Acórdão nº 01190/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução12 de Julho de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A…………, com os demais sinais dos autos, interpõe recurso de revista excepcional do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 14/07/2016, a fls. 471 e segs. dos autos, que revogou a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgara improcedente o pedido de intimação para prestação de informações e passagem de certidão, e que, em substituição, intimou o Exmº Senhor Diretor Geral da Administração Tributária e Aduaneira a emitir certidão e informação «nos termos e com as restrições assinaladas, se for caso disso.

».

1.1. Rematou a alegação de recurso com as seguintes conclusões: 1) O presente recurso deverá ter efeito meramente devolutivo, nos termos do art. 143.º nº 3 do CPTA, por ser a única forma de a recorrida AT cumprir, desde já, a decisão condenatória, pelo menos, nos enfoques e termos em que esta foi proferida, sob pena de, caso contrário, quando as informações viessem a ser prestadas pela Administração se revelarem já totalmente inúteis, por serem extemporâneas, nomeadamente por já ter sido decidido o processo de impugnação da decisão de fixação da matéria colectável (proc. nº 173/15.8BEAVR, que corre termos no TAF de Aveiro) e a requerente já não poder fazer uso das mesmas, consubstanciando, pois e assim, uma situação de facto consumado ou, pelo menos, originando a produção de prejuízos de muito difícil ou mesmo impossível reparação para a recorrente (mormente pela produção de titânicas liquidações de impostos, com todas as consequências, mormente a nível coercivo e com impacto brutal na sobrevivência e nível de vida da requerente).

2) Há cerca de um ano e meio que a recorrente tenta, debalde, que a AT preste informações (o pedido de informação e certidão data de 04/03/2015) que se revelam absolutamente decisivas para assegurar o exercício pleno da garantia da tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.

3) O Aresto recorrido apenas de forma aparente é favorável aos interesses da recorrente, dado que, por um lado, considera improcedente (ou nem conhece) grande parte do recurso e, por outro lado, encerra um entendimento de tal modo restritivo e minimalista do processo de intimação judicial e do direito fundamental à informação, que, salvo o devido respeito, viola a principologia e os direitos fundamentais (mormente direito fundamental à informação e a garantia fundamental de tutela jurisdicional efectiva e em tempo útil; a própria legalidade e transparência da actuação da Administração, que constituem, actualmente e cada vez mais, valores essenciais do Estado de direito democrático dos cidadãos, que devem ser controlados pelos Tribunais) e a jurisprudência firmada deste Supremo Tribunal.

4) Verificam-se, com evidência, os requisitos previstos no art. 15o.º do CPTA para a admissão da revista, uma vez que as concretas questões trazidas a este STA estão, desde logo, relacionadas com o próprio âmbito e objecto do processo de intimação judicial regulado fundamentalmente nos arts. 104.º e ss. do CPTA (nomeadamente se é o meio próprio nos casos em que a administração preste informações incompletas ou mesmo falsas) e também com garantias inarredáveis dos cidadãos, como sejam, o acesso ao direito (e em tempo útil) e o direito fundamental à informação e os correspondentes e estruturantes deveres de legalidade e de transparência da Administração recorrida (cfr. Art. 266.º da CRP) — com assento constitucional, entre mais, nos arts. 2.º, 18.º, 20.º e 268.°, n.º 1, 2 e 4 da CRP e que são corolários do estruturante princípio do Estado de direito democrático dos cidadãos.

5) As questões trazidas a juízo revestem-se de fundamental importância social, mormente considerando os interesses públicos fundamentais e de primeira necessidade subjacentes à legalidade e transparência da actuação da máquina fiscal, que se relaciona e se impõe a todos os cidadãos e entidades que são contribuintes, e que, aliás, envolvem, as mais das vezes, muito avultadas quantias pecuniárias (como também sucede no presente caso, tendo, portanto, as decisões grande impacto comunitário e sendo de considerável grandeza — aliás, é publicamente reconhecido o temor generalizado que perpassa pela sociedade portuguesa em relação à actuação da Administração fiscal, que muitas das vezes coloca em causa o direito fundamental de propriedade privada dos cidadãos (cfr. art. 62.° da CRP).

6) Ou seja, estamos perante matérias que são por si mesmas de interesse geral, assumindo assim relevância social fundamental numa sociedade democrática, e perante um alargadíssimo leque de interessados, revelando-se, pois, fundamental ter acesso a todas as informações que levam a Administração (nomeadamente a Fiscal), a agir, por forma a poder controlar cabalmente a sua actuação através dos Tribunais (e, por sua vez, é fundamental que os cidadãos disponham de um meio judicial eficaz, de jurisdição plena e urgente, como o presente processo de intimação que não pode ser objecto de interpretações minimalistas e redutoras).

7) Estas questões são, também e sobretudo, de fundamental relevância jurídica, na medida em que está em causa a interpretação de normas capitais e basilares do regime dessas intimações judiciais e está em causa a própria concepção e âmbito das mesmas. As questões são igualmente de complexidade jurídica bastante e são relativas a verdadeiros baluartes das fundamentais garantias dos cidadãos (mormente a interpretação devida do disposto nos arts. 104.º e ss. do CPTA, conjugada com os direitos fundamentais previstos nos arts. 18.º, 20.º, 268.º, n.º 1, 2 e 4 da CRP, bem como conjugada com o próprio direito fundamental de propriedade privada — cfr. art. 62.º da CRP), e na medida em que convoca o juiz à determinação do modo e conteúdo de dever de prestação de informação à luz do princípio da proporcionalidade (cfr. arts. 18.º e 266.º da CRP e Lei n.º 46/2007 — LADA), como forma de evitar o boicote ao cumprimento do direito à informação.

8) Acresce, decisivamente, que a admissão da presente revista se revela ainda claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, uma vez que a decisão do acórdão recorrido é, entre o mais, ostensiva e manifestamente errada, juridicamente insustentável e, aliás, contrária ao entendimento doutrinal e à jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal (cfr. acórdãos que citaremos infra), mormente na interpretação redutora e minimalista que leva a efeito do processo de intimação, revelando-se, pois, imprescindível a intervenção correctiva deste Tribunal, por forma a evitar situações de resolução desigualitária dos litígios e por forma a contribuir para a segurança, previsibilidade e eficácia na aplicação do direito.

9) Por outro lado, as questões de interpretação destas normas (entre o mais, arts. 104.º e ss. do CPTA e arts. 18.º, 20.º e 268.º, n.º 1, 2 e 4 da CRP) têm a virtualidade de repetição em termos essencialmente semelhantes perante pretensões análogas — note-se, por exemplo, que qualquer administração pode prestar informações incompletas ou falsas — capacidade de expansão da presente situação.

10) Relativamente ao segmento da alínea a) do pedido da recorrente (concretos factos que deram origem à inspecção) e se se percebe a actuação levada a efeito pela AT, o despacho de credenciação nº DI201400144 foi o que legitimou a acção inspectiva interna à requerente e no âmbito do qual viria a ser instaurado formalmente um procedimento inspectivo externo (ordem de serviço OI201402670), que durou 2 minutos — cfr. entre o mais, o doc. 1 junto com as alegações de recurso, de 15/04/2016, para o TCAN, a fls. … dos autos.

11) A recorrente requereu (cfr. pedido a fls. … dos autos) não apenas os factos e a origem da ordem de serviço externa (com a ordem de serviço OI201402670), mas sobretudo do procedimento inspectivo interno (DI201400144), que constitui a verdadeira acção inspectiva, o que foi manifestamente incumprido pela AT – tanto mais que o procedimento externo foi apenas uma aparência ou formalidade, aberto e encerrado em 2 minutos, e em que nenhum acto externo existiu, nada foi recolhido ou decidido, pelo que ao contrário do que, em boicote, efectuou a AT, as informações relevantes sobre os factos que deram origem à instauração da acção inspectiva se encontram sobretudo no âmbito do DI201400144.

12) Pelo que falta informar os concretos factos que desencadearam a verdadeira acção inspectiva a coberto do DI201400144 — e que a AT já referiu ter sido uma denúncia, mas, ao que parece e segundo a mesma, terá sido uma participação da UIF da Polícia Judiciária e que não está a coberto do segredo previsto nos arts. 67.º e 70.º da LGT, como já decidiu o Aresto de 29/10/2015 do TCA-N (cfr. autos a fls.).

13) Deste modo, o Aresto recorrido ao decidir que a intimação foi cumprida (quanto aos concretos factos que deram origem) padece, salvo o devido respeito, de ostensivo erro de julgamento, violando não apenas a autoridade de caso julgado do anterior Acórdão do TCAN, de 29/10/2015 (cfr. art. 619.º CPC), como também ofende as mais elementares garantias da particular nesta matéria, nomeadamente e entre o mais, o disposto nos arts. 104.º e ss. do CPTA, o princípio da proporcionalidade (art. 2.º e 18.º da CRP), o direito fundamental à informação (cfr. arts. 18.º e 268.º, n.º 1 e 2 da CRP), o princípio da liberdade de informação (cfr. art. 37.º, n.ºs 1 e 2 e 48.º, n.º 2 da CRP), a garantia fundamental de acesso ao direito e de tutela jurisdicional efectiva para defesa dos mais elementares direitos e interesses legalmente protegidos da recorrente (cfr. art. 20.º e 268.º, n.º 4 e 5 da CRP) e do próprio direito de propriedade da recorrente (art. 62.º CRP), que são garantias fundamentais de qualquer Estado de direito democrático de cidadãos...

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