Acórdão nº 01710/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA BENEDITA URBANO
Data da Resolução25 de Setembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.

A., devidamente identificada nos autos, recorreu para este Supremo Tribunal do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), de 31.05.13, invocando para o efeito o n.º 1 do artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

1.1.

A recorrente apresentou alegações, concluindo, na parte que não respeita à questão da admissibilidade do recurso, ao pedido de esclarecimentos (nos termos do art. 669.º, n.

os 1 e 3 do Código de Processo Civil – CPC - ex vi artigo 1.º do CPTA), e à arguição de nulidades, já apreciadas, o seguinte (fls 248 e segs): “(…) iv.

Perante a questão central sub judice – saber se, declarada a existência de causa legítima de inexecução, pelo douto Acórdão recorrido, é o presente processo o meio próprio para fixar a indemnização a que a Recorrente terá direito pela falta de satisfação do direito que lhe assistia à integral repristinação – estão verificados os requisitos da admissibilidade de recurso de revista previstos no n.º 1 do artigo 150.º do CPTA, porquanto, desde logo, se trata de questão que pela sua relevância jurídica ou social se reveste de importância fundamental, porquanto o que verdadeiramente se discute é a concretização do direito à tutela jurisdicional efetiva, previsto no artigo 20.º da CRP e concretizado, no contencioso administrativo, no artigo 268.º, n.º 4, da Constituição, isto é, em que medida é que este direito impede que a parte, em caso de declaração de causa legítima de inexecução, seja obrigada a recorrer a novo processo para fixação de indemnização para compensação desta impossibilidade de dar cumprimento ao aresto anulatório do ato administrativo; v.

Além do mais, face à delimitação do objeto do presente recurso, parece-nos evidente, salvo melhor opinião, que esta questão idealizada em abstrato, reveste-se de um cariz genérico e com relevância suficiente para que se considere preenchido o requisito da clara necessidade de admissão do recurso para uma melhor aplicação do direito, e cuja decisão, salvo o devido respeito, é ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, ainda mais face ao que tem vindo a ser entendimento deste Supremo Tribunal (cfr. Douto Acórdão de 02.06.2010, proferido no âmbito do processo n.º 01541A/03 (…); vi.

O entendimento do douto Acórdão recorrido de que não foi pedida a indemnização e nem é este o meio próprio para a fixar não pode, em nosso entendimento, proceder, dado que, desde logo, o pedido de fixação de indemnização foi efectivamente realizado, quer em sede de réplica, quer na 10.ª conclusão das contra-alegações apresentadas; vii.

Por outro lado, ainda que tal pedido não tivesse sido efetuado, nos termos do artigo 178.º do CPTA, “Quando julgue procedente a invocação da existência de causa legítima de inexecução, o tribunal ordena a notificação da Administração e do requerente para, no prazo de 20 dias, acordarem no montante da indemnização devida pelo facto da inexecução”, sendo, assim, o presente processo executivo o local próprio para a fixação da indemnização requerida; viii.

A consagração da possibilidade de fixação nesta sede entende-se como uma concretização do princípio da tutela jurisdicional efectiva, previsto no artigo 20.º e concretizado, quanto à jurisdição administrativa, no artigo 268.º, n.º 4, da CRP, na medida em que a tutela jurisdicional efetiva não se esgota no direito de acesso aos tribunais, procurando-se, assim, também, que a parte não se tenha que desdobrar em múltiplos processos, com as suas naturais delongas, para ver o seu direito efetivamente reconhecido; ix.

Ora, obrigar a Recorrente a intentar nova ação para ver o seu direito a uma indemnização pela inexecução do acórdão é, inevitavelmente, adiar uma decisão durante anos, que poderia ser tomada a muito breve trecho, contrariando-se, inclusivamente, a jurisprudência deste Supremo Tribunal, de que é exemplo o douto Acórdão de 02.06.2010, proferido no âmbito do processo n.º 01541A/03 (…); x.

Assim, a conclusão de que este processo executivo não é o meio próprio para indemnizar a Recorrida pela falta de satisfação do direito que lhe assistia à integral repristinação não pode deixar de consubstanciar uma interpretação inconstitucional do artigo 178.º do CPTA por violação do direito à tutela jurisdicional efectiva plasmado no artigo 20.º e concretizado, no que à jurisdição administrativa diz respeito, no artigo 268.º, n.º 4, da CRP, o que desde já se arguiu para os devidos legais efeitos”.

Termina a autora solicitando que seja dado provimento ao recurso com as consequências legais que daí poderão advir.

1.2.

A entidade recorrida contra-alegou, concluindo deste modo (fls 268 e segs): “I) No processo executivo subjacente ao presente recurso, a ora recorrente, sob pretexto de reclamar uma indemnização pela impossibilidade de execução por causa legítima (artigo 166.º do CPTA), peticiona, de facto, uma indemnização pelos danos que, pretensamente, lhe teriam sido causados pelo ato declarado.

