Acórdão nº 01356/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelTERESA DE SOUSA
Data da Resolução22 de Março de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório A…………. e filhos, inconformados com a sentença proferida pelo TAF do Porto em 26/11/2013, que no âmbito da ação para efetivação de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito absolveu os réus Estado Português e Município do Marco de Canaveses dos pedidos, e condenou a Freguesia de Vila Boa do Bispo a pagar-lhes uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos, no montante de €119.711,48 e de €49.487,79 pela perda do direito à vida de B………….., marido da autora mulher e pai dos demais, relegando para execução de sentença a prova dos demais danos materiais, interpuseram recurso jurisdicional da mesma para o Tribunal Central Administrativo do Norte (fls. 1370 e ss).

Em alegações, a fls 1370 e segs. dos autos, formulam as conclusões seguintes: OS FACTOS 1./ Pelo que, por força da PROVA DOCUMENTAL de fls 128 a 234, 348 a 441, 645 a 720 e 846 e ss e do disposto no Decreto-Lei n.° 468/71 de 5 de Novembro a resposta ao Quesito 17° deve ser alterada para “Foi o Estado Português que autorizou, dirigiu, aprovou a barragem do Torrão e respectiva albufeira, na qual ocorreu o afogamento, bem como terrenos adjacentes, tudo pertencendo ao domínio público hídrico” 2./ Atendendo por um lado, a que saber a quem pertence ou compete a gestão, fiscalização, administração, conservação, sinalização, protecção de pessoas e bens, e vigilância de determinado local, é um facto e não matéria de direito, facto esse que não carece de alegação ou de prova nos termos do art. 412 (ex- 514°) do CPC, pois as leis e normas jurídicas para além de serem do conhecimento geral, o tribunal também tem conhecimento dessas normas por virtude do exercício das suas funções (iura novit curia) e por outro lado atendendo ao disposto no Decreto-Lei n° 502/71 de 18 de Novembro, no Decreto Regulamentar 2/88 de 20 de Janeiro, no Dec. Lei n° 21/98 de 3 de Fevereiro, no Decreto-Lei n° 336/93 de 29 de Setembro, no Decreto-Lei n.° 70/90 de 2 de Março, no Dec.Lei n° 46/94 de 22 de Fevereiro, no Dec.Lei 383/77 de 10 de Setembro, e no Dec. Lei 190/93, de 24/05, a resposta ao Quesito 21° deve ser alterada para “Provado” 3./ Porque por um lado, a Divisão de Hidrografia Fluvial da Direcção dos Serviços de Hidrologia ao efectuar nos termos do Dec.Lei 383/77 de 10 de Setembro estudos da geomorfologia da bacia da albufeira, do Torrão determinando as respectivas características fisiográficas, elaborando estudos e monografias do Rio Tâmega e analisando as modificações da hidrografia fluvial do Rio Tâmega provocadas pela construção da barragem do Torrão, permitiu ao R/Estado saber e conhecer, através destes seus serviços públicos, a morfologia do leito do rio referido em 3°) e 18°), e logo do perigo que a mesma constituía para os banhistas e utentes do local, mormente pela existência de casas muros, ramadas, árvores e fundões artificiais e por outro lado, porque resulta já das respostas aos Quesitos 4°, 18° e 19° da BI que não estava criado um serviço de vigilância no local, nem sinalizados os perigos com vista a evitar acidentes, a prova do Quesito 22º resulta da mesma fundamentação que o MM° Juiz “a quo” expôs para dar por provada a matéria dos Quesitos 4°, 18° e 19° da BI, pois na verdade trata-se dos mesmos factos. Assim a resposta deve ser alterada para “Provado” 4./Estando em causa também nos presentes autos a responsabilização do R./Estado por omissão legislativa, a questão de saber se existem ou não existem leis ou outras normas é matéria de facto pois trata-se de saber se o Estado praticou ou não um acto, concretamente o de legislar. Assim pela análise dos Decreto-Lei n° 41279 de 20 de Setembro, Decreto-Lei n° 349/85 de 26 de Agosto, Decreto-Lei 300/84 de 7 de Setembro, Decreto- Lei n.° 265/72 de 31 de Julho e Lei n.º 44/2004 de 19 de Agosto (normas o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções) resulta que entre 26 de Agosto de 1985 e 19 de Agosto 2004,- e logo na data do acidente em 2000 - existiu um vazio legal relativamente a normas jurídicas que regulem, disciplinem e sancionem a assistência aos banhistas nas praias fluviais, e de aguas interiores do domínio público, respectivas condições de instalação, sinalização, meios de salvamento, serviços de vigilância e enfermagem, logo a resposta ao Quesito 23.º deve ser alterada para “Provado” 5./ Na primeira parte do Quesito 24° não estamos perante matéria de direito mas sim perante um facto, logo respondível, sendo de presumir que o Estado cumpre e implementa as leis que cria e nessa medida estariam instalados no local do acidente os meios necessários a prevenir ou pelo menos a evitar a morte do B…………. Acresce que, atendendo a que através de PROVA POR PRESUNÇÃO JUDICIAL (decorrente da experiência comum e da normalidade das situações da vida), resulta que se no local estivessem instalados os meios de socorro necessários, tal prevenia ou evitava a morte do B…………. e atendendo ainda ao critério do art. 563.°, do CC, -teoria da causalidade adequada-, de acordo com o qual a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado não teria provavelmente sofrido se não fosse a lesão, a resposta ao Quesito 24° deve ser alterada para “Provado” 6./ Atendendo a que através de PROVA POR PRESUNÇÃO JUDICIAL (decorrente da experiência comum e da normalidade das situações da vida) resulta que se a R. Município tivesse administrado, vigiado ou fiscalizado e sinalizados os fundões existentes no local e demais perigos do local onde ocorreu o afogamento, tal prevenia ou evitava a morte do B…………; atendendo ainda ao critério do art. 563.°, do CC, -teoria da causalidade adequada-, de acordo com o qual a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado não teria provavelmente sofrido se não fosse a lesão; e atendendo ainda ao disposto na Lei n.° 48/98 de 11 de Agosto (Lei de bases da política de ordenamento do território e de urbanismo), no Decreto-Lei n.° 380/99 de 22 de Setembro (Regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial) no Decreto-Lei n.° 93/90 de 19 de Março (Regime jurídico da Reserva Ecológica) na Portaria n.° 1068/93 de 25 de Outubro, Resolução do Conselho de Ministros 11.0 34/94 (Plano Director Municipal de Marco de Canaveses) e no documento de fls 572 a 574 —Boletim Informativo da Câmara Municipal do Marco de Canaveses Ano II Nov 88/Janeiro 89, a resposta ao Quesito 27° deve ser alterada para “Provado” 7./ Pelo que atendendo a que saber se determinado local, face ao PDM, integra um determinado tipo de área, é matéria de facto e não de direito, tal como também é um facto apurar quais as competências de determinada entidade pública; atendendo a que por se tratar de uma Albufeira o local onde ocorreu o acidente, por força do disposto no Decreto-Lei n.° 93/90 de 19 de Março (Regime jurídico da Reserva Ecológica Nacional (Artigos 1.º, 2°, ANEXO 1 n° 2 e) e ANEXO III n°1), na Portaria n.° 1068/93 de 25 de Outubro e no Plano Director Municipal de Marco de Canaveses (prova documental a fls 57 a 60 e 575 a 585) ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 34/94 (Artigo 43.°, 44.° n°1 e 3, 45° n°1, 3, 50°, 51° n°1 b), 52° nº 1), integra área da Reserva Ecológica Nacional do Município; atendendo a que estas normas são normas cujo conhecimento para além de ser uma obrigação do Julgador, é um facto de que o Tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções, uma das quais é precisamente aplicar as normas; a resposta ao Quesito 28° deve ser alterada para “Provado com o esclarecimento de que o local onde ocorreu o acidente se situa em área de Reserva Ecológica Nacional.” 8./ Tomando por base a fundamentação e resposta ao Quesito 11°, o documento de fls 565 a 567 “Guia de Perícias Médico Legais” do Prof. Carlos Lopes, o relatório de autópsia documento de fls 35 a 46, regras de experiência comum, bem como a prova por PRESUNÇÃO JUDICIAL a resposta ao Quesito 50° deve ser alterada para “Provado” 9./Provada que ficou a matéria do Quesito 20° “- A praia em questão é de livre acesso ao público”-, bem com a matéria do Quesito 20°A- “À data do acidente habitualmente juntavam-se e banhavam-se na praia do Alvelo ou Meregeiro um número considerável de banhistas, com o esclarecimento que tal ocorria ao fim de semana”- provado está, face ao disposto, quer na Directiva 76/160/CEE do Conselho, de 8 de Dezembro de 1975 quer no Decreto-Lei n. 236/98 de 1 de Agosto, que no local do acidente o banho não estava interdito e era praticado por um número considerável de banhistas, e nessa medida tratando-se de uma água balnear era uma praia.

