Acórdão nº 01546/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução20 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

I - RELATÓRIO 1_A……………, interpôs recurso jurisdicional para o STA, ao abrigo do art. 150º do CPTA, do acórdão proferido no TCAS, em 10 de Julho de 2014, que concedeu provimento ao recurso interposto pela Ordem dos Advogados do acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, proferido em 30/04/2013 no âmbito da ação administrativa especial por ele instaurada, que julgou a ação procedente, declarou a nulidade do ato impugnado e revogou aquela decisão julgando a acção improcedente, mantendo o ato recorrido na ordem jurídica.

Efetivamente o Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada entendeu que, apesar de não procederem as questões de prescrição do procedimento disciplinar, caducidade e demais vícios era de proceder o vício de violação do direito de defesa por omissão de produção de prova e falta de apreciação crítica da prova produzida pelo que declarou a ação procedente e declarou a nulidade do ato que aplicara ao autor a pena disciplinar de suspensão.

  1. A Ordem dos Advogados interpôs recurso para o TCAS com fundamento na não ocorrência do vício de violação de lei, tendo este revogado a decisão de 1ª instância e julgado improcedente a ação mantendo o ato recorrido.

    O autor e aqui recorrente conclui as suas alegações da seguinte forma: “1- A remessa de oficio de notificação, ao mandatário, para morada diferente da comunicada aos autos, consubstancia falta de notificação.

    2- A falta de notificação, para se pronunciar em matéria susceptível de influir na decisão jurídica da causa, constitui nulidade processual de acordo com o art° 195°, n° 1 do Código de Processo Civil.

    3- Foi ao recorrente violado o direito de se pronunciar nos termos do n.° 2 do art.° 146 do CPTA.

    4- A prescrição é de conhecimento oficioso, nos termos do n.° 5 do art.° 112, do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei n.°15/2005, de 26 de Janeiro de 2005, com as alterações introduzidas pela Lei n.° 12/2010, de 25 de Junho.

    5- Pronunciando-se o Ministério Público, nos termos do n.° 1 do art.° 146, pela prescrição do procedimento disciplinar, impunha-se ao tribunal uma resposta.

    6- Não tomando conhecimento da prescrição o Acórdão está ferido de nulidade por omissão de pronúncia.

    7- O Acórdão não realizou uma apreciação crítica da prova, não sendo possível sindicar o raciocínio que permitiu dar como provados os factos.

    8- Ocorreu a violação do princípio da presunção de inocência, ao dar como provados todos os factos porque o arguido, em sede disciplinar, não os impugnou ou apresentou prova contraditória.

    9- Estão reunidas as condições de admissão do recurso de revista, necessário a uma melhor aplicação do Direito, em virtude da violação das garantias de defesa do arguido.

    3- A Ordem dos Advogados conclui as suas alegações da seguinte forma: “A. Não se encontram preenchidos os pressupostos para que o recurso em causa possa ser admitido, uma vez que não está em causa a apreciação de uma questão que pela sua relevância jurídica ou social se revista de importância fundamental e, por outro lado, a admissão do recurso não se torna claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, nos termos do disposto no artigo 150.°, n.° 1, do CPTA; B. A falta de notificação ao mandatário do Recorrido do parecer do MP junto do TCAS não gera nulidade ou irregularidade processual, uma vez que o mesmo conheceu posteriormente do teor de tal peça do processo, sendo ainda certo que a invocada prescrição não poderia ser objecto de conhecimento oficioso, pois que nem era objecto do recurso da OA, nem dela recorreu o ora Recorrente.

    1. Estando em causa prescrição de procedimento disciplinar, a contagem do respectivo prazo terminou com a prolação da decisão disciplinar da OA e, desde então, não retomou o seu curso, na medida em que, sob pena de violação do princípio constitucional da separação de poderes, a OA esteve impedida de exercer tal poder disciplinar (entenda-se, já o tinha exercido).

    2. Estando comprovados nos autos os factos em que assentou a decisão disciplinar punitiva, integradores da infracção, está igualmente demonstrada a culpa do agente, não sendo de convocar aqui o princípio da presunção de inocência, pois que nos autos se demonstraram todos os factos necessários à aplicação da pena disciplinar.

    TERMOS EM QUE, e nos mais de direito aplicáveis: • Deve a presente interposição de recurso de revista ser julgada inadmissível, e, mesmo que assim se não entenda, • deve o presente recurso de revista ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se, consequentemente, na integra, a sentença recorrida, por não merecer qualquer reparo e ter interpretado e aplicado corretamente a Lei aos factos, • O que se requer com todas as consequências Legais.” 4.

