Acórdão nº 0698/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS CARVALHO
Data da Resolução21 de Abril de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

RELATÓRIO 1.1.

A………………………, devidamente identificada nos autos, inconformada com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte [TCA/N], datado de 12.09.2014, que concedendo provimento ao recurso revogou a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga e, em consequência, indeferiu a providência cautelar de suspensão de eficácia [despacho do Secretário de Estado da Saúde, datado de 01.11.2012, que autorizou a abertura/transferência de localização da “Farmácia ……..”] pela mesma deduzida contra “MINISTÉRIO DA SAÚDE”, “INFARMED - AUTORIDADE NACIONAL DO MEDICAMENTO E PRODUTOS DE SAÚDE, IP” e a contrainteressada B…………….., todos igualmente identificados nos autos, veio interpor recurso para uniformização de jurisprudência nos termos do art. 152.º do CPTA, apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz [cfr. fls. 2320 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário]: “… A - Em 29.01.2013, a Requerente apresentou no TAF de Braga um procedimento cautelar de suspensão de eficácia do ato administrativo traduzido no Despacho do Secretário de Estado da Saúde, de 02.11.2012, B - Em que, sob proposta do INFARMED, autoriza a abertura, transferência, ou manutenção em funcionamento de cinco farmácias, entre as quais a Farmácia do ………….., da contrainteressada B………… C - Por via de um recurso contencioso interposto pela aqui Requerente, em 17.12.2002, pedindo a anulação do concurso aberto para atribuição de uma farmácia na …………. freguesia de ……………, concelho de Guimarães, D - O qual veio a ser anulado por douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17.01.2007, anulação que ficou a dever-se a haver sido admitida uma concorrente, a aqui contrainteressada, por ser então já proprietária duma farmácia, e isso em manifesta violação do n.º 3 da Base II da Lei n.º 2125.

E - Por via dessa anulação, e em cumprimento do disposto nos arts. 157.º e segs. do CPTA, o INFARMED repetiu as formalidades do concurso, excluindo dele a Contrainteressada, anulando o alvará que lhe fora atribuído e ordenando o encerramento da Farmácia do ………. e acabando por atribuir à Recorrente o alvará n.º 5465 que permitiu a abertura ao público da sua Farmácia ………… em janeiro de 2012.

F - Todavia, a Farmácia do ……….., da Contrainteressada, apesar das pressões da Recorrente, só acabou por ser encerrada em 26.05.2014, ou seja, perto de um ano e meio após a abertura da Recorrente.

G - O procedimento cautelar requerido pela Requerente veio a ser decidido por douta sentença de 22.04.2014, que julgou procedente tal providência e decretou a suspensão da eficácia do aludido e identificado Despacho do Secretário Estado da Saúde, H - E na qual sentença se afirma, além do mais, que «a dita transferência representa, por isso, a abertura de uma ‘nova’ farmácia e a consequente repartição de mercado» querendo com isto significar que com a ‘transferência’ da Farmácia do ……………… ocorre uma divisão de clientes entre as duas e, por isso, uma perda de clientela para a da Recorrente.

I - Desta aludida sentença foi interposto o competente recurso pelo INFARMED e pela Contrainteressada para o TCAN, o qual, por seu acórdão de 12.09.2014, concedeu provimento ao recurso da Contrainteressada e indeferiu o pedido de suspensão da eficácia do identificado ato.

J - Este aresto está em manifesta oposição ao acórdão, também do TCAN, de 14.06.2013, Proc. n.º 00100/13.7BEAVR, que num caso semelhante e de providência cautelar para suspensão do mesmo ato do Secretário de Estado da Saúde julga procedente a dita providência e decreta a requerida suspensão.

K - Aderindo inteiramente à douta argumentação expendida neste último referido aresto, uma vez que não diríamos mais nem melhor, e comparando os entendimentos perfilhados nos dois acórdãos opostos, L - E com vista a resolver o conflito existente entre os dois, consideramos que a questão jurídica em causa deve ser resolvida mediante a seguinte fixação de jurisprudência: A perda de clientela é um prejuízo de difícil reparação, para o efeito da suspensão da eficácia de um ato administrativo, na previsão da alínea b) do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.

M - Ao assim decidir deve ainda o douto acórdão anular o acórdão impugnado e substituí-lo decidindo a questão em causa, nos termos do n.º 6 do art. 152.º do CPTA …”.

1.2.

Devidamente notificados apenas o “INFARMED…” e a referida contrainteressada vieram produzir contra-alegações [cfr., respetivamente, fls. 2493 e segs. e fls. 2501 e segs.

], tendo sintetizado as mesmas nos termos do quadro conclusivo seguinte: 1.2.1.

“INFARMED…” “… 1.ª O legislador utilizou a distância de dois quilómetros como critério legal para assegurar que, independentemente da capitação, cada farmácia tem a clientela necessária para ser um negócio atrativo e assim se manter aberta em funcionamento, de forma a garantir a distribuição medicamentosa e de serviços farmacêuticos pelo território e pela população.

