Acórdão nº 0131/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Janeiro de 2016
Magistrado Responsável | FONSECA DA PAZ |
Data da Resolução | 07 de Janeiro de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: RELATÓRIO A…………, intentou acção administrativa especial para impugnação da deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (doravante designado apenas por CSTAF), datada de 13 de Dezembro de 2012, que lhe aplicou a pena disciplinar de demissão, tendo, na petição inicial, pedido que: - Se declare a nulidade/anulação da deliberação recorrida por violação do princípio constitucional da imparcialidade (contido no artº 266.º, n.º 2 da CRP) OU - Se declare a nulidade/anulação da deliberação recorrida por vício de violação de lei, por infracção do disposto no art.º 43º do Código de Processo Penal (ex vi art. 112.º do EMJ) OU AINDA - Se declare nula ou se anule a deliberação recorrida (vício de violação de lei) por falta de censurabilidade da sua conduta E - Se reconheça a prescrição do direito de instaurar procedimento disciplinar contra o Recorrente relativamente aos factos constantes do Capítulo I do Relatório Final, declarando-se, em consequência, a nulidade/anulação da deliberação recorrida nesta parte, OU, SUBSIDIARIAMENTE, CASO ASSIM NÃO VENHA A SER ENTENDIDO - Se declare nula ou se anule a pena de demissão que lhe foi aplicada, substituindo-a por uma outra mais adequada à real gravidade do facto, à culpa do Recorrente, à sua personalidade e às circunstâncias que depõem a seu favor, nos termos dos artigos 96º e 97º do EMJ.
O CSTAF contestou, referindo que a deliberação impugnada não padece de nenhum dos vícios que lhe são assacados pelo Autor, devendo, por isso, a acção ser julgada improcedente.
Notificadas nos termos do art.º 91.º, n.º 4 do CPTA, ambas as partes vieram apresentar alegações.
O Autor concluiu a sua alegação do seguinte modo: “1.
A deliberação, de 13.12.2012, do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF), que aplicou ao Recorrente a pena de demissão prevista no art°. 107 do EMJ, padece dos seguintes vícios que a tornam ilegal, geradora de nulidade/anulabilidade: a) Violação do princípio constitucional da imparcialidade; b) Fundada desconfiança sobre a imparcialidade do Sr. Instrutor (Suspeição / Recusa); c) Novos fundamentos do pedido de conhecimento superveniente referentes aos vícios ante indicados nas alíneas a) e b); d) Prescrição parcial do procedimento; e) Falsidade dos fundamentos que motivaram a condenação do Recorrente (falsificação da estatística processual com vista à obtenção de benefícios ilegítimos resultantes dum aumento artificial da sua produtividade, prejudicando o Estado e as partes processuais); f) Violação do princípio constitucional da proporcionalidade; g) Violação do princípio constitucional da fundamentação dos actos administrativos.
Da violação do princípio constitucional da imparcialidade: 2.
O princípio da imparcialidade - consagrado no art°. 266°, n°. 2 da CRP e no art°. 6° do CPA - constitui um meio de protecção da confiança do público nos órgãos da Administração de forma a que seja salvaguardada a confiança nas autoridades que tomam decisões e, assim, impedindo-se que possa razoavelmente suspeitar-se da sua isenção ou da rectidão da sua conduta e impõe que os órgãos e agentes da administração ajam de forma isenta e equidistante relativamente aos interesses em jogo nas situações que devem decidir ou sobre as quais se pronunciem sem carácter decisório.
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O CSTAF, enquanto órgão da administração Pública em sentido objectivo (cujas deliberações constituem verdadeiros actos administrativos) e enquanto órgão independente (não sujeito a tutela), encontra-se vinculado ao princípio da imparcialidade como forma de garantir que a sua actuação seja isenta e equidistante face aos interesses em jogo.
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O CSTAF nomeou como instrutor do processo disciplinar n°. …. (e apenso n°. …..
) movido ao Recorrente e no qual foi tomada a deliberação ora impugnada, precisamente o Presidente cessante desse mesmo CSTAF.
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Enquanto Presidente do CSTAF, foi este Sr. Instrutor (do processo disciplinar n°. …… e do apenso n°. ……) que (naquela anterior qualidade de Presidente) ordenou a abertura do inquérito e do processo disciplinar n.º …… contra o Recorrente, nele votando favoravelmente as respectivas deliberações e proferindo diversos despachos interlocutórios (docs. n°s. 4, 5, 6 e 7 apresentados com a petição inicial), e votando também favoravelmente a deliberação que condenou e puniu o Recorrente (doc. n°. 8 apresentado com a petição inicial).
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Esta deliberação que condenou o Recorrente foi objecto do recurso contencioso n°. 622/11 que correu termos na 1ª Secção – 1.ª Subsecção do Supremo Tribunal Administrativo, sendo certo que foi o actual instrutor (na qualidade de então Presidente do CSTAF) que, por sua própria iniciativa, decidiu a intervenção do CSTAF no proc. n.º 622/11, designando a pessoa que entendeu dever representá-lo em juízo.
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Enquanto Presidente do CSTAF, o actual instrutor praticou actos que importaram aos autos disciplinares (n°s. ….. e …..
