Acórdão nº 0939/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Agosto de 2016

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução10 de Agosto de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 3447/15.4BESNT 1. RELATÓRIO 1.1 A……….. (adiante Reclamante ou Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pela Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a reclamação por ela deduzida ao abrigo do disposto nos arts. 276.º a 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) da decisão administrativa proferida em sede de execução fiscal e que lhe indeferiu o pedido de distrate da hipoteca voluntária por ela constituída a favor da Exequente para garantir a dívida exequenda, formulado com fundamento na caducidade da garantia e na prescrição da obrigação tributária correspondente àquela dívida, que lhe está a ser exigida.

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso a Recorrente apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.

): «1. Ora, salvo melhor entendimento, incorreu o douto Tribunal a quo em erro, conforme infra melhor se demonstrará, não podendo a recorrente estar em maior desacordo com o proferido na douta sentença.

  1. Conforme factos provados na sentença, procedeu a ora recorrente à outorga de Contrato de Garantia de Hipoteca Voluntária Unilateral sobre o imóvel inscrito na matriz predial urbana, sob o artigo 1775, fracção E, na freguesia de ……………, no intuito e com o objectivo de assumir as garantais das dívidas respeitantes ao PEF 1503200501136410.

  2. Contudo, ao abrigo da legislação aplicável aos autos, em particular, cfr. melhor dispõe o aqui aplicável art. 183.º-A do CPPT, decorridos que se encontram todos os demais prazos que determinam a caducidade da garantia prestada, 4. O PEF supra melhor indicado se relaciona com alegada dívida respeitante a IRS do ano de 2000, a qual por natureza e decorrência lógica se encontra na presente data prescrita.

  3. Ora, veio a recorrente requerer ao douto Serviço de Finanças que se dignasse ordenar emitir distrate pelo douto Serviço de Finanças de Cascais 1 para efeitos de cancelamento da supra melhor indicada e referida Garantia prestada por Hipoteca Voluntária Unilateral.

  4. Não obstante, veio o douto Tribunal proferir sentença na qual entende que seria de indeferir a pretensão da recorrente, porquanto no douto entender a Garantia não caducou e a dívida exigida nos presentes autos não se encontra prescrita.

  5. Relativamente à caducidade da garantia e quanto à aplicação no tempo da lei processual civil e tributária, a regra é a mesma que vale na teoria geral do direito: a lei nova é de aplicação imediata aos processos pendentes, mas não possui eficácia retroactiva – cfr. artigo 12.º, n.º do [sic] Código Civil e artigo 12.º, n.º 3 da LGT.

  6. O PEF ora em causa foi instaurado em 22 de Agosto de 2005 e a Impugnação Judicial foi instaurado a 05 de Dezembro de 2005, 9. Lê-se no artigo 183.º do CPPT, versão aplicável aos factos, e que ora se transcreve: “1. A garantia prestada para suspender a execução em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição caduca se a reclamação graciosa não estiver decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição ou se na impugnação judicial ou na oposição não tiver sido proferida decisão em 1.ª instância no prazo de três anos a contar da data da sua apresentação.

    ” 10. Saliente-se: A garantia prestada para suspender a execução em caso de Impugnação Judicial caduca se a impugnação judicial não tiver sido objecto de decisão proferida em 1.ª Instância no prazo de três anos a contar da data da sua apresentação.

  7. Pelo que o decurso do hiato temporal indicado no artigo 183.º-A CPPT versão aplicável nos presentes autos, verificou-se em 05 de Dezembro de 2008.

  8. Tendo apenas sido proferido no respectivo processo, em 1.ª Instância, decisão a 11 de Março de 2016.

  9. Decisão essa que ainda não transitou em julgado, indo bem além dos previstos três anos que importavam para a determinação da caducidade da garantia prestada.

  10. Mais, não é pelo facto do regime da caducidade, aquando da prestação da garantia pela recorrente, somente vigorar para garantias prestadas na pendência de reclamações graciosas, que a mesma garantia não caducou.

  11. Até porque há que salientar que a lei só dispõe para o futuro.

  12. Sendo importante chamar aqui à colação o princípio da segurança e certeza jurídica e da confiança legítima dos cidadãos, claramente violados nos presentes autos.

  13. Pelo que, apesar de se ter alterado a redacção do n.º 1 do art. 183.º-A do CPPT, que passou a estatuir que “a garantia prestada para suspender o processo de execução fiscal caduca se a reclamação graciosa não estiver decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição”, e o legislador ter a intenção clara de restringir o campo de aplicação das circunstâncias objectivas da caducidade da garantia, face ao regime anteriormente estabelecido.

