Acórdão nº 01444/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelASCENS
Data da Resolução13 de Abril de 2016
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, nesta Secção do contencioso tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 - RELATÓRIO – Processo nº 1444/13-30 A…………….., S.A., melhor identificada nos autos, deduziu impugnação judicial do indeferimento do despacho da Direcção de Finanças de Lisboa, que por sua vez, indeferiu a reclamação graciosa por si apresentada contra o acto de liquidação adicional de IRC e juros compensatórios referente ao exercício de 2007, no montante de € 12.292.60.

Por decisão de 26 de setembro de 2012, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou improcedente a presente impugnação.

Inconformada com o assim decidido, interpôs a recorrente, o presente recurso com as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões: «i. Segundo o relatório de inspecção, A motivação da liquidação reside, sumariamente, no facto de os sujeitos passivos não residentes (beneficiários dos rendimentos) não terem não terem apresentado os formulários modelos 12-RFI para os rendimentos de serviços prestados.

ii. Analisada a CDT em causa, não se vislumbra uma única disposição que impusesse, aos não residentes, a exibição prévia, perante a Recorrente, de qualquer “meio de prova” para aplicação do regime legal previsto nessas CDT e, muito menos, que impusesse, aos não residentes, a exibição, perante as autoridades fiscais Portuguesas, de qualquer formulário “Modelo 12-RFI”.

iii. A propósito pode-se referir ainda o determinado no próprio art. 24.º do modelo das Convenção onde se refere “Os nacionais de um Estado contratante não ficarão sujeitos no outro Estado contratante a nenhuma tributação ou obrigação com ela conexa diferente ou mais gravosa do Que aquela a que estejam ou possam estar sujeitos os nacionais desse outro Estado que se encontrem na mesma situação, em especial no que refere à residência.” iv. Quanto à certificação a efectuar às entidades pagadoras francesas, o procedimento previsto passa pela entrega de um documento sem exigências formais (établi sur papier libré) que ateste o conjunto das condições requeridas para a aplicação das disposições previstas na convenção.

  1. Não pode o legislador ordinário nacional impor obrigações legais declarativas a não residentes em território nacional, nem impor às autoridades fiscais de outros países a certificação de formulários não aprovados por aquelas muito menos em violação das normas de direito internacional convencional, acordadas entre as competentes autoridades dos países em confronto — pelo que o artigo 90.º do CIRC, na interpretação que aqui lhe é conferida pelo Tribunal a quo, padece de inconstitucionalidade material designadamente por violação do disposto naquele artigo 8.º n.º 2 da CRP.

    vi. O TJCE tem invariavelmente considerado: - QUE (Como se verifica, por Exemplo, nos Acórdãos 107/94 Asscher; 118/96 Safir; 264/96 ci; 294/97 Eurowings; 307/97 Saint Gobain; 35/98 Verkooijen; 55/98 Vestergaard; 141/99 Amid; 136/00 Danner; 290/04; Fkp Scorpio; 345/04 Centro Equestre; 346/04 Conijn; 386/04 Stauffer; 471/04 Keller) embora a fiscalidade directa seja da competência dos Estados-Membros, não é menos verdade que estes últimos a devem exercer no respeito do direito comunitário (sic, processo C-264/96 ici, parágrafo 19); - QUE”(…) não se pode justificar, a título da eficácia dos controlos fiscais, uma regulamentação nacional que, de forma absoluta, impede o contribuinte de apresentar tais provas” – (Sic. Processo C-386/04 Stauffer, parágrafo 49).

    - QUE “os contribuintes residentes e não residentes estão em situações comparáveis, pelo que uma disposição que recusa a possibilidade dessa dedução aos não residentes constitui uma restrição proibida” – (Sic. Processo C-346/04 Conijn, parágrafo 24, destaque Nosso).

    vii. No caso em apreço, a Recorrente vê-lhe ser imputado um ónus a que não consegue dar satisfação por motivos que lhe são alheios uma vez que as entidades com quem se relaciona, sedeadas em outros Estados Membros, naturalmente não se acham vinculadas ao preenchimento de formulários previstos apenas na lei portuguesa.

    viii. Como refere a nossa doutrina “Trata-se inegavelmente, de aberrante e perverso mecanismo, que consagra o triunfo da burocracia cega sobre a racionalidade jurídica (...) a imposição de um (inconstitucional) empréstimo forçado. A irracionalidade e o carácter caprichoso do mecanismo em causa mais se acentua (...) o substituto tributário, fica na dependência da vontade de uma autoridade pública estrangeira, que pode recusar-se a pratica tal acto, alegando incompetência ou falta de previsão na lei interna (...) – (Alberto Xavier, 2007, Direito tributário internacional, Almedina, p.541, destaque nosso).

    ix. «O sistema consagrado no art.º 90.º do CIRC parte de uma desarrazoada suspeição e desconfiança quanto aos meios de prova da residência (...) usuais no comércio jurídico entre partes de boa-fé, para — quase num delírio de burocracia perfeccionista — chegarem a exigirem uma manifestação de uma autoridade pública estrangeira, tornando a prova para o cidadão comum uma kafkiana probatio diabólico (idem).

