Acórdão nº 0106/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução11 de Janeiro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1. O MINISTÉRIO DA JUSTIÇA [MJ] interpõe «recurso de revista» do acórdão pelo qual o Tribunal Central Administrativo Norte [TCAN] negou provimento ao recurso de apelação, para ele interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [TAF do Porto] que o condenou a ele e ao MINISTÉRIO DAS FINANÇAS [MF], a posicionar a autora, A…………, «no índice 135, com efeitos reportados à data da sua nomeação como procuradora-adjunta - 16.07.2004 - e a pagar-lhe a diferença salarial devida desde essa data até 15.09.2006, entre o montante correspondente ao índice 100 e o índice 135, no total de 24.722,67€, acrescido de 2.727,99€ de juros já vencidos, e nos juros vincendos, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento».

    Culmina as suas alegações com as conclusões seguintes: 1. Como previsto no artigo 142º, nº4, do CPTA, «O recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo só é admissível nos casos e termos previstos no capítulo seguinte»; 2. Tais requisitos constam do nº1 do artigo 150º, sendo o recurso admitido apenas quando: - esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental; - a admissão seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito; 3. Nos presentes autos encontram-se preenchidos tais pressupostos para que a revista seja admitida, quer na sua vertente substantiva quer na adjectiva, designadamente a relevância jurídica da questão objecto do recurso e, por violação evidente de lei substantiva e processual, a necessidade de melhor aplicação do direito; 4. Pese embora possa parecer que a decisão em recurso limita os seus efeitos ao caso concreto da recorrida e à sua esfera pessoal, tal assim não acontece, pois, respeitando a um concurso e a uma carreira profissional - a dos magistrados - acaba por ter reflexos muito para além do caso individual da recorrida, seja no concurso em causa, seja em todos os que o antecederam ou subsequentes, presentes ou futuros; 5. Daqui decorrendo a possibilidade da controvérsia suscitada nos presentes autos se replicar a casos futuros similares, o que acontece já, aliás, conforme se dará conta ao longo destas alegações, sendo vários os processos em curso com o mesmo objecto, uns ainda em primeira instância, outros nos Tribunais Centrais, e outros já neste Supremo Tribunal; 6. Mais, sobre a matéria em litígio, assistimos já a jurisprudência em sentidos diversos: o TCAS decidiu em sentido contrário ao do TCAN nestes autos; 7. Em caso em tudo idêntico ao do presente recurso, foi já admitida revista, por este tribunal, por despacho de 12.03.2015 [processo nº199/15, da 1ª Secção]; 8. Tal decisão vem assim fundamentada: «Está em discussão no presente recurso uma questão jurídica respeitante ao sistema retributivo dos magistrados judiciais. Trata-se de litígio sobre uma situação estatutária susceptível de repetir-se em termos essencialmente semelhantes sempre que a nomeação como juiz de direito ocorra antes de o interessado perfazer o módulo de três anos de tempo de serviço»; 9. E, «a prevalecer o entendimento da Associação recorrente, parece prejudicar uma outra questão, de que os autos dão notícia sobre a qual têm recaído interpretações divergentes. Por outro lado, vem invocado o tratamento diferenciado de uma situação alegadamente igual relativa a juízes da jurisdição administrativa e fiscal, o que é matéria comunitariamente sensível»; 10. Concluindo-se que «a questão transcende os interesses dos associados da recorrente cujo reposicionamento nos escalões remuneratórios se pretende ver corrigido, assumindo repercussão social que justifica a admissão do recurso»; 11. Sendo admitido, como se espera, ao presente recurso tem de ser dado provimento; 12. A pretensão da autora, do reconhecimento do direito a auferir o vencimento pelo índice 135 desde que tomou posse como procuradora-adjunta em efectividade de funções, não pode proceder; 13. A interpretação defendida pela recorrida não tem o mínimo de correspondência na lei, subvertendo-a por completo, pois que passa por cima do factor tempo de serviço, ignorando-o, fazendo corresponder à passagem do índice 100 para o 135 a passagem do exercício de funções em regime de estágio para o exercício efectivo de funções; 14. Neste contexto torna-se impossível aceitar o decidido no acórdão em recurso, segundo o qual «mostra-se adequado e justo que a mudança de estatuto verificada correspondesse igualmente a uma alteração remuneratória, em paralelo e conformidade com a escala indiciária dos magistrados»; 15. Se há mudança de estatuto, que o tribunal não precisa em que consiste, e que não se aceita, o certo é que não é dela que a lei faz depender a passagem ao nível remuneratório seguinte, mas sim do tempo na categoria anterior, e não se vê como pode com tanta singeleza um tribunal afrontar a letra da lei; 16. Ao abrigo da Lei nº2/2008, de 14.01, Lei de Ingresso nas Magistraturas [LIM], a formação inicial dos magistrados para os tribunais judiciais e para os administrativos e fiscais compreende um curso teórico-prático, organizado em dois ciclos sucessivos, e um estágio de ingresso [artigo 30º, nº1]; 17. Para os candidatos da via profissional - como acontece com a recorrida - o 1º ciclo de formação tem uma duração de 10 meses, enquanto o 2º ciclo dura 6 meses, sendo que o estágio tem uma duração de 12 meses pelo que completam a fase teórico-prática e o estágio em 28 meses; 18. Por outro lado, para os candidatos da via académica, a formação teórico-prática, os dois ciclos de formação, têm uma duração total de 20 meses [10 cada], seguindo-se uma fase de 18 meses referente ao estágio; 19. A estrutura da remuneração base a abonar mensalmente aos magistrados judiciais é a que consta da escala indiciária constante dos mapas anexos aos referidos estatutos, conforme dispõe o artigo 22º e 23º do Estatuto dos Magistrados Judiciais [EMJ] a qual evolui, na categoria de procurador, de acordo com os seguintes índices: ingresso - 100; com 3 anos de serviço – 135; 20. Ora, de acordo com as diferentes durações de formação e estágio antes referidas, os candidatos admitidos pela via académica, perfazem, entre a fase teórico-prática e o estágio, um total de 38 meses, isto é, podem atingir os três anos e não ser nomeados definitivamente; ao invés, os candidatos pela via profissional, que completam a fase teórico-prática e o estágio em 28 meses, podem ser nomeados definitivamente antes de completarem os três anos de serviço efectivo; 21. Ou seja, está demonstrada a falta de relação pretendida pela recorrida e sufragada pelo tribunal entre «índice 100-formação» e «índice 135-nomeação definitiva»; tal decorre inequivocamente de não existir uma exacta coincidência entre o tempo de formação em recrutamento normal e os 3 anos previstos na lei para progressão ao 2º índice, como acima se demonstrou; 22. Por outro lado, não resulta da lei que o índice 135 tenha uma relação intrínseca com o exercício de funções efectivas como magistrado através da sua nomeação, mas apenas com o tempo de serviço prestado - módulo de tempo no escalão imediatamente inferior - como magistrado, incluindo em regime de estágio; 23. E o mapa anexo a que se refere o artigo 23º do EMJ não diferencia as funções exercidas no nível de ingresso, não estabelecendo qualquer distinção consoante se esteja em formação ou em efectividade de funções; 24.

