Acórdão nº 01338/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Fevereiro de 2017
Magistrado Responsável | MADEIRA DOS SANTOS |
Data da Resolução | 01 de Fevereiro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: A Secretaria Regional da Saúde da Região Autónoma da Madeira deduziu esta revista de um acórdão do TCA-Sul, confirmativo da sentença do TAF do Funchal que, deferindo o procedimento cautelar requerido por A………., Ld.ª, provisoriamente autorizou a transferência de uma certa farmácia para outro local do mesmo concelho, condicionando-a ao cumprimento, pela dita requerente, «dos compromissos» que ela assumira num requerimento dirigido à Administração.
A SRS recorrente findou a sua minuta de recurso com as seguintes conclusões: 1. Nos presentes autos está em causa uma decisão cautelar de cujos efeitos decorre a privação da população de duas freguesias rurais e carenciadas (Santo António da Serra, Santa Cruz e Santo António da Serra, Machico), bem como dos utentes de um centro de saúde (Centro de Saúde do Santo da Serra) do acesso aos serviços de uma farmácia.
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Este impacto da decisão judicial em causa nos autos é bem revelador da relevância social que lhe confere importância fundamental à luz do art. 150º, nº 1 do CPTA.
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Por outro lado, nos autos discute-se os limites da tutela cautelar antecipatória quando a apreciação da pretensão da requerente está sujeita a discricionariedade administrativa, o que impede a condenação, a título principal, à prática do acto reclamado a título provisório.
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Questão jurídica delicada, designadamente em face do princípio constitucional da separação de poderes, que é susceptível de se colocar com frequência perante os tribunais administrativos, o que lhe confere importância fundamental suficiente para justificar a admissão da revista.
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Por fim, o Acórdão recorrido contraria toda a jurisprudência anterior do STA e dos TCA’s em matéria de limites da tutela cautelar antecipatória quando está em causa o exercício do poder discricionário da administração.
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Revelando-se, como tal, a intervenção do Venerando STA imprescindível para garantir uma melhor aplicação do Direito.
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Considerando o objecto da acção principal, por referência ao art. 66º, nº3 do CPTA, a ampla margem de livre decisão administrativa conferida à Administração pelo art. 26º do D.L. nº 307/2007 e até os concretos vícios imputados pelo Acórdão recorrido aos actos administrativos de indeferimento da autorização de transferência da farmácia, a entidade requerida, ora recorrente, nunca poderá ser condenada na referida acção principal à prática de um acto de deferimento da transferência, mas apenas e só à reinstrução do procedimento, com a emissão de parecer pela CMSC, seguida de nova decisão, sem vinculação quanto ao sentido.
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Assim sendo, não poderia, naturalmente, a requerente obter em sede de tutela cautelar a autorização de transferência, ainda que provisória, pois tal é muito mais do que a procedência da acção principal lhe pode garantir.
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Donde se conclui, inevitavelmente, que o Acórdão recorrido se mostra ilegal, por violação do princípio da instrumentalidade, que configura um principio essencial e basilar da tutela cautelar.
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Por outro lado, ao conferir à requerente a autorização provisória de transferência da farmácia, quando a apreciação de tal pretensão se enquadra, à luz do art. 26º do DL. nº 307/2007, no âmbito do poder discricionário da administração, o Acórdão recorrido incorre em violação do princípio da separação de poderes, consagrado no art. 111º da CRP e do art. 3º, nº1 do CPTA, 11. A interpretação do art. 112º do CPTA plasmada no Acórdão recorrido, segundo a qual é admissível o decretamento de providência cautelar de autorização provisória de transferência de farmácia, quando a norma que regula a apreciação de tal pretensão confere discricionariedade aos órgãos administrativos competentes é inconstitucional por violação do princípio da separação de poderes, consagrado no art. 111º da CRP.
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Considerando as concretas procedência antecipatória requerida e acção principal de que esta depende, a verificação deste requisito impunha a conclusão de que seria provável a condenação, a título principal, da entidade requerida a proferir acto administrativo de conteúdo vinculado, no sentido do deferimento da autorização de transferência da farmácia, o que manifestamente não se verifica.
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Assim sendo, é evidente que o Acórdão recorrido, ao considerar verificado o requisito da provável procedência da pretensão formulada no processo principal, apenas por referência a alegados vícios dos actos de indeferimento praticados pela entidade requerida, notoriamente insuscetíveis de conduzirem à condenação à prática de acto de deferimento da autorização de transferência da farmácia, viola flagrantemente o disposto no artº. 120º, nº1, parte final do CPTA.
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Os antecedentes legislativos e os trabalhos parlamentares referentes à alteração introduzida ao art. 26º do DL nº 307/2007 não podem deixar de sopesar na tarefa interpretativa da norma, apontando claramente para a prevalência da “necessidade de salvaguardar a acessibilidade das populações aos medicamentos” e a “sua comodidade”.
