Acórdão nº 01458/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução02 de Dezembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 945/12.5BEPRT 1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgando procedente a reclamação deduzida ao abrigo dos arts. 276.º e 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) pela sociedade executada, denominada “A…..…., Lda.” (adiante Executada, Reclamante ou Recorrida), anulou a decisão do órgão da Administração tributária (AT) que lhe indeferiu o pedido de prestação de garantia através de penhor de participações sociais, em ordem à suspensão da execução fiscal por a Executada ter manifestado a intenção de impugnar administrativa ou judicialmente a liquidação do imposto que está na origem da dívida exequenda.

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso, a Fazenda Pública apresentou as respectivas alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.

): «A. Vem o presente recurso interposto contra a sentença proferida nos presentes autos que julgou procedente a presente reclamação e, em consequência, anulou o despacho reclamado.

  1. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, pelas razões que passa a defender.

  2. A presente reclamação foi interposta pela Reclamante, aqui Recorrida, contra o despacho do Exmo. Chefe da Divisão de Gestão da dívida Executiva, de 18-12-2014, através do qual foi indeferido o pedido de suspensão do PEF acima identificado, por falta de idoneidade da garantia apresentada sob a forma de penhor de participações sociais – uma quota no valor de € 20.000,00 e outra no valor de € 113.200,00 – que a aqui recorrida detém sobre a sociedade B…………….., Lda.

  3. A decisão de indeferimento do pedido de suspensão do PEF por falta de idoneidade da garantia apresentada fundamentou-se, conforme despacho de indeferimento, ponto E, em suma, no seguinte, cfr. também Ponto 7) do probatório fixado na sentença a quo.

  4. Do referido despacho consta, como parte integrante, a avaliação das quotas oferecidas efectuada pela Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Património e Outros Impostos, da Direcção de Finanças do Porto.

  5. Sobre esta avaliação, a sentença a quo vem dizer o seguinte: “Na situação vertente, analisando a avaliação efectuada pela AT, com base na correcção do balanço que se traduziu na utilização do valor patrimonial tributário dos prédios, não se nos afigura que o método previsto no art. 15.º seja o mais adequado para avaliar as participações sociais em causa.

    Na verdade, a avaliação de partes sociais implica a avaliação da empresa em si pois a quota vale o que valer a sociedade.

    E a avaliação da empresa, ou seja, o processo de apuramento do seu valor, depende de vários factores a ter em consideração, tais como, a dimensão da empresa, a fase em que a empresa se encontra (de arranque, consolidação, etc.), o mercado onde a empresa desenvolve a sua actividade, tecnologia e equipamentos de que dispõe, etc.

    Para além destes factores, há que levar em conta a avaliação patrimonial (soma dos activos e os passivos da empresa, utilizando-se um determinado critério de valorimetria para cada um deles), bem como a avaliação económica (desempenho da empresa) e a avaliação financeira (nível de endividamento, sustentabilidade financeira, etc.) e, ainda, a avaliação numa perspectiva de rendimento, isto é, a capacidade de criação de valor Para isto, as demonstrações financeiras podem constituir um ponto de partida para a avaliação (não só o balanço e respectivo anexo, mas também as demonstrações de resultados), pelo facto de indicarem os activos de que a empresa é proprietária ou os respectivos direitos de utilização e a forma como os mesmos estão financiados) porém, não são suficientes para determinar o valor da empresa, pois, como se disse, há diversos aspectos que importa considerar, quando se trata de determinar o valor de participações sociais.

    É que, como se sabe, a contabilidade baseia-se num conjunto de critérios de mensuração ou valorimétricos que não correspondem, necessariamente, ao valor de mercado, pelo que o balanço contabilístico pode não ser o mais adequado para determinar o valor de venda das participações sociais.

    Do mesmo modo, também não parece adequado corrigir o balanço de modo a considerar o valor patrimonial tributário dos imóveis, pois o valor relevante é aquele que é possível realizar, na eventualidade da venda em execução fiscal, para garantir o pagamento da quantia exequenda, ou seja, o valor que o mercado está disposto a pagar.

    ” G. Com a ressalva do sempre devido respeito, não se conforma a Fazenda Pública com tais conclusões, sendo que, face à factualidade dada como provada, o Tribunal a quo fez uma errada interpretação da lei aplicada, pelo que se impõe decisão diversa da proferida.