  1. Desta forma, estando assente que a farmácia da Contrainteressada a mais de dois quilómetros da farmácia da Recorrente a lei não considera que possa haver prejuízos tuteláveis, porquanto se os houver, os mesmos fazem parte da concorrência normal entre farmácias que a Recorrente, pelo que os mesmos não podem ser considerados para efeitos de preenchimento de periculum in mora.

  2. Como bem decidiu o Tribunal Central Administrativo Sul, como a atividade das farmácias está relacionada principalmente com a saúde das pessoas, a escolha de uma farmácia por um utente faz-se por critérios bem diferentes daqueles que são usados para a escolha da satisfação de outras necessidades, pelo que não faz sentido, para análise do comportamento de clientela de estabelecimentos de farmácia, analisar apenas critérios economicistas.

  3. Pelo que, não será a abertura de uma nova farmácia causa adequada ao desvio de clientela da farmácia da Recorrente, sendo os prejuízos alegados pela Recorrente meramente hipotéticos.

  4. Desta forma, é inequívoco que não merece qualquer censura a decisão contida no Acórdão recorrido, antes a merecendo o Acórdão fundamento …”; 1.2.2.

Contrainteressada B……………… “… I. A Recorrente interpôs Recurso para Uniformização de Jurisprudência, nos termos do art. 152.º do CPTA, alegando que o Acórdão do TCA Norte de 12.09.2014 - acórdão recorrido - está em manifesta oposição/contradição ao acórdão, também do TCAN, de 14.06.2013, Proc. n.º 00100/13.7BEAVR, em virtude de, «num caso semelhante e de providência cautelar para suspensão do mesmo ato do Secretário de Estado da Saúde, ter julgado procedente a dita providência e decretado a requerida suspensão».

  1. E, aderindo à argumentação expendida naquele aresto, e com vista a resolver o conflito alegadamente existente entre os dois, considera a Recorrente que a questão jurídica em causa deve ser resolvida mediante a seguinte fixação de jurisprudência: «A perda de clientela é um prejuízo de difícil reparação, para o efeito da suspensão da eficácia de um ato administrativo, na previsão da alínea b) do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA».

  2. Não restando, assim, dúvidas de que a questão fundamental de direito relativamente à qual a Recorrente entende estar o Acórdão recorrido em contradição com o acórdão fundamento é a questão de se saber se a perda de clientela é, ou não, por si só, um prejuízo de difícil reparação, para o efeito da suspensão da eficácia de um ato administrativo, na previsão da alínea b) do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, suficiente para se considerar por verificado o requisito do «periculum in mora», necessário se torna, pois, avaliar se sobre esta questão se verifica efetiva contradição entre aqueles dois arestos.

  3. Contudo, para que se verifique a necessária contradição, prevista no n.º 1 do art. 152.º do CPTA, não basta a similitude do ato suspendendo e/ou do procedimento e a circunstância de um ter obtido provimento e o outro não.

  4. Necessário se torna que exista contradição sobre a mesma questão fundamental de direito, a qual, todavia e ao contrário do alegado pela Recorrente, se não verifica entre o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento - muito menos inegável ou evidente contradição.

  5. Com efeito, contrariamente ao vertido, e assente, no Acórdão recorrido, no Acórdão fundamento pesou a circunstância de, «sendo a farmácia da Recorrente uma realidade relativamente recente, não é possível determinar, nem em termos médios, qual o decréscimo da clientela desta farmácia como resultado do funcionamento da farmácia da Contrainteressada, pelo que se torna difícil apurar o real prejuízo resultante para a ora recorrente, desta situação». Circunstância pela qual, aliás, («por este facto decisivo») se considerou, ali, «diferente a situação» daqueles autos (do acórdão fundamento) «da situação apreciada e decidida no acórdão deste TCA Norte, de 8 de abril de 2011, no processo 01282/10.5BEPRT-A, invocado na sentença recorrida», precisamente o mesmo acórdão invocado no Acórdão do TCAN ora recorrido. (sublinhados nossos).

  6. E assim, da mesma forma como naquele acórdão fundamento se considerou, pela referida circunstância, diferente a situação dos referidos arestos, também, e da mesma forma, se deverá considerar diferente a situação apurada no Acórdão fundamento da situação apreciada e decidida no Acórdão recorrido, porquanto neste, ao contrário daquele, entendeu-se - e bem - não se verificar o alegado prejuízo de difícil reparação na medida em que, correspondendo aquele, segundo a requerente, ora recorrente, a € 103.200,00 anuais, e decorrente do facto da farmácia da contrainteressada vir a abrir ao público na freguesia de ………….., o alegado «desvio de clientela» (...) «acaba por constituir um prejuízo reparável in natura, pelo confronto entre as contas relativas aos exercícios dos anos em que sucederam ao início da atividade da farmácia da ora recorrente, e as contas...

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