Acórdão nº 0872/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Janeiro de 2016
Magistrado Responsável | ASCENS |
Data da Resolução | 13 de Janeiro de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – RELATÓRIO A……….. e B…………..
, deduziram impugnação judicial do acto de liquidação adicional de IRS, relativo ao ano de 2006, e respectivos juros compensatórios, pedindo a sua anulação, bem como o pagamento de juros indemnizatórios.
Por sentença de 27 de Fevereiro de 2013, o TAF de Loulé, julgou a impugnação judicial improcedente. Reagiram os ora recorrentes A………….. e B…………., interpondo o presente recurso, cujas alegações integram as seguintes conclusões: 1.
Ao decidir pela responsabilidade dos Recorrentes no pagamento do imposto incorreu o Tribunal a quo em errónea interpretação e aplicação do direito aos factos considerados provados.
-
A Sentença em crise violou, ainda, os artigos 44º nº 2, 76.º do CIRS, 44º nº 2 do CPPT e 62º do RCPIT.
-
Não tendo concluído pela falta de fundamentação, incorreu o Tribunal a quo em errónea interpretação do artigo 77º da LGT como, numa interpretação a inconstitucional do referido preceito por violador do artigo 268º nº 3 da Constituição da República Portuguesa.
-
Está em causa nos presentes autos a questão de saber se, no caso em apreço, a validade do acto de liquidação estava, ou não dependente da existência de um relatório (final) de inspecção.
-
Da factualidade assente e confrontando-a com o teor da Sentença, resulta o erro de julgamento, por um lado por ser a própria AT que remete o processo para uma equipa de inspecção da Direcção de Finanças de Faro; e, por outro lado, 6.
Não existem documentos de correcção se não houver um procedimento tributário subjacente e, em particular, uma acção de inspecção subjacente às mesmas; 7.
Assim como, inexiste liquidação adicional de imposto quando esta tem subjacente uma declaração do contribuinte nos termos previstos no art. 76º do CIRS [alínea a) do nº 1], nem a falta de apresentação da declaração [nº3], mas é efectuada nos termos do [nº 4], ou seja, de acordo com um procedimento de Inspecção.
-
E compreende-se que assim seja, pois, subjacente à actividade da AT encontra-se sempre a ocorrência de um procedimento tributário que obedece a regras claras e bem definidas.
-
O procedimento tributário é constituído pela sucessão de actos dirigidos a um determinado fim, e esses actos serão diferentes consoante o fim pretendido, como seja, por exemplo, a liquidação de tributos.
-
O afloramento que é feito, quer na LGT, quer no CPPT, sobre o conceito de procedimento tributário aponta este como compreendendo «toda a sucessão de actos dirigida à declaração de direitos tributários» (vide artigo 54º nº 1 da LGT e 44º nº 1 do CPPT).
-
O procedimento de inspecção, por sua vez, é um procedimento dentro do procedimento tributário.
-
Contudo, o procedimento de inspecção, constitui um procedimento autónomo e distinto com recolha de elementos probatórios para instruir e documentar um outro procedimento: o tributário que poderá conduzir a uma liquidação adicional (vide nº 2 do artigo 44º do CPPT); 13.
E, a liquidação em crise resultou de um processo de inspecção de natureza interna, como resulta da alínea e) do probatório.
-
Na verdade, e ao contrário do entendimento da Mm.ª Juiz a quo, o nº 2 do artigo 44º do Código do IRS não confere, por si só, à AT a possibilidade de emitir uma liquidação adicional sem existência de inspecção prévia.
-
No artigo 76º do Código de IRS, que regula as formas de liquidação deste imposto, não se prevê a emissão de uma liquidação oficiosa assente no n.º 2 do artigo 44º do Código do IRS.
-
De facto, a possibilidade de emissão de liquidação em sede de IRS sem recurso ao procedimento de inspecção tributária está, exclusivamente reservada aos casos em que o contribuinte não cumpre com a sua obrigação declarativa.
-
De acordo com a Doutrina e Jurisprudência entende-se que não prevendo a lei a possibilidade de efectuar, de forma oficiosa, uma correcção aos valores declarados pelos Recorrentes na Declaração Modelo 3 de IRS por si oportunamente submetida, dúvidas não restam que tal correcção apenas podia ser efectuada através de um procedimento de inspecção.
-
Contudo, quer seja externa, quer seja interna, a acção de inspecção obedece a um conjunto definido de regras, as quais se encontram previstas no RCPIT, entre as quais se encontra a obrigatoriedade de notificação do relatório (final) de inspecção nos termos do artigo 62º daquele diploma legal.
