Acórdão nº 0586/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Outubro de 2016
Magistrado Responsável | CASIMIRO GONÇALVES |
Data da Resolução | 19 de Outubro de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1.
A…………., S.A., com os demais sinais dos autos, recorre da decisão que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, indeferiu o pedido de reforma da conta, por não ser legalmente admissível apreciar o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, dado ter sido formulado intempestivamente (após ter transitado a decisão sobre custas).
1.2.
Termina as alegações formulando as conclusões seguintes: 1. Nenhuma disposição legal impõe, direta ou indiretamente, que o conhecimento do pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça nos termos do artigo 6.°, n.° 7 do RCP, se não suscitado antes da prolação da decisão final, deva forçosamente ter lugar em sede de reforma da conta quanto a custas, pelo que as regras gerais de interpretação elencadas no artigo 9.° do Código Civil invalidam uma interpretação como aquela que foi perfilhada pelo Tribunal a quo.
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Traduzindo-se num poder-dever cujo exercício não está restringido pela lei a um momento determinado do processo judicial, o Tribunal, se confrontado pela parte com a questão da desproporção do montante da taxa de justiça face ao encargo provocado ao aparelho jurisdicional após receber a conta final - o único momento em que toma conhecimento do quantum exato das custas - não pode recusar a sua apreciação, sob pena de omitir a prática de formalidade obrigatória (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra n.° 2045/09.6T2AVR-B.C2, de 29 de abril de 2014).
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Contrariamente ao defendido no despacho em crise, o pedido de reforma da sentença quanto a custas não constitui o meio mais adequado - e muito menos obrigatório - para obter a dispensa consagrada no n.° 7 do artigo 6.° do RCP, pois está vocacionado para as situações em que o segmento da sentença quanto a custas não respeitou alguma das normas dos artigos 527.° a 541.° do CPC, ou seja, quando não são observadas as regras atinentes à determinação da responsabilidade pelas custas.
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Sucede que a Recorrente em momento algum pretendeu insurgir-se contra a condenação em custas, até porque ficou vencida, ou contra o valor da causa, mas sim contra a quantificação da taxa de justiça refletida na conta, que é uma questão totalmente distinta.
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Demarcar os casos em que no segmento da sentença respeitante à tributação é violada qualquer uma das regras dos artigos 527.° e ss. do CPC daqueles em que a parte apenas discorda do seu montante reveste particular relevo porque, sendo verdadeiro que por regra o poder jurisdicional se esgota com a prolação da decisão (cfr. artigo 613.°, n.° 1 do CPC), este esgotamento só se refere à matéria da causa, i.e. à decisão proferida, e não ao que se relaciona com o montante das custas fixado na conta.
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Sendo a conta de custas “elaborada pela secretaria do tribunal que funcionou em 1ª instância no prazo de 10 dias após o trânsito em julgado da decisão final” e não interferindo a dispensa do remanescente no conteúdo da decisão final, não colhe o argumento do Tribunal a quo de que o referido artigo 613.°, n.° 1 do CPC obsta à apreciação do pedido de dispensa em sede de reclamação da conta.
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De resto, da leitura do artigo 31.° do RCP não se extrai um elenco taxativo de fundamentos para a reclamação da conta, que pode, assim, versar sobre qualquer vício da conta (cfr. acórdão do Tribunal da Relação do Porto no n.° 332/04.9TBVPA.P1, de 7 de novembro de 2013).
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Numa perspetiva formal-processual, a orientação aqui defendida pela Recorrente encontra suporte na jurisprudência (cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul n.° 11701/14, de 26 de fevereiro de 2015, acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul n.° 07270/13, de 29 de maio de 2014, e acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra n.° 2045/09.6T2AVR-B.C2, de 29 de abril de 2014).
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A complexidade da causa deve ser aferida casuisticamente a partir de dados concretos, não podendo o juiz simplesmente qualificar a lide como complexa por não ter complexidade inferior à comum ou não revestir manifesta simplicidade, até porque não resulta da letra do n.º 7 do artigo 6.° do RCP e nenhum destes dois conceitos foi densificado pelo legislador.
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Tendo como referência os critérios constantes do n.° 7 do artigo 530.° do CPC, importa realçar, em primeiro lugar, que a extensão dos articulados apresentados pela ora Recorrente está em perfeita conformidade com o tipo de processo e de matéria jurídica em discussão, estando muito longe de poderem ser qualificadas como prolixas.
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Em segundo lugar, a sentença resume a três as questões a decidir (caducidade da liquidação, falta de fundamentação e inexistência de facto tributário) e as mesmas, como facilmente se deteta, não envolvem intensa especificidade no âmbito da ciência jurídica ou grande exigência de formação jurídica por parte do juiz, nem suscitam a aplicação aos factos de normas jurídicas de institutos particularmente diferenciados.
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Por fim, foram ouvidas pelo Tribunal a quo apenas duas testemunhas e a Recorrente juntou treze documentos aos autos, não sendo realizadas diligências adicionais de prova.
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Na realidade, uma leitura da sentença e do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul evidencia que o processo não revestiu especial complexidade, desde logo porque a controvérsia cingiu-se a questões de direito exploradas pela doutrina e pela jurisprudência.
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Em suma, atendendo aos factos-índice do n.° 7 do artigo 530.° do CPC, à dimensão dos articulados, à prova carreada para os autos e ao tipo de questão controvertida é inequívoco que o processo não assumiu um grau de complexidade suficientemente elevado para justificar a cobrança de € 21.216,60 a título de custas.
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Por outro lado, a conduta processual da...
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