II) É consabido que o pedido da indemnização devida pela impossibilidade de execução por causa legítima pode ser deduzido no próprio processo executivo, ao passo que a indemnização devida pelos danos causados pela prática do ato ilegal deve ser deduzido no âmbito de um processo especial declarativo autónomo – cfr. Artigo 37.º/2 alínea f) do CPTA.

III) Tal entendimento é, aliás, pacífico entre a nossa jurisprudência e doutrina, pelo que, e atenta a real pretensão da recorrente, bem decidiu o Tribunal a quo ao considerar não ser o processo de execução o meio próprio para fixar a indemnização pretendida pela recorrente.

(…) VII) Sem embargo de, em sede de réplica (e conclusões das alegações) a ora recorrente alegar que “(…) frustrando-se a execução do douto Acórdão, tem a A. direito a que lhe seja indemnizada a sua perda de oportunidade (…)”, é inexorável que, da concretização desse pedido resulta que o que esta pretende obter através do processo executivo é uma indemnização pelos danos que, pretensamente, lhe advieram do ato ilegal (declarado nulo pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga).

VIII) Com efeito, esta pretende a reparação dos designados danos emergentes, lucros cessantes e danos futuros, pretensamente sofridos por não ter sido colocada na Conservatória do Registo Predial de Gondomar.

IX) Ora, os prejuízos que a recorrente pretende ver ressarcidos, quando muito, poderiam ser decorrentes do ato ilegal, pelo que é manifesto que, como decidiu o Tribunal a quo o processo executivo não é o meio próprio para fixar a indemnização a que se arroga a recorrente.

X) Ademais, para fundamentar a sua pretensão a recorrente dá como certo algo que, na verdade, é manifestamente improvável.

XI) E, no que respeita à inexistência deste grau de probabilidade, haverá ainda que ter presente que, como se refere no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02/06/2010 (Processo: 01541A/03): “(…) não é seguro que a anulação do acto e a impossibilidade de execução do julgado pela via da reconstituição natural determine, sempre e em qualquer caso, a atribuição de uma indemnização e isto porque o Exequente só tem direito a ser indemnizado quando seja certo ou, no mínimo, seja muito provável que a retoma do procedimento iria conduzir a que ele viesse a obter o benefício a que se candidatou”.

XII) Considerando a mudança de paradigma em que se consubstanciou a Lei n.º 10/2004, de 22 de março, não só não é certo, como nem sequer é muito provável, que a recorrente – se avaliada nos termos determinados pelo acórdão exequendo – lograsse ficar colocada em 1.º lugar no concurso para a Conservatória do Registo Predial de Gondomar, como, pelo contrário, é bastante provável que a sua avaliação fosse qualitativamente inferior àquela que lhe foi atribuída pelo ato declarado nulo”.

Em função do exposto, sustenta a entidade recorrida que o recurso deve ser “rejeitado liminarmente, por não se verificarem os pressupostos processuais previstos no artigo 150.º/1 do CPTA, ou, caso assim não se entenda, ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se o acórdão recorrido”.

  1. O presente recurso de revista excepcional foi admitido por acórdão da formação prevista no artigo 150.º do CPTA, de 06.03.2014, com vista a proporcionar uma melhor aplicação do direito relativamente a uma questão jurídica relevante (fl. 295).

    2.1.

    Devidamente notificado para se pronunciar, querendo, sobre o mérito do recurso (art. 146.º, n.º 1, do CPTA), veio o Douto Magistrado do MP apresentar o seguinte quadro conclusivo: (i) “Pelo exposto, deverá ser concedido provimento ao recurso, julgando-se procedente a arguição de nulidade, por falta de especificação dos fundamentos de direito daquela decisão, ordenando-se, em consequência, a baixa dos autos ao Tribunal recorrido, para efeito da sua reforma, nos termos dos artºs 668, n.º 1, b) e 731.º, n.º 2 do CPC ex-vi art. 140.º do CPTA”; (ii) “Para o caso de assim não se entender, deverá então ser concedido provimento ao recurso, por o processo de execução de julgado anulatório se revelar, por convolação, meio processual idóneo sui generis de fixação de indemnização devida pelo facto da inexecução, nos termos do art.º 178.º do CPTA, acompanhando-se a recorrente nas suas alegações de recurso”.

  2. Colhidos os vistos legais, ficam os autos submetidos à conferência para julgamento.

    II – Fundamentação 1.

    De facto: 1.1 Considera-se assente, com interesse para a decisão, as seguintes incidências processuais: a) A ora recorrente apresentou a sua candidatura ao concurso, aberto pelo Aviso n.º 12973/2008, em 28 de Abril de 2008, para provimento de lugar de 1.º Conservador (interino) da Conservatória do Registo Predial de Gondomar. Apesar de ser a candidata com maior antiguidade no cargo, ficou classificada em segundo lugar, em razão de a classificação de Bom com Distinção com que concorreu ser inferior à do primeiro classificado, que...

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