  14. Há que ter em linha de conta que, aquando da dedução da impugnação judicial, a pessoa não poderia razoavelmente contar com essa alteração legislativa, isto é, não poderia a recorrente presumir que a caducidade da garantia só vigorava na pendência das reclamações graciosas.

  15. Ademais, importa denotar que a garantia foi prestada pela recorrente na sequência da dedução da impugnação judicial, a fim de suspender a execução.

  16. Ora, na esteira do alegado pelo douto tribunal, fica o contribuinte sujeito ao facto de ter deduzido ou não reclamação graciosa naquela data, ficando o contribuinte prejudicado pelo facto de, naquela data, ter seguido uma estratégia processual diferente da dedução da reclamação graciosa.

  17. Ademais, qualquer pessoa tem a noção de que quando uma norma jurídica entra em vigor está implícita uma ideia de que a mesma só pode ser aplicada no futuro, 22. Ressalvando-se sempre os efeitos e as consequências que resultaram da vigência da lei anterior revogada.

  18. Até porque, caso assim não sucedesse, as várias situações causavam turbulências na nossa sociedade e a confiança do cidadão cumpridor da ordem jurídica não pode ser esbulhada, 24. Considerando-se assim igualmente desrespeitadas as regras de aplicação da lei fiscal no tempo que impedem a sua retroactividade e ofendem as garantias dos contribuintes.

  19. Uma vez que, no tocante aos elementos essenciais dos impostos aplica-se a lei tributária que vigorar data da ocorrência do facto tributário.

  20. Ora, se aquando da impugnação judicial deduzida, a garantia prestada para suspender a execução que lhe está na base caduca se não tiver sido proferida decisão em 1.ª instância no prazo de três anos a contar da data da apresentação é com esse preceito que a contribuinte ora recorrente estava razoável e legitimamente a contar.

  21. Pelo que o entendimento propugnado pela Tribunal a quo fere de morte os princípios da segurança e certeza jurídica e da própria paz jurídica, uma vez que não assegura a defesa dos direitos dos contribuintes a um grau razoável de confiança jurídica.

  22. Por sua vez, e quanto à questão da prescrição e ao abrigo do artigo 48.º da Lei Geral Tributária (LGT), as dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos, 29. A prescrição das dívidas tributárias é um elemento essencial dos impostos, enquadrando-se na “Garantia dos Contribuintes”, cfr. n.º 2 do artigo 103.º da CRP, ipsis literis: “Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes”.

  23. No caso concreto, verifica-se que nos termos do artigo 48.º da LGT, se encontram preenchidos os requisitos de que depende a verificação da ora invocada prescrição, por referência ao processo supra melhor identificado.

  24. Por sua vez, é necessário ter em linha de conta o estatuído no art. 49.º da LGT, nomeadamente seus n.ºs 1 e 3, que referem que “A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição” e “Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar. (Redacção dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12)”, respectivamente.

  25. Assim, dúvidas inexistem que a interrupção da prescrição apenas pode ocorrer uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.

  26. Como se lê na douta sentença ora em crise, a primeira interrupção da prescrição (e único cfr. interpretação do art. 49.º LGT) ocorreu em 05 de Dezembro de 2005, com a apresentação da Impugnação Judicial.

  27. Atendendo a que o efeito interruptivo de contagem de prescrição – apresentação da Impugnação Judicial – cessou em 06 de Dezembro de 2006, verdade é que a dívida se encontra prescrita desde 22 de Agosto de 2014.

  28. Ademais, o instituto da prescrição encontra o seu fundamento na certeza e estabilidade das relações sociais, que não se compadecem com a cobrança de impostos cujos pressupostos, ou cujo vencimento, se situem em épocas muito remotas.

  29. Mais, a degradação dos efeitos interruptivos da prescrição, decorrente da paragem do processo de impugnação judicial por mais de um ano por motivo não imputável ao contribuinte deve obstar à sustação do novo prazo de prescrição, mesmo que tenha ocorrido antes da revogação do artigo 49.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária pela Lei n.º 53/2006, de 29.12.

  30. Assim, e no caso, não é legalmente admissível considerar que a posterior citação dos executados, em 12 de Outubro e 28 de Dezembro de 2007, fez eclodir nova interrupção da prescrição, porque estaria em clara violação com o disposto no n.º 3 do art. 49.º da LGT, uma vez que a interrupção da prescrição “tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar”.

  31. Não podendo a citação efectuada ao executado produzir novamente o primeiro facto interruptivo da execução Concebendo, sem conceder...

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