Acórdão nº 0415/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 30 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução30 de Março de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1. A……………, interpôs recurso para este Pleno, do acórdão deste STA, de 27.10.2016, que julgou totalmente improcedente a ação administrativa interposta por A………….., B………….., C…………., D……….. e E………., contra o MJ, o CSMP, de impugnação de actos administrativos, cumulando com o pedido de reconhecimento de direito e de condenação ao pagamento de quantias (art. 37º nº1, alíneas a), f) e h) do CPTA, com o fundamento de que os A. tinham sido remunerados pelo trabalho prestado de acordo com o EMP, não tendo sido preteridos quaisquer princípios ou normativos.

Conclui as suas alegações da seguinte forma: “I. É entendimento explanado no Acórdão recorrido que «(...) de acordo com a lei, a mudança de escalão decorre automaticamente do decurso do tempo”.

  1. O Recorrente não pode concordar com o supra referido entendimento.

  2. Ao contrário do que se defende no Acórdão recorrido, não se pode, no caso sub judice, atender única e exclusivamente ao sentido literal da lei, sob pena de não se atender à racio que o legislador empregou à norma.

  3. Os magistrados do Ministério Público em regime de estágio, embora exerçam as funções inerentes à respectiva magistratura, sob responsabilidade própria, e gozem do respectivo regime de direitos, deveres e incompatibilidades, fazem-no com a assistência de formadores (cfr. n.° 1 do artigo 71.° da Lei n.° 2/2008, de 14 de Janeiro ex vi artigo 8.° da Lei n.° 95/2009, de 2 de Setembro).

  4. Terminada a fase de estágio, os magistrados do Ministério Público são colocados, como vimos, em regime de efectividade; na falta de vagas, e até à sua ocorrência, são colocados como auxiliares (artigo 72.° da Lei n.° 2/2008, de 14 de Janeiro ex vi artigo 8.° da Lei n.° 95/2009, de 2 de Setembro).

  5. É a partir desta nomeação que o magistrado fica investido, em definitivo, na plenitude dos direitos e deveres inerentes ao estatuto do magistrado do Ministério Público, pois, até aí, era um magistrado em formação, que gozava do respectivo estatuto apenas a título provisório durante um período probatório.

  6. Desempenhando funções qualitativamente muito diferentes das de um magistrado do Ministério Público em regime de efectividade.

  7. Tais factos evidenciam que, em rigor, aquando do estágio, ainda não foi iniciada a carreira do magistrado.

  8. Não desempenhando, em suma, o Procurador-Adjunto em regime de estágio as funções de um Procurador-Adjunto em regime de efectividade.

  9. Ao contrário do que defende o acórdão recorrido, que erra manifestamente, não pode, pois, a passagem de regime de estágio para a situação de Procurador-Adjunto em regime de efectividade, de forma alguma, traduzir uma progressão automática na carreira de Procurador-Adjunto, ocorrida, ope legis, ao fim de três anos de exercício de funções.

  10. Com efeito, a passagem da categoria de Procurador-Adjunto estagiário para a de Procurador-Adjunto em efectividade de funções está, sem restar qualquer dúvida, associada a uma verdadeira modificação da qualidade das funções exercidas, consubstanciando uma definitiva investidura nos direitos, garantias e deveres próprios dessa categoria, XII. A passagem do índice 100 para o índice 135 significa que o legislador, ao estabelecer a escala indiciária constante do mapa anexo ao artigo 96.° do EMP, quis precisamente distinguir claramente a situação do magistrado do Ministério Público em formação, primeiro como auditor e depois como Procurador-Adjunto em regime de estágio, da situação do Procurador-Adjunto que termina o estágio e é nomeado em regime de efectividade.

  11. A mudança de escalão remuneratório configura uma verdadeira mudança de categoria, em virtude da alteração do conteúdo funcional da mesma.

  12. A mudança de regime de estágio para regime de efectividade consubstancia um verdadeiro acréscimo de responsabilidades e evidente diferença qualitativa e quantitativa de funções.

  13. Devendo os segmentos normativos ser interpretados neste caso de modo a garantirem a todos os magistrados do Ministério Público, logo que sejam nomeados como Procuradores-Adjuntos em regime de efectividade, a passagem para o índice 135.

  14. O Acórdão recorrido não só violou o princípio constitucional do direito de retribuição do trabalho, explanado no artigo 59.° da CRP, como também violou o princípio da igualdade.

  15. Uma interpretação do artigo 96.° do EMP e respectivo mapa indiciário anexo, no sentido de que um Procurador-Adjunto advindo de um curso especial, em exercício efectivo de funções, deve ser remunerado pelo mesmo índice que um Procurador- Adjunto em regime de estágio, apenas por não ter ainda três anos de exercício de funções, consubstancia uma discriminação negativa daquela, a nível remuneratório, discriminação essa proibida pelo artigo 1° do Protocolo 12 anexo à Convenção Europeia dos Direitos do Homem e pelo artigo 14° da Convenção em combinação com o artigo 1° do Protocolo 1 (sendo o salário à semelhança da pensão de reforma um direito patrimonial, a diferença de tratamento é injustificável - veja-se a argumentação do Ac. CEDH Fábián c. Hongrie - 78117/13).

