 2.ª Secção, que expressamente discorre nestes termos: “a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a sufragar o entendimento de que o referido prazo de caducidade – previsto no artigo 353.º, n.º 2, do CPC para os embargos de natureza preventiva – pressupõe a efectiva realização da diligência ofensiva da posse ou de outro direito incompatível com essa realização ou com o seu âmbito, ou seja, que é seu pressuposto tratar-se de embargos de terceiro de função repressiva, não existindo prazo para a dedução de embargos de terceiro de função preventiva, os quais podem ser sempre deduzidos entre a data do despacho que ordena a diligência e a sua efectiva realização”; 9.º- Na esteira igualmente do vazado no douto acórdão do STJ de 09.02.2006, proferido no proc. n.º 06B014, in www.dgsi.pt, que também decidiu que a lei não prevê prazo fixo para a dedução dos embargos de terceiro com função preventiva; 10.º- Também assim ensinava Alberto dos Reis, como se extrai do Acórdão da Relação de Lisboa de 02.06.2005, proferido no proc. n.º 2981/2005-8, in www.dgsi.pt citando aquele Insigne Mestre nestes termos: “se os embargos tiverem função preventiva, equivalente à da acção possessória de prevenção, isto é, se tiverem por fim evitar o esbulho e por fundamento o justo receio dele, rege o artigo 1039.º e não a 1.ª alínea do artigo 1037.º, na parte relativa ao prazo”, para nele ter decidido que “o prazo de caducidade a que alude o artigo 353.º/2 do C P C não se aplica tratando-se de embargos de terceiro com função preventiva; nestes a tempestividade é aferida pelos limites definidos no artigo 359.º do CPC que visa precisamente os embargos deduzidos, antes de realizada, mas depois de ordenada a diligência ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com o seu âmbito” 11.º- Deste modo, a M.ma Juiz [do Tribunal] “a quo”, ao julgar intempestivos os presentes Embargos de Terceiro, fez uma errada interpretação do art. 350.º n.º 1 do CPC e do n.º 3 do art. 237.º do CPPT, subsidiariamente aplicável ex vi do disposto no artigo 2.º alínea e), do CPPT.

12.º- Pelo que deve aquela sua decisão ser revogada e substituída por outra que julgue os presentes Embargos de Terceiros tempestivos e, em consequência, ordene o prosseguimento dos autos, com as legais consequências.

Assim decidindo, farão Vossas Excelências, Senhores Juízes Conselheiros, a devida JUSTIÇA».

1.3 Não foram apresentadas contra alegações.

1.4 Neste Supremo Tribunal Administrativo os autos foram com vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso. Isto, após ter feito uma resenha da situação processual, com a seguinte fundamentação: «[…] Os embargos de terceiro são um meio instituído para a defesa da posse, quando ofendida por qualquer diligência ordenada judicialmente, nomeadamente em consequência de penhora.

Segundo dispõe o n.º 1 do artigo 342.º do Código de Processo Civil (anterior 351.º), quando a penhora ou qualquer acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte na causa (“terceiro”), pode o lesado fazê-lo valer, deduzindo embargos de terceiro.

No caso concreto dos autos resulta da sentença recorrida que a embargante e aqui recorrente invocou a qualidade de arrendatária do imóvel para a dedução dos embargos, pelo que está em causa uma eventual ofensa de um direito incompatível com a ordenada diligência de entrega do imóvel (embora não resulte da matéria de facto assente na sentença recorrida qualquer elemento que revele aquela qualidade de arrendatária).

A questão que se coloca a este tribunal consiste em saber se a sentença recorrida fez uma incorrecta aplicação do direito ao julgar os embargos intempestivos.

Tendo os embargos sido apresentados com o propósito de obstar à execução da diligência de entrega do imóvel, os mesmos caracterizam-se pela sua função preventiva, pelo que nesta parte rege o disposto no artigo 350.º, n.º 1, do CPC, que prevê a dedução dos embargos antes de realizada, mas depois de ordenada essa diligência. Ou seja, neste caso é afastada a regra geral que decorre do n.º 2 do artigo 344.º do CPC, que prevê o prazo de 30 dias para a dedução dos embargos de terceiro.

A questão que se coloca consiste em saber se no caso dos embargos com função preventiva também se afasta a aplicação do disposto no segmento final do referido n.º 2 do artigo 344.º do CPC, que estabelece como limite a data da venda dos bens. Como se alcança do n.º 1 do artigo 350.º, este preceito legal remete no mais para o regime dos embargos com função repressiva e constante dos artigos anteriores, o que abrange igualmente o segmento final da norma do n.º 2 do artigo 344.º. Doutra forma o intérprete incorreria numa incongruência, que afectaria a unidade do sistema jurídico. O que se pretendeu...

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