    A revista foi admitida por acórdão, de 16.02.2015, da formação deste STA a que alude o nº5 do artº 150º do CPTA, nos termos seguintes:“… 1. (...) Ora, o modo como o acórdão recorrido chegou à conclusão de que a factualidade integrante do acto punitivo está provada no processo disciplinar é de molde a suscitar dúvidas sobre o efectivo entendimento desse princípio e suas implicações em sede de critério de valoração da prova nele professado. Com efeito, embora protestando a aceitação de que no procedimento disciplinar em causa vigora o referido princípio, o acórdão recorrido, assumiu como suficiente para prova de todos os factos imputados ao arguido a participação disciplinar e a prova documental constituída por uma acta do julgamento a que o arguido faltara e uma guia para pagamento das custas dessa acção, ponderando que o arguido não disse o que quer que seja no âmbito do processo, nem procurou demonstrar quaisquer factos que afastassem a ilicitude e a culpa.

    Além disso, o TCA parece ter ido além, em desfavor do arguido, do que a decisão administrativa final – o acórdão do Conselho Superior da Ordem dos Advogados – considerara provado. Com efeito, atendendo em parte à argumentação do arguido na impugnação administrativa, em que questionara a prova dos factos, o Conselho Superior, admitiu que “com os elementos constantes dos autos, não possa ter-se por provado o que consta dos n.ºs 6 (última parte), 7 (última parte), 10 a 14, 15 (primeira parte), 16 (primeira parte) 18 e 19” do acórdão do Conselho de Deontologia de …... Ora, o discurso fundamentador do acórdão parece não ter tido em consideração essa evolução quanto à factualidade imputada ao arguido, “retomando” a coincidência quanto aos factos imputados ao arguido entre queixa, acusação e decisão punitiva, que a própria Ordem dos Advogados abandonara (vid. fls 19 do acórdão, p. ex. a prestação de informação falsa à cliente).

    Perante esta fundamentação – na análise sumária que aqui compete e sem prejuízo de diverso entendimento quanto à natureza e atendibilidade da questão em sede de julgamento – depara-se o tratamento de uma questão jurídica relevante de modo pouco claro ou contraditório, o que justifica a admissão do recurso com fundamento na clara necessidade de melhor aplicação do direito. Para o que releva, ainda, a divergência de resultado a que chegaram as instâncias e a relativa gravidade da medida sancionatória aplicada.” 5.

    O Ministério Público foi notificado, ao abrigo do art. 146º, nº 1, CPTA, não tendo emitido Parecer.

  2. Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

    II-FUNDAMENTOS 1- DE FACTO O acórdão do TCAN deu como provada a seguinte matéria de facto: “A - Em 2004-12-10 foi registada na Ordem dos Advogados, Conselho Distrital de ……, sob o nº ……, a entrada do requerimento subscrito por A…………., datado de 2004-12-06, e dirigido ao Presidente do Conselho de Deontologia que constitui a participação contra o ora A., com o seguinte teor: “… 1 - Em finais do mês de Setembro de 2000 contactei a Drª B………….., para tratar dos assuntos referentes ao meu divórcio.

    2 - Na primeira conferência foi-me dito que o processo demoraria entre 4 a 6 meses.

    3 - Decorrido uma semana realizou-se uma conferência entre nós, na qual o meu marido acordou em fazer o divórcio por mútuo consentimento.

    4 - Como já tinha passado cerca de um ano e o divórcio não era decretado contactei o Senhor Dr. A……………., que se prontificou a tratar do assunto junto da Drª B…………….

    5 - Entretanto fui notificada de um processo cível em que a Drª B…………… me exigia os honorários do divórcio, embora ainda não tivesse sido decretado.

    6 - Contactei o Senhor Dr. A……………. que me disse que eu tinha razão e que iria contestar o pedido, tendo-lhe entregue todos os documentos.

    7 - No dia do julgamento, verifiquei que o meu Advogado não estava presente e não respondi à chamada, embora estivesse no Tribunal.

    8 - O meu marido esteve presente e entrou para a sala.

    9- No dia a seguir contactei o Senhor Dr. A………….. que me disse que estava no Tribunal.

    10 - Porém, a verdade. É que não compareceu ao julgamento, conforme decorre da acta que junto, apesar de me ter dito várias vezes, que tinha estado no Tribunal, conduta que manteria até que lhe exibi a cópia da acta da sentença, desculpando-se neste dia com um Estagiário.

    11 - Nunca mais soube nada, até que há cerca de 15 dias fui contactada pela PSP, que me disse que tinha uma dívida em Tribunal para pagar.

    12 - Dirigi-me de imediato ao Tribunal e aí informar-me que o Advogado foi notificado da sentença e das custas e nada me disse.

    13 - A carta para notificação do pagamento das custas foi enviada para a morada do meu marido, vivendo nós separados.

    14 - Contactado o Sr. Dr. A………….. disse-me que tinha recorrido e estava à espera da marcação da segunda audiência.

    15 - Porém, no Tribunal disseram-me que não há qualquer recurso e o processo está findo.

    16 - Assim sinto-me prejudicada e lesada em 495,20 €, a quantia de 153,32 € referente a custas conforme documento que junto, Esperando que Vª. Exª. tome as medidas que entenda conveniente para resolver este assunto. (...)”, cfr. fls. 1 a 3 do PA.

    B - Esta participação foi acompanhada dos seguintes documentos: - cópia da acta de audiência e julgamento do dia 10 de Dezembro de 2003, da qual consta que...

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