Acórdão nº 0699/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução10 de Maio de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório -1 – A Autoridade Tributária e Aduaneira – AT recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 4 de Março de 2016, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A……………, LDA, com os sinais dos autos, contra liquidação adicional de IRC relativa ao ano de 2008, no montante de €3.300.004,65, anulando a liquidação sindicada.

A recorrente conclui as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: a. Salvo o devido respeito que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida padece de erro de julgamento da matéria de direito, por errada interpretação e aplicação do instituto da caducidade à situação “sub judice”.

b. Com efeito, o facto de o Tribunal a quo fundamentar a sua decisão com base no acórdão do TCA Sul n.º 02859/09 de 09.02.2010 que enquadra uma situação totalmente diversa da aqui em discussão, faz inquinar a análise do Tribunal; c. Na situação do Acórdão referido, a AT procedeu, em 1999, a correcções no exercício de 1991 que alteraram a matéria colectável desse exercício, e que por sua vez tiveram consequências nos exercícios seguintes, nomeadamente, em 1996 (ano da liquidação impugnada), por desconsideração dos prejuízos reportados e resultantes dos declarados naquele exercício de 1991; d. Nesta situação, cremos que bem decidiu o Tribunal no que concerne à caducidade porquanto in casu verifica-se a existência de correções à matéria colectável de 1991 que tiveram impacto nesse exercício – no qual não foi, no entanto, apurado lucro tributável e não deu origem a qualquer liquidação – mas que deviam ter sido notificadas ao sujeito passivo dentro do prazo de caducidade.

e. Pelo que, não tendo as correções promovidas pela AT à matéria colectável ao exercício de 1991 sido notificadas ao sujeito passivo dentro do prazo de caducidade, as referidas alterações com efeitos no reporte de prejuízos para os exercícios posteriores não podem ter repercussões nestes exercícios (1996); f. A situação em aqui nos autos em análise é totalmente distinta porquanto a alteração promovida aos proveitos de 2007 por força da acção inspectiva externa consistiu apenas na confirmação de que os proveitos efectivos referentes ao exercício de 2007 foram, num único exercício, de montante superior a 25% do limite estabelecido (€149.693,37) no n.º 1 do artigo 53.º do CIRC, pelo que, cessava a aplicação do regime simplificado de tributação passando a aplicar-se o regime geral com efeitos a partir de 2008; g. De facto, o fim da AT com a acção de inspecção foi recolher elementos que pudessem aferir da correcta aplicação do princípio contabilístico da especialização dos exercícios e apurar os proveitos dos exercícios de 2006 e 2007 para efeitos de enquadramento tributário, nunca tendo por intuito a alteração da matéria tributável à qual se seguisse a emissão de qualquer liquidação adicional para esses exercícios; h. E tanto assim é que a AT viria a concluir que parte dos proveitos contabilizados em 2008, a maioria, aliás, respeitavam, na realidade e de acordo com o princípio da especialização de exercícios, a 2007, sem, no entanto, promover nenhum acto de liquidação adicional, em face da caducidade do direito à liquidação; i. A AT, decorrente do princípio da especialização de exercícios, reconheceu proveitos que deviam ter sido contabilizados em 2007, alterando a título meramente declarativo os proveitos desse exercício, com consequências legais para os exercícios futuros, cujo período de caducidade estava a decorrer, nomeadamente, para o exercício de 2008, alterando o regime de tributação em IRC (ficando sujeito ao regime geral); j. A alteração aos proveitos de 2007, tem efeitos no exercício de 2008, porque acaba por alterar o enquadramento do regime de enquadramento da impugnante em IRC no exercício de 2008. Mas a referida alteração não provoca directamente a alteração da matéria tributável do exercício de 2008; k. Em substancia, estamos em presença de correcções operadas aos proveitos de 2007 que não tiveram como consequência a alteração da correspondente liquidação, mantendo-se inalterada para efeitos tributários a situação da Impugnante.

l. Recorde-se que o artigo 45.º da LGT respeita ao prazo máximo durante o qual o Estado pode exercer o seu direito a liquidar, ancorando-se a caducidade do direito à liquidação nos princípios da certeza e da segurança jurídica.

m. Ora, como vimos, o reconhecimento dos proveitos em 2007 para efeitos de aplicação do correcto enquadramento tributário da Impugnante em exercícios posteriores, não teve em vista a emissão de qualquer liquidação adicional para esse exercício, independentemente de se ter apurado ou não prejuízo fiscal.

n. A situação tributária quanto ao exercício de 2007, encontra-se estabilizada e imperturbada desde 2011 (data da ocorrência da caducidade do direito de liquidar), não tendo as alterações promovidas aos proveitos qualquer impacto em termos fiscais nesse exercício.

