Acórdão nº 01422/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelMADEIRA DOS SANTOS
Data da Resolução06 de Novembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I-RELATÓRIO 1- O MINISTÉRIO PÚBLICO, junto do TAF de Leiria, intentou acção administrativa especial, nos termos do art. 40º ETAF, para declaração de nulidade da Deliberação de 16.02.1998, da Câmara Municipal de Óbidos e dos Despachos de 6 de Dezembro de 1999 e 24 de Janeiro de 2000, (doc. 1), 9 de Abril e 24 de Setembro de 2001, de 22 de Maio e 31 de Julho de 2002 (doc. 2), respeitantes ao loteamento de um prédio rústico, sito em ………….. e ……………, freguesia de ……….., concelho de Óbidos, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 701, inscrito na matriz sob o art. 14º, secção H, freguesia de …………., contra o Município de Óbidos, identificando vários contra-interessados.

O TAF de Leiria julgou a acção improcedente, por sentença de 28.02.2009 fls. 870/882.

1.1- Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso dessa decisão para o Tribunal Central Administrativo Sul, ao abrigo dos art.s 140º, 141º, nº1, 142º, nº1 e 143º, nº1, do CPTA e art.s 734º, nº1, al. a) e 736 do CPCs. (fls. 896). Admitido o recurso (fls. 902), o TCA-SUL proferiu acórdão (fls.1009-1024), em 24.04.2013 que, concedendo provimento ao recurso, revogou a decisão recorrida, julgando “procedente a acção” declarando “a nulidade da deliberação e despachos impugnados, designadamente da deliberação de 16.02.1998, da CMO, que deferiu o pedido de loteamento e dos despachos de 06.12.1999, 24.01.2000, 09.04.2001, 24.09.2001, 22.05.2002, 31.07.2002, do Presidente da CMO, que deferiram pedidos de licenciamento de construção determinar as custas pelos Recorridos, em partes iguais; atendendo ao pedido formulado nesta acção e à decisão ora proferida, nos termos dos artigos 3º, nº1, al. a), 8º-A, nº1, alínea b), 8º-A, 3, alínea a) e 53º da CRP, envie à Secretaria do TCA, após trânsito desta decisão, à Conservatória do Registo Predial de Óbidos, cópia da PI e do presente Acórdão, com indicação da data do respectivo trânsito, para efeitos de promoção do registo.”.

1.2- Inconformada, veio a B…………….., SA, interpor recurso a fls. 1049-1058, para o STA, ao abrigo do art.150º CPTA, concluindo as suas alegações do modo seguinte: “1. A questão da manutenção das garantias hipotecárias, enquanto efeitos putativos dos atos administrativos impugnados, ainda que estes venham, efetiva e definitivamente, a ser declarados nulos reveste-se, por isso, claramente de relevância jurídica e social.

  1. É que uma decisão, como a que foi agora prolatada e de que se recorre, afeta gravemente a segurança e estabilidade que caracteriza as relações jurídicas constituídas através dos contratos de mútuo com hipoteca outorgados, 3. Afetando, nomeadamente a confiança que os seus agentes depositaram na presunção de legalidade que decorre dos atos administrativos que tiveram por base e permitiram mesmo o nascimento de tais relações.

  2. Sem conceder, ainda que tivesse sido declarada a nulidade como foi, e que a mesma venha permanecer relativamente aos atos administrativos impugnados pelo Autor e ora recorrido, o que apenas por necessidade de raciocínio se admite, 5. tal não deveria nunca, salvo o devido respeito, afetar os direitos de garantia que decorrem das duas hipotecas, registadas a favor da B…………… e que na altura da entrega da presente ação, se encontravam registadas há já quatro anos, sob o prédio urbano designado por Lote nº……, sito no “…………….. e …………..”, freguesia de ……….., concelho de Óbidos, descrito na Conservatória do Registo Predial de Óbidos sob a ficha nº 00935/040599 da dita freguesia; 6. Tanto mais que, como credora de boa-fé que, obviamente, desconhecia sem culpa a existência de tal vício, a B……………. beneficia de hipotecas, constituídas e devidamente registadas a seu favor 4 anos antes da entrega da presente ação de impugnação, 7. Sendo inteiramente legítimo o interesse da credora B……………. na manutenção dos seus direitos de garantias; 8. São, de difícil, ou mesmo, impossível reparação, os evidentes danos que a B…………. sofreria perante a projecção da nulidade dos referidos atos administrativos nas mencionadas hipotecas; 9. Sendo manifesta a desproporção existente entre o seu interesse em continuar a beneficiar das mencionadas garantias reais e o interesse na execução do acórdão de que se recorre e que declarou a nulidade de tais atos.

    Nestes termos e nos demais de direito que forem doutamente supridos pelo superior critério de V.Exªs. deverá ser julgado procedente o presente recurso, e caso venha a persistir a declaração da nulidade dos atos administrativos impugnados, devem ser mantidos os direitos de garantia, resultantes das hipotecas constituídas e registadas a favor da B……………, 4 anos antes da entrega da presente ação de impugnação, sob o prédio urbano designado por Lote nº ….., sito no “…………….. e ………….”, freguesia de …………, concelho de Óbidos, descrito na Conservatória do Registo Predial de Óbidos sob a ficha nº 00935/040599 da dita freguesia ou, no mínimo, como decorrentes de actos administrativos consequentes àqueles atos, com as demais consequências legais.

