Acórdão nº 0350/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução29 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório - 1 – A…………, S.A., com os sinais dos autos, vem interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista excepcional, ao abrigo do disposto nos artigos 141.º, n.º 1, 142.º, n.º 4 e 150.º do CPTA, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 3 de Outubro de 2013, que concedeu provimento ao recurso interposto pela Autoridade Tributária a Aduaneira da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgara procedente a impugnação por si deduzida contra o acto de indeferimento de reclamação graciosa tendo por objecto acto de liquidação “a posteriori” de ISP relativo ao ano de 2002 e respectivos juros compensatórios no montante de €15.669,30.

A recorrente conclui as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: I. O presente recurso vem interposto do Acórdão proferido a fls. dos autos, pelo Tribunal Central Administrativo Sul, por via o qual esse Tribunal a quo concedeu provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública – ora Recorrida -, da decisão proferida, em sede de primeira instância, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, a qual julgou totalmente procedente, por provada, a Impugnação Judicial quanto ao acto de indeferimento da Reclamação Graciosa do acto de liquidação “a posteriori” interposta pela ora Recorrente.

  1. O aludido Acórdão de fls. dos autos padece de falhas no que à aplicação do Direito concerne, de tal ordem que a admissão do presente Recurso de Revista, e consequente decisão recorrida, se revelam manifestamente necessários para a apreciação de uma questão de primordial importância e para a melhor aplicação do Direito, em cumprimento do disposto no n.º 1, in fine, do artigo 150.º do CPTA.

  2. Na verdade, reveste-se de importância fundamental e da maior relevância jurídica, para a orientação dos tribunais inferiores, saber: (1) Se a prolação de uma “Decisão-surpresa” consubstancia uma nulidade do Acórdão, pela aplicação conjugada dos artigos 123.º e 125.º do CPPT, 95.º do CPTA e 615.º do NCPC, por ser uma irremediável coartação do direito ao contraditório constitucionalmente consagrado no artigo 20.º da CRP; (2) Se o recurso a métodos indirectos para a determinação da base tributável é passível de ser concretizada sem o cumprimento do disposto nos artigos 87.º e seguintes da Lei Geral Tributária (LGT) e sem que ao contribuinte sejam asseguradas as garantias aí legalmente previstas, colidindo assim com todos os princípios constitucionais atinentes à matéria, em concreto os artigos 103.º, 104.º e, no limite, 13.º, todos da Constituição da República Portuguesa (CRP) e, ainda, (3) Se é possível tributar matéria presumida quando se mostra demonstrado a matéria colectável real, pondo-se, assim, em crise todos os princípios constitucionais atinentes à matéria, em concreto os artigos 103.º, 104.º e, no limite, 13.º, todos da CRP.

  3. Por outro lado, a admissão do presente recurso revela-se, igualmente, necessária para uma melhor aplicação do direito. De facto, in casu, o que se verifica é precisamente uma tentativa de efectivar interesses relevantes e de cariz supra-individual, uma vez que o acórdão recorrido contende, essencialmente, com os direitos de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva, equitativa e em que seja assegurado o direito ao contraditório, os quais não só possuem assento constitucional – nos artigos 20.º e 268.º n.º 4 da Constituição da república Portuguesa (CRP) – como assumem carácter de interesse comunitário.

  4. O que esteve em causa no procedimento inspectivo levado a cabo pela Administração Tributária foi a tentativa de ilidir a presunção de veracidade dos documentos contabilísticos da Recorrente. Por outras palavras, do que se tratou, então, foi da ilisão, por parte da referida Administração Tributária, da presunção contida no artigo 75.º da LGT.

  5. Sendo, porém, que, in casu, (1) a Recorrente logrou demonstrar que os erros detectados se tratavam de lapsos materiais; e (2) a recorrente justificou-os documentalmente.

  6. Ou seja, a recorrente logrou impedir que se procedessem às correcções perpetradas pela Administração Tributária, sendo certo que apenas alcançou tal efeito em sede judicial, pois que no procedimento gracioso que lhe antecedeu, aquela entidade desvalorizou, em absoluto, toda a alegação e prova produzida.

  7. O teor do acórdão recorrido, em primeira linha, e desde logo, padece de nulidade, na exacta medida em que consubstancia uma verdadeira “Decisão-surpresa”.

  8. Do texto do Acórdão em crise extrai-se que o douto Tribunal Central Administrativo Sul não só acode à tese da Fazenda pública no sentido de que os citados documentos não justificam as inexactidões encontradas, como também avança uma inesperada tese no sentido de que se tratam aqui de presunções na fixação da base tributável da Recorrente levada a cabo pela Administração Tributária.

  9. ou seja, pese embora a insuficiente fundamentação do Acórdão recorrido depreende-se do teor do mesmo que o Tribunal a quo entende que se está aqui perante a fixação de rendimentos presumidos, sem que a Recorrente haja logrado demonstrar a realidade da sua contabilidade e, assim, impor a tributação segundo rendimentos reais e não presumidos.

  10. TODAVIA, refira-se que, (1) OU SE TRATA AQUI DE UMA QUESTÃO DE ILISÃO DA PRESUNÇÃO DE VERDADE DOS DOCUMENTOS DOS CONTRIBUINTES, (2) OU SE TRATA AQUI DA APLICAÇÃO DE MÉTODOS INDIRECTOS NA FIXAÇÃO DO RENDIMENTO TRIBUTÁVEL.

  11. O que não se admite, porque não se pode admitir, é (i) autuar todo o procedimento administrativo com base em determinados pressupostos, (ii) conceder ao contribuinte a possibilidade de a este responder, (iii) fazer correr um procedimento de Reclamação Graciosa, (iv) decidir-se do mérito do mesmo, (v) deixar correr um processo judicial de impugnação, (vi) decidir-se do mérito do mesmo e, APENAS EM FASE DE RECURSO, (vii) alterarem-se todos os pressupostos que basearam tudo o que lhe antecedeu, vindo assim dar a entender, de forma desprendida, que o que aqui se tratam são presunções de rendimentos.

  12. Ao proceder-se como se procedeu, abriu-se o caminho (proibido) para que o Tribunal de segunda instância baseia a sua argumentação e fundamentação em questão jurídica nunca colocada “na disponibilidade” das partes. Diz-se “na disponibilidade” das partes porque nunca nenhuma delas colocou tal questão em crise, jamais a Administração Tributária...

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