Por outro lado, atendendo à fundamentação e respostas aos Quesitos 1°, 2°, 2°A, 4°, 6°, 7° e 26° da BI, - que o local onde ocorreu o acidente é uma praia - e que a primeira vez que alguma praia de águas interiores foi classificada foi através da Portaria n° 1055/2006 de 25 de Setembro, a resposta ao Quesito 58° deve ser alterada para “Provado que o local onde ocorreu o acidente é uma praia que nunca foi classificada pela Portaria n° 1055/2006 de 25 de Setembro, nem após ela.” 10./ Atendendo à PROVA DOCUMENTAL de fls 645 a 720 e 846 e ss e a que só o Decreto Regulamentar n° 3/2002 de 4 de Fevereiro veio nos termos do Decreto-Lei n° 502/71, de 18 de Novembro, a classificar a albufeira do Torrão como Albufeira protegida (art.1) e a que até hoje não foi aprovado nenhum Plano de Ordenamento da Albufeira do Torrão e que por isso à data do acidente-2000- a barragem do Torrão não contemplava nem deixava de contemplar qualquer utilização secundária a resposta ao Quesito 64° deve ser alterada para “Não Provado”.

DE DIREITO 11./ Apesar de na fundamentação da sentença o MM° Juiz “a quo” reconhecer o direito dos AA/Recorrentes aos danos materiais, na parte dispositiva da sentença termina por não impor qualquer obrigação (condenação) nem por dizer qual dos RR, após a liquidação dos danos terá que pagar a respectiva quantia...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT