Acórdão nº 01957/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução22 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A UNIVERSIDADE DE COIMBRA interpõe recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou procedente a oposição que A………… deduziu à execução fiscal contra si instaurada para cobrança de dívida proveniente da falta de pagamento de propina respeitante ao ano lectivo de 2003/2004, julgando extinta, por prescrição, a dívida exequenda.

1.1.

Terminou a sua alegação de recurso com as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto pela recorrente Universidade de Coimbra da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra nos autos em epígrafe, sentença que considerou procedente a oposição à execução deduzida pelo oponente A………….. considerando extinto, por prescrição, o crédito exequendo, nos termos do artigo 204º, nº 1, d), do CPPT.

B. O Tribunal a quo julgou incorrectamente a questão suscitada na oposição à execução, relativamente ao início da contagem do prazo da prescrição. Entendeu o Tribunal a quo que «(…) aplicar ao termo inicial do prazo de prescrição do tributo aqui em causa a regra estabelecida para os impostos de obrigação única ou para os impostos periódicos, configura uma analogia legalmente proibida. Deste modo, tal termo inicial apenas pode ser o que resulta da lei geral - art. 306º do Código Civil - segundo o qual o prazo de prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido (...)».

C. Ao não aplicar ao caso em apreço, ainda que subsidiariamente, as regras de contagem do prazo de prescrição previstas no art. 48º da LGT, a decisão recorrida decidiu em sentido oposto a outra decisão proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo, em concreto no acórdão do STA de 8/03/1995, proferido no âmbito do processo nº 018842. Se a decisão recorrida aplica o prazo de prescrição de oito anos, previsto no art. 48º da LGT, à propina reclamada pela exequente nos presentes autos, terá, por maioria de razão, que aplicar as regras de contagem do prazo previstas no mesmo normativo.

D. A aplicação das regras de contagem do prazo previsto no art. 48º da LGT ao caso em apreço não constitui aplicação analógica, mas, maxime, extensiva ou subsidiária.

E. Nas obrigações tributárias decorrentes de impostos periódicos, salvo lei especial, a prescrição começa a correr a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e nos impostos de obrigação única a partir da data em que o facto tributário ocorreu (nº 1 do art. 48º da LGT, na redacção da Lei nº 55-B/2004, de 30/12).

F. A norma do art. 48º da LGT aplicar-se-á em toda a sua extensão, quer quanto ao prazo quer quanto ao modo de contagem do mesmo, à propina reclamada nos presentes autos; e se assim se não entender, terá então a mesma norma que se aplicar extensiva ou subsidiariamente à dívida reclamada nos presentes autos, e não a norma do art. 306º do Código Civil.

G. A decisão recorrida está em manifesta oposição com a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, segundo a qual, no específico campo aduaneiro, o instituto da prescrição das obrigações, à míngua de preceito legal directamente aplicável, será contemplado, subsidiariamente, pelo regime da prescrição das obrigações tributárias em geral; devendo aplicar-se, quanto à contagem do prazo da prescrição, subsidiariamente, as regras plasmadas no art. 48º da LGT e não o regime do Código Civil (V. ac. do STA 8/03/1995, proferido no âmbito do processo nº 018842, disponível em www.dgsj.pt).

H. Deverá a decisão recorrida ser substituída por outra que considere como início da contagem do prazo de prescrição o dia 01/01/2005 e, em sua consequência, deverá julgar-se improcedente a oposição deduzida pelo oponente.

Deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida na parte em que considera aplicável ao caso em apreço o art. 306º do Código Civil para efeitos de contagem do prazo de prescrição da dívida exequenda e proferir-se acórdão considere como início da contagem do prazo de prescrição o dia 01/01/2005, ao abrigo do disposto no art. 48º da LGT e em consequência considere improcedente a oposição deduzida pelo oponente. Assim se fazendo Justiça! 1.2.

Não foram apresentadas contra-alegações.

1.3.

O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de que não se devia tomar conhecimento do recurso, porquanto o acórdão referenciado nas conclusões do recurso tem estrita aplicação à questão da prescrição de obrigações tributárias aduaneiras, não podendo servir de fundamento para sustentar uma “solução oposta” sobre a “mesma questão de direito” no que toca à questão da prescrição de obrigações jurídicas emergentes de propinas.

1.4.

Notificadas as partes do teor desse parecer, veio a Recorrente juntar aos autos certidões de seis sentenças proferidas por diversos tribunais tributários (TAF de Coimbra, Aveiro e Braga), proferidas nos processos nºs 757/12.6BECBR, 26/13.4BEBRC, 38/13.8BEAVR, 256/13.9BEAVR, 755/13.2BEBRG e 767/13.6BEBRG, que, alegadamente, deram solução divergente da adoptada na sentença recorrida à questão da prescrição da obrigação jurídica emergente de propinas.

