Acórdão nº 0310/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DO CÉU NEVES
Data da Resolução19 de Novembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A A., A………….., técnica de justiça principal, devidamente identificada nos autos, interpôs a presente acção administrativa especial, com vista à impugnação do acórdão proferido em 02 de Dezembro de 2014 pelo Conselho Superior do Ministério Público, que negou provimento ao recurso hierárquico por si intentado, da deliberação tomada em 08/07/2014 pelo Conselho dos Oficiais de Justiça, que aplicou à A. a pena única, por acumulação de oito infracções disciplinares, de suspensão por 30 dias [artº 17º do EDTEP], suspensa na sua execução por 2 anos, por violação repetida do dever geral de prossecução do interesse público e do dever geral de zelo, previstos à data dos factos no artigo 3º nºs 2, alíneas a) e e), 3 e 7 do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas (EDTFP), aprovado pela Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro, com alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 47/2013, de 5 de Abril, e actualmente no artigo 73º, nºs 2, alíneas a) e e), 3 e 7 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada pela Lei nº 35/2014, de 20 de Junho.

* O CSMP contestou, recusando que o acto impugnado sofra das ilegalidades invocadas pela autora e concluindo, a final, pela improcedência da acção.

* Ambas as partes alegaram por escrito, mantendo as posições antes assumidas.

A autora apresentou para o efeito as seguintes conclusões que aqui se reproduzem: a) «O douto acórdão recorrido padece de falta de fundamentação ao deter contradições na apreciação dos factos, pois apesar de parecer tomar em consideração todos os factos dados como provados (falta de funcionários, excesso de serviço, mudanças na distribuição do serviço pelas secções, entre outros), depois deles não retira a conclusão que se impõe – a absolvição da recorrente ou caso assim não se entenda, pelo menos a justificação dos ilícitos aqui em análise.

b) Assim, o douto acórdão recorrido violou os artºs 3º, 17º, 20º e 21º do Estatuto Disciplinar, entendendo-se não existir infracção disciplinar ou quando muito existirem circunstâncias dirimentes da responsabilidade disciplinar que a afastam – além de que nem se pronunciou sobre isso mesmo.

c) Sem prescindir, e caso assim não se entenda, viola o artº 17º e o artº 20º da Lei nº 58/2008, dado que os factos não integram o disposto no primeiro artigo e são violados os critérios de escolha e medida das penas do artº 20º do mesmo diploma».

* Igualmente o CSMP apresentou alegações finais que concluiu da seguinte forma: A. «A impugnada deliberação do Plenário do CSMP de 2 de dezembro de 2014, que negou provimento ao recurso hierárquico necessário interposto pela Autora e confirmou a decisão do COJ de 12 de Setembro de 2014, que lhe aplicou a pena disciplinar de 30 dias de suspensão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, não enferma de nenhum dos vícios que a Autora lhe atribui; B. Desde logo improcede a sua alegação para convencer da existência do vício de omissão de pronúncia, pois no ato impugnado o CSMP pronunciou-se sobre as duas únicas questões que suscitou – a alegada falta de fundamentação e o alegado vício de violação de lei – e não tinha que se pronunciar sobre argumentos aduzidos, factos ou circunstâncias; C. E ainda assim, no ato impugnado o CSMP até se pronunciou também sobre alguns dos argumentos e das circunstâncias que a Autora invocou, para expressamente explicar que poderiam justificar alguns atrasos mas não justificavam aqueles atrasos e a desorganização imputados à Autora a título de culpa que fundamentam a punição; D. De igual modo improcede alegação da Autora no que respeita à pretensa falta de fundamentação do ato impugnado, derivada de não ter acolhido a alegada falta de fundamentação de deliberação do COJ; E. Com efeito, desde logo a decisão do COJ, confirmada pelo ato impugnado, encontra-se devidamente fundamentada, de facto e de direito, pois remete expressamente para o relatório final do processo disciplinar, o qual contém extensa fundamentação, perante a qual um destinatário normal não terá qualquer dificuldade em perceber quais foram as razões de facto e de direito em que se fundamentou a decisão; F. E a própria Autora, perante essa fundamentação exaustiva, com indicação circunstanciada dos factos que consubstanciam as faltas cometidas, bem como da subsunção jurídica que se fez desses factos, com indicação das normas violadas, ficou a perceber perfeitamente quais as razões de facto e de direito por que foi punida, de tal modo que isso mesmo resulta da sua alegação, em que precisamente rebate os fundamentos da decisão, por discordar dos mesmos; G. Por isso, o ato impugnado, ao decidir que a decisão do COJ estava devidamente fundamentada, também não incorreu em qualquer vício, antes fazendo correta interpretação e aplicação das normas que regem sobre o dever de fundamentar e os requisitos da fundamentação do ato administrativo; H. Sendo certo que também o próprio acto impugnado se encontra devidamente fundamentado de facto e de direito, na apreciação que fez das questões suscitadas pela Autora; I. Finalmente também não assiste a razão à Autora para imputar ao ato impugnado o vício de violação de lei, alegadamente derivado de não ter considerado que na decisão do COJ ocorreu esse mesmo vício; J. As circunstâncias indicadas pela Autora não são dirimentes da sua responsabilidade disciplinar, pois não são susceptíveis de enquadramento em nenhuma das alíneas do artigo 21.º do EDTFP, designadamente na alínea b), única a considerar, que prevê a não exigibilidade de conduta diversa; K. Pelo contrário, era exigível à Autora que adoptasse uma conduta diferente daquela que adoptou, pois sobre ela impendia o dever de diligenciar para que não se tivessem verificado aqueles graves atrasos na tramitação dos processos e no tratamento do expediente recebido; L. Concretamente, os factos e omissões da Autora integram, em acumulação de infracções, as oito infracções disciplinares por violação dos deveres gerais de prossecução do interesse público e de zelo, por que foi punida; M. A graduação da pena disciplinar aplicada à Autora fez-se criteriosamente, com observância dos critérios de escolha e medida das penas estabelecidos no artigo 20.º do EDTFP, tendo em conta todas as circunstâncias a considerar, pelo que se mostra adequada, necessária e proporcional à gravidade da conduta e ao grau de culpa da Autora; N. Concretamente, as dificuldades de serviço invocadas pela Autora foram ponderadas, e só por via delas a pena disciplinar foi graduada apenas em 30 dias de suspensão e ainda suspensa na sua execução pelo período de 2 anos; O. Portanto, não ocorreu a invocada violação das normas dos artigos 3º, 17º, 20º e 21º do EDTFP, sendo totalmente improcedente a alegação da Autora nesse sentido; P. E assim, o impugnado acórdão do CSMP, ao confirmar a pena disciplinar de 30 dias de suspensão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos aplicada à Autora pelo COJ, decidiu em conformidade com o direito e não enferma dos vícios que a Autora lhe atribui nem de quaisquer outros que inquinem a sua validade, pelo que deverá ser mantido na ordem jurídica».

* Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.

* 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. MATÉRIA DE FACTO 1. A autora é técnica de justiça principal, tendo exercido funções até ao dia 31 de Agosto de 2014 na 4ª secção dos serviços do Ministério Público de ……………… 2. Em 27 de Junho de 2014, foi elaborado no âmbito de processo disciplinar pela inspectora do Conselho dos Oficiais de Justiça, o relatório final que propôs que à autora fosse aplicada a pena única de 30 dias de suspensão, suspensa na sua execução pelo período de dois anos, nos termos dos artigos 9º, nº 1, al. c) e nº 3, 10º, nº 4 e 17º, todos da Lei nº 58/2008 de 09/09 que aprovou o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que exercem Funções Públicas, aplicável por força do disposto nos artigos 66º, 89º e segs do EFJ – cfr. teor de fls. 350 a 382 do processo instrutor, que aqui se dá por reproduzido.

  1. Consta da acusação, levada ao relatório, a seguinte factualidade: 1ºA arguida A……………… é oficial de justiça com a categoria de Técnica de Justiça Principal, desempenhando funções na 4ª secção dos Serviços do Ministério Público de …………., desde 4 de fevereiro de 2003, inicialmente em regime de interinidade (até 13/01/2008) e desde 14/01/2008 em regime de efetividade – cfr. fls. 86 2º No âmbito das referidas funções e de acordo com o disposto na alínea i) do Mapa I anexo ao Estatuto dos Funcionários de Justiça, aprovado pelo Dec. Lei nº 343/99, de 26/08, compete ao técnico de justiça principal provido em secção de processos dos serviços do Ministério Público: Orientar, coordenar, supervisionar e executar as atividades desenvolvidas na secção, em conformidade com as respetivas atribuições; Desempenhar, no âmbito do inquérito, as funções que competem aos órgãos de polícia criminal; Desempenhar as demais funções conferidas por lei ou por determinação superior.

    3º Enquanto Técnica de Justiça Principal nos referidos Serviços, a arguida praticou os seguintes factos: a) No Inquérito nº. 464/09.7GB………..

    que corre termos na 4ª secção dos Serviços do Ministério Público de ………….., foram praticados atrasos na tramitação do mesmo, da responsabilidade da arguida e que foram os seguintes: 1. O despacho de 17-09-2009 foi cumprido a 25-09-2009 - 8 dias depois; 2. A conclusão de 27-10-2009 foi efetuada cerca de 15 dias depois do termo do prazo; 3. O despacho de 27-10-2009 foi cumprido no 5º dia subsequente; 4. O despacho de 09-02-2010 foi cumprido a 05-03-2010 - decorridos 24 dias; 5. Por despacho de 09-02-2010 foi proferido despacho de acusação e arquivamento, o que implicava a remessa a outro Tribunal para julgamento. No mesmo despacho foi autorizada a devolução dos telemóveis e dinheiro apreendidos.

    O despacho de acusação e arquivamento foi cumprido em 5/03/2010; A arguida juntou...

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