  16. Pois que, um tratamento desigual do que é essencialmente idêntico, desprovido de qualquer justificação racional, plausível ou aceitável traduz-se numa violação do princípio da igualdade, na vertente material, e do princípio “trabalho igual, salário igual”, ambos constitucionalmente consagrados nos artigos 13.° e alínea a), n.° 1 do artigo 59.° da Constituição da República Portuguesa (adiante “CRP”).

  17. Considerando-se, pois, inadmissíveis, quer diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios objectivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais.

  18. No caso sub judice, ao ter-se continuado a remunerar o Recorrente, após a sua nomeação como Procurador-Adjunto em regime de efectividade, e até Junho de 2012, como se fosse estagiário, quando se lhes exigia já diferente qualidade e quantidade de trabalho, bem como diferente responsabilidade, resulta precisamente violado o princípio da igualdade nesta vertente material, porquanto se dá tratamento igual àquilo que é manifestamente diferente, sem qualquer fundamento para tal diferenciação.

  19. Acresce que também quanto ao princípio constitucional da tutela da confiança, andou mal o acórdão recorrido, ao considerar que o Recorrente estava em condições de prever que os actos impugnados poderiam vir a ser praticados.

  20. Ora, o princípio da confiança postula uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança no direito das pessoas e nas expectativas que lhes são juridicamente criadas.

  21. Ou seja, em Junho de 2012, quando o Recorrido Ministro da Justiça decidiu abonar o Recorrente, aplicando o índice remuneratório 135, sem que tivesse sido ainda emitido o alegado “parecer”, era impreterivelmente exigível, à luz dos preceitos constitucionais acima aludidos, que se densificasse o critério pelo qual se procedeu à alteração remuneratória para o índice 135 da escala indiciária constante do anexo 1 do EMP.

  22. Dito de outra forma, se o Ministério da Justiça, mesmo na ausência do alegado “parecer”, considerou que o Recorrente tinham direito à remuneração de acordo com o índice 135 da escala indiciária constante do anexo I do EMP, tinha, ao abrigo do seu dever de fundamentação, a obrigação de referir a norma legal habilitadora que lhe permitia abonar tal remuneração e qual o critério pelo qual a remuneração tinha sido alterada para o índice 135, o que não fez.

  23. Refira-se, outrossim, que o princípio da legalidade, desiderato fundamentalíssimo do “agir” administrativo impõe que, mesmo nos actos de mera execução material, seja necessário a explicitação do critério legal utilizado pela Administração, evitando-se deste modo, arbitrariedades e “idiossincrasias” da própria Administração.

  24. Para além da ausência de critério explícito na alteração remuneratória ocorrida em Junho de 2012 (Índice 130 para índice 135), conforme supra referido, em violação do princípio da confiança, passados quatro anos, o Recorrido veio determinar a reposição dos vencimentos auferidos pelo Recorrente, o que deve ser considerado, no mínimo, ilegítimo.

  25. Ora, mesmo que se considere que o Recorrente, à data de Junho de 2012, não teriam direito ao vencimento de acordo com o índice 135, o que se admite sem conceder, vir quatro anos mais tarde determinar a reposição de tais vencimentos é excessivamente oneroso das expectativas legitimamente fundadas do Recorrente, conforme jurisprudência unânime (Acórdãos do Tribunal Constitucional números 287/90, 303/90, 625/98, 634/98, 185/2009, disponíveis em www.tribunalconstitucionaLpt), violando, em consequência, o direito fundamental à retribuição do Recorrente e os princípios constitucionais da confiança e proporcionalidade.

  26. Razões pelas quais deve revogar-se o Acórdão recorrido e, em consequência, anularem-se os actos administrativos praticados e reconhecer-se ao Recorrente o direito a ser remunerado pelo índice 135 logo que tomou posse como Procurador-Adjunto em regime de efectividade relevando o período do curso de formação teórico-prática ministrado pelo CEJ, para contagem de tempo de serviço para efeitos remuneratórios.

    O direito a ser remunerado pelo índice 135 logo que tomou posse como Procurador-Adjunto em regime de efectividade relevando o período do curso de formação teórico-prática ministrado pelo CEJ, para contagem de tempo de serviço para efeitos remuneratórios.

    [repetido por lapso] XXIX. E como consequência deste reconhecimento, devem os Réus ser condenados também ao pagamento das diferenças remuneratórias entre o índice 100 e o índice 135 não pagas desde a data da nomeação do Recorrente em regime de efectividade e Junho de 2012, acrescido dos respectivos juros legais vencidos e vincendos até efectivo e...

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