Acórdão nº 01390/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 03 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelJOSÉ VELOSO
Data da Resolução03 de Dezembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
  1. Relatório 1. O ESTADO PORTUGUÊS [EP] – aqui representado pelo Ministério Público - interpõe recurso de apelação da sentença proferida em 05.12.2013 pelo então Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [TAC], que julgou parcialmente procedente a acção declarativa de condenação, com processo ordinário, que os aí autores – A……………, sua mulher B……………., e ainda C…………….

    - intentaram contra si, contra o MUNICÍPIO DE VILA FRANCA DE XIRA [MVFX] e contra D…………..

    [este último na qualidade de único herdeiro de E…………….].

    Na sentença recorrida foi decidido: a) Condenar os réus EP e D………….. a pagar solidariamente ao casal autor uma indemnização no valor de 125.000,00€ [cento e vinte e cinco mil euros], acrescida de juros legais desde a data da sentença até integral pagamento; b) Condenar os réus EP e D………… a pagar solidariamente à autora C……………. uma indemnização no valor de 112.500,00€ [cento e doze mil e quinhentos euros], acrescida de juros legais desde a data da sentença até integral pagamento; c) Absolver o réu MVFX do pedido.

    Conclui assim as suas alegações: 1- Vem o recurso interposto da sentença que julgou parcialmente procedente, por provada, a presente acção; 2- Imputando aos réus EP e MVFX a infracção dos respectivos deveres de fiscalização, e bem assim imputam ao réu D…………. a violação das regras legais que proíbem a instalação de esquentadores na casa de banho, condutas que estiveram na origem da morte dos seus familiares; 3- A discordância, razão de ser do presente recurso, centra-se na responsabilidade atribuída ao réu EP, quanto à instalação do esquentador na casa de banho, e a alegada não fiscalização; 4- Após a vistoria técnica efectuada à Quinta ……….., em 08.07.1991, foi instalado um esquentador na casa de banho, o qual esteve na origem do falecimento da F………… e do G………….., em 19.08.1998, intoxicados por inalação de monóxido de carbono; 5- Apesar da prévia notificação dos proprietários de tal «Quinta» de que era proibida essa instalação; 6- Inexistiu qualquer responsabilidade do réu EP por violação [omissão] de deveres e poderes de fiscalização; 7- No DL nº169/97, de 04.07, o legislador expressamente previu a inexistência legal de circunstâncias de tempo ou lugar que devem determinar a realização de inspecções, o que significa que é a própria Administração que tem o poder para, em concreto, decidir quanto à oportunidade e ao momento da realização dessa fiscalização; 8- Na, douta sentença recorrida nada é referido quanto à data da instalação do esquentador, pelo que irrelevante se mostra a existência ou não de qualquer acção de fiscalização; 9- É manifestamente insuficiente para se concluir pela responsabilidade do réu EP, e proceder à sua condenação, como foi feito, o mero apuramento factual da inexistência de acção ou acções e fiscalização, desacompanhada de quaisquer outros relevantes elementos de prova; 10- Só há responsabilidade civil por factos ilícitos quando estão provados - cumulativamente - os pressupostos dessa responsabilidade, quais sejam o facto, a ilicitude, a culpa, a existência de um dano, e o nexo de causalidade entre a conduta e o dano; 11- Para que haja responsabilização da Administração por danos materiais e morais resultantes de actos culposos dos seus agentes, impõe-se que haja negligência destes, traduzida em acção ou omissão imputável ao exercício da função pública; 12- Não foi violado o disposto no artigo 6º do DL nº48051, 21.11.1967, o qual estatui: «É ilícito o acto que viole normas legais e regulamentares ou princípios gerais aplicáveis, bem como aquele que viole as regras de ordem técnica e de prudência comum»; 13- Da actuação dos agentes do réu EP não transparece culpa funcional, uma vez que a mesma se insere dentro dos parâmetros porque se deve pautar o exercício da sua função e da diligência exigível segundo critérios de normalidade; 14- Não há nexo de causalidade entre a «não fiscalização» e o dano ou resultado: a morte da F………. e do G……….; antes a causa adequada à morte de ambos foi a conduta de terceiros, no caso os donos da Quinta ………… - a instalação e manutenção do esquentador na casa de banho das instalações onde os mesmos pernoitaram; 15- O agente só deverá responder pelos resultados para cuja produção a sua conduta era adequada e não por aqueles para os quais, tal conduta, de acordo com a sua natureza geral e o curso normal das coisas, não era apta para produzir e só se produziram em virtude de uma circunstância extraordinária; 16- A sentença recorrida é nula, padecendo de erro de fundamentação, erro de julgamento e falta de motivação, violando, por isso, o disposto no artigo 615º, nº1, do CPC; 17- Pelo que não deve o réu EP ser condenado ao pagamento seja de que importância for, a título de indemnização aos ora autores; 18- Mas mesmo que assim não se entenda, o que apenas se admite por mera cautela, sempre se dirá que quanto aos alegados danos sofridos, face à factualidade dada como assente, o montante em que o réu EP foi condenado mostra-se excessivo; 19- Tal montante deverá ser fixado equitativamente, segundo o prudente arbítrio do julgador, que deverá levar em conta a responsabilidade dos donos da Quinta ………., a situação económica de lesante e lesado, bem como outras circunstâncias que relevem no caso; 20- «In casu» manifestamente se mostra excessivo - face a todos os critérios jurisprudenciais existentes - o montante atribuído a ser pago, solidariamente, aos familiares dos «de cujus»; 21- Pelo exposto, deverão Vossas Excelências, Colendos Conselheiros, substituir a, aliás douta, sentença recorrida, por outra que absolva o réu EP.

