Acórdão nº 0910/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução13 de Outubro de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1.

MUNICÍPIO DO BARREIRO, devidamente identificado nos autos, intentou no Supremo Tribunal Administrativo ação administrativa especial contra o CONSELHO DE MINISTROS [doravante «CM»] e os contrainteressados “MUNICÍPIO DE ALCOCHETE”, “MUNICÍPIO DE ALMADA”, “MUNICÍPIO DA MOITA”, “MUNICÍPIO DO MONTIJO”, “MUNICÍPIO DE PALMELA”, “MUNICÍPIO DE SEIXAL”, “MUNICÍPIO DE SESIMBRA”, “MUNICÍPIO DE SETÚBAL”, impugnando e pedindo, pelos fundamentos aduzidos na petição inicial [cfr. fls. 02/31 dos autos] que fossem anulados os atos contidos nos n.ºs 1, 2, 3 e 4 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 30/2014, e do art. 01.º do Caderno de Encargos anexo, e condenação na “prática do ato devido consubstanciado na revogação da decisão constantes do n.º 4 da Resolução n.º 30/2014 …” e na “abstenção à prática de todo e qualquer ato ou comportamento de preparação, concretização e implementação ou desenvolvimento do processo de reprivatização da A…….., SA, que dê execução direta aos atos impugnados”.

1.2.

Citados R. e contrainteressados devida e regularmente apenas o R. apresentou contestação opondo-se à pretensão contra si deduzida [cfr. fls. 107/160], defendendo-se por exceção [incompetência do tribunal e da inadmissibilidade do meio processual condenação à prática do ato devido] e por impugnação, pugnando pela procedência da exceção e improcedência do pedido, com consequente absolvição.

1.3.

Notificado o Magistrado do MP junto deste Supremo Tribunal para efeitos do disposto no art. 85.º do CPTA pelo mesmo não foi apresentada qualquer pronúncia [cfr. fls. 301 e segs.

].

1.4.

Notificado o A. para se pronunciar sobre as exceções invocadas nos articulados pelo Demandado veio o mesmo sustentar a sua improcedência [cfr. fls. 307/311].

1.5.

Foi proferido despacho saneador, sem qualquer impugnação, no qual, por um lado, se julgou procedente, em parte, a exceção de incompetência material, determinando-se, em conformidade, a prossecução dos autos “apenas para a apreciação e julgamento … no segmento que tem como o objeto/pretensão a anulação dos atos consubstanciados/contidos na Resolução do Conselho de Ministros n.º 30/2014” e, por outro lado, se julgou totalmente improcedente a exceção de inadmissibilidade do meio processual de condenação à prática do ato devido [cfr. fls. 338 e segs.

].

1.6.

Notificadas as partes para produzirem alegações escritas nos termos e para os efeitos do disposto no art. 91.º, n.º 4, do CPTA, apenas veio fazê-lo o R. «CM» [cfr. fls. 362/367], pugnando pela total improcedência do pedido, sem que, todavia, haja efetuado qualquer síntese conclusiva.

1.7.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

  1. DAS QUESTÕES A DECIDIR Considerando os termos da pretensão deduzida pelo A. e aquilo que foi decidido com trânsito no despacho saneador de fls. 338/347 dos autos constitui objeto de pronúncia nesta sede o aferir, em suma, da legalidade do ato impugnado quanto à alegada violação pelo mesmo dos princípios da legalidade, da proporcionalidade, da proteção da confiança e da boa-fé [arts. 02.º e 266.º, n.ºs 1 e 2, da CRP, 06.º-A, do CPA/1991], da participação [art. 267.º, da CRP] e da autonomia das autarquias locais [arts. 06.º e 235.º, da CRP e 03.º, n.º 1, da Carta Europeia da Autonomia Local], bem como do disposto conjugadamente nos arts. 03.º, do DL n.º 53/97 [na sua redação originária], 34.º, n.º 1, do DL n.º 133/2013, 01.º, n.º 2, 24.º, n.º 4, 85.º, n.º 1, 373.º, n.º 2, e 377.º e segs., do «CSC», 04.º, 06.º, 09.º e 18.º dos Estatutos da «B…………..», ao ter modificado autoritária e unilateralmente os estatutos desta sociedade quando uma qualquer alteração estatutária, a ocorrer, teria de ser levada a cabo ao abrigo do regime previsto no Código das Sociedades Comerciais dada a autolimitação assumida pelo Estado acionista quanto aos seus poderes.

  2. FUNDAMENTAÇÃO 3.1.

    DE FACTO Presentes o alegado pelas partes e a suficiência dos elementos probatórios que se mostram já produzidos nos autos julga-se como assente o seguinte quadro factual necessário à apreciação da pretensão: I) O Município do Barreiro é acionista da “B………….., SA” [doravante «B…………»], entidade gestora do sistema multimunicipal de triagem, recolha seletiva, valorização e tratamento de resíduos sólidos urbanos da margem sul do Tejo, criada pelo Decreto-Lei (DL) n.º 53/97, de 4 de março, e cujos Estatutos estão em anexo [diploma este cujo teor aqui se tem por reproduzido], e da qual fazem parte, atualmente, os Municípios de Alcochete, Almada, Barreiro, Moita, Palmela, Seixal, Sesimbra e Setúbal tendo firmado, em 11.04.1997, o “Acordo de Acionistas” documentado a fls. 73/76 dos autos cujo teor aqui se dá igualmente por reproduzido.