    Vossas Excelências farão, como sempre, a costumada JUSTIÇA!” 1.3- O Município de Óbidos interpôs igualmente, a fls. 1061-1068v, (original: fls. 1101 a 1117 recurso para o STA, invocando o mesmo normativo, alegando em conclusão: “1. A questão que o Recorrente coloca para apreciação desse Tribunal não só se reveste de importância fundamental, atenta a sua relevância jurídica, como a admissão do recurso é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito; 2. O Decreto-Lei n.° 196/89, de 14 de Junho, que estabelece o regime jurídico da reserva agrícola nacional (“Lei da RAN”), não classifica ou qualifica o solo; 3. Também não define índices de ocupação e utilização do território; 4. Também não proíbe a contabilização das áreas incluídas na RAN para aferição dos índices e parâmetros urbanísticos; 5. É esse o entendimento das CCDR e da DGOTDU; 6. É o que se retira da evolução do Regime Jurídico da REN, enquanto elemento literal e histórico decisivo para a boa interpretação da lei; 7. Cabe aos instrumentos de gestão territorial (planos), designadamente aos planos diretores municipais a fixação dos critérios a ter em conta para o estabelecimento dos índices urbanísticos, como decorre do regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial aprovado pelo Decreto-Lei n.° 380/99, de 22 de Setembro; 8. Tecnicamente a “área total” é igual ao somatório das áreas de terreno afeto às diversas categorias de uso; 9. O Regulamento do PDM do Município de Óbidos não exclui as áreas de terreno dos prédios integradas na RAN para efeitos de cálculo do índice de construção; 10. Segundo o Regulamento do PDM de Óbidos a área bruta do terreno (é) a área de terreno da parcela objeto da operação urbanística, do prédio objeto da operação urbanística (alínea 4 do artigo 3.° do RPDM); 11. Será de uma “parcela” se incidir sobre uma área de terreno não resultante de operações de loteamento, marginado por via pública e suscetível de construção (alínea 2 do artigo 3° do RPDM); 12. Será dum “prédio” se incidir sobre uma área de terreno que, para ser suscetível de construção, tem de ser objeto de uma operação de loteamento e ou de aprovação de obras de urbanização (alínea 3. do artigo 3º do RPDM); 13. No caso dos autos, estamos inequivocamente perante um “prédio”; 14. O intérprete não pode restringir a área do prédio para quantificar a área bruta do terreno e consequentemente definir o índice máximo de construção; 15. É a área total do prédio, enquanto unidade matricial, que terá de ser tida em conta para efetuar os cálculos da área de construção; 16. O índice de construção de 0,26 está, pois, bem calculado; 17. O ato camarário em crise não aprovou a divisão do terreno agrícola em hortas; 18. Decidindo como decidiu o Acórdão em crise violou o disposto nos artigos 3.°, 36º e 37.°, todos do RPDM de Óbidos, inexistindo qualquer preceito na Lei da RAN em vigor à data da prática dos atos em crise que sustente o entendimento sufragado pelo TCA Sul; 19. E, por esse motivo, deverá ser revogado e substituído por outro que considere que o índice de construção, o índice de implantação e o índice de ocupação volumétrica são calculados em função área total da parcela ou do prédio a lotear, não havendo aqui que fazer qualquer diferenciação pelo facto de parte da área que serve de base ao cálculo daqueles indicadores urbanísticos estar incluída na RAN, mantendo, por esse motivo, na ordem jurídica a deliberação camarária de 16 de Fevereiro de 1998, que aprovou o loteamento, e todos os atos de aprovação praticados pelo PCMO, subsequentes, àquele ato camarário, por ser legal, como se espera por ser de JUSTIÇA.” 1.4.

    A………………, L.da não se conformando com o acórdão, também recorreu, fls. 1073-1085, para este STA, ao abrigo do mesmo regime constante do art. 150º CPTA, concluindo: “1ª - Pelo douto acórdão recorrido foi, no essencial, concedido provimento ao recurso interposto pelo MP da douta sentença proferida pela 1ª instância, tendo esta sido revogada e julgada procedente a acção apresentada pelo MP, com a consequente declaração de nulidade da deliberação da Câmara Municipal de Óbidos (CMO) de 16/2/1998, que deferiu o pedido de loteamento em causa nos autos, e dos despachos do Presidente da CMO de 6/12/1999, 24/1/2000, 9/4/2001, 24/9/2001, 22/5/2002 e 31/7/2002, que deferiram os pedidos de licenciamento de construção igualmente em causa nos autos, porquanto, resumidamente: - «o projecto de loteamento apresentado abrangia um prédio rústico de 11.720 m2, que incluía uma área de 2.927,41 m2 de RAN», pelo que, «estando esta área em RAN, o prédio sujeito a loteamento não poderia ser todo ele considerado urbano ou urbanizável e apto a construir, pois nele se incluía uma área cuja construção estava vedada»; - «acresce que, o indicado loteamento ao prever a possibilidade de a parcela em RAN ficar afecta à totalidade dos lotes, para uma utilização...

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