Acórdão nº 01113/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Março de 2017
Magistrado Responsável | ARAG |
Data da Resolução | 29 de Março de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), vem, nos termos do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) ex vi do art. 25.º n.º 2 do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), interpor recurso para este Supremo Tribunal da decisão arbitral proferida em 3 de Setembro de 2014 no processo n.º 70/2014-T CAAD, por alegada contradição com o decidido no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 15 de Janeiro de 2013, proferido no recurso n.º 01949/07, transitado em julgado.
A recorrente termina a sua alegação de recurso formulando as seguintes conclusões: 1ª Vem o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência, interposto, nos termos do artigo 25.° do RJAT e do artigo 152.° do CPTA, da decisão arbitral proferida no processo n.° 70/2014-T CAAD, que correu termos no Tribunal Arbitral constituído no âmbito do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), na parte que julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto ao segmento decisório referente à correção promovida pela AT em sede de IVA quanto aos bens de utilização exclusiva na parte relativa à dedução de IVA suportado em «serviços relacionados com assessoria fiscal, consultoria jurídica e consultoria estratégica relativa à detenção, aquisição e alienação de participações sociais na qualidade de acionista, oportunidades de investimento e desinvestimento, desenvolvimento do negócio da sociedade e outros relacionados»; 2ª Com efeito, a decisão arbitral recorrida colide com o Acórdão, já transitado em julgado, do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), prolatado no processo n.° 01949/07 em 15-01-2013 (Acórdão Fundamento), encontrando-se irremediavelmente inquinado do ponto de vista jurídico, por errada interpretação dos artigos 2.°, 9.°, 167.° e 174º da Diretiva n.° 2006/112/CE (artigos correspondentes aos artigos 2º, 4º, 17.º e 19.º da Diretiva n.° 77/388/CEE, designada habitualmente por “6ª Diretiva”) e dos artigos 1.º, 20º, 22.º e 23.º do Código do IVA; 3ª Estando em ambos os acórdãos subjacente idêntica situação de facto, porquanto em ambas as decisões se está perante exercício do direito à dedução dos inputs suportados a montante por uma Sociedade Gestora de Participações Sociais (SGPS), que exerce a atividade de gestão de participações sociais, bem como a prestação de serviços técnicos de administração e gestão de participações (permitido nos termos do disposto no artigo 1.º e 4.º do Decreto-lei n.° 495/88, de 30 de dezembro) (cf. acórdão do STA de 2010-12-07 (processo n.° 0511/06); 4ª Verificando-se, in casu, uma patente e inarredável contradição quanto à mesma questão fundamental de direito: saber se, no caso de uma Sociedade Gestora de Participações Sociais (SGPS), que exerce a atividade de gestão de participações sociais, bem como a prestação de serviços técnicos de administração e gestão de participações, o direito à dedução do imposto suportado, nos termos dos artigos 2º, 9º, 167.º e 174.º da Diretiva n.° 2006/112/CE (artigos correspondentes aos artigos 2°, 4°, 17.° e 19.° da Diretiva n.° 77/388/CEE, designada habitualmente por “6.ª Diretiva”) e dos artigos 1.º, 20.º, 22.º e 23.º do Código do IVA, depende da demonstração objectiva da ligação existente entre as aquisições de bens e serviços (inputs) e os serviços prestados no âmbito de uma efetiva atividade sujeita e não isenta (acórdão fundamento), ou, se basta ao legal exercício do direito à dedução serem tais inputs considerados custos gerais (como pugnado na decisão recorrida).
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Com feito, o Acórdão Fundamento sufragou a interpretação de que para se extrair a conclusão de que o IVA suportado no caso de uma SGPS exerce a atividade de gestão de participações sociais, bem como a prestação de serviços técnicos de administração e gestão de participações, o direito à dedução do imposto suportado que «torna-se necessário que se estabeleça, sem margem para dúvidas, um nexo directo, causal, imediato, entre as operações a montante (o fornecimento das prestações de serviços por terceiros) - inputs - e os seus efeitos a jusante (na esfera jurídica das sociedade participadas) - outputs. Isto é, tem de ser inequívoco que tais serviços foram utilizados apenas no imediato e único interesse das participadas, servindo apenas a B……….. SGPS como veículo para a concretização desse resultado.