  2. O artigo 90.º do CIRC é materialmente inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade, se interpretado no sentido de que impõe ao sujeito passivo o cumprimento de uma obrigação que, em rigor, depende da vinculação de uma entidade terceira — corporizando, em determinadas situações, uma obrigação impossível de ser cumprida.

    xi. O TJCE tem vindo a considerar, de uma forma bastante abrangente e sucessivamente reiterada, que “Segundo jurisprudência constante, a livre prestação de serviços, enquanto princípio fundamental do Tratado, só pode ser limitada por disposições justificadas por razões imperiosas de interesse geral aplicáveis a qualquer pessoa ou empresa que exerça uma actividade no território do Estado-Membro destinatário Essas restrições devem designadamente ser adequadas para garantir a realização do objectivo que prosseguem e não devem ir além do necessário para o atingir. – (“Sic, Processo C-398/95 Ergasias, parágrafo 21, destaque nosso, e, no mesmo sentido, acórdãos de 25 de Julho de 1991, Ságer, n.º 15; Gouda e o., C-288/89, Colect., p. -4007, nºs 13 a 15; de 31 de Março de 1993, Kraus, C-19/92, Colect., p. I- 1663, n.º32, e de 30 de Novembro de 1995, Gebhard, c-55/94, Colect., p. -4165, n.º 37)”. sendo “um tratamento fiscal desfavorável contrário a uma liberdade fundamental não pode justificar-se pela existência de outras vantagens fiscais” – (sic.processo C- 35/98 verkooijen, parágrafo 61, destaque nosso).

    xii. A imposição de cumprimento de formalidades administrativas - mormente o preenchimento de “formulários” a empresas sedeadas em países estrangeiros — como condição para a não imposição de dupla tributação, viola, de forma crassa os princípios da liberdade de estabelecimento, da liberdade de circulação e da não descriminação — estabelecidos no Tratado da União Europeia (C 83/54) na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (2007/C 303/01) e na Directiva 2006 do Parlamento Europeu e do Conselho (Relativa aos serviços no mercado interno – jornal oficial L 376 de 27.12.2006).

    xiii. Ficou decidido pelo TJCE que “aplicação das regulamentações nacionais do Estado-Membro de acolhimento aos prestadores de serviços é susceptível de proibir, perturbar ou tornar menos atractivas as prestações de serviços, na medida em que implique despesas, bem como encargos administrativos e económicos suplementares.” (Sic, Processo C-290/04, FKP Scorpio Konzertproduktionen GmbH, parágrafo 46, 47 e 49, destaque nosso, e no mesmo sentido acórdãos de 15 de Março de 2001, Mazzoleni e ISA, c-165/98, colect., p. 1-2189, n.º 24, e de 25 de Outubro de 2001, Finalarte e o., processos apensos c-49/98, C-50/98, c-52/98 a c-54/98 e c-68/98 a c-71/98, colect., p. 1-7831, nº 30).

    xiv. E que “(...) o facto de, mesmo quando o prestador de serviços não residente tenha informado o devedor da remuneração do montante das suas despesas profissionais directamente relacionadas com as suas actividades, ter de se dar início a um procedimento de reembolso a posteriori das referidas despesas é susceptível de prejudicar a realização de prestações de serviços Com efeito, na medida em que tal procedimento acarreta encargos administrativos e económicos suplementares e se impõe inevitavelmente ao prestador de serviços, a legislação fiscal em causa constitui um entrave à livre prestação de serviços, proibido, e princípio, pelos artigos 59° e 60° do Tratado CEE” (idem).

    xv. Se a Administração Fiscal duvidava do facto de os prestadores serem efectivamente residentes e estarem sujeitos a tributação em França, cabia-lhe solicitar as competentes informações junto das entidades congéneres — na medida em que a CDT em questão contém uma disposição legal específica, relativa a “troca de informações”.

    xvi. Ao invés do referido pelo Tribunal a quo, em lado algum da CDT em causa se retira que os mecanismos de cooperação apenas serão colocados em marcha em caso de dúvida quanto aos certificados apresentados - outrossim, a cooperação justificar-se-á em todos os casos em que se obtenham “ úteis para assegurar o lançamento e cobrança regulares dos impostos abrangidos por esta Convenção — mormente quando o sujeito passivo não logre a obtenção desses certificados, por recusa do respectivo operador.

    xvii. Com efeito, a preocupação do legislador nacional foi evitar a dupla tributação internacional dos mesmos rendimentos; é essa a ratio das CDT, acordos internacionais celebrados entre países — pelo que não pode a preocupação da Administração Fiscal Portuguesa residir em salvaguardar, exclusivamente, a tributação do lado de Portugal, abstraindo-se da dupla tributação internacional Que dessa actuação advém.

    xviii. Existem vários diplomas que visam criar e aprofundar os mecanismos de cooperação fiscal ao nível da comunidade podendo destacar-se como exemplo, a Directiva 77/799/CEE do Conselho, de 19 de Dezembro de 1977, relativa à assistência mútua das autoridades competentes dos...

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