), tal como se depreende de fls. 96 (do processo disciplinar) e onde se lê que “5. Ao despacho e ofícios referidos em 1. eram juntos, como Documentos de Apoio (...) cópia de requerimentos das partes nos mesmos processos, de ofícios do Exm° Presidente do CSTAF (Juiz Conselheiro …………..) [ora instrutor] ao Exm° Presidente do TAF….
[ora Recorrente] (...)” 8. No exercício das suas funções de instrução no processo disciplinar a imparcialidade do instrutor está irremediavelmente afectada ‘ab initio’ porquanto não é possível nem expectável que as exerça duma forma isenta e equidistante relativamente aos interesses em jogo: a sua conduta não poderá ser objectivamente desinteressada, isenta, neutra e independente uma vez que o anterior exercício do cargo de Presidente do CSTAF e a anterior promoção de todos os sobreditos actos o impedem de reger-se unicamente por critérios lógico-racionais na instrução do processo disciplinar subsequente, 9.
Ele há-de necessariamente deixar influenciar-se (ainda que inconscientemente) por sentimentos estranhos ao circunstancialismo factual envolvente, qualquer que seja a sua origem, natureza ou relação com a questão controvertida.
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Acresce que todas as suas opiniões colhem natural favor e ganham especial relevo junto dos membros do órgão do qual ele foi Presidente até há pouco tempo atrás, circunstância que (praticamente) impedia que o Relatório Final que ele elaborou não tivesse sido (como foi) acolhido pelo CSTAF.
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A nomeação do anterior Presidente do CSTAF para proceder à instrução do processo disciplinar n°. ….. (e do apenso n°. ….
) projecta para o exterior precisamente a imagem inversa à objectividade, isenção e equidistância em relação aos interesses em presença que o princípio da imparcialidade impõe aos órgãos da administração (cf. a este propósito a doutrina constante do Ac. STA nº 0936/10, de 22.02.2011).
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A consequência natural da violação do princípio da imparcialidade é a nulidade/anulação de todos os actos de instrução praticados pelo Sr. Instrutor nomeado, que ora se requer seja declarada.
Da fundada desconfiança sobre a imparcialidade do Sr. Instrutor (Suspeição / Recusa): 13.
A seriedade e a gravidade do motivo gerador da desconfiança ou suspeição sobre a imparcialidade do juiz conduzirão à sua recusa quando objectivamente diagnosticados num caso concreto, isto é, quando forem geradoras de desconfiança em função de razões objectivamente valoradas à luz da experiência comum e conforme juízo de um cidadão médio.
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Perante todo o circunstancialismo nas conclusões n°s… (que se dão aqui por reproduzidas), em nome da transparência e com base nos parâmetros do bom senso e da experiência comum, o ‘cidadão médio’ suspeitará inevitavelmente que a actuação do Sr. Instrutor não tenha sido imparcial, gerando-se desconfiança sobre a sua imparcialidade.
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Em função do que a sua actuação terá de ser recusada por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade, com base na sua intervenção noutro processo e em todos os factos descritos nesta peça processual, devendo, em consequência, ser anulados/declarados nulos todos os actos de instrução por ele praticados no processo disciplinar n°. ….. (e no apenso n°. …..
).
Novos fundamentos do pedido de conhecimento superveniente referentes aos vícios ante indicados nas alíneas a) e b) Factos: 16.
O Sr. Instrutor foi eleito Presidente do STA (e do CSTAF, por inerência - art°. 75°, n°. 1, do ETAF) em 02.12.2009 (doc. n°. 1) para um mandato com a duração de cinco anos, sem lugar a reeleição (art°. 20, n°. 1 do ETAF) e ao qual é aplicável o limite de idade de 70 anos legalmente fixado para o exercício de funções públicas, que ocorreria em 24.10.2011 (doc. n°. 2).
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Era entendimento do Sr. Instrutor que o seu mandato de cinco anos deveria terminar efectivamente em 2014, e não antes (em Outubro de 2011), mesmo que ele perfizesse 70 anos em momento anterior, tendo inclusivamente chegado a efectuar algumas diligências para que a lei fosse mudada de forma a permitir manter-se no cargo para além dos 70 anos (docs. nºs 3 e 4).
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Não tendo logrado a referida alteração legislativa, em Outubro de 2011 o Sr. Instrutor renunciou ao cargo de Presidente do STA, mantendo-se, ainda assim, em funções até à tomada de posse do novo Presidente (doc. n°. 5), a qual viria a ocorrer em Novembro de 2011 (doc. n°. 6).
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Por despachos de 26.03.2012 e de 28.03.2012, o Presidente do STA e do CSTAF recém-eleito nomeou o Presidente cessante como instrutor do inquérito e do processo disciplinar que subjazem ao presente recurso (cf. fls. 273 e 275 do processo disciplinar n°. …..
), no âmbito dos quais o instrutor elaborou o seu Relatório Final em 09.11.2012 (cf. fls. 1416 e seguintes dos autos disciplinares) que foi totalmente acolhido na deliberação do CSTAF de 13.12.2013 20.
Três escassos meses depois (em 13.03.2013) o Sr. Instrutor voltou a integrar o CSTAF, por nomeação (política) da Assembleia da República (doc. n°. 7) alcançando desse modo o...
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