Acórdão nº 0343/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução16 de Março de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1.

    A………..

    [autor] - Procurador da República - demanda nesta acção administrativa especial [AAE] o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO [CSMP] formulando a este Supremo Tribunal [STA] os seguintes pedidos: a) Declaração de nulidade, ou, se assim não se entender, a anulação, do acórdão do Plenário do CSMP de 02.12.2014 na parte em que nele se determina que o autor, após trânsito em julgado do acórdão proferido pela Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, em 30.10.2014, fique na situação de disponibilidade nos termos do artigo 161º, nº1 alínea b), do EMP [Estatuto do Ministério Público]; b) Declaração de nulidade, ou, se assim não se entender, a anulação, do acórdão da Secção Disciplinar do CSMP [SD/CSMP] de 16.12.2014, por via do qual foi novamente aplicada ao autor a pena disciplinar de aposentação compulsiva; c) Declaração de nulidade, ou, se assim não se entender, a anulação, do acórdão do Plenário do CSMP de 27.01.2015, por via do qual foi desatendida a reclamação apresentada pelo autor contra o acórdão mencionado em b), que por ele foi mantido na íntegra; d) Condenação do CSMP a adoptar todos os actos e operações necessárias a reconstituir a situação que existiria se os actos impugnados não tivessem sido praticados [pedido cumulado com o de impugnação ao abrigo do artigo 4º, nº2 alínea a), do CPTA]; e) Condenação do CSMP a pagar ao autor, a título de indemnização por danos morais, quantia líquida nunca inferior a 100.000,00€, bem como quantia, a liquidar, relativa a compensação pelos danos derivados de toda a conduta ilícita do réu, materializada nos actos ilegais que praticou, tanto os ora impugnados como os já declarados nulos pelo STA [pedido cumulado com o de impugnação ao abrigo do artigo 4º, nº2 alínea f), do CPTA].

    1. Como causa de pedir, o autor aponta na sua petição inicial [artigos 75º a 199º] aos actos impugnados várias ilegalidades a título principal e a título subsidiário [artigo 238º da petição inicial].

      A título principal, aponta à Deliberação do Plenário do CSMP de 02.12.2014 as ilegalidades seguintes: a) Violação do disposto no artigo 161º, nº1 alínea b), do EMP; b) Violação do conteúdo essencial do seu direito fundamental ao exercício da sua profissão, consagrado no artigo 47º da CRP.

      E às Deliberações do SD/CSMP de 16.12.2014, e do Plenário de 27.01.2015, as ilegalidades seguintes: c) Violação do artigo 63º da Lei nº58/2008, de 09.09, ex vi artigo 216º do EMP, ou do disposto no artigo 228º da Lei nº35/2014, de 20.06, que mantém, em termos praticamente idênticos, a mesma redacção daquele artigo 63º; d) Violação do conteúdo essencial do seu direito fundamental ao exercício da sua profissão, consagrado no artigo 47º da CRP; e) Violação dos princípios da dignidade da pessoa humana e do Estado de Direito Democrático, previstos nos artigos 1º e 2º da CRP, e bem assim do direito fundamental do autor a ser julgado em sede disciplinar no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa, que é consagrado no artigo 32º, nº2 e nº10, da CRP.

      E, a título subsidiário, imputa a estas duas últimas Deliberações as ilegalidades seguintes: f) Falta de fundamentação [artigos 124º e 125º do CPA] geradora de nulidade insuprível do procedimento disciplinar por impossibilidade de audiência e defesa cabais do autor [artigo 204º do EMP]; g) Erro nos pressupostos de facto e de direito; h) Prescrição das infracções disciplinares e do direito de instauração de procedimento disciplinar [refere os artigos 283º, nº1, 277º, nº1, e 105º, e 77º, nº1, do CPP; 11º, nº1, e 178º, nº1 e nº2, da Lei nº35/2014, de 20.06].

      Relativamente ao pedido de indemnização, cumulado com o impugnatório, o autor, partindo da conduta do CSMP materializada nos actos impugnados e nos já declarados nulos pelo STA, articula «danos não patrimoniais» de que se quer ver compensado.

    2. O réu CSMP apresentou contestação, na qual se defende por excepção e por impugnação [folhas 158 a 211 dos autos].

      Excepciona a falta de impugnabilidade contenciosa da Deliberação da SD/CSMP de 16.12.2014 que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva [ver artigos 3º a 19º da contestação].

      Excepciona a falta de impugnabilidade contenciosa da Deliberação do Plenário do CSMP de 02.12.2014 que colocou o autor na situação de disponibilidade, nos termos do artigo 161º, nº1 alínea b), do EMP [ver artigos 20º a 28º da contestação].

      Manifesta-se no sentido da «injustificação» e «inutilidade» do pedido cumulado de condenação à adopção dos actos e operações necessárias para reconstituir a situação que existiria se os actos impugnados não tivessem sido praticados [ver artigos 179º a 187º da contestação].

      E manifesta-se, também, no sentido da ilegalidade da cumulação do pedido de indemnização na parte em que é pedido «o ressarcimento de pretensos danos causados pelas Deliberações do CSMP de 14.07.2010 e de 04.06.2013» [artigos 200º a 207º da contestação].

      Impugna todas as ilegalidades apontadas aos actos impugnados na petição inicial, impugna a verificação dos pressupostos da obrigação de indemnizar, e impugna, ainda, o próprio montante indemnizatório que foi peticionado [artigos 188º a 279º da contestação].

    3. O autor pronunciou-se sobre as referidas excepções e demais questões que foram suscitadas na contestação pelo réu [folhas 329 a 360 dos autos].

    4. Foi proferido despacho saneador que, para além de julgar verificados todos os indispensáveis pressupostos processuais, apreciou e decidiu as questões que foram suscitadas na contestação do réu e às quais respondeu o autor.

      Assim, foi julgada «procedente» a excepção de inimpugnabilidade contenciosa do acórdão de 16.12.2014 [ver ponto 3 parágrafo 2º], e, em conformidade, foi absolvido da instância o CSMP «no tocante à declaração de nulidade ou anulação do mesmo» [artigos 89º, nº1 alínea c), do CPTA, e 576º, nº2, do CPC].

      Foram julgadas «improcedentes» a excepção de inimpugnabilidade contenciosa da Deliberação do Plenário do CSMP de 02.12.2014 [ver ponto 3 parágrafo 3º], e a questão da injustificação ou inutilidade do pedido de condenação à adopção dos actos e operações necessárias para reconstituir a situação actual hipotética anterior aos actos impugnados [artigos 4º, nº2 alínea a), e 173º, nº1 e nº2, do CPTA] - ver ponto 3 parágrafo 4º].

      Foi «rejeitada» com fundamento na sua ilegalidade a cumulação do pedido por danos morais na parte em que inclui o ressarcimento de danos causados pelas Deliberações do CSMP de 14.07.2010 [AAE nº772/10] e de 04.06.2013 [AAE nº1169/13].

      E foi relegada para depois da decisão do mérito do pedido principal [artigos 90º, nº3 e nº4, do CPTA aplicável, e 90º nº4, do actual CPTA], e caso necessário, «a produção de prova sobre a factualidade contida nos artigos 268º a 289º da petição inicial». E isto porque se trata de matéria de facto controvertida mas cuja demonstração só se tornará pertinente no caso de procedência «do pedido de declaração de nulidade, ou anulação, dos actos impugnados, na medida em que esta será indispensável para aferir do requisito da ilicitude necessário à emergência de eventual obrigação indemnizatória por parte do réu».

    5. Em sede de alegações finais [artigo 91º, nº4, do CPTA aplicável], o autor apresentou as conclusões seguintes: A) O acórdão do Plenário do CSMP de 02.12.2014, na parte em que determina que o autor, após trânsito em julgado do acórdão proferido pela 1ª Secção de Contencioso Administrativo deste STA em 30.10.2014, fique na situação de disponibilidade, nos termos do artigo 161º, nº1, alínea b), do EMP, é manifestamente ilegal por violação do disposto no aludido normativo 161º, nº1, alínea b), do EMP, pois tal disposição é inaplicável no caso: o autor não regressou à actividade após cumprimento de pena. O autor esteve, na verdade, impossibilitado, por via do acto punitivo que veio a ser declarado nulo por acórdão deste STA de 30.10.2014, de exercer as suas funções, situação que é manifestamente diferente da de cumprimento de pena; B) O nº1 do artigo 161º do EMP consubstancia uma norma taxativa; C) Acresce que, não está legalmente previsto qualquer caso de colocação na situação de disponibilidade numa situação como a presente, precisamente porque a nossa lei é peremptória ao afirmar que a anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado - ver artigo 173º, nº1 e nº2 do CPTA; D) Considerar-se legítimo que um magistrado possa estar na situação de disponibilidade após ter estado ilegalmente afastado do exercício das suas funções por via de acto da entidade com competência disciplinar que veio a ser jurisdicionalmente declarado nulo, é o mesmo que considerar-se legítimo que a entidade culpada pelo ilegal afastamento do exercício da sua profissão possa manter a situação fáctica criada pelo acto ilegal, isto é, possa manter o magistrado afastado do exercício das suas funções, e, consequentemente, não só manter como agravar as consequências [já de si] nefastas da ilegalidade previamente incorrida! E) Isto, claro, em evidente violação do comando ínsito no aludido artigo 173º, nº1 do CPTA, e, bem assim, da intenção do nosso legislador ao obrigar a Administração a repor a legalidade violada, como forma possível de minorar os efeitos nefastos das ilegalidades cometidas e reparar, tanto quanto possível, os direitos e interesses violados; F) Note-se que esta imposição que decorre da lei para a Administração, tem o seu fundamento em vários princípios elementares que vinculam a actividade administrativa, como o princípio da boa-fé [ver artigos 266º, nº2, da CRP, e 6º-A do CPA], o princípio da confiança [ínsito na ideia de Estado de Direito Democrático], o princípio do respeito pelos direitos e interesses...

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