Acórdão nº 075/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução16 de Dezembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 561/12.1BECBR 1. RELATÓRIO 1.1 A “Casa do Povo da ………, I.P.S.S.” (adiante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo decisão por que o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra julgou o Tribunal incompetente em razão da matéria para conhecer da impugnação judicial por ela deduzida contra o acto que identificou como «Liquidação n.º 2.11-1/12, de 20 de Março de 2012, da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho relativa a taxa relativa às compensações» que lhe foi efectuada pelo Município de Montemor-o-Velho (a seguir Recorrido), depois de considerar tacitamente indeferido o recurso hierárquico que deduziu contra o indeferimento da reclamação graciosa que deduziu contra aquela liquidação.

1.2 O recurso foi admitido, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usaremos o itálico na transcrição, as partes que no original estavam em itálico surgem aqui em tipo normal, a fim de se respeitar o destaque que lhes foi concedido pelo Recorrente.

): «I. A Recorrente não aceita que o douto Tribunal a quo se declare incompetente para conhecer da validade da liquidação da compensação urbanística por parte da Recorrida em 26 de Março de 2012, por concluir que a compensação prevista no art. 44.º do RJUE não é um tributo, mas uma indemnização.

  1. A douta sentença a quo inicialmente refere estarmos perante um tributo, para posteriormente referir que o acto que exige o seu pagamento é meramente administrativo, verificando-se uma contradição entre a fundamentação em matéria de direito da douta sentença recorrida com a subsequente violação do art. 607.º n.º 3 do CPC, devendo concluir-se, por isso, pela nulidade da douta sentença recorrida, nos termos do art. 615.º n.º 1 al. b) do CPC e do 125.º n.º 1 do CPPT.

  2. Para além da nulidade supra referida, a douta sentença recorrida também deverá ser revogada na medida que decidiu contrariamente ao direito vigente, em particular contra o entendimento unânime desse venerando Tribunal ad quem, segundo o qual que [sic] a compensação urbanística se traduz numa “Taxa de Compensação”, tal como decidido por esse venerando Tribunal ad quem nos acórdãos de 5 de Junho de 2013, emitido no Proc. n.º 0876/12 de 13 de Novembro de 2013, emitido no Proc. n.º 0734/13.

  3. Na verdade, contrariamente ao decidido pelo douto Tribunal a quo, “a taxa de compensação” tem como contrapartida dispensar o particular da cedência de parcelas de terreno a integrar no domínio público municipal, (sic STA Ac. de 5 de Junho de 2013, emitido no Proc. n.º 0876/12)”, V. Inexistindo qualquer fundamento de direito para o douto Tribunal a quo considerar que a compensação visa indemnizar a Recorrida por vantagem dada à Recorrente num procedimento urbanístico.

  4. Por isso o douto Tribunal a quo, ao entender que o acto da Recorrida não é tributário viola o disposto no art. 4.º n.º 2 da LGT, na medida que as taxas de compensação previstas no art. 44.º do RJUE resultam da remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares, VII. Pois a Recorrente não poderia construir qualquer infra-estrutura, equipamento ou edifício sem o prévio licenciamento da Recorrida e, subsequente, cedência de espaço ou pagamento de compensações, conforme consta dos arts. 56.º, 57.º e 58.º RMEU da Recorrida.

  5. Nessa medida, a compensação urbanística traduz-se numa fonte de receita tributária da Recorrida e própria perequação entre os diversos particulares, tendo sido criada por regulamento municipal aprovado nos termos do art. 103.º da CRP e do art. 5.º da LGT, como fonte de direito Tributário.

  6. O douto Tribunal a quo não interpretou a norma regulamentar em causa de acordo com o disposto no art. 11.º da LGT, pois não teve em consideração o entendimento do seu autor (a ora recorrida) que tal norma é tributária.

  7. A douta sentença Recorrida violou os arts. 1.º e 3.º da LGT, ao considerar que não estamos perante uma relação tributária, desse modo a competência material da jurisdição tributária estabelecida no art. 12.º do CPPT.

  8. Assim, inexistia qualquer motivo para o douto Tribunal a quo decidir pela sua incompetência absoluta material, nos termos do art. 16.º do CPPT, por ser o tribunal absolutamente competente para apreciar o litígio sub judice.

  9. Nessa medida, deve a douta sentença recorrida ser revogada e emitido acórdão no sentido de considerar a Secção do Contencioso Tributário da TAF de Coimbra como materialmente competente para se pronunciar quanto às questões referentes à liquidação e compensações urbanísticas previstas no art. 44.º do RJUE, nos moldes supra expostos.

  10. A douta sentença recorrida deve ser reformada quanto à condenação por custas na medida que a Recorrente é uma IPSS e, por isso, se encontra isenta do seu pagamento, nos termos do art. 4.º n.º 1 al. f) do RCP.

