Acórdão nº 0314/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Maio de 2016
Magistrado Responsável | MARIA BENEDITA URBANO |
Data da Resolução | 19 de Maio de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.
A………, SA (A……..
), devidamente identificada nos autos, intentou, no TAF de Lisboa, contra o Estado português, acção administrativa comum pedindo a condenação deste no pagamento de uma indemnização de € 80.373,05, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até efectivo pagamento, às taxas legais. A referida quantia, peticionada a título de responsabilidade civil extracontratual do Estado, corresponde ao montante despendido pela A. com o pagamento de honorários ao seu mandatário judicial.
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O TAC de Lisboa, por decisão de 11.10.07 (cfr. fls. 433 e ss), julgou a acção improcedente por não verificação cumulativa dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual.
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Inconformada, a A. interpôs recurso para o TCAS, tendo este tribunal concedido provimento ao recurso, revogando a decisão sindicada e condenando o R. Estado português a pagar a quantia total de € 5.107,84, acrescida de juros de mora desde a data da citação. Na sua decisão, o TCAS considerou que “a Recorrente tem direito ao pagamento dos honorários do Dr. B…….., mas só até ao limite máximo do que for fixado para as acções que patrocinou face à tabela de honorários para apoio judiciário que estivesse em vigor à data da apresentação da respectiva conta. Ou seja, a Recorrente tem direito ao pagamento de honorários pelo valor de 5.107,84 €, conforme acima se explicitou” (cfr. fl. 872).
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A A. recorreu para este Supremo Tribunal do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), de 22.11.12, invocando para o efeito o n.º 1 do artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
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No recurso interposto do acórdão do TCAS, a recorrente formulou várias conclusões, tendo sido convidada a reduzir e especificar as mesmas. Em resposta ao convite do então Relator, apresentou, posteriormente, as seguintes conclusões (cfr. fls 965 e ss): “ “1º Está em causa uma questão “cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito” revestindo a sua solução, em termos claros, de um “interesse de particular relevância social”, nos termos do artº 721-A do CPC.
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Para tanto contribui, especialmente, a evolução legislativa verificada em termos da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas do direito público (cfr., a Lei 67/2007 de 31 de Dezembro).
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A questão sub judice pode ser assim enunciada: «Decidindo-se que o Estado Português, como dano indemnizável, deve suportar as despesas e os honorários advocatícios despendidos por sociedade em anterior procedimento judicial indemnizatório por factos ilícitos por Ele (Estado) praticados, então: • Pode tal valor equivaler àquele que foi fixado pelo advogado mandatário e respectivo cliente? • Desde que tal valor esteja de acordo com os critérios previstos no E. O. A. e com laudo favorável da Ordem dos Advogados? • Existindo, portanto, um nexo de causalidade adequado entre tal valor / dano e os factos ilícitos que o provocaram? 4º Ou, pelo contrário, como decidido pelo douto acórdão recorrido: • A obrigação da reparação do lesante não poderá ir para além do valor que está legalmente estipulado como o adequado e necessário para um patrocínio oficioso de tal procedimento? • Identificando-se tal valor com o que a lei (que regulamenta o apoio judiciário) determina para pagamento do patrono nomeado ou escolhido? • Concluindo-se que apenas dentro destes montantes e parâmetros se verifica a existência do nexo de causalidade adequada relativamente aos prejuízos sofridos? • Do que, nos termos dos artºs 15º a 17º da Lei 387-B/87 de 29/12 e da Lei 30-E/2000 de 20/12, resultaria, por aplicação dos valores indicados na Portaria 150/2002 de 19/2, o valor máximo de honorários de 5.107,84€? 5º O digno tribunal recorrido procedeu a um não admissível salto lógico ao identificar os valores da tabela de honorários de advogado oficioso com os limites legais à responsabilidade do agente pelos danos adequadamente causado pelo facto ilícito.
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Considerar tal limite (o da tabela de honorários do advogado oficioso) como limite legal à responsabilidade do agente, é fazer uma interpretação dessa tabela (e respectiva teleologia) com um alcance demasiado extenso e pouco fundamentado.
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Constitui uma ficção considerar que o serviço prestado por um advogado oficioso o será em condições equivalentes às de um advogado não oficioso.
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Pois que, em termos práticos, as condições em que é exercido o mandato não são as mesmas.
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Os laços de confiança e as relações pessoais que se estabelecem entre mandante e mandatário forense não são de igual vigor na presença de uma relação oficiosa e de uma outra a que falte tal característica.
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Não se pode confundir o valor de honorários a que a uma e outra realidade se pode / deve atribuir.