    À semelhança das diuturnidades, também a progressão assenta na presunção de que a antiguidade permite maior eficácia no desempenho de funções, pelo que constitui mais um prémio pela permanência na categoria do que pelo mérito evidenciado, sem prejuízo de situações de comprovado demérito serem impeditivas de mudança de escalão

    [Paulo Veiga e Moura, Função Pública, 1º volume, Coimbra Editora, 1999, página 419]; 25. Para a decisão dos presentes autos é irrelevante saber-se se a passagem do índice 100 ao índice 135 constitui uma progressão, como sempre se tem entendido, ou uma promoção; 26. A existência de qualquer avaliação no fim do estágio em nada contende com a exigência de tempo de permanência em determinado escalão e a avaliação no fim do período de estágio não é uma avaliação de desempenho, no sentido estrito. Como claramente resulta do artigo 71º da LIM, o que existe é uma avaliação sobre a preparação para o exercício de funções e não uma avaliação de desempenho; 27. E inexiste igualmente suporte legal para a equiparação entre «ingresso/formação», pois o ingresso é apenas sinónimo de entrada na carreira, sem qualquer relação com as funções a exercer ou com a fase de formação; 28. O normal é que o início da carreira tenha uma fase de formação, mas tal ligação é meramente natural, daí não decorrendo que, terminada a fase especificamente qualificada de formação seja necessária e automática a promoção do funcionário; 29. A posição ora seguida foi sufragada no Parecer do Conselho Consultivo da PGR, nº16/2012, votado na sessão de 28.06, homologado por despacho da Sr.ª Ministra da Justiça de 06.09, e publicado no DR, 2ª série, nº227, de 13.11.2012, onde se concluiu que: «3ª- Não decorre da Lei nº9/2011, de 12.04, que os magistrados que sejam nomeados, findo o estágio, como efectivos ou auxiliares, tenham o direito de transitar imediatamente, por força de tal nomeação, para o índice 135 da respectiva escala remuneratória; 4ª- Sendo nomeados como magistrados efectivos ou auxiliares após o estágio, a mudança para o índice 135 só ocorrerá quando perfizerem três anos de serviço, neste se incluindo o período do estágio»; 30. E a não progressão imediata ao índice 135 não viola qualquer princípio constitucionalmente consagrado, designadamente o da igualdade; 31. O recrutamento dos juízes para os tribunais administrativos e fiscais ali em causa verificou-se em circunstâncias especiais, decorrentes de uma reforma do contencioso administrativo e fiscal que alterou profundamente o sistema então vigente; 32. Ao referido concurso apenas podiam concorrer...

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