Acórdão nº 01362/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução28 de Janeiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1.

“B…………….”, organização não governamental de ambiente [«ONGA»] sediada no Funchal e melhor identificada nos autos, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal [doravante TAF/F], contra a “CÂMARA MUNICIPAL DE SANTA CRUZ” [«CMSC»], “VEREADOR DA CÂMARA MUNICIPAL SANTA CRUZ COM PELOURO DAS OBRAS PARTICULARES” e C……………..

, este último na qualidade de recorrido particular e, entretanto, substituído na sequência de habilitação de adquirente por “A……………, SA” [cfr. decisão de fls. 39/41 do apenso A], o presente recurso contencioso de anulação no quadro de ação popular administrativa prevista no art. 12.º da Lei n.º 83/95, pedindo, pela motivação aduzida no articulado inicial, a declaração de nulidade das deliberações daquela edilidade, datadas de 22.09.1982, de 05.09.1984, de 20.03.1985, de 17.12.1986 e de 09.10.2000 e, bem assim, dos atos praticados pelo referido Vereador, ao abrigo de subdelegação de competências [seus despachos de 21.02.2000, de 08.10.2000 e de 16.10.2000], respeitantes ao licenciamento das operações de loteamento e de licenciamento de obras particulares promovidas pelo recorrido particular no prédio rústico sito em ……….. (……….), freguesia de ………., concelho de Santa Cruz.

1.2.

No prosseguimento dos autos veio a ser proferido, em 18.02.2004, despacho saneador [cfr. fls. 385 e segs.

] no qual se julgaram improcedentes as exceções de ilegitimidade processual ativa, de intempestividade/caducidade do direito, de irrecorribilidade [quanto às deliberações impugnadas] e de ilegal cumulação de pedidos e de coligação de recorridos.

1.3.

Inconformados com tal decisão as entidades recorridas «CMSC» e Vereador da «CMSC» interpuseram recurso jurisdicional [cfr. fls. 425 e 460 e segs. e fls. 1088/1089 na sequência de convite inserto no despacho do Relator de fls. 1083 v.

], apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz: “...

  1. Essencial à legitimidade da ora recorrida seria o facto de as normas ditas violadas pelos atos impugnados visarem a proteção do ambiente, o que não acontece, pois, os interesses ou valores que tutelam não têm esse objetivo e incidência.

  2. Ao considerar a «B…………..» como dispondo de legitimidade ativa o despacho agravado violou o art. 53.º, n.º 2, da CRP, o art. 10.º da Lei n.º 35/98 e os arts. 1.º, 2.º e 12.º da Lei n.º 83/95, de 31 de julho.

  3. O recurso de impugnação dos atos em questão é intempestivo, porquanto, os poucos vícios que importariam «nulidade» não ocorrem e os demais, importam mera anulabilidade, pelo que, de há muito, haviam precludido os prazos de impugnação.

  4. As certidões dos atos em causa, não suspendem os prazos de impugnação e, por isso, ocorre, em todos os casos, intempestividade.

  5. Dada a revogação das deliberações de 22.09.82 e 05.09.84, apenas subsistiu a deliberação de 20.03.85, e só esta é sindicável.

  6. O despacho recorrido lavrou em erro, quando considera que as deliberações de 22.09.82 e de 05.09.84, eram suscetíveis de impugnação.

  7. O despacho do Vereador recorrido, de 08.10.2000 é meramente confirmativo do despacho de 21.02.2000 e, como tal, não é impugnável.

  8. Por sua vez, o despacho do Vereador, de 16.10.2000, é um mero ato de execução de decisão anterior o despacho de 21.02.2000, não sendo, também, impugnável.

  9. Por outro lado, verifica-se que, com a impugnação das deliberações camarárias e a dos atos individuais do Vereador, têm distintas causas de pedir, pelo que ocorre uma cumulação ilegal de pedidos, ao contrário do decidido no despacho recorrido, que violou o disposto no art. 38.º da LPTA...

    ”.

    1.4.

    Devidamente notificada a aqui ora recorrida «B……………» após apresentação, na sequência de despacho do Relator, das conclusões das alegações que haviam sido omitidas, a mesma não veio, entretanto, produzir quaisquer contra-alegações [cfr. fls. 496 e segs. e fls. 1087 e segs.

    ].

    1.5.

    No decurso dos ulteriores termos veio a ser proferido, em 27.02.2006, despacho a indeferir o requerimento para realização de uma 2.ª perícia [cfr. fls. 687], despacho esse que foi, igualmente, objeto de impugnação por parte das entidades recorridas «CMSC» e Vereador da «CMSC» [cfr. fls. 701 e 719 e segs. e fls. 1088/1089 na sequência de convite inserto no despacho do Relator de fls. 1083 v.

    ], apresentando como quadro conclusivo o seguinte: “...

  10. Na resposta ao quesito 6.º os peritos consideraram que não foram encontrados sinais que afetem a solidez e a estabilidade da arriba, não havendo risco de desmoronamento das construções.

  11. Já na resposta aos quesitos 7.º e 8.º admitem que, teórica e potencialmente, tal possa eventualmente acontecer.

  12. Nos esclarecimentos que prestaram a tal respeito os peritos dizem, por um lado, não haver dados suficientes para admitir tal probabilidade, e, ao mesmo tempo, referem que é «fortemente provável» que isso aconteça, sem adiantar, no entanto, qualquer previsão temporal para tanto.