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Ou, caso assim não se entenda, pelo menos determinam que, falhando este requisito, o pedido haja de ser indeferido, independentemente dos demais critérios.
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Assim sendo, considerando o conteúdo do parecer da CMSC e os fundamentos nele invocados, não seria, sequer necessária uma ponderação autónoma do requisito da viabilidade económica da farmácia, porquanto no referido parecer se considerou não verificado o requisito da “necessidade de salvaguardar a acessibilidade das populações aos medicamentos” e a “sua comodidade”, tendo o Acórdão recorrido interpretado erradamente o art. 26º do D.L. nº 307/2007 ao assim não considerar.
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Resulta do teor da deliberação da CMSC, bem como da informação do departamento de gestão do urbanismo que antecedeu e instruiu a proposta de deliberação, que aquela autarquia, ao emitir o parecer, ponderou “a viabilidade económica da farmácia a transferir, mas entendeu não estarem verificados os demais requisitos, designadamente a “necessidade de salvaguardar a acessibilidade das populações aos medicamentos” e a “sua comodidade” e por isso se pronunciou negativamente.
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Pelo que andou mal o Acórdão recorrido ao considerar que o referido parecer se mostra ilegal por violação do art. 26º do DL nº 307/2007, por não ter sido ponderada “a viabilidade económica” da farmácia a transferir de onde decorreria a invalidade do despacho de indeferimento de 14-11-2015.
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No que se refere ao despacho de 20 de Novembro de 2015, o Acórdão recorrido considerou prejudicada a parte do recurso relativa ao conhecimento perfunctório da sua validade, em sede de fumus boni juris, na medida em que considerou suficiente para a verificação deste requisito a invalidade do despacho de 14-11- 2015.
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Procedendo, como se espera, o recurso no que se refere àquela apreciação, poderá este Supremo Tribunal conhecer da validade do acto de 20-11-2015, em substituição.
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A entidade requerida, ora recorrente, não estava obrigada a proceder a nova apreciação da pretensão da requerente, nem tão pouco a desencadear um procedimento de consulta da CM Santa Cruz.
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Já que, na verdade, trata-se exactamente do mesmo pedido que já tinha merecido anterior parecer desfavorável e decisão de indeferimento.
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Sendo que, ao contrário do que refere a sentença da 1.ª instância, também os fundamentos da pretensão são os mesmos, consistindo, na (suposta) debilidade financeira inerente à exploração da farmácia na sua localização actual.
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As referências que a requerente entendeu incluir à eventualidade de abrir um estabelecimento de venda de medicamentos não sujeitos a receita médica no local onde actualmente funciona a farmácia e de disponibilizar entregas ao domicílio na freguesia de Santo António da Serra não constituem verdadeiros fundamentos do pedido de transferência.
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São apenas referências, sem qualquer previsão legal, diga-se, e sem qualquer garantia de cumprimento, insusceptíveis de conduzir a diferente enquadramento da pretensão anteriormente deduzida.
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Assim sendo, e nos termos do art. 13º, nº 2, do CPA, não existia sequer dever de decisão relativamente à pretensão apresentada pela segunda vez pela requerente.
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Ao considerar o contrário, a sentença da 1ª instância violou esta norma legal.
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Mesmo por referência a estes vícios, que, a procederem, nunca poderiam conduzir à condenação da entidade demandada nos autos principais a praticar um acto deferimento do pedido de transferência da farmácia, nunca estaria verificado o requisito da provável procedência da acção principal, tendo andado mal o Acórdão recorrido ao assim considerar, violando o art. 120º, nº1 do CPTA.
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A “Farmácia ………..” não existe sequer do ponto de vista jurídico, requerente nos autos é a sociedade comercial A……….., Lda. e é sobre esta que recai o ónus de alegação e prova dos prejuízos de difícil reparação.
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É, pois, por referência à esfera jurídica da sociedade que é parte nos autos, e não de um dos seus estabelecimentos, que tem de se apreciar a existência de prejuízos em sede de “periculum in mora”.
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As alegadas dificuldades na exploração da “Farmácia..........” não têm qualquer impacto relevante na estabilidade financeira da sociedade comercial requerente, ora recorrida, que continua a apresentar resultados muito favoráveis, acima da média do sector, continuando a perspectivar-se lucros elevados para os anos subsequentes (V. factos 15 e 17).
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Aliás, como é reconhecido no Acórdão recorrido, não ficou provado qualquer risco de insolvência da requerente, no caso de recusa da providência cautelar.
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Os supostos prejuízos, a ocorrerem, seriam sempre, em qualquer caso, perfeitamente quantificáveis e ressarcíveis, e repete-se, não põem em causa a saúde financeira da sociedade requerente, pelo que não podem qualificar-se como prejuízos de difícil reparação à luz do disposto no art. 120º, nº1 do CPTA.
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Ao assim não entender, a sentença recorrida viola aquela disposição legal.
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Errou ainda a sentença recorrida ao qualificar como...
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