Nestes termos, e nos melhores de Direito, que V. Exas. Venerandos Conselheiros doutamente suprirão, deverá a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que se coadune com a pretensão exposta, determinar a baixa dos autos à primeira instância para aí se proceder à apreciação do pedido, por competência material desse douto Tribunal recorrido para tal decisão, e assim se fazendo, se fará a tão costumada JUSTIÇA!».

1.3 O Município contra-alegou, resumindo a sua argumentação em conclusões do seguinte teor: «I- A impugnante veio interpor recurso para o STA, supostamente por discordar da douta decisão proferida pelo TAF de Coimbra, ao ter declarado a incompetência do Tribunal Tributário para apreciar a questão controvertida.

II- Aquela apresentou nos serviços do Município, um projecto para licenciamento da obra de um “centro de noite”, a que foi atribuído o n.º 361/2003, o qual viria a ser deferido e licenciado. Ainda nesse processo e por força do aludido licenciamento, tratando-se de um edifício com impacto semelhante a loteamento, por não ter havido cedências de áreas ao domínio público, foi a Casa do Povo da ……… notificada para proceder ao pagamento da correspondente compensação, no montante de 3.823,50 euros.

III- Alega para o efeito que nos termos do RMEU de 2003, estava isenta do seu pagamento, atenta a sua qualidade de pessoa colectiva de utilidade pública. Conclui, peticionando a procedência da impugnação, pela declaração da nulidade do acto administrativo, traduzido no ofício n.º 2.11-1/12, de 20 de Março de 2012, da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, determinando-se a caducidade e a prescrição de qualquer direito da Ré.

IV- Em verdadeiro rigor o que é impugnado nos presentes autos é a decisão administrativa, na qual o impugnado se pronunciou sobre o recurso hierárquico interposto, indeferindo-o, nos termos constante da al. k) dos factos assentes.

V- Decorre do pedido de licenciamento que instrui o processo de obras n.º 361/2003 – construção de Centro de Noite – requerido pela aqui impugnante, ter o projecto de arquitectura sido aprovado – conforme documento n.º 3 junto à PI o qual se dá aqui por integralmente reproduzido, com as seguintes condicionantes: a) Deve ser contemplado em projecto de arranjos exteriores uma área para equipamento de utilização colectiva; b) Deve ser contemplado em projecto de arranjos exteriores uma área para espaços verdes de utilização colectiva; c) Deve ser proposta uma área de estacionamento, de forma a cumprir a Portaria n.º 1136/2001 de 25/09; d) Todas as que vierem a ser apontadas pelas entidades consultadas.

VI- Como decorre do art. 10.º da Lei das Finanças Locais, as receitas municipais compreendem os impostos, taxas, preços, multas, coimas, rendimentos de bens, participação em lucros, produtos de alienação de bens, empréstimos e outras receitas estabelecidas por lei.

VII- Nos presentes autos como refere a douta sentença, “o que está aqui em causa é o pagamento de uma quantia que está a ser exigida à impugnante, quantia essa que assenta na circunstância desta aquando da realização de uma concreta e determinada obra que prevendo infra-estruturas (espaços verdes e equipamentos de utilização colectiva), a libertaram do ónus de ceder parcelas ao Município para a construção dessas mesmas infra-estruturas, pelo que aquela ficou obrigada a compensar o Município com um determinado pagamento. Deste modo, o que está aqui em causa não é o pagamento de qualquer contraprestação de serviço prestado por entidade pública, nem a remoção de um qualquer obstáculo jurídico a um particular, uma vez que é lícita e livre a actuação deste, nem sequer a protecção de um determinado bem jurídico. Tão só de indemnizar a entidade pública pela vantagem que o particular auferiu aquando do licenciamento da respectiva obra, vantagem, essa que está prevista em regulamento municipal.

VIII- Por isso, a sobredita compensação não é um tributo mas antes uma “indemnização” por uma suposta vantagem do particular em processo de licenciamento pelo qual deve ser ressarcida a componente urbanística”.

IX- A previsão de áreas para espaços verdes e de utilização colectiva, infra-estruturas e equipamentos no âmbito das operações de loteamento, de outras que tenham um impacto similar a estas ou com impacto urbanístico relevante, bem como as respectivas cedências gratuitas ao domínio público, encontram-se abordadas nos artigos 43.º e 44.º do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.

X- No domínio do pagamento de compensações ao Município, em comentário ao art. 44.º do RJUE, F. Paula Oliveira, M. J. Castanheira Neves, Dulce Lopes e Fernanda Maçãs, 3.ª edição, página 383, é referido “Ora, para nós, a figura das compensações não é senão um mecanismo de reposição da igualdade entre, por um lado, os administrados, in casu entre aqueles que são onerados com cedências ou com a previsão de áreas que se mantêm na sua titularidade privada e, por outro, aqueles que não onerados com qualquer uma destas imposições...

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