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Sobre esta questão pronuncia-se o Tribunal Arbitral em sentido totalmente oposto, ao concluir que «O critério para aferir da dedutibilidade que resulta desta jurisprudência não é o de se tratar ou não de custos que uma holding pura teria ou não suportado, mas sim, neste caso, o de esses custos serem ou não custos gerais da Requerente, pois, segundo aquela jurisprudência, os custos gerais, por o serem, são elementos constitutivos do preço dos serviços prestados.»; 7ª Demonstrada está uma evidente contradição entra a decisão recorrida e o Acórdão Fundamento (cf conclusões supra), quanto à interpretação e aplicação, isto é, uma manifesta contradição sobre a mesma questão fundamental de direito que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e, consequentemente, anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo Acórdão que, definitivamente, decida a questão controvertida (n.° 6 do artigo 152.° do CPTA); 8ª E, nesse pressuposto e considerando a decisão judicial supra no segmento decisório indicado, encontra-se justificado o recurso à presente via processual para uniformização de Jurisprudência, com a consequente anulação da decisão arbitral recorrida nesse segmento e a sua substituição por outra que mantenha a correção promovida pela AT sindicada nos autos (cf. alínea i.3) do ponto 2 das alegações e 1ª conclusão supra), considerando que o direito à dedução do imposto suportado depende da demonstração objectiva da ligação existente entre as aquisições de bens e serviços (inputs) e os serviços prestados no âmbito de uma efetiva atividade sujeita e não isenta, pelo que na falta de demonstração objectiva de tal nexo direto e imediato pela ora Recorrida, não basta ao legal exercício do direito à dedução serem tais inputs considerados custos gerais (como pugnado na decisão recorrida); 9ª O Tribunal Arbitral a quo incorreu em erro de julgamento ao não considerar que o direito à dedução do IVA suportado depende de uma demonstração objetiva do nexo direto e imediato entre as aquisições de bens e serviços (inputs) e os serviços prestados no âmbito de uma efetiva atividade sujeita e não isenta; 10ª Tal como retira da conjugação do artigo 2°, 2.° §, da 1ª Directiva IVA, do artigo 17.° da 6ª Sexta Diretiva IVA e do artigo 168° da Directiva IVA, impõe-se a existência de um nexo de causalidade entre os bens e serviços (inputs) e o output tributado, para que o IVA seja suscetível de ser dedutível; 11ª Com efeito, o IVA suportado numa operação a montante só poderá ser dedutível na medida em que possa estar relacionada com uma operação a jusante efetivamente tributada, sendo que a relação em causa deverá ser aferida em função do reporte e inclusão do custo suportado no preço da operação tributada; 12ª Assim mesmo o entendeu o TJUE em acórdão proferido a 1995-04-06 no âmbito do processo C-4/94 (“caso BLP”), ao referir que os bens ou serviços a montante devem apresentar uma relação directa e imediata com uma ou diversas operações sujeitas a imposto a jusante, sendo que o direito à dedução do IVA pressupõe que as despesas em causa devam constituir parte integrante dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas; 13ª Tal relação direta e imediata impõe a realização de uma análise casuística por parte dos órgãos jurisdicionais nacionais (cfr. acórdão do TJUE de 2000-06-08 no âmbito do processo n.° C-98/98 – “Caso Midland Bank”); 14ª Aliás, nos casos em que o sujeito passivo efetua operações tributáveis e/ou isentas e beneficia de bens ou serviços que podem ser utilizados tanto em operações sujeitas a IVA como para operações isentas daquele imposto (como no caso sub judice), a relação direta e imediata assume importância fundamental quando se pretende proceder à dedução do IVA; 15ª Não bastava, portanto, à Recorrida afirmar que se tratavam de despesas gerais da sua atividade antes se impondo que houvesse cumprido o ónus probatório que sobre ela impendia (artigo 74° da LGT); 16ª Contudo, e tal como decorre da factualidade provada nos autos, o referido nexo direto, causal e imediato dos inputs tributados não foi comprovado pela Recorrente quer em sede inspetiva, quer em sede graciosa quer ainda em sede arbitral; 17ª Pelo que de modo algum poderia o Tribunal Arbitral a quo ter emitido decisão nos termos em que o fez relativamente a esta correção.
Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados, revogada parcialmente a decisão arbitral recorrida e substituída por outro Acórdão consentâneo com o quadro jurídico vigente.
Contra-alegou a recorrida tendo concluído: DA AUSÊNCIA DE VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DESTE RECURSO POR ALEGADA OPOSIÇÃO DE DECISÃO ARBITRAL COM ACÓRDÃO DO TCAS i) Este recurso é motivado por divergência da AT com o julgamento em matéria de facto
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Basta ler o modo como a AT termina as suas alegações (parágrafos 57. a 59.), e as conclusões que se lhe seguem (conclusões 15.° a 17.°), para se perceber de imediato, julga-se, que a motivação deste recurso para o STA reside na discordância da AT com o julgamento em matéria de facto.
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Ora, quer o recurso por oposição de julgados previsto no artigo 25.°, n.°s 2 e 3, do RJAT, quer em geral os recursos para o STA, não podem ter por pretensão a revisão do julgamento em matéria de facto, donde não dever ser admitido, julga-se, logo por este primeiro motivo, o recurso interposto pela AT aqui em causa.
ii) Situações...
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