Acórdão nº 0262/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução14 de Maio de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo por oposição de acórdãos 1. RELATÓRIO 1.1 A…………….. e B………………… (adiante Recorrentes) vieram, ao abrigo do disposto no art. 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão proferido nestes autos em 16 de Outubro de 2014 pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, invocando oposição com o acórdão do mesmo Tribunal e Secção, de 10 de Julho de 2014, proferido no processo n.º 7606/14, quanto à questão do direito de audiência prévia à derrogação do sigilo bancário por decisão administrativa, e com o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte, de 13 de Fevereiro de 2014, proferido no processo n.º 492/13.8BEVIS, quanto à questão da falta de fundamentação prevista no n.º 4 do art. 63.º-B da Lei Geral Tributária (LGT).

1.2 Admitido o recurso, o Juiz Desembargador Relator no Tribunal Central Administrativo Sul, em face das alegações produzidas ao abrigo do disposto no art. 284.º, n.º 3, do CPPT, entendeu verificada a oposição de acórdãos e ordenou a notificação das partes para alegarem nos termos do n.º 5 do mesmo artigo.

1.3 Os Recorrentes apresentaram, então, alegações sobre o mérito do recurso, que resumiram em conclusões do seguinte teor: «1. O Acórdão recorrido encontra-se em oposição ao Acórdão do TCA do Sul, proferido no processo n.º 07606/14, de 10/07/2014, pois entende que, no caso de acesso à informação e documentos bancários de um contribuinte, se encontra dispensada a respectiva audiência prévia 2. O Acórdão recorrido encontra-se em oposição ao Acórdão do TCA do Norte, proferido no processo n.º 00492/13.8BEVIS, de 13/2/2014, já que defende que a determinação presumida de capital, pela aplicação de uma taxa “implícita” de juro, isto é, de referência, uma “hipótese” ou um exemplo, de 4%, aos juros percepcionados, cumpre o dever de fundamentação previsto no n.º 4 do art. 63.º-B da LGT, para considerar a existência de indícios da existência de acréscimos de património não justificados, nos termos da al. f) do n.º 1 do art. 87.º da LGT.

3. Não é claro, nem evidente que o objectivo do legislador ao aprovar a Lei n.º 94/2009, de 1 de Setembro, fosse o de eliminar o direito de audiência prévia do contribuinte nas situações de derrogação do sigilo bancário.

4. A audiência prévia do contribuinte à derrogação do sigilo bancário é exigida pelos princípios da colaboração e proporcionalidade (arts. 55.º e 59.º da LGT).

5. A audição do contribuinte prévia à derrogação do sigilo bancário, permite a que o mesmo conheça a fundamentação de facto e de direito da AT para a proposta de decisão, e que caso reconheça razão à AT, possa fornecer-lhe elementos que esclareçam a situação e que evitem o sacrifício do direito à intimidade privada.

6. Só com o reconhecimento do direito de audição prévia do contribuinte no caso de derrogação do sigilo bancário é possível conciliar-se, em matéria tributária, o direito à intimidade tributária com o direito do Estado à arrecadação de receitas para realização das actividades a que se propõe.

7. E inexistem motivos de celeridade que justifiquem a dispensa de audiência prévia do contribuinte antes da decisão de derrogação do sigilo bancário, pois o direito de audição é efectuado num prazo muito curto que vai de 15 a 25 dias.

8. Também a preservação de prova não justifica a dispensa de audiência prévia do contribuinte, pois a mesma encontra-se na posse de terceiros que o contribuinte não controla ou domina – instituições bancárias.

9. Logo o Acórdão recorrido deve ser anulado pela aceitação da não concessão de audiência prévia do contribuinte nos casos de derrogação do sigilo bancário.

10. O acórdão recorrido andou mal ao assumir que a presunção de capital, pela aplicação de uma taxa “implícita” de juro, isto é, de referência, uma “hipótese” ou um exemplo, de 4%, aos juros percepcionados, cumpre o dever de fundamentação previsto no n.º 4 do art. 63.º-B da LGT, para considerar a existência de indícios da existência de acréscimos de património não justificados, nos termos da al. f) do n.º 1 do art. 87.º da LGT 11.Tal visão viola o dever de fundamentação nas vertentes formal e substantiva.

12. Do ponto de vista formal a AT não justifica como chega à taxa de 4%. Refere que utiliza essa taxa como exemplo, porém fica por perceber porque motivo foi utilizado o exemplo de 4% e não 3%, ou 5%, ou qualquer outro. A AT não justifica sequer porque motivo utiliza essa taxa exemplo para 2010 e para 2011.

13. A fundamentação para a presunção de capital, pela aplicação de uma taxa “implícita” de juro não é congruente, nem lógica, mas especulada, sem qualquer justificação para o exercício especulativo prosseguido.

14. A existência de uma variação dos juros bancários percepcionados por um sujeito passivo não pode considerar-se indício da existência de acréscimo de património não justificado.

