Acórdão nº 01388/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução20 de Dezembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: * 1.1.

Caixa Geral de Depósitos, SA, reclamou, no Tribunal Tributário de Lisboa, do despacho do Diretor da Unidade dos Grandes Contribuintes que indeferiu o pedido de verificação da caducidade da garantia bancária, apresentada no processo de execução fiscal n.º 3301201001015435, relativo a uma dívida do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletiva (IRC) do exercício de 2007, peticionando a sua anulação.

* 1.2.

Aquele Tribunal, por sentença de 13/10/2017, julgou procedente a reclamação.

* 1.3.

É dessa decisão que a recorrente, Fazenda Pública, vem interpor recurso terminando as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo: «A. O Meritíssimo Juiz a quo ao fundamentar a decisão de anulação do despacho reclamado escudou-se integralmente no Acórdão desse Supremo Tribunal Administrativo de 08.04.2015, proc. n.º 0274/15, tendo, para o efeito, transcrito excerto que, nas suas palavras, interpreta o vocábulo «interessado», previsto no n.º 3 do art.º 183-A do CPPT, Ora, B. Com o devido respeito pelo douto aresto, que é muito, não se acompanha o entendimento naquele expendido, porque se entende que o mesmo, na interpretação que fez do preceito – 183.º-A do CPPT - não teve em devida consideração os elementos sistemático, finalístico/teológico e histórico que devem presidir a uma reconstrução do pensamento legislativo, o qual por sua vez, deve enquadrar o elemento literal.

C. O intérprete terá que recorrer a outros elementos, designadamente, aos elementos lógicos, mormente ao elemento teológico (ratio legis) subjacente ao preceito legal em análise — que, no caso em apreço, corporiza a preocupação de desonerar o executado/reclamante, dos custos inerentes à manutenção de uma garantia para além de um prazo considerado razoável pelo legislador, mantendo, no entanto, o processo de execução fiscal suspenso até à decisão do pleito (cfr. artigo 9.º do Código Civil, aplicável ex vi artigo 11.º da LGT) D. Pelo que, pese embora as sucessivas: alteração, revogação e reintrodução, a razão de ser deste normativo legal (“rácio legis”) era, e continua a ser, a de “prevenir” a “imposição ao contribuinte de um encargo oculto por razões que lhe são alheia”, dotando-o de um instrumento jurídico que, se assim o entender, poderá acionar mediante a apresentação do requerimento a que se refere o n.º 3 do artigo 183.º-A do CPPT.

E. Ora, quem suporta o encargo com a prestação da garantia é o devedor/executado/reclamante, por contrapartida, dir-se-á, da vantagem de ver suspenso o processo de execução fiscal (PEF).

F. É por demais manifesto que as instituições bancárias não suportam qualquer encargo com a prestação de garantia, bem pelo contrário.

G. Em rigor, conforme as regras usuais no âmbito da atividade bancária, ao invés de oneradas, as entidades bancárias garantes são remuneradas pela emissão e manutenção da garantia bancária.

Nestes termos, H. Do elemento teológico (ratio legis), resulta evidente que, para efeito do regime jurídico edificado no artigo 183.º-A do CPPT, apenas o devedor/executado/ reclamante se subsume no conceito de interessado e como tal terá legitimidade para acionar aquele instrumento jurídico, pois só ele é onerado com o encargo da garantia prestada, para efeitos da suspensão do processo de execução fiscal.

Por outro verso, I. Os encargos visados pela desoneração que resulta do regime contido no artigo 183.º-A do CPPT, são os custos inerentes à prestação da garantia, especificamente, os resultantes das comissões pagas para a sua manutenção e não foi com certeza o propósito do legislador desobrigar as entidades garantes de cumprirem a sua prestação, de entrega da soma pecuniária pré-determinada ao beneficiário – entidade exequente (AT) – uma vez acionada a garantia.

