Acórdão nº 01529/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GON
Data da Resolução04 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A…………, S.A., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença proferida pelo TAF de Sintra, na parte em que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial por aquela deduzida contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, por sua vez apresentada contra liquidação de IRC do ano de 2008, ou seja, na parte relativa à improcedência dos juros indemnizatórios peticionados.

1.2. Termina as alegações formulando as Conclusões seguintes: A. A impugnação judicial já foi deferida com fundamento na inconstitucionalidade da norma do artigo 5.°, n.º 1 da Lei n.º 64/2008, de 5 de dezembro.

  1. São devidos juros indemnizatórios quando se apurou que houve erro imputável aos serviços e o tal erro de direito persiste de forma igual, independentemente se se trata de um ato de liquidação praticado pela Administração Tributária ou um ato de autoliquidação praticado pelo próprio contribuinte.

  2. Ou seja, nem a circunstância de estar em causa nos autos um ato de autoliquidação constitui um óbice ao pagamento daqueles juros ao abrigo do preceituado no artigo 43.°, da LGT, nem tão-pouco poderá sustentar-se a inexistência de erro imputável aos serviços com fundamento na adstrição da Administração Tributária ao cumprimento da lei e no facto de estar na base da ilegalidade do ato de autoliquidação impugnado a inconstitucionalidade material de uma norma.

  3. A este respeito pronunciou-se já por diversas vezes este Supremo Tribunal no sentido de o dever de obediência da Administração Tributária à lei compreender todas as fontes normativas (de quanto resulta um dever de obediência, prima facie, à CRP, enquanto Lei Fundamental do Estado) e de o direito do contribuinte a juros indemnizatórios, atenta a função reparadora dos mesmos em face de uma atuação ilegal da Administração Tributária, estar dependente apenas da existência de um comportamento ilegal por parte da Administração Tributária de quanto resultem prejuízos para o contribuinte, como sucedeu no caso sub judice.

  4. Desta forma, são devidos juros indemnizatórios desde a data do pagamento até à data da emissão da respetiva nota de crédito, o que na presente data perfaz o valor de Euros 10.170,51.

    Termina pedindo o provimento do recurso e a revogação da sentença recorrida, na parte em que decidiu pela improcedência relativa ao pagamento de juros indemnizatórios por parte da recorrida à recorrente.

    1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

    1.4. O MP emite Parecer nos termos seguintes, além do mais: «(…) Ora, no caso concreto dos autos estamos perante uma autoliquidação, caso em que tanto a matéria tributável como a liquidação são realizadas pelo próprio contribuinte, pelo que estará afastada a possibilidade de imputação do erro aos serviços, a não ser nos casos em que a liquidação for efectuada com base em orientações genéricas da administração tributária (n.º 2 do artigo 43° da LGT), o que não ocorreu no caso concreto.

    Todavia o artigo 100° da LGT acolhe uma previsão ampla da obrigação do pagamento de juros indemnizatórios, na medida em que impõe o seu pagamento em «... caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade...» (Redacção da Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro).

    E sendo certo que no caso dos autos estejamos perante uma autoliquidação, certo é que o recorrente apresentou reclamação graciosa e a AT não reconheceu a ilegalidade da liquidação com base no vício de inconstitucionalidade da norma aplicada, vício este que veio a ser reconhecido em sede de impugnação judicial pelo tribunal.

    Daí que se nos afigure que a partir do momento da pronúncia pela AT sobre a autoliquidação, esta assumiu como seu o acto tributário e não só é condição da sua impugnação contenciosa, como a partir desse momento lhe é imputável o erro de direito decorrente do vício de inconstitucionalidade suscitado pelo sujeito passivo. Ou seja, ao não dar provimento à reclamação e manter dessa forma a ilegalidade do acto tributário, a administração tributária constitui-se em responsabilidade extracontratual a partir desse momento e que é fundamento da obrigação indemnizatória.

    Com efeito, a obediência que a AT deve à lei, tanto se reporta à lei ordinária, como à Constituição ou ao Direito Internacional a que o estado português se tenha vinculado (cfr. a este propósito os acórdãos do STA de 05/06/2002 e de 09/10/2002, recursos n.ºs 0392/02 e 0789/02, respectivamente).

    E assim sendo, afigura-se-nos que há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios ao abrigo do disposto na alínea c) do n° 3 do artigo 43° da LGT, aplicável extensivamente a este caso.

    Decorre da sentença recorrida que a recorrente aplicou a taxa de 10% referente aos casos de tributação autónoma durante todo o período de 2008, o que só deve ocorrer no mês de Dezembro de 2008, donde resulta um excesso de tributação que a recorrente quantifica no montante de C 48.036,18 euros ((1) Tendo sido sujeito a tributação autónoma o valor de 1.027.810,90 euros, a que aplicou a taxa de 10%, apurando o valor de 102.781,09 euros, entende a recorrente que se aplicasse a taxa de 5% no período de Janeiro a Novembro de 2008, o valor apurado seria apenas de 54.744,91 euros, pelo que não seria devido o montante de 48.036,18 euros, cuja restituição reclama.

    ) Sucede que na sentença recorrida não foi dado como assente se na autoliquidação foi ou não apurado imposto a pagar e no caso afirmativo se o mesmo foi liquidado, pois só neste caso é que releva a eventual restituição do montante de 48.036,18 euros que a recorrente pretendia da administração tributária e que no seu entender corresponde à diferença entre o resultado da aplicação no período de Janeiro a Novembro de 2008 da taxa de 10% fixada na Lei n° 64/2008, de 5 de Dezembro, em vez da anterior taxa de 5%. Ou seja, só neste caso é que se coloca a questão do pagamento de juros indemnizatórios pela privação desse capital pago em excesso, como decorre do segmento final do n.º 1 do artigo 43° da Lei Geral Tributária, já que os mesmos se destinam a reparar os prejuízos advindos ao contribuinte do desapossamento e consequente indisponibilidade de um determinado montante pecuniário e que originam aquela obrigação indemnizatória (cfr. a este propósito o acórdão do STA de 02/07/2003, rec. 0388/103).

    E como o STA só conhece de direito, verifica-se a necessidade de ampliação da matéria de facto, de forma a apurar-se qual foi o montante das tributações autónomas liquidado em excesso e se foi apurado imposto a final a pagar e se o mesmo foi ou não pago (ou se havia imposto a restituir).

    Em face do exposto afigura-se-nos que a sentença recorrida fez uma incorrecta apreciação e aplicação de lei, motivo pelo qual se impõe a sua revogação na parte objecto de recurso, devendo os autos ser remetidos à 1ª instância para efeitos de ampliação da matéria de facto, com vista a apurar se foi ou não pago imposto em excesso e no caso afirmativo reconhecer-se o direito a juros indemnizatórios nos termos e âmbito supra enunciados.» 1.5. Corridos os...

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