o. Por sua vez, o impacto da alteração dos proveitos de 2007 para exercícios posteriores, nomeadamente, para 2008, apenas teve repercussões para efeitos de enquadramento tributário em IRC, não tendo a referida alteração consequências directas no apuramento da matéria tributável desse ano.

p. Assim sendo, na situação vertente não se colocam questões que se prendem com a necessidade de certeza de direitos ou de relações jurídicas.

q. E é o facto de existir essa diferenciação que não foi, com o devido respeito, apreendida pelo Tribunal a quo que faz inquinar o sentido da decisão recorrida, ferindo-a de ilegalidade.

r. Acresce que a actuação da Administração Tributária, no caso concreto, se encontra legitimada pelas próprias normas constantes do ordenamento jurídico tributário.

s. Por força da sua função de controlo e fiscalização dos impostos, a Administração tributária, para exercício da sua actividade inspectiva, tem ao seu dispor meios legais que lhe possibilitam a comprovação e a verificação das realidades tributárias.

t. No âmbito daqueles meios que se destinam a materializar e concretizar o fim a que a AT se destina, encontram-se os previstos nos artigos 36.º n.º 1 do RCPIT e o artigo 121.º do Código do IRC, conjugado com os artigos 2.º e 12.º do RCPIT.

u. De acordo com os citados artigos, a AT pode verificar e consultar elementos da contabilidade relativos a períodos ou factos tributários já abrangidos pelo período de caducidade desde que o prazo de conservação de 10 anos ainda se encontre a decorrer, como acontece com a documentação contabilística.

v. Isto é, a AT pode iniciar procedimentos inspectivos com vista a confirmar e verificar o cumprimento das obrigações tributárias relativas a exercícios já caducados, mas não pode efectuar qualquer correcção à matéria tributável ou apurar imposto com referência àqueles exercícios já caducados.

w. In casu, a AT através do seu procedimento externo de comprovação e análise quanto aos elementos declarados em 2006 e 2007 teve em vista verificar se para o exercício de 2008 se verificavam os pressupostos para o seu enquadramento no regime geral de tributação.

x. E não tendo ainda decorrido o prazo de caducidade relativamente ao exercício de 2008, a informação recolhida no âmbito daquele procedimento aos exercícios anteriores terá que ter necessariamente impacto nesse exercício, nomeadamente ao nível de alteração do seu enquadramento tributário para o regime geral, dado que não se verificam os pressupostos para beneficiar do regime simplificado.

y. De resto, entendimento contrário sempre resultaria na inviabilização da alteração do enquadramento tributário do sujeito passivo, perpetuando-se o erro quanto à situação tributária do contribuinte.

z. Sobre esta questão, concordamos inteiramente com a informação de 14.05.2013 elaborada pela Direção de Finanças de Braga (junta aos autos), na qual se defende que “A não ser assim, o enquadramento tributário dos sujeitos passivos viria antecipada a caducidade da sua alteração, em detrimento dos restantes elementos constitutivos do facto tributário subjacente. Antecipação essa que poderá abranger, no limite, três anos, ou seja, o período durante o qual um sujeito passivo permanece no regime simplificado de tributação, se os seus pressupostos, não se alterarem.” aa. Acrescenta ainda a referida informação que "Caso se viesse a verificar um errado enquadramento do sujeito passivo, por factos já abrangidos pela caducidade do imposto, o posterior reenquadramento do mesmo seria inviabilizado, perpetuando-se, no limite, o referido erro de base, o que, manifestamente, não se percebe, pois teremos sempre que atender à natureza da correcção aqui operada e à especificidade da sua regulamentação, ou seja, o enquadramento do sujeito passivo no regime simplificado de tributação nos termos do art.º 53º do Código do IRC (entretanto revogado)." bb. Assim, tem de se concluir que foi legal a actuação da Administração Tributária ao enquadrar o sujeito passivo no regime geral de determinação do lucro tributável de IRC respeitante ao exercício de 2008 (desconsiderando a opção efectuada pelo regime simplificado) e ao liquidar o imposto em conformidade com tal regime.

cc. Logo, a sentença recorrida ao decidir contrariamente encontra-se inquinada de ilegalidade, não podendo por isso deixar de ser anulada.

dd. No que concerne à caducidade do processo inspectivo relativo aos exercícios de 2006 e 2007 realizado em 2012, não tem razão a Impugnante porquanto de acordo com o n.º 1 do artigo 36º do RCPIT e n.º 4 do artigo 123.º do CIRC, podem ser verificados e consultados elementos contabilísticos relativos a períodos ou factos tributários já abrangidos pelo prazo de caducidade desde que o prazo de conservação de 10 anos ainda se encontre a decorrer, como acontece com a documentação contabilística; ee. Assim, não podem ser iniciados procedimentos inspectivos relativos a exercícios já caducados mas...

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