J. Mas, se dúvidas subsistissem quanto à intencionalidade reguladora, ao espírito ínsito na norma, as mesmas seriam dirimidas pelo recurso, em conjugação com o elemento teleológico, aos restantes elementos lógicos de interpretação, a saber, ao elemento histórico e ao elemento sistemático. Porquanto, K. À luz do elemento histórico-literal, convirá não olvidar que na redação inicial o artigo 183.º-A do CPPT o seu n.º 6, estabelecia uma indemnização ao interessado pelos encargos suportados com a prestação da garantia, sendo que não suscita aqui, também, quaisquer dúvidas de que, o interessado só podia ser o contribuinte que havia prestado a garantia para suspender o PEF e que se encontrava onerado com os “encargos suportados com a sua prestação” e que nessa medida, por via daquele instituto, seria indemnizado.

L. Embora, na sua redação atual, o artigo 183.º-A do CPPT já nada diga quanto ao pagamento da referida indemnização, uma vez que, o n.º 6 foi revogado, afigura-se- nos que, do mesmo modo, o interessado a que se refere o n.º 3 desta disposição legal, que tem a legitimidade e poderá ter a iniciativa de apresentar requerimento a solicitar a “verificação da caducidade da garantia”, só poderia ser o devedor/executado/reclamante.

M. Com efeito, da reintrodução do regime, pela mera reposição parcial, decorre que o legislador não teve qualquer outra intenção, que não a de repristinar apenas parte da redação não cuidando, contudo, com a diligência que se entende ser devida, de ajustar o termo interessado ao efetivo destinatário da norma, o qual era, e continua a sê-lo, o devedor/executado/reclamante, porquanto, é o único constrangido com o encargo com a prestação de garantia e que, por recurso a este instrumento jurídico, se pode ver desonerado daquele, sem perder a vantagem de ter o PEF suspenso.

N. Por fim, também do elemento sistemático, isto é, da unidade do sistema jurídico, resulta indubitável que o interessado a que se refere o n.º 3 do artigo 183.º-A do CPPT só pode ser o devedor/executado/reclamante.

O. Pelo que, a legitimidade de apresentar requerimento a solicitar a “verificação da caducidade da garantia” terá de ser aferida, numa lógica de harmonia jurídico- sistemática, por quem detém, por seu turno, legitimidade para apresentar a reclamação graciosa e, para efeito de suspensão do processo de execução fiscal a esta associado, legitimidade para prestar garantia idónea, ou para dela ser dispensado, ou ainda, ter bens cuja penhora garanta o pagamento integral da quantia exequenda e do acrescido.

P. Acresce, ainda, que é ao prazo de decisão da reclamação graciosa que se encontra indexado o pressuposto do acionamento deste instrumento jurídico, atente-se ao previsto no n.º 1. Ora, quem conhece o procedimento de reclamação graciosa, mormente, a data da apresentação do respetivo requerimento, por referência ao qual se conta o prazo de 1 ano, pressuposto de acionamento deste instrumento jurídico, é o reclamante e não a instituição bancária garante.

Q. Se o legislador pretendeu tão só dotar o devedor/executado/reclamante de uma ferramenta que lhe permitisse desonerar dos encargos de manutenção da garantia, o instituto do artigo 183.º-A do CPPT não pode configurar um instrumento jurídico de que as entidades bancárias garantes possam lançar mão para se libertarem da obrigação assumida, porquanto, nunca esteve no espírito do legislador conferir, por via deste instituto, proteção jurídica às entidades garantes.

R. Por outro lado, mesmo entendendo-se o conceito de interessado adotado pelo artigo 183.º-A do CPPT num sentido lato, deverá ainda atender-se à natureza da garantia prestada, pois a situação de estarmos perante uma garantia bancária e ser a própria instituição bancária garante, e não o Devedor / executado / reclamante, a querer acionar aquele instrumento jurídico invocando a caducidade da garantia, configura uma situação diametralmente distinta.

S. Se é facto que a natureza da garantia não releva como pressuposto legal da declaração de caducidade, será também facto, e muito distinto, que a natureza da garantia releva para efeitos do apuramento do âmbito de ação/oponibilidade de exceções no cumprimento da obrigação de pagamento, da entidade garante face ao beneficiário, isto é, ao credor tributário.

T. O traço característico da garantia autónoma enquanto garantia pessoal é, tal como o nome indica, a autonomia da...

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