-
E, decorrido o prazo para o exercício do direito de audição pelo sujeito passivo deve ser elaborado o relatório final de inspecção que deverá ser notificado ao sujeito passivo por carta registada, sendo que é na data desta notificação que se considera concluído o procedimento de inspecção (artigo 62º nº 2 do RCPIT).
-
O relatório final inclui, de acordo com o trabalho desenvolvido no decurso da acção de inspecção, a identificação e sistematização dos factos detectados e procede à sua qualificação jurídica.
-
Ora, os Recorrentes não foram notificados do Relatório Final de inspecção pelo que há que daí tirar as devidas consequências e, nomeadamente a anulação das liquidações em apreço.
-
Face à prova produzida nos autos, o caso em apreço não configura uma situação de não notificação do relatório de inspecção, mas sim uma situação de verdadeira inexistência desse relatório.
-
E, face à inexistência de tal Relatório, não poderá o acto tributário em apreço considerar-se válido pois baseia-se num mero acto preparatório (projecto de relatório), inexistindo, pois, qualquer Relatório ou acto definitivo que fundamente os actos tributários.
-
Não existindo “in casu”, um acto definitivo que legitime a emissão dos actos tributários em apreço, os Recorrente não sabem quem determinou a emissão dos actos tributários “sub-judice” e se tinha competência para tal (i.e. se existiu, ou, não, usurpação de poderes).
-
Como vem decidindo este venerando tribunal superior, o processo de inspecção apenas se considera concluído com a notificação ao sujeito passivo do Relatório de Inspecção vide Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 30/11/2010 e proferido no âmbito do processo 0669/10 (Miranda de Pacheco).
-
A falta de notificação de relatório inquina as liquidações em causa e verificada a preterição de formalidade consistente na falta de notificação do relatório da inspecção sendo que tal preterição vicia o acto administrativo da liquidação daí resultante.
-
Por último, a Sentença recorrida incorreu, ainda, em violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva previsto no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.
V. DO PEDIDO Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, e sempre com o douto suprimento de V. Exa, deve ser dado provimento ao presente Recurso, revogar-se a Sentença recorrida, substituindo-se por outra que considere a Impugnação Judicial totalmente procedente por provada e anulando-se, em consequência, a liquidação adicional de IRS sub judice, Só assim se fazendo a costumada JUSTIÇA! Não houve contra-alegações.
O EMMP pronunciou-se emitindo o seguinte parecer: 1.
Os recursos são formas processuais específicas destinadas ao reexame de questões submetidas à apreciação dos tribunais inferiores e não à suscitação de questões novas, não apreciadas pelo tribunal recorrido No caso concreto, os recorrentes circunscrevem o objecto do recurso à questão da fundamentação (formal) do acto tributário, mas enunciam como questão decidenda a submeter à apreciação do STA a questão da legalidade do acto de liquidação com fundamento na ausência de precedência de relatório final de inspecção (texto das alegações, fls. 121).
Porém, o recurso não dirige nenhuma crítica específica à apreciação da sentença sobre a questão da fundamentação formal do acto tributário (cf.3.2-De Direito fls.99/101).
A nova questão decidenda enunciada não pode ser apreciada porque exterior ao perímetro de cognição do STA na qualidade de tribunal de recurso.
-
Sem prescindir O tribunal tributário sufragou o entendimento dos recorrentes sobre a inexistência de qualquer procedimento de inspecção subjacente à liquidação conectiva impugnada (fls. 100 último parágrafo).
A liquidação adicional efectuada resultou da consideração como valor de realização, enquanto componente das mais-valias sujeitas a tributação, do VPT do imóvel alienado (€ 914 460,00) e não do valor inferior constante do contrato de permuta.
A liquidação correctiva efectuada não depende da instauração de qualquer procedimento inspectivo, colhendo fundamento jurídico na aplicação conjugada do art.44° n°2 CIRS, art.12° n°1 CIMT e art. 38° n°3 CPPT (sendo inaplicável o regime constante do art.31°-A CIRS, por ausência de rendimentos empresariais e profissionais obtidos pelos sujeitos passivos).
CONCLUSÃO O recurso não merece provimento.
A sentença impugnada deve ser confirmada.
2 – FUNDAMENTAÇÃO O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte factualidade:
-
Em 06/01/2006, A…………, por si e na qualidade de procurador de sua mulher B…………, e C……….., na qualidade de sócio e gerente, em representação da sociedade comercial por quotas com a firma D……………, Lda., outorgaram escritura pública de permuta [documento de fls. 36 a 41 dos autos].
-
Na escritura pública referida em a), consta, designadamente, o seguinte: [documento de fls. 36 a 41 dos...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO