Acórdão nº 0799/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Setembro de 2014
Magistrado Responsável | CARLOS CARVALHO |
Data da Resolução | 25 de Setembro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.
RELATÓRIO 1.1. “MUNICÍPIO DE CONDEIXA-A-Nova”, devidamente identificado nos autos, instaurou neste Supremo Tribunal a presente providência cautelar, com incidente de decretamento provisório, contra o CONSELHO DE MINISTROS [doravante e abreviadamente «CM»] e os contrainteressados “MINISTÉRIO DO AMBIENTE, ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E ENERGIA” [«MAOTE»], “ERSAR - ENTIDADE REGULADORA DOS SERVIÇOS DE ÁGUAS E RESÍDUOS” [«ERSAR»], “A…….. (SGPS), SA”, [«A…….»] “B…….., SA”, “C…….., SA” [«C……..»] e “D……., SA” [«D…….»], nos termos e com a motivação aduzida no requerimento inicial de fls. 02/47 dos autos, sustentando estarem verificados os requisitos exigidos no art. 120.º, n.ºs 1, als. a) e b) e 2 do CPTA, pelo que peticiona que este Tribunal adote, com precedência de decretamento provisório, a requerida providência cautelar ordenando “a suspensão, com alcance geral, dos efeitos do ato suspendendo (ato administrativo em causa constituído pela publicação do Decreto-Lei n.º 45/2014 … e da Resolução do Conselho de Ministros n.º 30/2014 …)”.
1.2.
Após audição dos requeridos [cfr. fls. 127/237 dos autos - paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário] o relator, pelo despacho de fls. 240/243, indeferiu o pedido de decretamento provisório da providência e, no prosseguimento dos autos, determinou a citação dos requeridos para efeitos do disposto nos arts. 117.º e 118.º do CPTA.
1.3.
O ente requerido «CM», nos termos e para os efeitos previstos no art. 128.º, n.º 1 do CPTA, aprovou a resolução fundamentada [cfr. fls. 223/229 que aqui se dá por integralmente reproduzida], na qual reconhece que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público.
1.4.
O mesmo ente deduziu oposição [cfr. fls. 254/300] na qual se defende, por um lado, por exceção sustentando que o litígio está excluído do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal uma vez que o que o requerente verdadeiramente pretende obter com os presentes autos é a suspensão de eficácia das normas legislativas contidas no DL n.º 45/2014 e a opção política que as mesmas encerram. E, por outro lado, enquanto defesa por impugnação, respondeu, ponto a ponto, à argumentação do requerente, invocando, em resumo, que o ato suspendendo não enferma de qualquer das ilegalidades que aquele lhe imputa e que não estão verificados os requisitos do fumus boni iuris previstos nas als. a) e b) do n.º 1 do art. 120.º do CPTA, bem como que não há periculum in mora e que, de todo o modo, deve recusar-se a providência requerida, uma vez que, ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa.
1.5.
Os demais entes requeridos vieram deduzir, igualmente, oposições [cfr. «MAOTE» (fls. 415/418),«A………»/«B……..
»/«C……»/«D……» (fls. 420/444)], articulados esses nos quais se formulou defesa por exceção [ilegitimidade passiva invocada pelo «MAOTE»; incompetência material invocada pelos demais entes requeridos dado o litígio estar excluído do âmbito da jurisdição visto se pretender obter a suspensão de eficácia de normas legislativas contidas no DL n.º 45/2014 e a opção política que as mesmas encerram] e, no apresentado pela «A……» e outros, também defesa por impugnação, contraditando a argumentação do requerente, porquanto o ato suspendendo não enferma de qualquer das ilegalidades que aquele lhe imputa, não estando verificados os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora previstos nas als. a) e b) do n.º 1 do art. 120.º do CPTA, na certeza de que sempre deverá ser recusada a providência requerida à luz da ponderação de interesses inserta no n.º 2 do art. 120.º do CPTA.
1.6.
O requerente veio pronunciar-se sobre a matéria da exceção concluindo no sentido da sua improcedência [cfr. fls. 553/570].
1.7.
Notificado da resolução fundamentada referida em 1.3) o requerente veio, nos termos do art. 128.º, n.º 4 do CPTA, deduzir incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida [cfr. fls. 450/461] requerendo que fosse a mesma “considerada improcedente” e “declarada a ineficácia dos atos de execução indevida indicados … no art. 58.º” [1) ato administrativo que impõe a alienação de 100% das ações da C....., SA; 2) ato administrativo que obriga os municípios ao exercício do direito de preferência na alienação das participações sociais nas empresas concessionadas; 3) ato administrativo que estipula a alienação de 95% do capital social da C…… através de concurso público nos termos previstos na Resolução de Conselho de Ministros n.º 30/2014; 4) ato administrativo de alteração dos Estatutos da D……, consubstanciado no DL n.º 102/2014], “bem como os demais praticados indevidamente ao abrigo dos atos suspendendos, desde o dia 8 de abril até à presente data”.
1.8.
Notificado do incidente mencionado no número anterior, a entidade demandada veio, ao abrigo do disposto no art. 128.º, n.º 6 do CPTA, pronunciar-se sobre o mesmo, defendendo a sua recusa liminar dado tratar-se de “pretensão manifestamente ilegal” visto o “CPTA não admitir como pedido autónomo o que nele se requer” ou, caso assim se não entenda, o seu indeferimento, “por não se verificarem os vícios imputados à resolução fundamentada, designadamente o de deficiente fundamentação” [cfr. fls. 472/514].
1.9.
De igual modo em sede de contraditório no quadro do referido incidente «A…….
», «B……..
», «C…….
» e «D…….
» vieram deduzir resposta, ao abrigo do mesmo dispositivo legal, defendendo o indeferimento do mesmo [cfr. fls. 530/539].
1.10. Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.
-
FUNDAMENTAÇÃO 2.1.
DE FACTO Com interesse para a decisão a proferir, considera-se como assente o seguinte quadro factual: I) No Diário da República, Iª Série, n.º 69, de 08.04.2014, foi publicada a Resolução do Conselho de Ministros n.º 30/2014, que aqui se dá por integralmente reproduzida, donde se extrai, nomeadamente, o seguinte: “O Governo aprovou, através do Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, o processo de reprivatização do capital social da participação detida pela B…., SGPS, S.A., no capital da C……., S.A. (C…….).
O referido diploma determinou que o processo de reprivatização se faria através de um concurso público, a realizar nos termos previstos na Lei n.º 11/90 (…) e do referido decreto-lei, e ao qual não se aplica o disposto no Código dos Contratos Públicos.
O caderno de encargos que agora se aprova regula o referido concurso público de modo a assegurar todas as garantias de transparência, igualdade e concorrência que caracterizam um procedimento desta natureza, e a permitir ao Governo a escolha da proposta que melhor se conforme com os objetivos da reprivatização, assegurando -se que o adquirente da C…… estará dotado dos requisitos de idoneidade, e capacidade financeira e técnica indispensáveis à sua gestão, assegurando a qualidade do serviço público prestado às populações.
(…) O Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, concedeu, no âmbito do processo de reprivatização, direito aos municípios de alienação das participações sociais por eles detidas no capital das entidades gestoras de sistemas multimunicipais nas quais a C…… é acionista, alienação essa sujeita ao exercício de direito de preferência por parte de municípios que detenham participações no capital da mesma entidade gestora e que tenham decidido não alienar as respetivas ações. Mais estabeleceu que tais direitos seriam exercidos nos termos e condições, designadamente de prazo e de preço, a fixar no caderno de encargos, pelo que se vem agora proceder a essa regulamentação.
Fixa-se em 5% do capital social da C…… o montante das ações que são reservadas para aquisição pelos trabalhadores da C……, direito esse previsto no artigo 12.º do referido decreto-lei, em linha com o estabelecido na Lei n.º 11/90 (…).
(…) Assim: Nos termos do n.º 1 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, e das alíneas c) e g) do artigo 199.º da Constituição, o Conselho de Ministros resolve: 1 - Determinar que são alienadas 100% das ações da C…….., S.A. (C…….) e que o concurso público previsto no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 45/2014, de 20 de março, tenha por objeto ações representativas de 95 % do capital social da C……..
2 - Aprovar o caderno de encargos do concurso público, constante do anexo I à presente resolução, da qual faz parte integrante, no qual se estabelecem os termos e condições específicos a que obedece o concurso público previsto no número anterior.
3 - Aprovar os termos do exercício pelos municípios da opção de alienação das participações sociais por aqueles detidas no capital das entidades gestoras de sistemas multimunicipais nas quais a C…….. é acionista, bem como do exercício do direito de preferência pelos restantes municípios da mesma entidade gestora, relativamente à referida alienação, os quais constam do caderno de encargos a que se refere o número anterior.
4 - Determinar a abertura do concurso público previsto no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 45/2014 (….) através do envio para publicação do anúncio no Jornal Oficial da União Europeia e no Diário da República.
5 - Aprovar, no anexo II à presente resolução, da qual faz parte integrante, algumas condições da oferta pública de venda de ações da C……., dirigida exclusivamente a trabalhadores da C……., no âmbito da qual os referidos trabalhadores podem adquirir ações representativas de 5% do capital social da C…….
6 - Determinar que as ações que não sejam vendidas a trabalhadores, assim como aquelas cuja transmissão não se concretize, acrescem automaticamente às ações a adquirir pelo vencedor do concurso público, obrigando-se este a adquirir tais ações pelo preço por ação constante da sua proposta vinculativa.
7 -...
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