  6. No presente processo, em causa está a questão de saber se a aplicação do artigo 15.º n.º 1 do Código do Imposto de Selo, para determinar o valor das quotas, se mostra adequada ou não para aferir da idoneidade da garantia (no caso penhor de quotas) apresentada.

    I. Como decorre do estatuído no artigo 266.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP) “os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé”.

  7. Concretizando tais princípios a Lei Geral Tributária preconiza no seu artigo 55.º que “a administração tributária exerce as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes e demais obrigados tributários”.

  8. A Administração Tributária (AT) deve pautar a sua actuação na prossecução de tais princípios.

    L. Conforme dispõe o artigo 52.º n.º 2 da LGT, a cobrança da prestação tributária suspende-se nos termos do n.º 1 do mesmo normativo legal, ficando dependente da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias.

  9. Determina o n.º 1 do artigo 199.º do CPPT que “caso não se encontre já constituída garantia, com o pedido deverá o executado oferecer garantia idónea, a qual consistirá em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente”.

  10. Como resulta de tal normativo, e também afirmado pela decisão aqui em crise, assiste à AT uma certa discricionariedade para decidir da idoneidade da garantia prestada, isto porque incumbe lhe a apreciação e decisão de perante a garantia oferecida decidir da sua capacidade para pagamento da quantia exequenda e acrescidos, “aferindo-se essa idoneidade pela capacidade que o meio oferecido tem para satisfação da dívida exequenda em caso de incumprimento posterior do executado. A idoneidade de um meio resulta da sua capacidade para prossecução eficaz do fim para que foi criado”, cfr. Acórdão do STA de 27.08.2014, rec. 0874/14.

  11. Assim e como coligido no probatório, pontos 7), 8) e 9), a AT suportou a sua decisão no modelo de avaliação de quotas estatuído no n.º 1 do artigo 15.º do CIS, o qual faz uma apreciação do último balanço da empresa, reflectindo a globalidade da situação económica financeira da empresa, não se esgotando somente na simples avaliação dos prédios detidos pela sociedade para a qual se pretende que as quotas constituam garantia.

  12. Efectivamente da lei não decorre que o critério a prosseguir pela AT na aferição da idoneidade da garantia prestada (penhor de quotas) seja o estabelecido no artigo 15.º do CIS em junção com os demais elementos equacionados.

  13. No entanto, da lei também não decorre qualquer outro critério pelo qual a AT tenha que se nortear.

  14. Como estatui o n.º 2 do artigo 52.º da LGT “a suspensão da execução nos termos do número anterior depende da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias”.

  15. Deste normativo legal depreende-se que a AT, na aferição da idoneidade das garantias prestadas há-de socorrer-se do que dispõe para o efeito a legislação fiscal, o que in casu ocorreu, uma vez que a AT utilizou, na apreciação que se impunha o que decorre de Código Tributário (CIS).

  16. É certo que o artigo 15.º do CIS está previsto para as transmissões gratuitas, contudo, não existindo na lei fiscal outra norma que possa avaliar as participações sociais, no caso quotas, poderá o método previsto no n.º 1 do artigo 15.º CIS ser utilizado para efeitos de avaliação do penhor das quotas oferecidas como garantia.

  17. Alegar que a metodologia preconizada pelo art. 15.º do CIS só deve ser utilizada na determinação do valor de incidência do IS é o mesmo que afirmar que o valor real da empresa está relacionado com o fim a que se destina aquela avaliação, o que é absolutamente inconcebível.

    V. Mais, a título de exemplo, é afirmar que, relativamente, às acções, a sua cotação no mercado regulado não corresponde ao seu valor real; apenas corresponderia ao real se fosse utilizada para efeitos de transmissão gratuita e não para outros.

  18. Além disso, este critério tem vindo a ser utilizado na determinação do valor das participações sociais e outros títulos de crédito, como, por exemplo, através do Acórdão do TCA Sul, de 11/10/2011, proferido no Processo: 05052/11, no qual foi sumariado o seguinte: “1. As acções ao portador (as que não indicam o nome do respectivo titular), quanto ao modo de circulação, consubstanciam títulos de crédito que se podem transmitir de mão em mão sem necessidade do endosso, contrariamente às acções nominativas, as quais indicam o nome do seu possuidor, transmitindo-se por endosso.

    1. O valor nominal de um título de crédito consiste no...

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