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Diferem desde logo a relação com cliente, o conhecimento do processo e o tempo disponível para o tratamento que um caso desta complexidade exige, v. g. com as características constantes da matéria dada como provada, entre as quais, a urgência com que o mandato começou a ser exercido, o curtíssimo período – já com a audiência de julgamento iniciada – concedido para “entrar” dentro do processo, realizar o seu estudo (com centenas de documentos juntos e a juntar), delinear a respectiva estratégia processual, as inúmeras deslocações, o tempo total despendido, o adiantamento de verbas, a grande complexidade do assunto, a tenaz e constante oposição do Estado Português ao pretendido, o êxito alcançado, a utilidade económica da intervenção e, ainda, o facto de que tudo quanto foi conseguido (em termos processuais e de pedido) ter sido apenas alcançado nas instâncias superiores...
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Factores que por diferentes exigem diferente remuneração.
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Constitui uma verdadeira ficção defender que os mesmos resultados poderiam ter sido conseguidos através de advogado pago de acordo com a tabela de patrocínio oficioso.
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Pois que com este patrocínio, aqueles resultados seriam impossíveis.
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Tal posição não é intelectualmente séria, nem fundamentada, nem justa, nem está de acordo com a realidade...
Por outro lado, 16º O facto de o critério de fixação de honorários ser acordado entre advogado / cliente não significa que os mesmos não sejam adequados ao serviço prestado.
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Parte, na verdade, o douto acórdão recorrido do errado pressuposto de que o facto de serem fixados pelas partes comporta o “risco” (entenda-se, “certeza”) de serem arbitrários e exagerados.
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E, sendo arbitrários (na tese do douto acórdão recorrido) serão (forçosamente, presume) excessivos.
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Pelo contrário, o que cabe ao tribunal é averiguar em concreto da adequação do valor e da sua justeza ao serviço prestado e resultados obtidos.
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Ora, o laudo da Ordem dos Advogados junto ao processo comprova a adequação dos valores a partir do momento em que são verdadeiros os serviços alegados (o que não cabia apurar à Ordem, como foi ressalvado, mas se encontra dado como provado pelo Digno Tribunal).
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Note-se, até, que o advogado está sempre limitado pela sua consciência deontológica quando fixa os honorários finais dum processo, sabendo que exagerando no montante pedido (pedido que, no caso, a contraparte até aceitou e reconheceu) está sujeito a um tal pedido de laudo no futuro.
Finalmente, 22º Cumpre acautelar o princípio geral do processo civil segundo o qual a indemnização deve abranger os danos efectivamente sofridos, dos quais a quantia atribuída pelo tribunal recorrido é apenas parte irrisória.
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Decorre do exposto que não aceitar que entre os danos indemnizáveis se inclua o montante de honorários pagos a advogado, ou seja, de uma despesa suportada pelo lesado e originada pelo evento donde emerge a obrigação de reparar, seria negar o direito à justa indemnização por danos ou prejuízos – exactamente o que fez o douto acórdão recorrido.
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Ao ver-se obrigado a recorrer à justiça para fazer valer o seu direito lesado pelo Estado Português, para tanto suportando necessariamente despesas com o patrocínio de advogado não oficioso, a ora recorrente será fortemente penalizada por não se ver ressarcida da totalidade dos danos patrimoniais que efectivamente suportou com tal pagamento de honorários, ou seja, 69.873,04 euros acrescidos de IVA à taxa legal em vigor, mas apenas indemnizada numa ínfima parte, no valor de cerca de 5.000 euros.
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Desse modo, suportará a lesada, e não o lesante, o valor de 64.873,04 euros, numa violação clara do artº 22º da CRP que garante a responsabilidade por factos ilícitos da administração pública que causem prejuízo a outrem.
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Face ao antes exposto, nos termos e com os fundamentos acima expostos, o tribunal deveria, ao contrário do decidido, ter julgado a acção completamente provada e procedente, condenando o Estado Português na totalidade do pedido.
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Não o tendo feito, violou o douto acórdão recorrido, por erro de interpretação, os citados preceitos, diplomas e princípios legais, designadamente, os artºs 15º a 17º da Lei 387-B/87 de 29/12, a Lei 30- E/2000 de 20/12, a Portaria 150/2002 de 19/2, o artº 22 da C. R. P., 28º Que, conjugadamente, deveriam ser interpretados no sentido de se responder afirmativamente às questões enunciadas na anterior conclusão 3ª, e negativamente às questões enunciadas na anterior conclusão 4ª.
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Ou seja, no sentido de que, destas normas, não deriva que o legislador tenha entendido que os valores que são os fixados nas tabelas de honorários para apoio judiciário são também os montantes que considera justos e adequados ao pagamento aos vários patrocínios jurídicos, quaisquer que sejam os âmbitos e circunstâncias em que os mesmos se verifiquem.
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Deve o douto acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que julgue no sentido antes defendido, assim se fazendo Justiça”.
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O recorrido Estado Português, representado pelo Ministério Público, contra-alegou, concluindo do seguinte...
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