Acórdão nº 0208/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução02 de Outubro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: 1.

A……………, SA, instaurou no TAC de Lisboa, em simultâneo com a acção de contencioso pré-contratual, o presente processo cautelar - nos termos e para os efeitos do disposto nos art.°s 120.°/1/a), 128.° e 132.° do CPTA - contra o IFAP - Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP, tendo como contra-interessados a B…………. S.A., e C………………, S.A., relativo ao concurso aberto pelo IFAP para a “Aquisição de Serviços Combinados de Comunicações de Voz e Dados de Acesso à Internet e Conectividade em Todo o Território Nacional”, em o respectivo objecto foi adjudicado à C…………., pedindo o decretamento das seguintes providências: “(i) de suspensão de eficácia do acto de adjudicação do Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP, notificado à Requerente no dia 14/03/2013, pelo qual se procedeu à adjudicação do objecto do procedimento à concorrente C…………….; (ii) de abstenção da Entidade Adjudicante proceder à celebração do respectivo contrato com a concorrente C…………., ou, caso esteja tenha sido assinado, (iii) de suspensão dos efeitos do contrato celebrado e da respectiva execução, até ao trânsito em julgado da decisão a proferir em sede de acção administrativa especial sobre a invalidade do acto de adjudicação supra.” No decurso dessa providência a Requerente deduziu, nos termos do art.º 128.º/3 e 4 do CPTA, este incidente de declaração de ineficácia de actos de execução indevida pedindo que se notificasse o Requerido para identificar os actos de execução que entretanto praticou, que se suspendessem imediatamente os que estavam em execução e que se julgassem ineficazes todos esses actos de execução.

Requerimento que o TAC indeferiu pela seguinte ordem de razões: “Considerando, em suma, que, no caso vertente, não só não se verificam os pressupostos da peticionada declaração de ineficácia como também que, ainda que assim não fosse, é entendimento deste Tribunal que o art.º 128.º do CPTA não colhe aplicação em sede de providências cautelares relativas a formação de contratos, como é o caso dos autos, (atenta interpretação dada ao art.º 132.º/3 do CPTA), impõe-se concluir, sem necessidade de mais considerandos, que o presente incidente é totalmente destituído de fundamento (de facto e de direito), bem como de interesse para assegurar a utilidade da sentença a proferir, no cotejo com as providências requeridas nos autos, pelo que decido indeferir o pedido de declaração de ineficácia formulado ao abrigo do disposto no art.º 123.º/3 e 4 do CPTA.” A Requerente recorreu para o TCAS e este, revogando a decisão do TAC, declarou “a ineficácia dos «actos de execução relativos à instalação de circuitos e todos os que lhe sucederam» e os consequentes à solicitação junto do ora Recorrente, por este observada, para que «facultasse os excertos das configurações dos CPEs da Multinet referentes a rotas e nat’s»”.

Inconformado, o IFAP interpôs este recurso de revista onde formulou as seguintes conclusões: Pressupostos da Revista A. O n.º 1 do art. 150° do CPTA prevê que «Das decisões proferidas em 2.ª instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.» B.

Nos presentes autos, está em causa a questão da aplicabilidade do artigo 128.° do CPTA às providências relativas à formação de contratos públicos e, em especial, se, nesta matéria, os efeitos suspensivos da eficácia de actos, podem atingir os actos de execução do contrato celebrado, ou se apenas podem operar sobre os actos conducentes à formação do contrato e sua conclusão ou celebração.

C.

A questão da aplicabilidade do artigo 128.° do CPTA às providências relativas à formação de contratos públicos já foi apreciada pelo STA no Ac. de 20/03/2007, proc. 01191/06, e no Ac. de 03/10/2013, proc. 0829/13. Sendo que, no último, foi também apreciada a questão de saber se os efeitos suspensivos da eficácia de actos, podem atingir os actos de execução do contrato celebrado, ou se apenas podem operar sobre os actos conducentes à formação do contrato e sua conclusão ou celebração.

D.

Apesar de ambos os Acórdãos do STA serem anteriores o TCA não os considerou e optou, em vez disso, pela interpretação do Ac. do TCA Sul de 28.10.2010, proc. 6616/10, e do Ac. do TCA Norte de 07/10/2011, proc. 858/10.

E. O Recorrente não emitiu a ‘resolução fundamentada’ prevista no art. 128° do CPTA em obediência à jurisprudência do STA segundo a qual o art. 128.° do CPTA não teria aplicação aos presentes autos.

F.

O TAC de Lisboa perfilhou também o entendimento do STA e coibiu-se de notificar o Recorrente para os termos e efeitos do n.º 1, do art.º 128.° do CPTA.

G.

A questão tem sido tratada pelas instâncias de forma pouco coerente e contraditória - também reflectida no voto de vencido proferido no Acórdão recorrido - o que suscita dúvidas sérias e grave incerteza sobre qual o quadro legal aplicável a situações com a dos autos, o que traduz a sua relevância jurídica e torna necessária a sua resolução para uma melhor aplicação do direito. Impõe-se, por tanto, a intervenção do STA enquanto órgão do topo da jurisdição administrativa.

H.

Surge, nos presentes autos, uma questão adicional nunca colocada neste âmbito: a de saber se o facto de o conhecimento da celebração do contrato apenas chegar à esfera jurídica do Requerente, sem culpa sua, no decurso do processo cautelar, apesar da outorga ser anterior à respectiva propositura, possibilitará que seja deduzido, na instância cautelar, incidente de declaração de ineficácia dos actos de execução indevida reportados ao próprio contrato, ao abrigo do regime do art. 128° nos. 1, 3 e 4 CPTA.

I.

O assunto é de enorme relevância social colocando-se diariamente no contencioso administrativo emergente das relações jurídicas estabelecidas entre Administração e particulares no âmbito do aprovisionamento dos bens e serviços inevitáveis à prossecução dos fins públicos.

J.

No acórdão recorrido o TCA Sul comete o erro jurídico palmar de entender que não dispunha de elementos de facto que lhe permitissem a ponderação dos interesses públicos e privados em jogo, por não ter sido emitida a resolução fundamentada.

K.

Os elementos de facto foram devidamente alegados nos articulados iniciais das partes, como sucede em todos os processos judiciais em que os factos devem ser vertidos nos articulados e não em qualquer documento autónomo subscrito pelas partes! Objecto do recurso L.

O Requerido IFAP, IP não foi notificado para dar cumprimento ao n.º 1, do art. 128° do CPTA.

M.

A disposição do n.º 1, do art. 128° do CPTA não tem aplicação às “providências relativas a procedimentos de formação de contratos”, reguladas pelo art. 132° do CPTA, por razões de ordem histórica.

N.

Do D.L. n.º 134/98, que transpôs a Directiva Comunitária n.º 89/665/CEE, resultava claramente que, na pendência de um procedimento de formação de um contrato, o requerimento de adopção de medida provisória destinada a corrigir a ilegalidade ou a impedir que sejam causados outros danos aos interesses em causa, incluindo medidas destinadas a suspender o procedimento de formação do contrato, não importava a suspensão do concurso.

O. Tal regime era compreensível pela preocupação que o legislador comunitário teve em salvaguardar os interesses em jogo, na pendência do processo cautelar. Na verdade, estão em confronto, por um lado, os interesses públicos (corporizados nos colocados a cargo da Administração) e particulares dos outros concorrentes (os contra-interessados, muitas vezes oriundos de outros países da Comunidade) e, por outro, com os interesses defendidos pelo requerente.

P. A opção do legislador foi criar um processo extremamente célere por forma a que fosse desnecessária a paralisação do concurso, salvaguardando, assim os interesses em confronto.

Q.

Com a publicação do CPTA, inexistem razões ponderosas...

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