Acórdão nº 01526/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução14 de Setembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A…………., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedentes os embargos de terceiro que deduziu contra o acto de penhora das fracções autónomas designadas pelas letras “.......” e “.........” do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, sito na freguesia de ………….., registado na Conservatória do Registo Predial sob o nº 01149/210498, levada a efeito no âmbito da execução fiscal nº 3204200040142963 e apensos, instaurada no Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia-2 contra a sociedade B…………, Lda.

1.1. Terminou a sua alegação enunciando as seguintes conclusões: 1. A sentença recorrida fundamentou a sua decisão de improcedência dos embargos de terceiro na conclusão de que “não se pode, pois, concluir, (...) estarmos perante situação de posse merecedora da tutela judicial solicitada. Não podendo proceder os embargos deduzidos contra os atos de penhora das identificadas frações”.

  1. Do estatuído no art. 237º, nº 1, do CPTT resulta que a procedência dos embargos depende de o direito do embargante ser incompatível com a realização ou o âmbito da diligência e de ele dever prevalecer sobre o direito do exequente.

  2. Apesar do entendimento jurisprudencial, espelhado na sentença recorrida, de que o promitente-comprador, após obter a traditio da coisa, apenas frui, em regra de um gozo, autorizado pelo promitente-vendedor, sendo portanto, um mero detentor precário, praticando apenas meros atos materiais dessa posse, tal regra não exclui que os promitentes-compradores tenham o direito de embargar a penhora efetuada na execução - neste sentido os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 10.04.2002, 10.02.2010 e ainda o de 27.10.2010, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

  3. Na verdade, podemos claramente inferir que a posse conferida pela traditio da coisa para o promitente-comprador será, em regra, meramente precária, havendo no entanto casos em que se possa concluir ter atuado de forma correspondente ao exercício do direito de propriedade e, dessa forma, configurada uma verdadeira situação possessória, como acontece no caso sub judice.

  4. Na verdade, a aqui embargante preenche todos os requisitos supra enunciados uma vez que pagou integralmente o preço das ditas frações no momento da celebração do contrato prometido com a correspondente entrega das chaves, o que lhe permitiu a sua imediata ocupação, tendo assim assumido a posse das frações prometidas vender desde então de forma continua e reiterada, à vista e com o conhecimento de toda a gente e sem qualquer oposição.

  5. Tendo, aliás, procedido ao pagamento de todas as despesas de condomínio relativas àquelas frações e até publicitado junto de terceiros a sua intenção de arrendar as referidas fracções, comportando-se e sendo reconhecida por todos como dona e possuidora daquelas frações.

  6. Assim sendo, é inquestionável que a posse assim adquirida é ofendida pela penhora embargada, que é com ela incompatível, pelo que deviam os embargos ter procedido e aquela sido levantada.

  7. O Tribunal a quo entendeu ainda que “o direito de retenção não é ofendido por penhora em processo executivo, sendo, pelo contrário, o caminho para a reclamação do crédito respetivo no desenvolvimento desse processo, a graduar oportunamente em vista do respetivo pagamento”.

  8. O direito de retenção destina-se a garantir o crédito resultante do incumprimento pelo promitente-vendedor e, sendo o contrato-promessa um contrato de prestação de facto, o crédito resultante do incumprimento que se visa garantir com o direito de retenção abrange, em primeira linha, o cumprimento em espécie, ou seja, a celebração do contrato definitivo.

  9. Pelo que, a Embargante goza de direito de retenção dos imóveis em apreço, podendo, também por isso, deduzir os presentes embargos de terceiro.

  10. Aliás, o Tribunal da Relação do Porto, na esteira da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, defende que «hoje em dia, estes embargos deixaram de ser um meio processual possessório, que não se destina somente a defender a posse dos embargantes, ofendidos por qualquer acto ordenado judicialmente, pois que se destinam também a defender qualquer direito deles incompatível com a realização de diligência ordenada judicialmente. Assim, o retentor legal da fração pode usar os meios possessórios em relação à coisa retida e traditada, quando se está perante um caso em que ela pode exigir o cumprimento contratual em espécie. Hoje pois a posse não é já exclusiva pedra toque para aferir da viabilidade dos embargos de terceiro» — cfr. Ac TRPorto de 26/10/2006 e Ac STJ de 20/01/1999.

  11. O Supremo Tribunal de Justiça esclarece ainda que mesmo sendo admissível e defensável que o retentor não possa impedir a penhora e venda da coisa retida, devendo entrar na graduação de créditos que sobre ele se faça, quando está em jogo tão só um crédito monetário e/ou indemnizatório já não é admissível que o retentor não possa reter a coisa (com todas as consequências) quando ela se destina a garantir uma prestação de facto que tem por objecto (ainda que mediato) a própria coisa.

  12. Em suma, a Embargante goza de tutela possessória merecedora da tutela judicial solicitada sobre o imóvel penhorado, não só porque dele é possuidora, mas também porque é titular do direito de retenção sobre ele enquanto garantia do seu direito à execução específica, razão pela qual pode embargar de terceiro.

    Nestes termos, deve o presente recurso interposto pela requerente ser julgado procedente, por provado, e consequentemente, ser revogada a decisão proferida pelo Tribunal a quo, assim se fazendo JUSTIÇA! 1.2.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    1.3.

    O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto junto do STA emitiu douto parecer no sentido de que devia ser...

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