    1. Por seu lado, A…………. e sua mulher, B……………, autores da acção declarativa de condenação, vieram interpor recurso subordinado da sentença proferida pelo TAC, em 05.12.2013, na parte em que ela lhes foi desfavorável.

      Concluem assim as suas alegações: 1- Os recorrentes deduziram um pedido de condenação dos réus no pagamento da quantia de 150.000,00€ acrescida dos juros à taxa legal; 2- A douta sentença recorrida condenou os réus no pagamento da quantia de 125.000,00€ como indemnização por esses danos, desdobrando esse valor em 75.000,00€ pela perda do direito à vida e 50.000,00€ pelos danos morais sofridos pelos recorrentes em consequência da morte da filha; 3- A douta sentença recorrida considerou que, como os recorrentes, nas alegações dos factos, referiram o valor dos danos morais por si sofridos em 50.000,00€, que não podia condenar em mais; 4- A falecida F………….. era, à data da sua morte, uma jovem de 24 anos, alegre, saudável, estudante universitária e que tinha um futuro à sua frente; 5- Atentos estes factos, o valor de indemnização pela perda do direito à vida não deve ser inferior a 100.000,00€; 6- Se assim não se entender - o que só se admite por cautela - e mesmo que se considere os 75.000,00€ por essa indemnização, deveriam os réus ter sido condenados a pagar 150.000,00€. Assim seria considerado o valor de 37.500,00€ como indemnização a cada um dos réus pelos danos morais por si sofridos com a perda da filha; 7- Aliás, foi esse o valor fixado para a ré C…………., como indemnização por esse dano, pelo que não há razão para ser um valor diferente; 8- O pedido que os recorrentes formularam foi um pedido global de 150.000,00€ acrescido dos juros à taxa legal desde a citação; 9- Os limites da condenação contidos no artigo 661º nº1 [actual artigo 609º do CPC], têm de ser entendidos como referidos ao valor do pedido global e não aos valores parcelares em que ele se desdobra; 10- O valor do pedido além dos 150.000,00€, incluía também os juros desde a citação. A acção entrou em 2003, pelo que, se se considerarem os juros à taxa legal de apenas 4%, o valor desses juros será de 60.000,00€. Somando esta quantia aos 150.000,00€ temos o valor global do pedido de 210.000,00€; 11- Considerando o valor global de 210.000,00€ o valor da condenação dos réus deve ser de 180.000,00€, correspondente a 100.000,00€ do direito à vida e de 40.000,00€ pelos danos morais a cada um dos cônjuges; 12- Assim, se se considerar o valor global do pedido formulado pelos recorrentes, como sendo apenas de 150.000,00€ [sem considerar os juros] devia a douta sentença ter condenado os réus no pagamento da quantia de 150.000,00€ pelas razões alegadas.

      Terminam pedindo que a sentença recorrida seja alterada na parte pertinente, condenando-se os réus a pagar-lhes a quantia de 180.000,00€, ou, assim não se entendendo, 150.000,00€.

    2. O recorrido D……………. contra-alegou o recurso subordinado, e retirou as seguintes conclusões: 1- Os recorrentes não questionaram os factos dados como provados e só põem em causa os montantes que lhes foram arbitrados a título de indemnização pretendendo agora que, em vez do montante fixado como indemnização pela perda do direito à vida deveria ser elevado de 75.000,00€ para 100.000,00€ dando assim total satisfação ao valor solicitado na petição inicial; 2- Os montantes fixados pelo tribunal «a quo» enquadram-se nos limites da lei e a decisão seguiu os critérios que têm sido seguidos pelo STJ para casos similares; 3- Pretendem também os recorrentes que o montante que foi fixado para ressarcimento dos danos morais por eles sofridos seja alterado de 50.000,00 para a verba de 80.000,00€; 4- Todavia este pedido é dificilmente entendível porquanto o montante que foi atribuído aos recorrentes para compensação dos seus danos não patrimoniais corresponde à satisfação integral do que foi reclamado na petição inicial como se pode verificar do teor do artigo 62º da petição inicial: «E os danos não patrimoniais dos autores A………….. e B…………, pais da F…………, devem ser compensados com quantia não inferior a 50.000,00€; 5- Ora se os recorrentes viram integralmente satisfeito o seu pedido não podem agora reclamar uma outra quantia superior e o argumento que esgrimem de ter sido atribuída a indemnização de 37.500,00€ a C……………. pela compensação dos danos morais sofridos com a morte da filha não faz qualquer sentido pois foram os próprios recorrentes que...

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