  13. A insuficiência do esclarecimento, que não foi concludente por parte dos peritos, em matéria relevante, justificava, assim, uma 2.ª perícia, que o despacho recorrido recusou.

  14. O despacho recorrido que recusou a 2.ª perícia, não está fundamentado, e violou o disposto no art. 589.º do CPCivil ...

    ”.

    1.6.

    Notificada devidamente a aqui ora recorrida «B…………» após apresentação, na sequência de despacho do Relator, das conclusões das alegações que haviam sido omitidas, a mesma também não veio, entretanto, produzir quaisquer contra-alegações [cfr. fls. 741 e segs. e fls. 1087 e segs.

    ].

    1.7.

    Após instrução e julgamento naquele TAF/L veio a ser proferida sentença [cfr. fls. 917/945], datada de 25.05.2012, a julgar, por um lado, procedente a exceção de irrecorribilidade dos atos praticados pelo Vereador da «CMSC» de 08.10.2000 [por ser mero ato confirmativo do despacho de 21.02.2000] e de 16.10.2000 [por constituir mero ato de execução do despacho de 21.02.2000] e, por outro lado, também procedente o presente recurso contencioso de anulação, declarando-se “a nulidade de todos os atos impugnados e atrás identificados, com exceção dos de 8.10.2000 e de 16.10.2000 (estes por não serem impugnáveis)”, dada a verificação dos fundamentos de ilegalidade consubstanciados: i) na violação dos arts. 01.º, 03.º, 05.º, 08.º, 10.º, 17.º, 18.º, todos do DL n.º 468/71, dada a falta de reconhecimento estatal da propriedade privada ou concessão de uso privativo; ii) na falta de consulta prévia a entidades externas competentes como a Administração Central do Estado e da Direção Regional de Portos ou depois da Administração dos Portos da Madeira [DR 20/81/M e DLR 13/96/M] o que nos termos dos arts. 14.º, n.º 1, do DL n.º 289/73, 65.º, n.º 1, do DL n.º 400/84, 56.º, n.º 1, do DL n.º 448/91, 68.º, al. c) do RJUE é gerador de nulidade; iii) na ofensa aos arts. 18.º e 128.º, 1.ª parte do RGEU conducente à anulabilidade da “licença de construção e seus atos consequentes”; iv) na violação do art. 24.º, n.º 1, als. a) e c), do DL n.º 289/73 dada a caducidade da licença de 20.03.1985; v) na violação dos arts. 12.º do DL n.º 468/71, 48.º e 52.º, n.º 2, al. c), do DL n.º 445/91, por parte do despacho de 21.02.2000, dado não haver sido precedido das consultas e autorizações exigidas; vi) nas várias disparidades e divergências entre o alvará de loteamento e o pedido de licenciamento e o alvará de construção conducentes à nulidade dos atos recorridos nos termos do art. 52.º, n.º 2, al. b) in fine, do DL n.º 445/81; vii) sendo que as “cit. nulidades e anulabilidades dos atos relativos ao loteamento têm como consequência legal e lógica a nulidade da licença de construção (v. art. 133.º-2-i CPA)”. No mais foram julgados improcedentes os fundamentos invocados referentes a: i) violação dos arts. 66.º, n.ºs 1 e 2, al. b), da CRP, 121.º in fine do RGEU, 17.º e 18.º da Lei n.º 11/87; ii) a violação dos arts. 14.º e 40.º do DL n.º 448/91 quanto à caducidade da licença de loteamento de 09.10.2000; iii) a revogação das deliberações de 22.09.1982 e de 05.09.1984 pelas deliberações de 05.09.1984 e de 20.03.1985.

    1.8.

    A recorrida-particular «A…………, SA» e as entidades recorridas «CMSC» e Vereador da «CMSC», inconformadas, interpuserem, de per si, recursos jurisdicionais, formulando o quadro conclusivo que se reproduz: i) recorrida-particular «A……….

    , SA» [cfr. fls. 951 e segs.

    ] “...

    1. Como certamente decidirá o Venerando Supremo Tribunal Administrativo, assiste inteiramente razão aos Recorridos no que concerne às suas alegações de agravo de fls. 460 a 473 e 719 a 722 dos autos, devendo julgar-se procedentes as exceções de ilegitimidade ativa, de intempestividade, de irrecorribilidade e de ilegalidade da cumulação dos pedidos e da coligação, assim como, caso assim não se entenda, a pretensão dos Recorridos em verem realizada uma segunda perícia.

    2. A resposta à questão de saber qual a área afeta à extinta Direção Regional de Portos, e consequentemente se o terreno em causa nos autos se enquadra nessa área, resulta diretamente de disposições legais que definem a mesma, não podendo ser objeto de prova testemunhal.

    3. O Tribunal a quo fez mau julgamento da prova produzida em juízo, não se podendo manter a Sentença recorrida na parte em que dá como provado o facto 87. apenas com base na prova testemunhal produzida, a qual sempre se diga, nem tão pouco surge especificada.

    4. Nem se poderá manter a Sentença recorrida na parte em que dá como provado o facto 88. por não existir qualquer prova produzida nos autos que o sustente.

    5. Sendo uma das questões controvertidas dos presentes autos, não podia o Tribunal a quo deixar de cumprir o dever de fundamentar a sua conclusão de que «o terreno sobre o qual incidiram os atos administrativos aqui em causa se situa em domínio público marítimo», explicitando os factos, o Direito e os elementos de prova constantes dos autos com base nos quais formou a sua convicção. Não o tendo feito, é nula a Sentença recorrida nos termos do artigo 668.º, n.º...

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