Acórdão nº 0935/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução24 de Setembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A………………, com os demais sinais dos autos, vêm recorrer para este Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que julgou improcedente a reclamação por si deduzida contra o despacho do Órgão de Execução Fiscal que considerou como não prescritas as dividas de IVA de 1996 e 1997 e respectivos juros compensatórios.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «

  1. O prazo relevante para a prescrição das obrigações tributárias, em caso da sua alteração por leis que se sucedam, é determinado por aplicação da regra constante do art.º 297.º, n.º 1, do Código Civil, mas apenas enquanto norma que constitui um simples postulado necessário, nesse domínio do direito, dos princípios constitucionais da igualdade tributária (art.º 13.º e 103.º n.º 1, da CRP), da segurança jurídica e da tutela da confiança ínsitos no princípio do Estado de direito democrático consagrado no art.º 2.º CRP (cfr. Conselheiro Benjamim Silva Rodrigues no estudo “A Prescrição no Direito Tributário”, publicado in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, 1999, Vislis Editores, págs. 261 e segs).

  2. Atenta a funcionalidade e axiologia das normas que procedem à alteração do início do cômputo do prazo de prescrição ou à alteração de causas de suspensão ou de interrupção, devem estas normas ser tratadas como normas que alteram o prazo de prescrição, nos mesmos termos estabelecidos no art.º 297.º, n.º 1, do Código Civil para a alteração do prazo em termos absolutos, sob pena de violação dos princípios constitucionais da igualdade tributária, consagrado nos art.ºs 13.° 103.º n° 1, da CRP, da segurança jurídica e da tutela da confiança dos contribuintes ínsitos no princípio material do Estado de direito democrático.

  3. Uma interpretação conjugada dos artºs 12.º, nº 2, e 297.º, n.º 1, do Código Civil e dos art.°s 34.º, nºs 2 e 3, do Código de Processo Tributário e 48.º n.º 1, e 49.º da LGT, em qualquer das versões que tais preceitos alcançaram, acima referidas, em sentido contrário ao que consta da alínea anterior é inconstitucional por violação dos princípios constitucionais da igualdade tributária, consagrado nos art.ºs 13.º e 103.º, nº 1, da CRP, da segurança jurídica e da tutela da confiança dos contribuintes, estes ínsitos no princípio material do Estado de direito democrático consagrado no art.º 2.º CRP.

  4. As normas que procedem à configuração de causas de suspensão ou de interrupção do prazo de prescrição não são normas que estatuam sobre o conteúdo ou efeitos da relação jurídico-tributáría, mas antes normas sobre a repercussão do tempo nas relações jurídico-tributárias para efeitos da prescrição e em termos correspondentes aos da norma que dispõe sobre a alteração do prazo, constante do art.° 297.º, n.°1, do Código Civil; e) A questão da prescrição das dívidas exequendas tem assim de ser resolvida à luz do disposto no art.º 34.º n.º 1, 2 e 3, do CPT, porque, pela aplicação de tais preceitos, falta menos tempo para o prazo mais longo de prescrição (de 10 anos) se completar.

  5. Por força da aplicação de tais preceitos as dívidas exequendas relativas ao ano de 2006 prescreveram em 1 de Janeiro de 2009 e as relativas aos anos de 2007 em 1 de Janeiro de 2010 (Por lapso o recorrente refere nesta conclusão que as dívidas são relativas aos anos de 2006 e 2007, quando na verdade são relativas a 1996 e 1997.

    ).» 2 – A Fazenda Publica veio apresentar as suas contra alegações, pronunciando-se pelo não provimento do recurso, invocando, em síntese, a posição doutrinal de Jorge de Sousa no seu livro “Sobre a prescrição da obrigação tributárias, notas práticas”, a páginas 101 e 102, no sentido de que “ não é o artigo 297.º do CC que regula o regime de aplicação no tempo das leis sobre efeitos (interruptivos e suspensivos) que certos factos têm sobre o decurso dos prazos de prescrição. Os efeitos jurídicos de facto são determinados pela lei vigente no momento em que eles ocorrem, como decorre do nº2 do art.º 12º do CC.”- fls. 135 dos autos.

    3 – O Exmº Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso, reiterando toda a argumentação expendida pela Fazenda Pública.

    4 – Com dispensa de vistos, dada a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

    5- Em sede factual apurou-se em primeira instância seguinte matéria de facto:

  6. Em 10/04/2000 foi autuado o PEF 1287-00/100103.5 para cobrança coerciva das seguintes dívidas, no total de 27644,43€: b) A 13/04/2000 foi citado o ora reclamante no PEF 1287-00/100103.5 (cfr. documento de fls. 2, 2a) e 2b) do PEF); c) Em 28/02/2000 deu entrada na Repartição de Finanças de Trancoso a impugnação judicial das liquidações que estão na origem das dívidas em cobrança no PEF 1287200001001035 (cfr. documento de fls. 37 do PEF); d) A 21/01/2003 foi emitido mandado de penhora contra o ora reclamante para pagamento das dívidas no valor de 27.644,43€, no âmbito do PEF 1287- 00/100103.5 (cfr. documento de fls. 24 do PEF); e) No PEF 1287-00/100103.5 foi penhorado um veículo pesado de mercadorias, marca Iveco (cfr. cópia de auto de penhora, de fls. 26 a 28 do PEF); f) Ao bem penhorado foi atribuído o valor de 6.983,17€ (cfr. cópia de auto de penhora, de fls. 26 a 28 do PEF); g) 04/03/2003 foi requerida pelo ora reclamante a suspensão dos PEFs 1287- 97/100237.6, 1287-98/100235.0, 1287-98/100159.0 e 1287-00/100103.5, alegando o ora reclamante, para o efeito, a impugnação já deduzida das dividas respectivas, oferecendo como garantia “a casa destinada a habitação, sita no campo das ......, em Trancoso (..), inscrita na respectiva matriz urbana da dita freguesia sob o art.º 1022º (cfr. documento de fls. 29 do PEF); h) A 14/03/2003, no processo 1287-97/100237.6 e apensos, foi emitido mandado de penhora, contra o ora reclamante (cfr. documento de fls. 30 do PEF); i) A 21/03/2003 foi penhorado o bem identificado na alínea f, para garantia da dívida a prestar nos termos do art.º 169.º do CPPT, (...) proveniente de IVA dos anos 1993, 1996 e 1997 (...) (cfr. documento de fls. 31 e 32 do PEF); j) Em 16/12/2013 o ora reclamante requereu ao Chefe de Serviço de Finanças de Trancoso o decretamento de prescrição das dívidas em cobrança, além do mais, no PEF 1287200001001035 (cfr. documento de fls. 43 e seguintes do PEF); k) A 24/03/2014 foi emitido despacho pelo chefe de serviço no sentido da não prescrição da dívida (cfr. despacho de fls. 66 do PEF); l) A 24/03/2014 foi emitido o oficio n.º 329 com a finalidade de comunicar a não prescrição das dívidas em cobrança no PEF 1287200001001035 (cfr. documento de fls. 71 do PEF); m) A 26/03/2014 foi recebido pelo reclamante o ofício a que se refere a alínea anterior (cfr. documento de fls. 73 do PEF); n) A 02/04/2014 foi remetida a presente reclamação (cfr. documento de fls. 77 do PEF); 6.

    A questão objecto do presente recurso consiste em saber se incorreu em erro de julgamento a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que entendeu não ter ocorrido a prescrição das dívida exequendas de IVA e juros compensatórios referentes aos anos de 1996 e 1997.

    Como se vê fls. 61 e segs., maxime de fls. 74, a sentença recorrida entendeu que as referidas dívidas exequendas não prescreveram tendo em vista o disposto nos artº 48º e 49, nº1 e nº 3 da Lei Geral Tributária.

    Considerou-se na decisão recorrida que no caso subjudice seria aplicável o prazo de prescrição previsto no artº 48º da Lei Geral Tributária por força do disposto no artº 297º, nº 1 do Código Civil e, quanto às causas de suspensão e interrupção do prazo de prescrição, seria aplicável o disposto no artº 49, nº1 e 3 do mesmo diploma legal por força do princípio geral de aplicação das normas no tempo quanto aos efeitos das relações jurídicas duradouras, contido no artº 12º, nº 2 do Código Civil.

    Não conformado com este entendimento sustenta o recorrente que tais dívidas se encontram prescritas, porquanto, em sua opinião, a questão da prescrição das dívidas exequendas tem ser resolvida à luz do disposto no art.º 34.º n.º 1, 2 e 3, do CPT, resultando da aplicação de tais preceitos que falta menos tempo para o prazo mais longo de prescrição (de 10 anos) se completar.

    Para chegar a tal conclusão defende o recorrente que as normas que procedem à alteração do início do cômputo do prazo de prescrição ou à alteração de causas de suspensão ou de interrupção, devem ser tratadas como normas que alteram o prazo de prescrição, nos mesmos termos estabelecidos no art.º 297.º, n.º 1, do Código Civil para a alteração do prazo em termos absolutos, sob pena de violação dos princípios constitucionais da igualdade tributária, consagrado nos art.ºs 13.° 103.º n° 1, da CRP, da segurança jurídica e da tutela da confiança dos contribuintes ínsitos no princípio material do Estado de direito democrático.

    No prosseguimento de tal discurso argumentativo sustenta que as normas que procedem à configuração de causas de suspensão ou de interrupção do prazo de prescrição não são normas que estatuam sobre o conteúdo ou efeitos da relação jurídico-tributáría, mas antes normas sobre a repercussão do tempo nas relações jurídico-tributárias para efeitos da prescrição e em termos correspondentes aos da norma que dispõe sobre a alteração do prazo, constante do art.° 297.º, n,°1, do Código Civil.

    7.1 Vejamos pois se se verifica a prescrição das dívidas exequendas.

    No caso sub judice está em causa uma questão de sucessão de leis no tempo relativa aos prazos e também aos regimes de prescrição das dívidas tributárias.

    No Código de Processo Tributário, que entrou em no dia 1 de Julho de 1991, o regime geral da prescrição da obrigação tributária constava do artº 34º sendo tal prazo de 10 anos, para os impostos, contados desde o ano seguinte aquele em que tiver ocorrido o facto tributário.

    Nos...

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