15. Se mediante um facto conhecido (montante de juros obtido) for utilizado um elemento aleatório (uma taxa de 4% ou de qualquer outro valor) para se obter o valor do capital, não chegamos a um indício do capital investido, mas a uma mera especulação, uma mera hipótese de capital como qualquer outra.

16. Aí temos a violação do dever de fundamentação substancial.

17. Um aumento dos juros bancários recebidos não significa desde logo, à partida um aumento do capital investido.

18. Um aumento dos juros recebidos pode ter várias causas: aumento das taxas de juro; diferente período de maturidade do depósito; alteração do depósito contratado; pagamento de juros postecipados; etc.

19. A variação do valor absoluto de juros pagos não permite a conclusão, firme, segura e sólida de que houve aumento do capital investido.

20. Se apenas se conhece o valor dos juros anuais, para se chegar ao capital investido é necessário atender a vários factores, tais como: taxa de juro, condições de determinação da taxa de juro (fixa, crescente, etc.), período de depósito do capital, momento da maturidade do depósito; condições do pagamento de juros (ex. postecipados, periódico, capitalizados, etc.); cumprimento do prazo e condições de depósito, para ter direito ao pagamento do valor de juro acordado juros; tipo de produto associado ao depósito bancário (cross selling, etc).

21. Se apenas forem conhecidos os valores de juros anuais, a tentativa de determinar capital investido será meramente especulativa e aleatória, mesmo usando os dados da AT.

22. Veja-se o seguinte exemplo: Juros anuais ano 1 – 2.500,00 €; Juros anuais ano 2 – 6.600,00 €; Taxa de juro: 4%. Qual o capital investido? A AT diria que o capital investido no ano 1 foi de 62.500,00 € (2.500,00 €/4%) e de que no ano 2 foi de 165.000,00 € (6.600,00 €). Logo, caso o beneficiário tivesse declarado rendimentos líquidos de valor inferior a 102.500,00 €, haveria um acréscimo de património não justificado e estava legitimada a inverter o ónus da prova contra o contribuinte, nos termos da al. f) do n.º 1 do art. 87.º e do art. 89.º-A da LGT. Porém bastava que o depósito tivesse sido contratado em 1 de Setembro do ano 1 e se tivesse mantido os 12 meses do ano 2 para se chegar a um resultado totalmente diverso. Como no ano 1 o empréstimo apenas durou 1/3 do ano e no ano 2 o ano completo, poderia o capital investido ser de 187.500,00 € [(2.500,00 € / 4%) * 12 / 4)] no ano 1 e de 165.000,00 € no ano 2! Nesse caso não haveria incremento mas redução do capital investido.

23. O Acórdão recorrido deve assim ser anulado por vício de fundamentação formal e substancial».

1.4 A Fazenda Pública (a seguir Recorrida) contra alegou, resumindo a sua posição em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.

): «1. Inconformados com a decisão proferida nos presentes autos de derrogação de sigilo bancário, prevista no art. 63.º-B da Lei Geral Tributária (LGT), proferida no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 16 de Outubro de 2014, A…………… e B……………., ora Recorrentes, interpuseram o presente recurso com fundamento em oposição de acórdãos.

2. Considerando que o decidido naquele Acórdão contraria a doutrina dos Acórdãos de 10/7/2014 do TCA Sul (processo n.º 7606/14) e de 13/02/2014 do TCA Norte (processo n.º 492/13.8BEVIS) quanto às seguintes questões: 2.1. saber se após a entrada em vigor da Lei n.º 94/2009 e a redacção dada ao artigo 63.º-B da LGT deixou de ser exigível que o contribuinte directamente visado no âmbito de um procedimento de derrogação de sigilo bancário seja ouvido nos termos definidos pelo artigo 60.º da LGT; bem como 2.2. saber se em sede de fundamentação do despacho de derrogação de sigilo bancário, a taxa de juro exemplificativa determina necessariamente que o mesmo deva ser considerado como não fundamentado do ponto de vista formal.

3. Segundo os Recorrentes, foi decidido nos acórdãos fundamento, quanto à primeira questão (2.1) que aquela audição prévia se impunha (AC. TCAS, processo n.º 7606/14) e, quanto à segunda questão (2.2) que a mera referência à taxa de juro não era bastante para concluir-se pela fundamentação do despacho de derrogação de sigilo bancário (AC. TCAN, proc. 492/13.8BEVIS).

4.

Quanto à questão (2.1) saber se após a entrada em vigor da Lei n.º 94/2009 e a redacção dada ao artigo 63.º-B da LGT deixou de ser exigível que o contribuinte directamente visado no âmbito de um procedimento de derrogação de sigilo bancário seja ouvido nos termos definidos pelo artigo 60.º da LGT.

5. Considera o douto Ac. fundamento que a redacção do artigo 63.º-B da LGT, introduzida pela Lei n.º 94/2009 de 1 Set., eliminou da letra da lei a referência expressa ao exercício do direito de audição quando esteja em causa o acesso a documentação bancária do próprio sujeito passivo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT