Acórdão nº 01056/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução09 de Novembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

A…………, SA (A…………), devidamente identificada nos autos, recorre para este Supremo Tribunal do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), de 08.05.14 (fls. 318-331), que acordou negar provimento ao recurso apresentado pela A., “com fundamentação diferente da da decisão recorrida”.

A presente acção foi proposta inicialmente no TAC de Lisboa pela A…………, ora recorrente, contra o Município de Lisboa (ML), tendo aquele proferido decisão pela qual julgou parcialmente procedente a acção administrativa comum intentada pela Autora, e, em consequência, condenou “o Réu a pagar à Autora a quantia de € 67 745, 35, absolvendo-o dos restantes pedidos de que a Autora não desistiu” (cfr. fl. 199).

Por requerimento de fl. 405, entrado neste Supremo Tribunal em momento ulterior ao da apresentação das contra-alegações, veio a ora recorrente “informar que o Réu, Município de Lisboa, já efectuou o pagamento da quantia a que tinha sido condenado por sentença de 2 de Setembro de 2013, respeitante a juros sobre as facturas entretanto pagas na pendência da presente acção, no valor de € 67.745, 35. Assim, nada mais o Réu deve à Autora a este título, prescindindo a Autora de juris de mora sobre o valor agora pago”.

  1. A recorrente A………… apresentou alegações, concluindo do seguinte modo (fls. 345 e ss): “A - O presente recurso tem por objecto o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul datado de 8 de Maio de 2014, que negou provimento ao recurso, com fundamentação diferente da decisão proferida pelo TAC de Lisboa, que havia julgado parcialmente procedente a acção, não condenando o Recorrido no pagamento da indemnização peticionada, no montante de € 3.206.598,47, com fundamento na rescisão do contrato de "Empreitada 01/COPRAD/2000 - Urbanização do ……… - Fase II", e consequentes juros.

    B - A Recorrente não se conforma com a decisão recorrida porque o Tribunal cometeu erro de julgamento de Direito, violando, quanto ao alcance e aplicação, o disposto no n.º 2 do artigo 234º do Decreto-Lei 59/99 de 2 de Março, negando o pedido de indemnização da Recorrente.

    C - Após a celebração do contrato de empreitada em apreço e durante a execução do mesmo, a Recorrente rescindiu-o ao abrigo do disposto no artigo 154.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março.

    D - O Município de Lisboa nunca pôs em causa a legitimidade ou o fundamento para a rescisão operada por parte da A…………, nem o direito desta a ser ressarcida.

    E - A rescisão do contrato consubstanciou o legítimo exercício de um direito que assistia à Recorrente, que, para efeitos de indemnização, preferiu/optou aplicar o disposto no artigo 234.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, cumprindo escrupulosamente o disposto no mesmo.

    F - Com efeito, a Recorrente, ao recorrer a tal mecanismo, prescindiu de realizar a liquidação das perdas e danos sofridos, optando por receber uma única indemnização correspondente a 10% da diferença entre o valor dos trabalhos executados (projectos elaborados, neste caso) e o valor dos trabalhos adjudicados, incluindo a revisão de preços correspondente.

    G - Quer dizer, a Recorrente, não querendo aguardar por tal liquidação, optou pela alternativa objectiva e mais célere que a lei lhe conferia, não tendo para o efeito, como resulta claro da letra da lei, que provar ou demonstrar quaisquer danos ou prejuízos em que tenha incorrido.

    H - O mecanismo previsto no artigo 234.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, é, conforme consta do mesmo, um mecanismo alternativo, de aplicação automática, sem que seja necessário reunir condições ou pressupostos específicos para a sua aplicação. Nem qualquer apuramento real ou liquidação têm que ser efectuados.

    I - A sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de Direito ao considerar, que o empreiteiro não executou qualquer trabalho, quando havia sido dado como provado, por admissão expressa Réu/Recorrido, que o empreiteiro elaborou e entregou ao Município de Lisboa, todos os projectos que contratualmente lhe competia conceber.

    J - A empreitada em questão tratava-se de uma concepção/construção.

    K - A A………… realizou todos os trabalhos de concepção – todos os projectos – que lhe competia fazer.

    L - Ora, como atrás se demonstrou, esta via interpretativa seguida pelo Tribunal revela-se manifestamente errada e viola o disposto no n.º 2 do artigo 234º do D.L. 59/99, de 2 de Março.

    M - Também, a via interpretativa distinta seguida pelo Tribunal de 1ª instância, não tem apoio em qualquer dos elementos hermenêuticos disponíveis ao intérprete, priva o preceito de qualquer efeito útil, assenta numa confusão entre institutos jurídicos e contraria frontalmente tudo o que a Doutrina e a jurisprudência já laboraram sobre o assunto.

    N - A via interpretativa seguida pelo Tribunal de 1ª instância olvidou o sentido real (e claríssimo) do artigo 234.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, que é o de estabelecer uma opção por uma presunção legal inilidível (iuris et de iure) que elimine a incerteza jurídica da determinação e prova dos danos emergentes e dos lucros cessantes decorrentes da rescisão contratual gerada por facto imputável ao dono da obra, num contexto legal em que é reconhecido ao empreiteiro o direito a uma indemnização pelo interesse contratual positivo, abrangendo danos emergentes e lucros cessantes, isto é, e no limite, o direito ao preço convencionado deduzido das poupanças resultantes da não execução do contrato.

    O - "O artigo 234.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março a) Trata-se de uma cláusula legal de fixação antecipada do montante da indemnização devida ao empreiteiro em caso de o contrato ser rescindido com os fundamentos e nas circunstâncias previstos no n.º 1 do mesmo preceito; b) Trata-se de uma cláusula legal de fixação antecipada do montante da indemnização relativa a danos emergentes e lucros cessantes e pelo interesse contratual positivo, visando assim colocar o empreiteiro na situação económica em que estaria se o contrato tivesse sido integralmente cumprido; e...

    1. Trata-se de uma cláusula legal de fixação antecipada do montante da indemnização que, a ser ativada pelo empreiteiro no exercício da opção que lhe é conferida pelo preceito em causa, dispensa a invocação, prova ou quantificação de quaisquer prejuízos efetivos, sejam danos emergentes, sejam lucros cessantes".

    P- A ratio legis deste verdadeiro mecanismo sancionatório visa permitir ao empreiteiro reclamar uma indemnização de forma mais célere e sem necessidade de alegar e demonstrar danos emergentes e lucros cessantes.

    Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deverá o presente recurso ser julgado procedente, devendo ser considerado procedente o erro de Direito alegado e, em consequência a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue totalmente procedente a presente acção administrativa comum”.

  2. O recorrido Município de Lisboa (ML) apresentou alegações, concluindo, no essencial, do seguinte modo (fls. 374 e ss): “1 - O recurso de revista a que alude n.º 1, do artigo 150.º do CPTA, consubstancia-se na consagração de um duplo grau de recurso jurisdicional, em casos excepcionais, tendo por objectivo facilitar a intervenção do STA naquelas situações em que a questão a apreciar assim o imponha, devido à sua relevância jurídica ou social e quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

    2 - O mesmo é de natureza excepcional, não correspondendo à introdução...

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