Acórdão nº 0747/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GONÇALVES
Data da Resolução22 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública recorre da decisão que, proferida no TAF de Loulé, julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade A………., S.A., com os demais sinais dos autos, contra as liquidações adicionais de IVA referentes aos meses de Março a Outubro de 2011, no montante total de 159.381,55 Euros, bem como as liquidações relativas aos respectivos juros compensatórios, estas no montante total de 4.198,11 Euros.

1.2. Alega e termina com a formulação das conclusões seguintes:

  1. A questão decidenda é aferir se o acesso ao green integra, ou não, o conceito de espectáculo, prova desportiva, manifestação desportiva ou divertimento público, para aferir qual a taxa de IVA aplicável; b) Na redacção inicial do Código, a Lista I incluía a verba 2.13, que correspondia à então Verba 3.13 da Lista II anexa ao CIVA, que previa a sujeição à taxa reduzida os bilhetes de entradas para espectáculos de ópera, ballet, concerto, teatro, circo, revista, sessões de cinema e bilhetes de entrada para espectáculos e manifestações desportivas; c) A AT, então DGCI, entendia que tal verba incluía não apenas os bilhetes de ingresso naqueles espectáculos mas igualmente a utilização de instalações destinadas à prática desportiva e a espectáculos ou outros divertimentos públicos (Cfr. Ofício Circulado n° 30088, de 2006/01/19); d) Aderindo a este entendimento, o legislador alterou a letra da verba que passou a ter a numeração 2.15 destinando a taxa reduzida a espectáculos, provas e manifestações desportivas, prática de actividades físicas e desportivas e outros divertimentos públicos com as excepções ali previstas, não aplicáveis ao caso concreto; e) Assim, indubitável se torna que, com esta redacção da verba 2.15 à Lista I do CIVA, os “green fees” se encontravam sujeitos à taxa reduzida (então 5%); f) Acontece que, com o OE para 2011, a verba 2.15 sofreu nova alteração passando a prever a sujeição à taxa reduzida a espectáculos, provas e manifestações desportivas e outros divertimentos públicos com as mesmas excepções não aplicáveis in casu, vindo a ser revogada na íntegra a expressão “prática de actividades físicas e desportivas” com a entrada em vigor do OE para 2012; g) O entendimento da impugnante é que os “green fees” são devidos pela participação numa prova desportiva, porque o golfe é um desporto auto regulado que pressupõe que os praticantes tenham conhecimento das regras específicas e internacionais e capacidade técnica comprovada através de certificado sendo que um jogador não federado não pode ter acesso a um campo de golfe; h) Esse entendimento que também foi corroborado pelo Mm.° Juiz “a quo” não tem qualquer suporte legal, porquanto, i) Conforme dispõe o art.° 9º n° 2 do CC, não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso sendo que na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (n.° 3 do citado art.); j) A questão que importa sim dirimir é se os “green fees” são pagamentos devidos pela participação em provas desportivas ou pela prática de actividades desportivas, para saber se estamos perante sujeição à taxa reduzida de IVA ou à taxa normal; k) Das consultas efectuadas através do motor de busca Google e da Wikipédia resulta que o “green fee” é um pagamento devido pela utilização do campo para jogar, ou seja, para praticar golfe e não, como entendeu a ora recorrida, para fazer parte de uma prova desportiva; l) O facto dos jogadores/clientes dos campos de golfe terem de dominar as regras do jogo e possuírem um certificado específico não confere à prática do desporto a classificação de prova desportiva; m) Além disso, existem outros desportos (ex: a equitação, o mergulho, o xadrez, entre outros) que exigem certificados para a sua prática e, quanto ao conhecimento das regras do jogo, é condição sine qua non da prática de qualquer desporto seja ele qual for; n) Na verdade, o que distingue a “prova” ou “manifestação desportiva” da “prática desportiva” é o carácter de competição e a existência de uma entidade terceira que julgue, aprecie ou classifique os competidores e ateste o cumprimento das regras como árbitros, fiscais, juízes ou outros. Provas serão os campeonatos, torneios ou taças ou outros eventos desportivos com idêntica natureza; o) Para os efeitos previstos no Decreto Regulamentar n° 2-A/2005 de 24 de Março, consideram-se provas desportivas as manifestações desportivas realizadas total ou parcialmente na via pública com carácter de competição ou classificação entre os participantes, consoante se trate duma prova ou da simples prática desportiva; p) Assim sendo, os “green fees” são pagamentos devidos pela prática duma actividade desportiva, que é jogar golfe, e como tal face à redacção aplicável aos factos da verba 2.15 da Lista I anexa ao CIVA, estas prestações de serviços estão sujeitos à taxa normal de IVA; q) Nem o facto da interpretação da AT ter sido outra no passado com outras redacções da verba ora em análise obriga à manutenção da mesma face às alterações legislativas entretanto ocorridas; r) O entendimento da AT sobre a interpretação de normas tributárias não é estanque nem imutável no tempo, adequa-se às alterações legislativas ocorridas e, mesmo perante a mesma letra da lei, pode o entendimento ser alterado, salvaguardando-se os efeitos já produzidos quanto aos contribuintes a quem tais interpretações se destinam, mas podendo vir a ser alterados ex tunc; s) As normas comunitárias não têm aplicabilidade directa no ordenamento jurídico português, ou seja, os Estados Membros têm a possibilidade de transposição ou não duma Directiva de IVA, caso o não façam daí não se retira que haja violação do primado do direito comunitário sobre as normas internas do CIVA; t) A interpretação do pensamento do legislador ao suprimir do texto legal em 2011, a expressão “prática de actividades físicas e desportivas” tem de ser relevada e conjugada com o próprio conceito de “provas e manifestações desportivas”, para se descortinar se a prática do golfe cabe neste dois últimos conceitos; u) Aqueles dois conceitos pressupõem a competição em campeonatos, torneios ou taças ou outros eventos desportivos com idêntica natureza e os “green fees” são pagamentos devidos apenas pela prática de actividades desportivas; v) Segundo a douta sentença recorrida é entendimento da FP que a interpretação correcta da verba 2.15 da Lista I anexa ao CIVA (Lei n° 55-A/2010, 31/12) com a supressão pelo legislador da expressão “prática de actividades físicas e desportivas” é integrar as “provas e manifestações desportivas” apenas às entradas ou bilhetes de ingresso pagos pelos espectadores para tais eventos e já não às quantias pagas pelos praticantes para usufruírem de instalações desportivas; w) A douta sentença ao decidir, como decidiu, incorreu em erro de julgamento por violação do disposto no art. 18° do CIVA e verba 2.15 à Lista I do CIVA e art. 9º n° 2 do CC; Termina pedindo o provimento do recurso, com a consequente revogação da sentença recorrida.

