Acórdão nº 0221/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução28 de Setembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1.

    A………… e marido B………… - devidamente identificados nos autos - interpõem o presente recurso de revista do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte [TCAN], proferido a 04.11.2016, que negou provimento ao recurso de apelação, por eles interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu [TAF], mantendo, destarte, a decisão de absolver da instância o MUNICÍPIO DE VISEU [MV] com fundamento na falta de impugnabilidade do acto impugnado [ordem de demolição].

    Terminam as suas alegações formulando estas conclusões: A) A ordem de demolição impugnada dirige-se ao património comum dos recorrentes, adquirido na constância de um matrimónio sujeito ao regime de comunhão geral, por compra registada em 25.09.2000 - conforme apresentação AP. 87, documento 2 junto com a petição inicial; B) Facto que era do conhecimento do Município recorrido; C) Pelo que se impunha a notificação de ambos os recorrentes de todos os actos que afectem tal património comum, o que não ocorreu; D) Pois, perante a natureza do acto administrativo praticado, a recorrente mulher carece de legitimidade para intervir isoladamente e, acima de tudo, ao recorrente marido não pode ser negado ou condicionado o exercício da defesa do seus direitos e interesses - ver nº3 do artigo 1678º Código Civil e 12º, 13º e 20º da Constituição da República Portuguesa; E) Embora algumas das notificações sejam endereçadas em conjunto à recorrente mulher e marido nenhuma delas foi recebida por qualquer dos recorrentes mas por terceiros - ver 43 e 51; F) De qualquer forma, perante os interesses em causa e as razões acima expostas, sempre se impunha ao Município recorrido notificar individualmente cada um dos recorrentes; G) Não se encontrando cumpridos os imperativos estabelecidos, entre outros nos artigos 55º e 66º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, os actos praticados pelo Município recorrido padecem de vícios que determinam a sua nulidade; H) A preterição de tais formalidades legais ocorre, também, relativamente aos intervenientes que vieram a ser indicados nos presentes autos, como contra interessados, o que, igualmente, constitui vício que determina a nulidade do acto; I) A decisão judicial de natureza civil proferida no processo 4953/07.OTBVIS do extinto 4º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, que julga improcedente o pedido de declaração de ilegalidade da construção objecto da decisão de demolição impugnada e a sua consequente demolição, constitui caso julgado que o Município recorrido tem que respeitar em obediência ao disposto na alínea h), nº2, do artigo 133º do CPA, e aos imperativos constitucionais expressos nos artigos 203º, e nº2 do artigo 205º da CRP; J) Na verdade, tal decisão não se limita a declarar o direito propriedade e o consequente direito do proprietário edificar sobre a sua propriedade, mas também conhece o pedido de demolição de tal construção, julgando-o improcedente, e, portanto, absolvendo os aqui recorrentes de a demolirem por, necessariamente, não violar a lei; K) Assim, os actos praticados pelo recorrido Município enfermam de vícios que determinam a sua nulidade, pelo que a sua impugnação pode ser feita a todo o tempo - artigo 58º, nº1, do CPTA, ex vi artigos 133º, e 134º, nº2, do CPA; L) O acto impugnado, que a decisão recorrida qualifica como meramente confirmativo, não faz qualquer referência ao acto que pretensamente confirma, o que, parece, será o mínimo exigível para que se conclua pela sua qualificação confirmativa; M) Acresce que em momento algum o réu Município informa os recorrentes sobre a natureza, efeitos, e meios de defesa das notificações que lhes dirige como se impõe nos termos do artigo 68º do CPA; N) Em especial quanto ao acto administrativo de 18.06.2010, pretensamente confirmado, que se sintetiza num simples manuscrito «Proceda-se de acordo com a informação» desrespeitando o rigor exigido pelo disposto no nº2 do artigo 123º do CPA; O) Finalmente, parece não haver correspondência entre o acto pretensamente confirmado e o confirmativo, pois o primeiro é praticado no âmbito do PA 51/2006/124/0 e tem a exclusiva intervenção dos recorrentes e tem por objecto exclusivo a apreciação da legalidade de uma construção, e o segundo é praticado no PA 09/2011/128/0, tem a intervenção dos recorrentes e outros que vieram a ser chamados aos presentes autos, como contra interessados, e tem por objecto o licenciamento de uma construção onde se inclui aquela cuja demolição foi ordenada, e, ainda, outras construções que lhe estão adjacentes; P) Pelo que, não estarão reunidos requisitos suficientes para declarar que os actos praticados pelo Município após o acto de 18.06.2010 são meramente confirmativos; Q) De qualquer forma, por inexistir impugnação do pretenso acto confirmado, e notificação do recorrente marido, sempre seria admissível a impugnação apresentada - artigo 53º do CPTA; R) Assim, parece-nos, que a decisão recorrida, fará uma interpretação e aplicação do disposto nos artigos 55º, 59º, 66º, 68º, 70º, 123º nº2, 133º e 134º nº2, do CPA, e 50º a 53º, e 58º nº1, do CPTA, e 12º, 13º e 20º da CRP, que não será a mais exacta e, portanto, a determinar o presente recurso que deve ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida.