    II) A participação acionista destes Municípios, detendo ações tipo «A», representa 49,00% do capital social da «B………..» [cfr. doc. fls. 42/49 dos autos e art. 04.º do referido DL n.º 53/97 cujo teor aqui se dá por reproduzido].

    III) Detendo a “A……………, SA” [doravante «A………»] 51,00% [cfr. doc. fls. 42/49 dos autos e art. 04.º do referido DL n.º 53/97 cujo teor aqui se dá por reproduzido].

    IV) As bases do contrato de concessão da exploração e gestão dos sistemas municipais de tratamento de resíduos sólidos urbanos constam do anexo ao DL n.º 294/94, de 16 de novembro, que consagra o regime jurídico da concessão da exploração e gestão dos sistemas multimunicipais de tratamento de resíduos sólidos urbanos, diploma que aqui se dá por integralmente reproduzido.

    V) A «B………..» detinha, em regime de concessão, o exclusivo da exploração e gestão do sistema multimunicipal da margem sul do Tejo por um período de 25 anos nos termos do DL n.º 294/94 [art. 05.º, n.º 1, do DL n.º 53/97].

    VI) Em 20.03.2014, foi publicado no Diário da República, I.ª série, n.º 56, o DL n.º 45/2014, aqui dado por integralmente reproduzido, que aprovou o processo de reprivatização da «A…………» e definiu os respetivos trâmites de procedimento.

    VII) Em 08.04.2014, foi publicada no Diário da República, I.ª Série, n.º 69, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 30/2014, que aqui se dá por integralmente reproduzida incluindo o seu anexo «Caderno Encargos» - [ATO IMPUGNADO] -, donde se extrai, nomeadamente, o seguinte: “O Governo aprovou, através do Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, o processo de reprivatização do capital social da participação detida pela C…………., SGPS, S.A., no capital da A……………, S.A. (A……….).

    O referido diploma determinou que o processo de reprivatização se faria através de um concurso público, a realizar nos termos previstos na Lei n.º 11/90 (…) e do referido decreto-lei, e ao qual não se aplica o disposto no Código dos Contratos Públicos.

    O caderno de encargos que agora se aprova regula o referido concurso público de modo a assegurar todas as garantias de transparência, igualdade e concorrência que caracterizam um procedimento desta natureza, e a permitir ao Governo a escolha da proposta que melhor se conforme com os objetivos da reprivatização, assegurando-se que o adquirente da A………. estará dotado dos requisitos de idoneidade, e capacidade financeira e técnica indispensáveis à sua gestão, assegurando a qualidade do serviço público prestado às populações.

    (…) O Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, concedeu, no âmbito do processo de reprivatização, direito aos municípios de alienação das participações sociais por eles detidas no capital das entidades gestoras de sistemas multimunicipais nas quais a A………. é acionista, alienação essa sujeita ao exercício de direito de preferência por parte de municípios que detenham participações no capital da mesma entidade gestora e que tenham decidido não alienar as respetivas ações. Mais estabeleceu que tais direitos seriam exercidos nos termos e condições, designadamente de prazo e de preço, a fixar no caderno de encargos, pelo que se vem agora proceder a essa regulamentação.

    Fixa-se em 5% do capital social da A…….. o montante das ações que são reservadas para aquisição pelos trabalhadores da A………., direito esse previsto no artigo 12.º do referido decreto-lei, em linha com o estabelecido na Lei n.º 11/90 (…).

    (…) Assim: Nos termos do n.º 1 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, e das alíneas c) e g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve: 1 - Determinar que são alienadas 100% das ações da A……………., S.A. (A………….) e que o concurso público previsto no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, tenha por objeto ações representativas de 95 % do capital social da A………..

    2 - Aprovar o caderno de encargos do concurso público, constante do anexo I à presente resolução, da qual faz parte integrante, no qual se estabelecem os termos e condições específicos a que obedece o concurso público previsto no número anterior.

    3 - Aprovar os termos do exercício pelos municípios da opção de alienação das participações sociais por aqueles detidas no capital das entidades gestoras de sistemas multimunicipais nas quais a A………….. é acionista, bem como do exercício do direito de preferência pelos restantes municípios da mesma entidade gestora, relativamente à referida alienação, os quais constam do caderno de encargos a que se refere o número anterior.

    4 - Determinar a abertura do concurso público previsto no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 45/2014 (….) através do envio para publicação do anúncio no Jornal Oficial da União Europeia e no Diário da República.

    5 - Aprovar, no anexo II à presente resolução, da qual faz parte integrante, algumas condições da oferta pública de venda de ações da A…………, dirigida exclusivamente a trabalhadores da A…………, no âmbito da qual os referidos trabalhadores podem adquirir ações representativas de 5% do capital social da A………..

    6 - Determinar que as ações que não sejam vendidas a trabalhadores, assim como aquelas cuja transmissão não se concretize, acrescem automaticamente às ações a adquirir pelo...

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