1.5.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre decidir.

  1. Na sentença recorrida julgaram-se como provados os seguintes factos: A. No dia 24/09/2003, o oponente matriculou-se no curso de licenciatura em Engenharia Eletrotécnica e de Computadores da Universidade de Coimbra, do ano letivo de 2003/2004.

    B. Através da carta datada de 01/07/2012, a Universidade de Coimbra notificou o oponente para pagar a dívida proveniente de propinas e juros respeitante ao curso de Engenharia Eletrotécnica e de Computadores do ano letivo de 2003/2004 – fls.12.

    C. Em 10/08/2012 a Universidade de Coimbra emitiu a Certidão de Dívida nº 2012/20082, de fls. 29 que se dá por integralmente reproduzida, com base na qual foi instaurada contra o oponente a execução fiscal n.2 0736201201010972 – fls. 27.

    D. O oponente foi pessoalmente citado para a execução fiscal no dia 31/08/2012 - fls. 33 e 34.

    3.1.

    O presente recurso foi interposto ao abrigo do regime contido na norma do nº 5 do artigo 280º do CPPT, previsto para os casos em que a decisão recorrida perfilha solução oposta à adoptada em mais de três sentenças de tribunal de igual grau ou à adoptada em decisão de tribunal de hierarquia superior. Trata-se de um recurso ordinário para causas cujo valor não ultrapasse a alçada fixada para os tribunais tributários de 1ª instância, o que impediria, em princípio, o recurso (cfr. o nº 4 do art. 280º na redacção vigente à data da instauração deste processo de oposição, isto é, na redacção anterior à alteração introduzida pela Lei nº 82-B/2014, de 31.12).

    Embora o valor da presente causa não ultrapasse um quarto das alçadas fixadas para os tribunais judiciais de 1ª instância, o recurso será admissível desde que se verifiquem os seguintes requisitos: as decisões em confronto perfilhem «solução oposta» estando em causa o «mesmo fundamento de direito» e ocorra «ausência substancial de regulamentação jurídica». O que pressupõe, naturalmente, uma identidade dos factos subjacentes (que terão de ser essencialmente os mesmos do ponto de vista do seu significado jurídico) e uma identidade do regime jurídico aplicado (ainda que em invólucros legislativos diferentes), pois que sem essa identidade não será possível vislumbrar a emissão de proposições jurídicas opostas sobre a mesma questão fundamental de direito, nem se poderá atingir o fim visado com este tipo de recurso, que é o de assegurar o valor da igualdade na aplicação do direito.

    Tal recurso segue a tramitação dos recursos previstos no artigo 280º do CPPT, com a disciplina constante dos artigos 281º e 282º desse diploma legal, e não a tramitação prevista no artigo 284º do CPPT, pelo que nele não há, após o despacho de admissão do recurso, uma fase processual de alegações tendentes a demonstrar a existência da oposição de julgados seguida de despacho judicial de apreciação sobre a existência dessa oposição.

    Ao recorrente basta, pois, afirmar, no requerimento de interposição do recurso e com vista a vê-lo admitido, que interpõe o recurso ao abrigo da norma contida no nº 5 do artigo 280º, evocando a existência de arestos que suportam a oposição de julgados que o preceito desenha e define, de forma a viabilizar a pronúncia judicial sobre a admissibilidade legal do recurso, sendo que, no caso de não proceder imediatamente à junção de cópia desses arestos, deve o Juiz convidá-lo a fazê-lo antes da pronúncia judicial sobre a admissibilidade do recurso.

    Pelo que, uma vez proferido despacho de admissão do recurso nos termos indicados e requeridos, o recorrente não está obrigado a retomar essa matéria da admissibilidade do recurso nas alegações e conclusões do recurso que posteriormente tem de apresentar nos termos previstos no nº 3 do artigo 282º do CPPT. Razão por que, ao contrário da posição sustentada pelo Ministério Público, este Tribunal não pode recusar o conhecimento do recurso com fundamento no teor das conclusões do recorrente, particularmente por estas se cingirem a referenciar um acórdão do STA sobre a questão da prescrição de obrigações tributárias aduaneiras e que não pode servir de fundamento para sustentar uma oposição de julgados com a decisão recorrida.

    Todavia, dado que a decisão de admissão do recurso não vincula o tribunal superior, importa aferir se efectivamente existe a invocada oposição de julgados, tendo em conta que entretanto a recorrente juntou aos autos certidões de seis sentenças proferidas por diversos tribunais tributários de 1ª instância.

    A sentença recorrida, depois de ter concluído que a propina constituía uma taxa sujeito ao regime de prescrição contido nos artigos 48º e 49º da LGT, julgou que, não obstante, tais normas não podiam ter aplicação no que se refere ao termo inicial do prazo de prescrição da propina, por se referirem, tão só, a...

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