    Terminam, pois, pedindo a revogação do acórdão recorrido e o prosseguimento da acção [Acção Administrativa Especial (AAE)] no TAF de Viseu.

    1. O recorrido MV, não apresentou contra-alegações.

    2. O recurso de revista foi admitido para apreciação pela Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal [STA] - «Formação» a que alude o artigo 150º, nº5, do CPTA.

    3. O Ministério Público junto deste STA não se pronunciou - artigo 146º, nº1, do CPTA.

    4. Colhidos que foram os «vistos» legais, cumpre apreciar e decidir a revista.

  2. De Facto São os seguintes os «factos provados» fornecidos pelas instâncias: 1) Em Julho de 2006 deu entrada na Câmara Municipal de Viseu [CMV] uma exposição apresentada por C………… dando conta duma construção ilegal edificada sobre uma garagem localizada no logradouro dos ora autores - ver folha 3 do PA nº51/2006/124/0; 2) Desta exposição a CMV deu o devido conhecimento aos autores, bem como ao condomínio do prédio - ver folhas 9, 7, do PA; 3) Sendo que os mesmos vieram apresentar as suas posições, respectivamente em 28.12.2006 e em 03.01.2007 - ver folhas 24 e seguintes e 27 e seguintes do PA; 4) Tal como consta da exposição apresentada pelo Condomínio, e comprovada pelas cópias das actas que a acompanharam, verifica-se que as obras denunciadas e objecto do acto de demolição sub judice foram feitas depois de Maio de 2004 - ver folhas 27 e 26 do PA; 5) Em face dos elementos apurados, pelos serviços competentes, foi proferida a Informação nº430/2008, de 04.07.2008, pelo Departamento de Habitação e Urbanismo [DHU] da CMV, onde se conclui que, face ao quadro legal aplicável, aquela obra de ampliação sobre a garagem era insusceptível de legalização – ver folhas 28 e 29 do PA; 6) Como tal, nos termos do nº3, do artigo 106º, do DL nº555/99, de 16.12 [Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (RJUE)], propunha-se que se efectuasse audiência prévia sobre a intenção da CMV ordenar a demolição da obra; 7) Sobre esta «informação» recaiu a proposta de concordância de 07.07.2008, despacho de 10.07.2008 «para se proceder em conformidade com o proposto» e, consequentemente, foram os ora autores notificados para o efeito, o que fizeram por exposição de 28.07.2008 - ver folhas 29, 32, 33 e 34 do PA; 8) Sobre esta informação recaiu proposta de concordância de 12.02.2010, informação superior de 22.02.2010 no mesmo sentido, designadamente, que fosse dada ordem de demolição da construção ilegal, o que foi feito por despacho de 18.06.2010: «Proceda-se de acordo com a informação» - ver folha 41 do PA; 9) Deste «despacho» que ordena a demolição foram os ora autores devidamente notificados por ofício recebido em 01.09.2010 - ver folhas 45, 44 e 43 do PA; 10) Em resposta, os autores limitaram-se a fazer um simples requerimento informando a CMV de que iriam instruir o processo de licenciamento da obra em...

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