    1.3. Contra-alegou a recorrida, tendo formulado, a final, as Conclusões seguintes: A - A questão controvertida nos presentes autos prende-se com a questão de saber qual a taxa de IVA aplicável aos green fees ou seja, se os mesmos devem ser enquadrados no conceito de «provas e manifestações desportivas», pelo que devem ser tributados, à taxa reduzida de IVA nos termos da Verba 2.15 da Lista I anexa ao CIVA ou, se se enquadram no conceito de “prática de actividades físicas e desportivas” pelo que, aquela tributação reduzida deve ser corrigida para a taxa normal.

    B - Para decisão da situação em concreto, torna-se necessário proceder à interpretação das normas vertidas no Código do IVA, nomeadamente a alínea a) do n° 1 do artigo 18° do CIVA e a verba 2.15 da Lista I anexa ao CIVA, na redacção da Lei n° 55-A/2010, de 31 de Dezembro.

    C - A Interpretação de normas jurídicas é uma técnica jurídica cujas regras decorrem do art. 9º do Código Civil e que pretendem fixar o sentido e o alcance da norma.

    D - O artigo 11° da Lei Geral Tributária, estatui que, “na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais da interpretação e aplicação das leis”, que “sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei”.

    E - Existem, assim, os seguintes elementos da interpretação: o literal, através do qual se retira o sentido e alcance segundo a letra da lei e os elementos lógicos através dos quais se retira o espírito da lei, o seu sentido normativo dos quais se elencam o elemento Histórico, o elemento Sistemático e o elemento Teleológico.

    F - Fazendo uma retrospectiva histórica da aplicação da taxa reduzida de IVA aos green fees, verifica-se que desde a...

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